Sou
da geração que cresceu sabendo que o mundo acabaria no ano 2000. A princípio,
para quem nasceu em 1935, a data do apocalipse estava muito distante.
Como
o tempo custa a passar para as crianças, esqueci aquela previsão e toquei
tranquilamente a minha vida.
Concluí
o ensino básico em Cuiabá, depois morei doze anos no Rio de Janeiro, onde achei
que tudo já tivesse acontecido comigo.
Fiz
o meu curso de Medicina, servi o exército brasileiro, casei-me com uma
argentino-brasileira, vi nascer a bossa nova, participei e acompanhei muitos
fatos históricos da recente história verdadeira do Brasil.
Retorno
à minha Cuiabá. Aqui nasceram os meus três filhos, e percebi que o tempo
começou a andar bem mais rápido quando os meus filhos se casaram e o meu ninho
ficou vazio. Todos os meus seis netos nasceram antes do ano 2000.
De
repente lembrei-me da história que ouvi quando criança sobre o fim do mundo. O
ano 2000 estava chegando às minhas portas - a data fatal – e, em um rápido
exame de consciência, percebi que tinha feito tão pouco, que precisava de uma
prorrogação.
Enfrentei,
abraçado com a minha família - todos vestidos de branco e rezando - a
meia-noite do dia 31 de dezembro de 1999. Alegria, choro, abraços,
solidariedade, os fogos de artifício pipocando pela cidade e o mundo continuou,
não acabou.
Logo
fomos presenteados com o amanhecer de um novo dia, e mais tarde, com o
crepúsculo, anunciando outro anoitecer.
Apenas
um equívoco dos alarmistas intérpretes do futuro. “Tudo não passou de uma
brincadeira” - disse-me minha mãe, antes de completar noventa anos de
expectativa da data final da humanidade.
Passado
uma década desse susto, não tenho mais a companhia vital da minha mãe e da
minha mulher.
Nova
ameaça ganha as manchetes de revistas e jornais. Desta vez não há erro, - o
final do mundo será no dia 21 de dezembro de 2012.
Baita
sacanagem! Estamos gastando uma nota preta para fazer essa Copa do Mundo em
Cuiabá, para o mundo acabar antes? Reclamar pra quem?
Ou
tentamos com a NASA uma viagem apressada para a lua, onde conhecemos bem o
caminho e não fica tão longe assim, ou pereceremos todos.
Arca
de Noé? Nem pensar. O mundo evoluiu. Não concebemos mais tafuiá alguns privilegiados
em um barco para se salvarem.
Diante
do imponderável, sugiro que, daqui para frente, ninguém mais trabalhe e receba
salário mínimo ultrapassando o teto constitucional - com direito a verba
indenizatória de gabinete, auxílio moradia e para compra de livros e revistas.
Aluguel
de avião pequeno, carro e moto. Correio, telefone, passagens de avião - sendo
uma para o Rio de Janeiro - e emendas parlamentares a todos os cidadãos
brasileiros.
O
único plano de saúde será o atendimento no Hospital Sírio Libanês, podendo
fazer convênio com outros congêneres como Albert Einstein, Samaritano, Oswaldo
Cruz e alguns da rede privada do mesmo padrão. Fica extinto o SUS.
Falta
tão pouco tempo para que tudo se acabe, que seria bom parar de gastar esse
dinheirão nas obras da Copa e direcionar esses recursos para exterminar a
miséria e fome neste país.
Fica
também acertado que não adianta mais roubar dinheiro público, pois mesmo sendo
uma atividade que goza de imunidade e impunidade no Brasil, de nada adiantará
diante da catástrofe eminente.
Preparemo-nos
para que, no dia marcado, estejamos vestidos com trajes elegantes. Todos de
roupas importadas de grifes e barriga cheia de comida, com direito a chefes de
cozinha, com os melhores vinhos do mundo, igual aquele que se tomou para
comemorar uma eleição presidencial.
Iremos
unidos para o mesmo lugar em situação de igualdade. E se falhar a previsão como
das outras vezes?
Teremos
um país mais justo, igualitário e humano.
Gabriel
Novis Neves
12-01-2012
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