quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

CAIU A MÁSCARA


Mato Grosso possui três senadores. Todos pertencentes à famosa “base aliada” de apoio ao governo federal.
Segundo o genial Millôr Fernandes, “base aliada é um balaio onde há ladrão, mentiroso, tarado, fanático, covarde, traidor! Mas, do nosso lado”.
Porém, um desses três senadores não se comporta como vaquinha de presépio balançando a cabeça positivamente para atender a todos os caprichos da situação.
Estamos há poucos dias de uma eleição para as presidências do Senado da República e da Câmara dos Deputados.
Diante dos candidatos da base aliada, e da unanimidade dos governistas em sacramentar o esquemão da eleição antecipada de ambos, um dos nossos senadores, aliás, o mais jovem de todos, ofereceu o seu currículo para ser analisado pelos seus pares.
Tarde demais, pois eles já tinham decidido pelo prontuário dos futuros responsáveis pelo poder legislativo do Brasil.
Mesmo sabendo dos antecedentes dos favoritos aos cargos pleiteados, a nossa bancada fechou questão, votando contra a ética.
Um senador do nosso Estado justificou o seu voto no candidato do prontuário dizendo que fora voto vencido na bancada do seu partido, aquele do Waldemar. O outro alegou amizade pessoal.
O presidente do PMDB e Vice-Presidente da República, explicou o motivo dessa preferência quase unânime nos candidatos dos prontuários aos seus íntimos, que foi assim captado pela jornalista Dora Kramer do “O Estado de S. Paulo”: “Renan e Henrique Alves criam uma espécie de identificação com os que vivem ou poderiam vir a viver situações parecidas”.
“Ou seja, a maioria estaria disposta a eleger representantes que conhecem e sentem na pele 'o problema'”.
“Assim, teriam mais chance de ser 'compreendido' quando, e se, a adversidade batesse à porta” – disse a jornalista.
E conclui: “O colégio de líderes partidários para a sessão legislativa que se inicia em fevereiro, deve ter Garotinho no comando do PR, Eduardo Cunha à frente do PMDB e José Guimarães (ex-chefe do assessor flagrado em aeroporto com dólares escondidos na cueca) na liderança do PT”.
A notoriedade das excelências não decorre da imaculada reputação, é fato. Mas, moral para criticá-los, quem há de ter?
A trinca acima está dentro do padrão atual, e, portanto, apta para liderar.
Como ficam os nossos senadores e deputados que abonaram fichas sujas?
Todos serão candidatos daqui a dois anos, inclusive a governador.
Terão coragem de, olho no olho, pedir um voto de ética ao eleitor?
Como no “Estado Curral” a ética é o dinheiro, estamos condenados a assistir velhos filmes de terror.
Triste Brasil, onde o sacrifício do povo é inútil, sustentando essa verdadeira organização criminosa incrustada no poder e já denunciada ao independente Supremo Tribunal Federal.
Como ficamos aqui em Mato Grosso onde, vergonhosamente, em troco de superfavores pessoais, entregamos a nossa honra e dignidade ao plantonista de poder?
A máscara, pelo menos de alguns, caiu.

Gabriel Novis Neves
25-01-2013

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Polêmica


A iniciativa da Câmara de Vereadores encaminhando para a justiça decidir sobre a validade de um ato da legislatura passada, e a posição do prefeito sobre as consequências da anulação dessa decisão, tornou-se assunto obrigatório em todas as rodas da nossa cidade.
Interesso-me pelas coisas da minha cidade ouvindo sempre a sabedoria das ruas, pois ruas não falam, mandam recados.
Enquanto esperava-se a decisão da justiça sobre o aumento do IPTU, a expectativa ficou focada na construção do novo Pronto Socorro.
Qualquer sistema eficiente de saúde funciona como uma pirâmide de bases alargadas.
No seu vértice é obrigatório um Hospital de Clínicas com Pronto Socorro.
A presença do hospital não é sinal de eficiência no atendimento médico, porém a sua ausência em um polo que atende pacientes de todo o Estado, é inadmissível.
Os políticos gostam de atacar os problemas históricos da má qualidade da nossa assistência médica pública começando o processo pelo topo da pirâmide, que é o hospital.
Na verdade, há uma hierarquia no nosso modelo de atendimento – Sistema Único de Saúde (SUS).
Temos que construir uma ampla base chamada de Atenção Primária de Saúde. Nessa faixa deve-se perseguir o atendimento universal. Para isso precisamos, em primeiro lugar, de profissionais de saúde treinados, motivados e qualificados, com perfis técnicos para essa importante missão.
As equipes têm que ser multidisciplinares e os critérios das escolhas deverão ser por mérito, através de concursos públicos.
O governo fornecerá espaços físicos adequados e equipados, além de equipes de trabalhadores de saúde em condições de resolutividade neste estágio primeiro do sistema de saúde.
É o local dos Postos de Saúde e PSF (Programas Saúde da Família).
O segundo patamar refere-se aos atendimentos de atenção secundária, como a internação para patologias mais simples, pequenas intervenções cirúrgicas, exames de imagens e bioquímicos, observação para esclarecimento diagnóstico.
Teremos adequadas estruturas físicas para as Policlínicas e Unidades de Pronto Atendimento Médico e Social (UPAs), funcionando 24 horas por dia.
Com atenção primária e secundária funcionando, o índice de resolutividade dos problemas será de 80%.
Finalmente, será transferido para o Hospital de Clínicas e Pronto Socorro aquele paciente que precisa de procedimentos mais complexos.
Lá encontrará os especialistas, centros cirúrgicos com tecnologia de ponta e UTIs.
Como o nosso prefeito decidiu, com orientação da Procuradoria de Justiça do Município, não aumentar o valor do IPTU para este exercício, fica a pergunta no ar – haverá recursos para a construção de um novo Hospital e Pronto Socorro para Cuiabá?
O prefeito deverá reunir-se com o seu secretário de saúde e decidir estratégias de como melhorar a nossa debilitada saúde pública com os recursos existentes.
Se a estratégia tomada for de iniciar a melhoria do serviço pelo “início”, que é a atenção básica, acredito que logo teremos reflexos de melhora em todo o sistema, sem necessidade dos recursos aumentados do IPTU.
Quando estiver funcionando os Postos de Saúde, PSFs, as Policlínicas e UPAS (Unidades de Pronto Atendimento Médico e Social), o velho Hospital e Pronto Socorro de Cuiabá respirará sem aparelhos.
O prefeito receberá da sua assessoria técnica todas as alternativas, pois a decisão do caminho a ser seguido sempre é função do político.
Com a decisão de deixar para lá o aumento do IPTU e enfrentar já a realidade da nossa saúde pública com a contratação de 60 médicos, deixa-me a esperança de que os problemas serão resolvidos, aplicando a economia doméstica, ciência dos sábios.

Gabriel Novis Neves
17-01-2013

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

LEGAL E MORAL


Certas situações legais não são morais, e uma atitude moral nem sempre é legal.
Paulo Freire nosso grande educador enfrentou essa ambivalência.
Estudou Direito para se transformar em educador.
Naquela época, as opções para uma profissão de nível superior giravam em torno de algumas carreiras como, Medicina, Direito, Engenharia, Odontologia e Farmácia. Como alternativa para os jovens que concluíam o ensino médio, as Forças Armadas, o Banco do Brasil e a vida religiosa. 

Ao concluir, com brilhantismo, a Faculdade, montou um pequeno escritório de advocacia com dois colegas em Recife.

O seu primeiro, e único caso, foi a execução de despejo de um jovem profissional, recém-casado e com uma pequena filha. Paulo não suportou executar aquele ato legal. Achava imoral fazer o despejo daquela família.
Retornou ao escritório e disse aos colegas o que tinha acontecido e, a partir de então, não exerceria mais a profissão de advogado.
Fez então concurso público para lecionar no ensino básico da rede pública de ensino. Lecionava letras e estudava pedagogia, filosofia e psicologia.
Freire, cedo percebeu que o único caminho da cidadania e ascensão social seria pela educação.
O Brasil de então era um país de analfabetos e ignorantes. O método de ensino empregado beneficiava as classes sociais melhores colocadas.
Haveria que existir um método para alfabetizar pobres, encurtando distâncias e estimulando aptidões para uma profissionalização, não necessariamente de nível superior.
O jovem ex-advogado de Recife criou o seu polêmico método de alfabetização de massas.
Freire tinha pressa em tirar o seu povo do despejo da falta de oportunidades.
Mal entendido e perseguido no país, mas muito respeitado no exterior, terminou a sua passagem por aqui lecionando educação na USP, sem ter pós-graduação convencional e recebendo um salário envergonhador.
A situação jurídica do astronômico aumento salarial concedido pela antiga Câmara de Vereadores, inflando escandalosamente o salário do prefeito e vereadores, me fez lembrar o mestre Paulo Freire.
A lei permite essas aberrações do chamado efeito cascata nos vencimentos do prefeito e vereadores, porém, o político não é obrigado a aceitar.
O prefeito, mesmo sabendo ser legal o aumento salarial que o beneficiava, percebeu a imoralidade do ato e vetou a gentileza.
Medida legal, ética e moral.
Deixou que os vereadores agraciados pela chuva de cascatas salariais legais decidissem se optariam pela legalidade, ou desrespeitariam a imoralidade de leis feitas sob encomenda para benefícios de alguns.
Pela demora da decisão, os vereadores acenam pela opção da legalidade do ato, mandando às favas os escrúpulos da moralidade com a coisa pública.
A lição do mestre Paulo Freire está posta para servir de exemplo numa decisão onde a moral sobrepõe a lei.
Cá pra nós, quarenta mil reais de salário por mês para um vereador é imoral.

Gabriel Novis Neves
25-01-2013

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Simples solução


Estou pagando caro por um vício que adquiri há mais de sessenta anos - o de ler jornais.
Aqui em Cuiabá, quando eu era bem jovem, meu pai me escalava para ficar de plantão na porta da Livraria e Papelaria Santa Therezinha, ao lado do Bar do Bugre, para esperar a chegada do “O Jornal”, vindo do Rio de Janeiro.
O horário da chegada do lote de jornal era imprevisível – geralmente após as 16 horas. Era transportado pelos antigos aviões DC3.
O avião decolava de madrugada do Rio com os passageiros e os esperados jornais, mas os aviões pousavam na ex-Cidade Verde quando podiam.
Naquela época, criança era proibida de participar das rodas de adultos que se acumulavam à espera do jornal.
O papo rolava solto no bar do meu pai. Desembargadores, juízes, promotores, políticos, profissionais liberais, funcionários públicos letra “O” de penacho, professores, poetas, jornalistas, enfim, a nata da inteligência cuiabana.
Eu ficava sempre de ouvidos atentos, querendo decifrar as coisas que os mais velhos conversavam, especialmente sobre política.
Tudo que é bom nesta vida dura pouco – diz o ditado popular. Deixo a minha cidadezinha para estudar no Rio.
Chegando à minha nova cidade fiquei deslumbrado com a variedade de jornais existentes.
Existiam os jornais matutinos, os vespertinos e os da noite.
Tinha até um especializado em esportes.
Em praticamente toda esquina havia uma imensa banca de jornal. Algumas funcionavam vinte e quatro horas. Sem contar os meninos que vendiam jornais por todas as partes da cidade.
Os meus deslocamentos pela ex-Cidade Maravilhosa quase sempre foram de bonde.
Quando o meu plantão era na Penha, lia quatro jornais: dois na ida e dois na volta.
O vício da leitura de jornal tornou-se para mim crônico e incurável.
Acabo de saborear o meu vício na leitura das mais recentes notícias.
O ex-presidente, que recentemente deixou o cargo como herói nacional, agora foi denunciado na Procuradoria Geral da República como chefe de uma gang que assaltava os cofres públicos.
Sua imagem foi mortalmente atingida perante a opinião pública.
Os marqueteiros do governo estão superpreocupados com os escândalos que brotam abundantemente em todos os níveis de poder, agora em tempo real graças aos modernos meios de comunicação.
Acham que tais notícias irão desconstruir a imagem dos super-heróis que acabaram de deixar o poder em todos os níveis: federal, estadual e municipal.
Esses fatos, sobre o exercício do poder público no Brasil, são a mais doce repetição de tudo que li em mais de meio século, quando o poder muda de dono, apesar de quase todos serem da mesma família.
A única diferença são as fantasias e os nomes dos personagens.
Tudo seria simples de se resolver caso os desvios de conduta praticados pelos nossos governantes fossem divulgados na época do ocorrido.
Havendo o silêncio do zelo e o elogio premiado, geralmente construído pelos marqueteiros pagos com o nosso dinheiro e a sua ampla divulgação, o grande público, que é o eleitor, só tomará conhecimento dos motivos dos seus sofrimentos e do atraso desta nação, após a saída dos seus ídolos do poder.
Agora é tarde.
Sobra o lamento pelo leite derramado, tão simples de ser evitado. 

Gabriel Novis Neves
20-01-2013

domingo, 27 de janeiro de 2013

IDADE E TEMPO


Que enorme dificuldade teriam os idosos em se tornarem contemporâneos?
Isso anularia, com certeza, o preconceito que contra eles existe de serem pessoas normalmente repetitivas e desinteressantes.
Claro que na moda, por influência das diversas mídias, tudo foi mais fácil já que o que mexe com beleza é sempre absorvido com mais facilidade.
Assim, eles rapidamente aderiram aos jeans, aos mocassins às camisas coloridas,  a maneira descontraída de ser e alguns mais destemidos, aos brincos e colares.
Já as mulheres, sempre mais intensas, sofreram  mudanças radicais no seu comportamento estético, sendo que as menos críticas conseguiram beirar o ridículo nessa ânsia de parecer jovem.
No âmbito das ideias, o mundo digital vem tornando cada dia menor, o conflito de gerações.
Já nos deparamos, cada dia mais, com pessoas de uma faixa etária avançada, mas totalmente descoladas de conceitos arcaicos sobre tudo e sobre todos.
Aí estariam incluídos entre o seres comuns, inúmeros poetas, escritores, filósofos, músicos e os que lidam com arte de uma maneira geral.
Para esses as portas do Universo sempre foram mais abertas já que os estereótipos de bem e mal, certo ou errado, estiveram sempre mais questionados em suas vidas.
Isso me lembra a genialidade de um Raul Seixas quando em seus versos, se referia ao sonho de se tornar “uma metamorfose ambulante”. Nada mais contemporâneo que isso, uma vez que o planeta em que vivemos está em constante mutação.
Se conseguirmos nos despojar dos valores estáticos que aprendemos a considerar como certos e irrefutáveis, estaremos nos aproximando cada vez mais das novas gerações, com as quais podemos não só trocar, mas também muito apreender.
Ótimos avós não são avós que abastecem seus netos de bens materiais, nem sempre úteis, mas principalmente os que se fazem amar por essa jovialidade, na maneira de pensar e de encarar a vida, sempre dialogando e nunca ditando regras de conduta.
Essa prática maniqueísta, confrontando certo e errado, o que sempre consegue é afastar o idoso do convívio social, já que suas ideias não se oxigenaram durante a vida e, portanto nem são dignas da tentativa de um intercambio.
Durante a vida, vamos perceber jovens envelhecidos e velhos absolutamente joviais, não por sua aparência física, mas principalmente pela capacidade de mudar valores.
Que todos os idosos façam essas reflexões, a fim de que não se tornem peças de museu para os seus familiares e circunstantes, com seus discursos  enfadonhos sobre um passado que só a eles interessa.
O que a todos fascina é o AQUI e o AGORA.
Não fiquemos atentos à idade, mas sim à contemporaneidade.

Gabriel Novis Neves
25-01-2013

sábado, 26 de janeiro de 2013

Os ismos


Através dos séculos a humanidade vem caminhando pelos vários “ismos”.
Vivenciamos o escravagismo, o feudalismo, o comunismo, o socialismo, o capitalismo, o liberalismo e, com o aparecimento das sociedades de mercado, o consumismo, igualmente nefasto como todos os outros, principalmente no tocante à progressiva perda de valores éticos e morais.
A aquisição indiscriminada dos chamados bens de consumo passou a ser o foco principal na vida de todos numa sociedade que precisa vender e, portanto, “fabricar” a cabeça de seus compradores. Dessa maneira, nossos descendentes, ao contrário de nós, têm pressa em acúmulos rápidos de fortunas a qualquer preço, a fim de que sejam satisfeitas as necessidades desse novo voraz mercado.
As gerações passadas se contentavam com uma melhora progressiva de sua situação material, sempre pautada em muito trabalho e, como os bens adquiridos não eram tão descartáveis, chegavam à maturidade na certeza plena de terem feito o melhor para si e para os seus familiares.
Com a alta tecnologia, tudo fica obsoleto em pouco tempo e, portanto, estamos sempre precisando de novos carros, novas casas, novos barcos, novos eletrodomésticos, novos eletrônicos, enfim, novos objetos de um suposto encantamento sempre muito fugaz.
Como esse dito sucesso tão almejado poucas vezes ocorre, passamos a fazer parte de um mundo invadido pelos tranquilizantes, pelas drogas alucinógenas, por toda uma gama de artifícios que minimizem a nossa ansiedade na busca desses valores.
Essas mudanças vêm afetando seriamente os comportamentos humanos e a cada dia a conquista do que se propõe como sucesso, fica mais difícil, principalmente aos mais jovens.
Como somos um país novo, ainda estamos muito impregnados com as várias quinquilharias com as quais nossos colonizadores nos encantavam.
Talvez em virtude disso, em pleno século XXI ainda sejamos fascinados pelos templos do consumismo tais como os que existem em New York, Miami e, mais recentemente, em Dubai.
Já temos o triste título de povo mais consumista do mundo, e dessa forma venerado como salvador das economias em crise.
Que as pessoas se conscientizem que viagens são o melhor investimento que podemos fazer em nós mesmos, desde que elas sejam feitas em busca do enriquecimento cultural de que tanto necessitamos.
Sou um otimista praticante e creio na humanidade a caminho de um novo “ismo” que a ela proporcione os verdadeiros prazeres de uma vida plena, sem a angústia na busca de uma felicidade artificialmente fabricada.

Gabriel Novis Neves
15-01-2013

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

OS SUICIDAS


Segundo estatísticas, o povo escandinavo teria o índice mais alto do mundo em termos de suicídio.
A explicação simplista para isso seria que, ao  passar dos anos  e com o vislumbre da aproximação de doenças degenerativas, esses altos, louros e belos espécimes da raça humana, todos com excelente poder aquisitivo, achariam por bem terminar por conta própria os seus destinos de viajantes.
Enfim, se matariam por excesso de felicidade já que o futuro já lhes acenava com algo aterrorizador, a velhice e os seus percalços.
Só que pensando bem, isso vai de encontro a essa gente tão elitizada cultural e socialmente, criada para usufruir do que a vida tem de melhor, não sendo massacrados pelas grandes distorções econômicas a que nós outros somos submetidos no cotidiano.
Afinal, tudo que é bom, é para ser prorrogado o maior tempo possível, não é assim que funcionam as mentes saudáveis?
Importante lembrar que o instinto de conservação é o que nos move por toda a vida, sendo que algumas vezes temos dificuldade de entender porque pessoas em fase terminal, dão sinal de tanto apego aos momentos que se esvaem.
Somente estados depressivos muito fortes, conseguem nos tirar desse verdadeiro culto ao viver, seja ele bom ou ruim.
Imagino, com tristeza, que esse tenha sido o caso do nosso grande ator Walmor Chagas, responsável por momentos inesquecíveis do teatro brasileiro.
Vivendo na mais absoluta solidão, após uma jornada de tantas glórias, foi ficando para ele cada vez mais difícil, a convivência com o passado, num presente estéril e de velhice avassaladora. Os bons atores, habituados que são aos aplausos constantes, não mais conseguem imaginar a vida sem os mesmos.
A grande solidão da velhice, não é a falta dos outros, mas a “falta de si mesmo”, da incapacidade de se emocionar e assim emocionar outras pessoas.
Essa é a finalidade de um ator e também nossa, "atores na vida".

Gabriel Novis Neves
23-01-2013

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Escolas médicas


Medidas governamentais importantes são sempre liberadas nos últimos dias de dezembro, quando grande parte da população está envolvida no clima das festas de final de ano e com as férias prolongadas.
Neste ano que findou a surpresa, para grande parte dos brasileiros, foi saber que 54,5% dos recém-formados médicos não estão aptos ao exercício da profissão.
A reação foi de indignação para este fato, pois há muito tempo os educadores vêm reclamando às nossas autoridades competentes.
A sociedade que não tem acesso a essas informações, que angustiam os especialistas em educação médica, rejubila-se quando o governo federal anuncia a criação de novas escolas de medicina.
Aqui em nosso Estado foi anunciada a criação de mais três escolas de medicina, que são vistas pela população como uma dádiva do governo. Mas, é uma doce ilusão. Pensam os desavisados que esta medida trará maiores benefícios para a Saúde Pública.
No período de 2000 a 2012, foram abertas 98 novas faculdades, totalizando 198 escolas médicas no Brasil.
A presidente anunciou sua vontade de abrir mais 4.500 vagas para alunos de medicina.
Isso significa a criação de algo em torno de 55 novas escolas.
Toda essa avalanche de expansão de cursos de medicina acontece quando as nossas universidades federais estão em estado de penúria.
Muito mais importante neste momento seria aumentar as vagas para a residência médica.
Aproximadamente 6.000 médicos recém-graduados não têm condições de frequentar a residência médica, considerada a etapa mais importante para a formação de profissionais qualificados.
Outra distorção que merece uma reflexão é com relação à localização dessas novas escolas.
Seria racional se essas escolas fossem implantadas em áreas mais remotas e carentes desse país tão cheio de desigualdades.
Entretanto, 70% delas foram instaladas na região sudeste, rica e com significativo número de escolas e, o pior é que, 74% delas são privadas, com mensalidades exorbitantes.
A maioria desses centros de formação de médicos não dispõe de instalações hospitalares adaptadas para o ensino e carecem de corpo docente qualificado, como bem frisou Miguel Srougi, com pós-graduação em urologia pela Universidade de Harvard (EUA) e professor titular de urologia da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo).
Todo esse cenário desolador do nosso ensino médico é patrocinado pelo governo federal, focado em interesses políticos menores e pelo anseio do lucro desmedido, conclui Miguel Srougi.
O professor Adib Jatene presidiu uma comissão especial do MEC e descredenciou, há um ano, algumas escolas médicas pela baixa qualidade de ensino.
Pois bem, de maneira misteriosa e inexplicável, a Comissão Nacional de Educação cancelou a ação punitiva.
O Brasil não precisa de mais escolas médicas para melhorar a precária situação da nossa saúde pública, e sim, de uma política de governo para a fixação do médico no interior, além de oferecer condições de trabalho aos nossos jovens médicos.
Temos hoje 198 escolas médicas e, segundo a presidente, até 2014 esse número chegará a 253, para uma população de quase 200 milhões de habitantes.
Em compensação, os Estados Unidos da América do Norte, habitado por 314 milhões de pessoas, têm 137 faculdades de medicina.
“A grande maioria dos novos médicos são vítimas de uma sociedade permissiva, escolas médicas deficientes e governantes incapazes”.
Estamos transformando esperanças em frustrações.

Gabriel Novis Neves
10-01-2013


* Publicado simultaneamente no www.gnn-cultura.blogspot.com  

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

CARNAVAL


“O carnaval é a maior expressão da cultura popular brasileira”, assim observou Eduardo Portela numa das suas visitas à UFMT.
Este ano a Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira homenageará Cuiabá no desfile da Sapucaí no Rio de Janeiro.
A poucos dias da festança lá e cá há um silêncio sepulcral sobre esse acontecimento.
Aqui, porque mudou a administração da cidade, e o orçamento da secretaria de turismo é invisível, não permitindo nenhuma ação comemorativa da nossa cultura.
No Rio, porque essa arrumação é iniciativa do governo passado, e o atual quer primeiro saber em quanto anda o cronograma financeiro da “homenagem.”
 “Cuiabá, um Paraíso no Centro da América!” Este será o enredo da Estação Primeira de Mangueira. O seu samba tem como autores: Lequinho, Junior Fionda, Paulinho Carvalho e Igor Leal, e como intérpretes: Luizito, Zé Paula de Siena, Ciganerey e Agnaldo Amaral.
 “Ouçam o apito da sirene indicando que o trem verde e rosa vai dar a partida. Não cuiabanos! Não se trata da máquina de ferro e aço que há 150 anos é esperada ansiosamente, mas, quando a cortina de fumaça dos fogos de artifício se abrir e a penumbra se dissipar na Sapucaí, todos entenderão que o sonho é a verdadeira vitória sobre o tempo. Alegrai-vos, cuiabanos. O tempo da espera acaba aqui e agora!”
Este é o texto que a Liga Independente das Escolas de Samba do Rio de Janeiro (LIESA-RJ), distribui ao mundo anunciando a presença de um “Paraíso no Centro da América, - Cuiabá!”
Cid Carvalho, carnavalesco da Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira, esteve duas vezes em Cuiabá, pesquisando a “liga” para a Mangueira chegar aqui.
Segundo a LIESA Cid Carvalho “Ficou impressionado com essa espera angustiante por um trem que simbolizava a integração da cidade ao resto do país”. E ainda acrescenta que “No encontro com o escritor cuiabano Fernando Tadeu, autor do livro “Sonhos e Esperanças de Cuiabá,” que detalha os diversos obstáculos geográficos e financeiros que impediram a construção da malha ferroviária e a chegada do trem do desenvolvimento, Cid fez-lhe uma promessa: ‘A espera acabou. Esse trem é a Mangueira, que partirá da Estação Primeira levando a sua alegria até Cuiabá’. Tadeu se emocionou”.
A LIESA destaca também o comentário de Cid Carvalho de que “Até hoje, o trem é o brinquedo predileto de meninos e adultos que já foram meninos. É um símbolo que está presente em cada família cuiabana”, e que, o mesmo promete “empreender uma viagem levando um trem de bambas até a cidade considerada o portal de acesso ao Pantanal, à Amazônia, ao Cerrado e a Chapada dos Guimarães – enfim, ao Paraíso no Centro da América.”
Nas várias das comunicações a LIESA lembra que “Folclore, culinária, a envolvente dança do Siriri não faltarão”, ficando para o final das estações o anúncio de Cuiabá como uma das sedes da Copa de 2014, e que tudo isso promete no desenrolar “uma animada partida, onde o tatu é a bola, a cigarra é o juiz, o tamanduá é a bandeira e o craque é a cobra. Os locais enfrentarão o time da Rosa e Verde".
A letra do samba enredo é de uma beleza suave, ao refletir a natureza, e trazer o verde e rosa das casas, redes e varandas cuiabanas da Vila Real do Senhor Bom Jesus de Cuiabá.
Nas estrofes os mistérios, as lendas, as assombrações, o vapor, o apito, e os “causos” que inspiram a arte, a poética, e fornecem o doce dos temperos.
No contexto, um convite para comemorar com São Benedito a chegada do trem do desenvolvimento, esperado por Cuiabá e, por que não dizer?, por uma grande parte das cidades de toda América do Sul.
Por fim, concluo com Mikhail Bakhtin de que realmente “durante o carnaval é a própria vida que representa, e por um certo tempo o jogo se transforma em vida real. Essa é a natureza específica do carnaval, seu modo particular de existência”.

Gabriel Novis Neves
20-01-2013 

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Natal passado


Propalam-se alegria e felicidade no Natal em regozijo ao nascimento do nosso Salvador - assim reza a tradição.
A realidade, porém, é bem diferente nos dias atuais.
Ruas e avenidas que dão acesso aos shoppings, lojas e comércio em geral, ficam com o trânsito engarrafado, dificultando e estressando aqueles que precisam trabalhar.
Como a cidade de Cuiabá cresceu ao Deus dará, temos hospitais, centros de diagnósticos, pronto atendimentos, localizados numa verdadeira miscelânea, que fica mais evidente por ocasião das festas comerciais.
Multidões de consumidores invadem as lojas, enquanto as igrejas, onde se reza a Jesus, ficam às moscas - muitas vezes com as suas portas fechadas para proteger as suas relíquias dos assaltantes.
A nossa algoz sociedade, em ato de caridade, distribui aos menos favorecidos lembrancinhas inúteis e sobras de comida.
Pobre nação que deturpa os princípios da religiosidade do seu povo em nome da religião! Que não deixa de ser uma forma autoritária de temer a Deus.
Alguns dirão que o Natal é assim no mundo inteiro desde que o mundo é mundo.
Nada mais falso. As estatísticas da Federação do Comércio demonstram que a cada ano, mesmo com as atuais crises mundiais na economia, as vendas sempre aumentam neste período, proporcionando grandes lucros aos empresários.
Como festa comercial, o Natal comprovou que é um sucesso de consumo, sendo ameaçado, e até ultrapassado, pelo profano “Dia das Mães”.
A sociedade condena as pessoas que agem fora do gabarito das suas festas comerciais. A religiosidade mostra aos fiéis o caminho da salvação, que passa necessariamente pelo permanente amor ao próximo.
Assistindo hoje ao tipo de celebração em que se transformou o Natal, fico pensando nos Natais de minha meninice e juventude. A pureza e o espírito de união marcavam essa data. Rezava-se em família pelo Menino Jesus.
Hoje, não. O consumismo desenfreado tomou conta do espírito de Natal. A festa culmina com o triste espetáculo da troca de etiqueta dos presentes, os únicos valores válidos no dia que ficou dedicado à comilança e bebedeira.
Dessa forma esta data, em vez de agregar, separa as classes sociais e transforma-se, facilmente, em um momento propício para o afloramento das antigas infelicidades minimizadas pelo tempo.
O resultado desse modernismo, que ocasiona lucros aos comerciantes explorando a religiosidade da nossa gente, é projetado na sociedade na forma de transtornos emocionais como depressões, sentimentos de culpa e a melancolia, tal qual um hipnotizador que nos leva a revisar o nosso inconsciente - depósito das nossas vivências boas ou más.
O Natal já foi uma celebração da família, hoje dizimada pela impulsão do TER, fator de desagregação - nunca de união -, especialmente a familiar.
Quisera eu ter o poder de fazer voltar o verdadeiro Natal! Aquele em que celebramos os valores imateriais. Em uma fraternal homenagem a este espírito iluminado que desceu à Terra para nos mostrar o verdadeiro caminho para a felicidade.

Gabriel Novis Neves
20-01-2013

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

CONTRAMÃO


No ensino da medicina estamos caminhando na contramão da história.
Atualmente as nossas escolas estão preparando seus futuros médicos como no início do século XX, quando a expectativa de vida do brasileiro não atingia os cinquenta anos.
Continuamos priorizando certas disciplinas, como obstetrícia e pediatria, quando o índice de natalidade diminuiu e a expectativa de vida do brasileiro está ultrapassando os setenta anos.
Quando entrei na faculdade de medicina nos anos cinquenta, as famílias eram de prole numerosa. A minha mãe teve nove filhos, e vinha de uma família de somente oito irmãos, devido à morte prematura da minha avó materna - antes de completar trinta anos.
Pelo lado paterno eram dezenove irmãos.
Naquela época não havia poluição, tampouco essa epidemia de mortes causadas pelo "progresso" – acidentes de trânsito e violência urbana de múltiplas causas. Não podemos deixar de citar as produzidas pelas drogas ilícitas e suas ramificações sociais.
As escolas do passado formavam excelentes médicos generalistas e humanitários, voltados, principalmente, à atenção da saúde materno-infantil, à prevenção das doenças e à educação em saúde.
Com o aparecimento da tecnologia na medicina sai de cena o médico humanista e entra o que domina as máquinas.
Como hoje as famílias ficaram menores e a população está vivendo mais, sentimos falta do profissional que entenda de idosos.
Antigamente as crianças eram educadas para serem adultas e o médico do século passado era o ideal. Tínhamos uma rarefeita população de idosos.
Os tempos são outros, até o século mudou, mas continuamos a não produzir, em quantidade suficiente, profissionais para cuidar dos idosos.
Os lobistas da indústria tecnológica de material médico e farmacológico são os responsáveis pela formação desse novo perfil profissional.
Não há país no mundo que suporta os gastos com esse tipo de assistência médica, quando uma boa anamnese resolveria a maioria das queixas dos pacientes idosos.
Em breve o Brasil terá grande parte da sua população formada por idosos.
Se não mudarmos a formação dos estudantes de medicina, a nossa tão injusta saúde, que é um direito de todos e dever do Estado, sucumbirá como um todo.
Vamos sair da contramão na formação dos nossos médicos mudando logo o currículo das nossas escolas médicas?
Só assim estaremos preparando gente para a nossa realidade.

Gabriel Novis Neves
10-01-2013

domingo, 20 de janeiro de 2013

Horóscopo


Há um tempo perguntei a um antigo e tarimbado jornalista, editor do jornal mais lido da cidade, qual a seção preferida pelos leitores.
Sem pensar ele me respondeu: “horóscopo”.
Fiquei surpreso. Imaginava que política, futebol e coluna social seriam os vencedores dessa pesquisa empírica.
Os anos se passaram e, quase ao “dobrar o cabo da boa esperança,” comecei a escrever para jornais.
Todas as vezes que encaminho os meus artigos para a redação lembro-me do velho jornalista.
Os adversários que havia escolhido – política, futebol e sociedade, continuam fortíssimos concorrentes para um articulista amador.
Imagino ter que enfrentar uma coluna que advinha o futuro das pessoas baseado no estudo do sol, da lua e dos planetas!
Com uma atração irresistível na pátria das superstições, quem teria ainda tempo disponível para uma olhadela na seção dos articulistas?
Iniciei então a prestar atenção nas pessoas que leem horóscopo através de perguntas discretas, porém especulativas.
Sem o apoio de qualquer instituto de pesquisa, fiquei impressionado com o número elevado de leitores que mantém o hábito de consultar o seu futuro antes das manchetes dos jornais.
Eu mesmo me descobri um dependente na leitura dessas diárias previsões, seja no trabalho, no amor ou saúde.
Interessante, é que o leitor do horóscopo não comenta o seu prognóstico do dia, a não ser para pessoas da sua mais absoluta confiança.
A futurologia, mesmo sendo considerada uma ciência astrológica, sofre tremenda discriminação dos materialistas.
Politicamente não é correto falar sobre esse assunto, embora seja o predileto dos políticos.
Na Bahia, o horóscopo do dia corre três vezes: manhã, tarde e noite – nos moldes do jogo do bicho.
O enorme sucesso dessa leitura é que ela é curta e o seu esquecimento é imediato, não alugando massa encefálica.
Pelo menos comigo é assim. Leio com atenção o que os astros dizem e, no final da leitura do jornal, não me lembro mais das recomendações
Dia desses recebi um telefonema de um colega exultante com a leitura do meu horóscopo.
Enquanto ouvia a leitura sobre o meu futuro, esforçava-me para lembrar daquilo que tinha lido cedo no meu jornal.
A felicidade do meu colega me contagiou, não sobre o planejamento traçado pelos astros para este complemento de tempo, mas por saber que tenho amigo.
Reconheci no telefonema um especial amigo, embora já tivesse esquecido, ao desligar o telefone, a previsão do meu horóscopo.

Gabriel Novis Neves
16-01-2013