segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Agora é CU

Os políticos e burocratas são os maiores especialistas em criação de siglas. Assistindo à televisão, ouvi o Magnífico Reitor da Universidade Estadual de Mato-Grosso (UNEMAT) - respeitado professor doutor - referindo-se ao novo concurso público como concurso unificado – CU. Tudo começou como o maior concurso público do mundo. Após o fracasso, foi comparado a um pum que virou traque, e agora está na dimensão de um CU – concurso unificado.

O maior concurso público do mundo não foi anulado, e sim, cancelado para alguns e adiado para outros. Não ocorreram falhas, apenas pequenos incidentes pontuais em algumas localidades. Não há sinais de quebra de sigilo e sim pequena desorganização e confusão na distribuição das provas. Enfim, não houve nada, além da exploração política.

O Governo, compreensível como sempre, adiou pela segunda vez a data do agora concurso unificado , favorecendo os candidatos que terão mais tempo para se prepararem para as provas em janeiro e fevereiro do próximo ano.

Aqueles candidatos que se sentissem prejudicados foram orientados pelo senhor Secretário de Administração a procurar a justiça. Com a velocidade desses processos, com todos os recursos jurídicos que o Estado utilizará, muitos dos candidatos receberão as suas indenizações no céu.

Não houve imbróglio e sim uma grande distorção metodológica na execução do concurso que entraria para o livro dos recordes. Tudo ficou resolvido em uma simples reunião quando foi decidido que o nome daqui para frente seria concurso unificado, e para facilitar o entendimento dos candidatos, seria chamado de CU.

E assim ficamos aguardando até janeiro e fevereiro o CU – concurso unificado.

Gabriel Novis Neves
26 de Novembro de 2009.

domingo, 29 de novembro de 2009

Filosofia do cavalo

Em emocionante artigo a diretora de redação de um dos grandes jornais de Cuiabá relata a sua luta contra o câncer. No Dia Mundial de Combate ao Câncer (27 de novembro), a jornalista, que se identifica como sobrevivente de um câncer registra o que ela chamou de criminosas políticas públicas de tratamento no Brasil desta doença.

80% das vítimas desta doença dependem do Sistema Único de Saúde (SUS). 20% são pacientes da rede privada. Ficou evidente na análise da jornalista que existem pacientes de primeira classe (tratados em hospitais privados) e os de segunda classe (tratados pelo SUS). Ela confessa que está curada, porque era paciente de primeira classe. É a realidade vista por uma paciente.

Como médico há cinqüenta anos o meu cotidiano é o sofrimento humano. Participei recentemente de um congresso médico, e no seu final, prometi a mim não voltar mais a nenhum. É desumano para um médico dominar novas tecnologias e terapias, e diante de um paciente de segunda classe (80% da população brasileira), não poder utilizar aqueles conhecimentos. O pior é que se a classe médica reclama das condições oferecidas aos pacientes pobres ela é quase destruída pelos plantonistas do poder.

Acabo de saber que um paciente de segunda classe morreu por falta de um desfibrilador cardíaco. E a impotência do médico ante tal situação? Só lhe resta deixar o plantão e fazer um Boletim de Ocorrência (BO) na delegacia policial mais próxima, para não ser responsabilizado pela morte.

Minha mulher morreu de câncer, embora fosse passageira de primeira classe como a jornalista. É difícil acompanhar a trajetória desses pacientes “até a sua aposentadoria totalmente fora de hora”.

E o que fazem as nossas autoridades? Aplicam no orçamento da saúde a filosofia do cavalo na parada de 7 de setembro:

Andando, cagando e sendo aplaudido...

Gabriel Novis Neves
29-11-2009


* Publicado simultaneamente no http://www.gnn-cultura.blogspot.com/

FELICIDADE

Sempre me interessei por este assunto e é a ferramenta principal que utilizo no pré-natal das minhas clientes. Há trinta anos, após vinte pesquisando o perfil das minhas gestantes, com a orientação de artistas plásticos, escultores, pintores e fotógrafos, montei o único consultório de terapia visual de Cuiabá.

A gestante acha que neste período de reprodução, fica feia. Tem receio de perder o interesse sexual do companheiro; apresenta dúvidas com relação ao tipo de parto; preocupações com a saúde do neném; insegurança se encontrará o seu médico quando em trabalho de parto, e finalmente, “medo” dos honorários do seu obstetra. Trabalho contra estes valores adquiridos no meio em que vivem as nossas futuras mamães, e procuro reverte-los, pois, com certeza, isto ajudará o futuro do seu neném.

Após o nascimento, sempre repito aos pais, que o único objetivo do recém-nascido saudável é reencontrar a felicidade perdida com a sua saída do útero. O útero materno é o céu que perdemos com o nosso nascimento. ”Jogados” ao mundo, imediatamente procuramos encontrar a felicidade. Desde que nascemos corremos atrás dela, mas a felicidade está sempre correndo atrás de nós.

”A felicidade é como a pluma que o vento vai levando pelo ar. Voa tão leve, mas tem a vida breve”- Vinícius de Moraes.

Mas afinal o que é a felicidade? Sempre tive dúvidas se sou ou não feliz. Lendo uma revista de circulação nacional fiz espontaneamente o teste da “Felicidade Interna Bruta”. O resultado para mim foi surpreendente! Eu não sou feliz, e sim, muito feliz - na contagem dos pontos do teste da revista.

Só me falta agora acreditar no teste e escrever o que é ser muito feliz.

Gabriel Novis Neves
28/11/2009


* Publicado simultaneamente no http://www.gnn-cultura.blogspot.com/

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

A CORDA

Recente pesquisa americana realizada em trinta e oito nações demonstrou que a maioria das pessoas idosas gostaria de retornar à idade infantil. Se a velhice é assustadora para alguns, para mim não é. Pertenço ao seleto grupo dos idosos. Velhice não dói e aos poucos o idoso vai percebendo as suas perdas. Acho que esta idade é a fase mais engraçada da nossa vida. É o período da descoberta dos pequenos detalhes, que na ansiedade da juventude, passam despercebidos.

Também não aceito chamar esta fase da vida como a melhor idade. Entendo como melhor idade aquela fase da vida em que estamos bem, indiferentemente da nossa faixa etária.

O idoso nunca se esquece da sua infância pela riqueza de valores adquiridos nesta fase. Sonhos e fantasias são os principais ingredientes desse período. Talvez por isso, tenha sido sempre um dos temas preferidos dos nossos poetas. Ataulfo Alves tinha saudades “da professorinha que lhe ensinou o bê-á-bá, dos jogos de botões pelas calçadas e das missas aos domingos na Matriz”.

Thiago de Melo abandonou a vida mundana para viver entre os povos das florestas da sua infância, e nos lembra, nos seus mandamentos, que “um adulto deveria confiar em outro adulto, como uma criança confia em outra criança”.

Quantos dos que me lêem nunca ouviram dos seus avós, pais, dindas, que “a corda sempre arrebenta do lado mais fraco”? Este é um dos ditados da sabedoria popular que toda criança aprende. O adulto, às vezes, lembra-se deste ditado, e faz tudo para que a corda arrebente do lado mais fraco.

Estamos na prática observando esta verdade. O famoso concurso público, o maior do mundo, fracassou. Pela ordem hierárquica, quatro autoridades construíram o mastro da frustração, com milhares de assessores internos e externos que, agrupados, constituem o que chamamos de Governo.

Assim são responsáveis: o Governador, que autorizou e confiou no seu Secretário de Administração, que contratou a UNEMAT, representada pelo seu Reitor, que mandou a professora elaborar as provas do concurso. O Governador em um ato que merece todo o nosso aplauso reconheceu e assumiu o erro, e pediu desculpas aos inscritos no mega concurso. Bonita atitude senhor Governador!

O Secretário de Administração não admitiu o erro. Foi proibido até de falar sobre o concurso, pois sempre que era indagado pelo Governador sobre o andamento do mesmo, afirmava que estava tudo sob controle (declaração do Governador).

O Reitor afirma que trabalha há sete anos com a professora - responsável pelo grupo que formulou as provas - e que ela é uma pessoa idônea, que não merece ser punida. Mas o Governo precisava mostrar aos seus súditos um responsável e escolheu um bode expiatório; mais uma vez, a corda arrebentou do lado mais fraco. A professora foi demitida sem ser ouvida e o delegado que investiga o caso informa que não encontrou sinais de fraude no concurso.

Triste realidade o enredo do maior concurso público do mundo! A professora foi a única responsável pelo fracasso da empreitada megalomânica. Demitida e execrada perante a opinião pública, simplesmente por ser a parte mais fraca da corda.

Gabriel Novis Neves
26 de Novembro de 2009

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Acredite se quiser

O Brasil está pessimamente colocado no ranking mundial com relação à educação. Este desempenho pífio, em uma área essencial ao desenvolvimento, impede o Brasil de pertencer ao time dos países que lideram o planeta Terra.

Há um esforço tremendo da mídia em confundir educação com “o cara” do Obama. É tão simples resolver o problema da educação! Só mesmo um país de mentirinha não consegue extirpar este tumor maligno - tudo tem que passar pela decisão política de investir recursos em educação. Em dez anos os resultados apareceriam.

A verdade é que o poder político não tem o mínimo interesse em mudar este quadro humilhante. Tivemos um candidato à Presidente da República - professor, ex-reitor e ex-ministro da educação - que elegeu uma só prioridade para o seu governo: educação. Abertas as urnas contabilizou 2% dos votos.

O quadro educacional no nosso Estado não é nada animador e só ganhamos de alguns grotões. Não é por acaso que profissionais felizardos “enchem a boca” para dizer que estudaram nos Estados Unidos, Canadá, Alemanha, Itália, França e Austrália. O sucesso educacional nacional não existe. É necessário um carimbo de grife estrangeira.

Estou fazendo estas considerações sobre o país campeão de analfabetos funcionais, evasão escolar e repetência para defender a nossa Universidade Estadual de Mato Grosso – a UNEMAT.

A UNEMAT tem sede em Cáceres e cursos em muitos municípios do Estado. Possui um corpo docente com doutores e mestres. É dependente dos escassos recursos do tesouro do Estado. Enfrenta toda sorte de dificuldades desde a sua criação. Está consolidada em crescimento e respeitada na área acadêmica. Conheço muitos dos seus professores e sei o que estou dizendo. A UNEMAT não possui autonomia financeira, e para sobreviver depende do humor dos plantonistas do poder. Houve um fiasco de proporções nacionais com relação ao maior concurso público do mundo.

O desgaste do governo é impressionante! Tive acesso a uma pesquisa e não acreditei no tamanho da catástrofe. A Assembléia Legislativa quer ouvir os responsáveis pela humilhação sofrida pelos brasileiros que procuram trabalhar através de um concurso. O governo é muito claro quando joga toda responsabilidade do erro na nossa querida Universidade Estadual que, como dependente financeira do tesouro, com toda certeza, foi obrigada a aceitar o trabalho.

Por pura covardia o autor da estúpida idéia de um concurso de dez mil vagas e trezentos mil candidatos, realizado no mesmo dia, não aparece. Esta idéia, assim como a sua aprovação, não foi da UNEMAT. Esta instituição de ensino superior, repito, deve ter sido obrigada a aceitar esta loucura, pois dos males talvez esse fosse o menor. Os verdadeiros responsáveis devem sair dos seus esconderijos e assumir o erro cometido. Todo mundo sabe quem são. Mas eles, os deuses da vaidade, preferem destruir uma Universidade a agir com lealdade ao contribuinte, confessando a verdade.

É difícil acreditar que, para salvar alguns votos e melhorar o imenso desgaste político, tem gente pensando em destruir uma instituição de ensino superior em Estado tão pobre.

Acredite se quiser, mas a intenção é esta.

Gabriel Novis Neves
Cuiabá, 25/11/2009

terça-feira, 24 de novembro de 2009

GARCIA NETO

O meu pai comprou do espólio do ex-governador de Mato Grosso, Antônio Cesário de Figueiredo, a sua residência na Rua do Campo (Barão de Melgaço nº 365). Era um casarão com fundos para a Rua da Fé (Comandante Costa).

Antigamente os governadores moravam em sua própria casa - nada parecido com a Residência Oficial dos Governadores. Por ocasião da nossa mudança da Rua de Baixo (Galdino Pimentel) para a nova e definitiva casa, o meu pai resolveu dividi-la, pelo seu enorme tamanho, para alojar a nossa família. Durante as obras os pedreiros encontraram dezenas de armas enterradas no subsolo do velho casarão. Fizeram um enorme buraco no quintalão e ali elas foram enterradas. Eu tinha mais ou menos dez anos, e este fato tornou-se um dos “pontos luminosos” da minha vida, no conceito de Carlos Heitor Cony. Não dá para esquecer aquilo que vi, ser tratado com tanta naturalidade.

Estudando a história de Cuiabá, e conversando com meu pai sobre as armas encontradas, fiquei sabendo que naquela época, “ escreveu não leu”, era o “tiro” que resolvia, e ali morava o governador do estado - que morreu pobre.

A parte que nasceu da divisão da casa foi alugada para uma firma construtora, de fora, chamada Coimbra Bueno, a única que trabalhava no estado. Para tocar as suas inúmeras obras, a empresa contratou um jovem engenheiro sergipano recém-formado, solteiro e muito competente. O seu nome: Dr. José Garcia Neto.

A vinte metros do escritório da construtora morava o Dr. Lima Avelino, meu companheiro de xadrez. É isso mesmo: aprendi a jogar o xadrez, antes de ser alfabetizado, quando fui morar na casa do meu avô, médico, viúvo, surdo e otorrino. Joguei muito xadrez com o Dr. Lima Avelino casado com a D. Alice. Às vezes ia à casa do Dr. Lima Avelino, advogado e Delegado Federal do Trabalho para distraí-lo jogando xadrez. Perdia mais que ganhava. Ficamos amigos.

Lembro-me perfeitamente da chegada de Maria Lygia - com seus pais, Francelino e Alicinha e o irmão José Fernando - à Cuiabá. Vieram do Amazonas encantados com as maravilhas que o meu colega de xadrez e esposa falavam sobre o futuro da Cidade Verde. Durante algum tempo moraram com os parentes amazonenses já totalmente cuiabanizados. Além do mais a Mariete, filha única do casal hospedante, ganhou a companhia da prima querida, Maria Lygia.

Presenciei a paquera do engenheiro de Sergipe com a bonequinha de Manaus. Ele, um homenzarrão; ela, uma figura carismática com pouca altura.

Por doze longos anos me afasto de Cuiabá para estudar no Rio de Janeiro. Ao retornar, meus amigos estavam casados, com filhos e participando das transformações da Cuiabá em desenvolvimento. O engenheiro de Sergipe era vice governador do Estado. Fui morar ao lado da escola Artífice, depois chamada de Escola Técnica, e hoje Instituto Universitário. O engenheiro logo ao chegar à Cuiabá foi professor dessa escola.

Sempre apaixonados viveram Garcia e Maria Lygia. Vinícius de Moraes deveria conhecê-los. Tenho certeza que alguns versos seriam mudados pelo poeta que nunca acreditou no amor eterno: “O amor é eterno enquanto dura”, diz o autor de Garota de Ipanema. Garcia e Maria Lygia desmentiram o líder da bossa nova. O amor deles foi eterno. Só a morte os separou temporariamente. Garcia viveu intensamente o amor puro da sua mulher, filhos, genros, noras, netos e netas.

O povo de Cuiabá que ele tanto amou, também o amava.

Adeus Garcia e até a qualquer hora.

Gabriel Novis Neves
Cuiabá 20/11/09

A história do sofá

Uma das piadas mais antigas que conheço é aquela do português, que sempre ao sair para trabalhar, sua esposa recebia a visita do vizinho. De tanto assistir a repetição desta cena, o seu compadre, após muita reflexão, revela o fato ao amigo. Passado algum tempo e como a rotina continuava, o compadre cria coragem e pergunta ao português:

“- Que providencias você tomou com relação aquilo que lhe relatei?”

“- Estou em dívida com você. Joguei o sofá fora, onde a minha mulher namorava e o problema ficou resolvido. Muito obrigado pelo alerta.”

“- Não há de quê.” Respondeu melancolicamente o compadre.

“A Gazeta" de 15/16 de Novembro de 2009 traz a manchete, com direito a fotografia do secretário de comunicação de MT: "Estado faz operação pente-fino para coibir fraudes em licitações”.

A notícia é mais hilariante que a história do sofá do português. Primeiro pelo linguajar policialesco da matéria (pente-fino). Segundo que o governo não confia na sua Secretaria de Administração. Acha que ela não coíbe irregularidades nas licitações, e com este pente-fino dá uma resposta às denuncias que vêm ocorrendo e que devem aumentar com a proximidade do ano eleitoral. Essa força tarefa, que melhor seria chamada de força vergonha, será oficializada com a publicação de um decreto governamental.

Essa história de força tarefa não é parecida com a história do sofá? No sofá a honra da mulher do português foi lavada quando o sofá do amor proibido foi jogado fora. Com a força tarefa, como fica a honra do secretário de administração chamado de incompetente e toda a sua briosa equipe?

O governo reconhece que os mesmos não possuem condições técnicas de realizar uma licitação ética e que a corrupção aumenta em ano eleitoral. Acaba e enterra com a credibilidade dos pregões.

É assim que se resolvem problemas? Criando decretos?

Fantástica providência preventiva!

Gabriel Novis Neves
14-11-2009

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

A DINDA

O pum que virou traque

Todas as providências foram tomadas pelo governo do estado para mais um recorde. Já temos o título de maior produtor de soja do mundo, do maior rebanho bovino do Brasil, do maior casamento comunitário do Brasil e só faltava o título de estado realizador do maior concurso público do mundo. O mais humilde dos habitantes desta terra sabe que propaganda, às vezes, não funciona na prática.

A cena do teatro estava montada. A insensibilidade, inabilidade e incompetência dos produtores de recordes, ficaram evidentes. Dias antes do concurso o governo deveria anulá-lo, por sentir que as coisas não aconteciam como planejavam. Este concurso seria, politicamente, o filme do Bruno Barreto para a próxima campanha eleitoral. Possibilidade de dar certo era zero à esquerda, mas a vaidade prevaleceu.

Imaginem o Fantástico anunciando mais esta conquista para Mato Grosso. Quebraram a cara. O concurso foi anulado e o despreparo deste pessoal, além da falta de respeito humano, ficou claro. Cenas jamais vistas em concursos públicos são exibidas em sites. O tiro saiu pela culatra. Os candidatos ao maior concurso público do mundo foram maltratados, houve quebra do sigilo das provas, desorganização e muita humilhação para aqueles que apostaram o seu futuro acreditando na seriedade do governo.

E agora, o que fazer com a frustração de quase trezentas mil pessoas? É o recorde em números de candidatos nesta situação. A oposição vai deitar e rolar em cima deste fato. Foi a maior prova de desprezo pelo cidadão num reinado terminando, com os seus filhos sem esperanças.

Não há justificativa para este crime. O governo é réu e precisa de humildade para reconhecer urgentemente que errou mais uma vez.

Não me venha com esta história de terceirizar o erro!

O pum que o governo preparou, virou traque.

Gabriel Novis Neves
22-11-2009

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

CONVITE

Atendendo a um convite provocador da Sociedade Brasileira de Cardiologia – MT para proferir a Conferência de Abertura da IX Jornada de Cardiogeriatria de Mato Grosso e V Jornada de Geriatria e Gerontologia de Mato Grosso, fui estudar as desvantagens de envelhecer.

Confesso com toda a sinceridade que não encontrei nenhuma. Alguém poderá a esta altura pensar que eu “pirei” e preciso de tratamento psiquiátrico. Ledo engano. Estou muito bem “das saúdes”.

Com o acréscimo de vida aos meus dias sou forçado a enfrentar modificações fisiológicas facilmente controladas com a farmacologia moderna. O último problema masculino era a irrigação dos corpos cavernosos resolvida com o uso da pilulazinha azul, e nos casos mais graves, a prótese de silicone. Diabetes, hipertensão arterial, reumatismo, catarata, queda de cabelos e rugas, a tecnologia médica controla, e bem.

Chamar a terceira idade como “a melhor idade”, para mim é puro preconceito. Melhor idade é aquela em que você está bem.

Fui verificar as possíveis vantagens do idoso. Tenho que resumir ou publicá-las por capítulos - vou citar algumas dessas vantagens.

O idoso não paga transporte coletivo, quando o motorista de ônibus atende o seu pedido de parar. Não entra em fila de bancos e embarques em aeroportos; é chamado muitas vezes de: museu, história viva e vô. O prazo de validade do idoso tem que ser renovado anualmente - o que considero uma vantagem inegociável, por viver sempre com o combustível novo da iniciação. A vida é feita de ciclos: no início eles tem circunferências maiores, ao envelhecer estes ciclos são menores - o que é considerado outra grande vantagem do idoso.

Fecho um ciclo e imediatamente abro outro. Este ano ainda não findou e já fechei dois antigos e enormes ciclos. Nem senti as conseqüências destes fechamentos, pois outros ciclos já estavam se abrindo na minha vida. Nada parecido com o jogo de dama em praça pública, cadeira de balanço pelas calçadas, visitas para matar o tempo ou inúteis conversas sobre o passado.

Nada melhor para um idoso aparador de crianças, o privilégio de passar um final de semana entre cardiologistas, geriatras e gerontologistas.

É bom ter uma relação afetiva com esse pessoal, especialmente com o cardiologista, pois todos nós iremos morrer e no atestado de óbito constará como causa da morte – parada cardíaca.

Se o obstetra significa o médico do início da vida o cardiologista está muito condicionado ao final da existência. No meu caso tenho a sorte de ter um cardiologista no décimo primeiro andar do meu edifício e sou morador do vigésimo andar, bem pertinho do céu.

Envelhecer é o momento de colher tudo o que plantamos quando jovens. E digam-me se não é prazerosa a colheita?

Não preciso mesmo de tratamento psiquiátrico e sim de companheiros para compartilhar os frutos colhidos.

Envelhecer é bom.

Gabriel Novis Neves

16.11.2009.

* Publicado simultaneamente no http://www.gnn-cultura.blogspot.com/

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Ela tem razão

Uma famosa jornalista ficou impressionada ao visitar o Pronto Socorro de Cuiabá e classificou-o como campo de batalha. Não sei se a jornalista já tinha visitado o nosso Pronto Socorro ou outros por este mundo afora. É realmente impressionante o ambiente em um hospital de urgência e emergência. Ali as coisas nem sempre são como aparecem. Neste tipo de hospital não há possibilidade de planejamento.

Certa ocasião durante meu plantão no Pronto Socorro Souza Aguiar, no Rio de Janeiro, saí de ambulância para prestar assistência aos passageiros de um avião da Varig que se acidentara ao pousar no aeroporto do Galeão. Era dezembro de 1959, e entre eles estava o famoso historiador Otávio Tarquínio de Sousa. Todos os passageiros morreram. Alguns ainda com vida, foram transportados. Nesta hora não se pergunta se há vagas no hospital. É caso de extrema emergência e o ambiente do hospital é o de guerra mesmo.

Quantas vezes já conduzi pacientes gravíssimos, acidentados em vias públicas diretamente para o centro cirúrgico, independente de vaga. Muitos estudantes de Medicina abandonam o curso quando enfrentam esta realidade. A jornalista tem toda a razão quando ao fazer uma matéria sobre o Pronto Socorro Municipal de Cuiabá, disse que aquilo era um campo de batalha. Concordo com ela, é um verdadeiro campo de batalha para os pacientes gravíssimos que estão ali amontoados, para os médicos, para todos os trabalhadores de saúde, para a sociedade e jornalistas que realizam o seu trabalho de informar.

A Medicina não entra na lógica do lucro e nunca foi sacerdócio. A Medicina é uma profissão diferenciada das outras, pois cuida de seres humanos fragilizados. Não, e nunca admitirei, mesmo em situações limites, as “patadas dos médicos” no atendimento aos seus pacientes e familiares. Estes profissionais que assim se comportam, não são médicos, talvez técnicos em doenças e não devem “plantar favas” que são leguminosas cujo fruto é uma vagem ou legume que não suportaria uma patada. Matar as leguminosas ou maltratar alguém com patadas, não é ensinamento de Hipócrates.

O desespero extremo dos médicos do Pronto Socorro Municipal é conseqüência das condições adversas de trabalho a eles oferecidas. Ao contrário do que muita gente pensa, o médico nestas situações é pouco útil aos seus pacientes. O médico participa do processo de cura quando competente e humano tem condições de trabalhar com dignidade em um cenário de solidariedade. No momento em que inexiste essa situação, continuar enganando a população é crime hediondo. O correto é parar, denunciar e propor soluções. Seria o médico um patife ao participar desta tragédia, com um silencio inaceitável, tradutor da falta de compromisso com a população e a ética. A finalidade principal da Medicina é a promoção da saúde e a sua prevenção, assim como cuidar das situações de urgências e emergências. Ter um filho médico foi um sonho da baixa e alta burguesia.

Hoje, os países do primeiro mundo importam estes profissionais (médicos) e terceirizam os seus serviços auxiliares, principalmente os de imagens, com os países emergentes. As faculdades de Medicina não irão nunca ensinar humanização aos seus alunos, podem até tentar. Esta disciplina é aprendida em casa. Quando o estudante procura a Universidade para se profissionalizar através da instrução, o seu caráter já está moldado com os valores adquiridos no meio em que viveu.

O caos da saúde pública no Brasil, Mato Grosso e Cuiabá é responsabilidade dos nossos políticos – que foram eleitos por nós – dos médicos e da sociedade produzindo sofrimento, especialmente na população mais pobre e necessitada.

A jornalista tem razão.

Gabriel Novis Neves
06-11-2009

* Publicado simultaneamente no http://www.gnn-cultura.blogspot.com/

terça-feira, 17 de novembro de 2009

ACABOU !

Com a intervenção direta do Tribunal de Justiça do Estado, terminou o movimento dos médicos de Cuiabá por melhores condições de trabalho, dignidade e humanismo nas relações - paciente – médico - burocratas. Foram mais de sessenta dias de sofrimento para os médicos, e principalmente, para aqueles que não falam e que ninguém fala por eles.

Foi apenas uma etapa vencida. O mais difícil está por vir. Criou-se uma expectativa enorme na população, que com três milhões de reais teríamos a maior reforma da história do Pronto Socorro de Cuiabá, e que com outros três milhões adquiriríamos equipamentos tecnológicos de última geração.

Pura propaganda enganosa, e o mais importante nem foi lembrado: a qualificação e valorização dos trabalhadores da saúde. Alertei aos meus jovens colegas que o governo fará tudo para passar à população, que o que os médicos desejavam era só um aumento de oitocentos reais mensais no seu holerite. Isso já está sendo martelado a peso de ouro nos informes publicitários, oficiais e nas entrevistas dos burocratas. E a verdade não é essa. Nunca em cinqüenta anos de Medicina presenciei um movimento de médicos como o de agora. Garanto que não houve motivação política e sim despreparo dos burocratas para enfrentar este sério problema social.

O resultado foi a catástrofe que vivemos. A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Saúde criada pela Assembléia Legislativa é um instrumento, que bem trabalhado, contribuirá em muito para a melhoria da Saúde Pública, não só de Cuiabá como de todo o Estado. Ficará para a história da Medicina o relatório final dessa Comissão. Acredito no compromisso dos membros da CPI com a população deste Estado. Ela tem tudo para mostrar o “Santo” como ele é.

Um jovem hoje só procura ser médico para tornar-se agente de mudança social. Medicina não é mais um curso de status ou de remuneração diferenciada. O médico moderno participa da realidade em que vive, e está em todos os grotões com a população nos seus momentos mais difíceis. Um trabalho coordenado e organizado dessas “formiguinhas” pode alterar este cenário de desumanização.

Acabou o movimento. Mas o trabalho do médico continua, em busca de novas conquistas sociais.

Gabriel Novis Neves
16/11/2009

* Publicado simultaneamente no www.gnn-cultura.blogspot.com

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Come quieto

Lendo um jornal de circulação nacional, chamou-me a atenção a fotografia do governador de Minas-Gerais, em uma matéria cujo título era - "Come Quieto”. O material jornalístico comentava que, pela primeira vez, uma pesquisa colocou o jovem político em primeiro lugar na preferência do eleitorado brasileiro para suceder o "cara".

Conseguiu ultrapassar os seus dois principais adversários, o vampiro de São Paulo e a guerrilheira.

O povo mineiro é conhecido pela sua discrição. O avô do governador nunca atendia telefone e dificilmente abria a boca para emitir uma opinião em reunião pública. Foi um hábil negociador, mas no "tete a tete".

Aqui em Mato-Grosso precisamos de um urgente estágio com os mineiros. Os nossos políticos estão falando demais e fazendo cada vez menos. A população que trabalha - não tem quem fale por ela. Está totalmente abandonada, embora na mídia o quadro apresentado seja totalmente diferente. O acesso a um jornal local é privilégio de uma minoria. Conseguir ler, por exemplo, a revista Veja, então nem se fala.

Esta semana a Veja, em matéria paga de uma página, trata do informe publicitário sobre a dengue que mata. Somos, com a Bahia, o estado em primeiro lugar na incidência desta doença. Toda a população de Mato-Grosso gostaria de saber o custo deste anúncio. Ainda bem que o publicitário oficial trata a Dengue como coisa séria, comparando-a a um jogo de futebol. O que precisamos mesmo não é ganhar o jogo, mas recursos para treinamento e contratação de agentes de saúde para esclarecer a população que não lê a Veja, da importância dos cuidados para não deixar o mosquitinho proliferar. Ações governamentais permanentes são necessárias para acabar com as fazendas urbanas do “aedes aegipti”.

Tenho quase certeza que o custo da propaganda acabou com os recursos do governo para a campanha da dengue. E dengue mata.

Mas na foto ficamos bem.

Gabriel Novis Neves
15.11.2.009

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

A FESTA DO ALVARÁ

Quanto mais se vive mais se aprende. Hoje foi um dia de festa na nossa empresa. O motivo merece grandes comemorações. No momento de crise na saúde pública, conseguimos da Prefeitura, o nosso Alvará Sanitário.

As lideranças do hospital foram até a Vigilância Sanitária receber o “troféu”. As funcionárias se prepararam como se fossem debutantes e o chefe foi de terno e gravata.

Este documento é necessário e imprescindível ao funcionamento de qualquer estabelecimento que cuida da saúde. Poucos hospitais em Cuiabá possuem este “troféu” que conquistamos. O próprio hospital da Prefeitura não possui o Alvará Sanitário, logo, funciona fora da lei.

Como exigir dos outros o que você não faz? Eis a questão! Como fica o município quando manda lacrar hospital, farmácia, restaurante, lanchonete, etc.? O exemplo vem de cima. O Governo é extremamente vulnerável em todos os seus setores e o resultado enfrentamos no nosso dia-a-dia: desrespeito total à população, toda a sorte de desmandos nas áreas prioritárias, principalmente educação e saúde e a praga da imunidade.

A lei brasileira parece que foi feita só para os pobres. Até hoje, não consigo esquecer o “Programa Federal” comandado pelo próprio Presidente, para salvar o membro da Academia Brasileira de Letras no Senado. Vergonhoso para um país, péssimo exemplo aos jovens. Até nossa aguerrida senadora, intransigente defensora da ética e moral, foi peça fundamental, quando Presidente do Senado, no projeto de salvação do “bigode”.

Quando cumprimos a lei, que é nossa obrigação, como é o caso do Alvará Sanitário, fazemos festa!

Triste realidade de um país na contramão da história!

Gabriel Novis Neves
05 de Novembro de 2009

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Até quando?

Oficialmente há sessenta dias estamos sem os serviços públicos de urgência e emergência. Inaceitável em uma capital de Estado rico e pólo de atendimento de um milhão de pessoas. E nada de objetivo se faz para resolver esta calamitosa e desumana situação. O salário humilhante de oitocentos reais pago aos médicos já chegou a mil e oitocentos reais por mês. Mas as condições mínimas para o exercício digno da medicina não existem.

A reforma física do nosso Pronto-Socorro ficará em torno de três milhões de reais. Só com a demolição do Verdão o Governo estadual gastará oitenta milhões de reais, segundo notícias da mídia. Para equipar o novo Pronto-Socorro estão estimados mais três milhões de reais. O projeto do novo estádio de futebol custou vinte milhões de reais ao tesouro público.

Dinheiro, o Governo está demonstrando que tem e de sobra. A pergunta que nos incomoda é: “porque não se trata os problemas da saúde como se trata os problemas do futebol?” Infelizmente tenho que acreditar que a saúde pública não é prioridade neste Estado.

A paciência da nossa pacata população está no limite. Se eu for destacar as tentativas governamentais para resolver este sério problema de saúde pública, mesmo a contra gosto entrarei na página do humor. Virou moda, nesta outrora briosa Cidade Verde, diante de um problema terceirizar o serviço. Já pertence à história o tempo do “morrer se possível” para se implantar uma civilização.

Houve uma tentativa de se entregar as obras do PAC ao Exército Brasileiro - que não aceitou. Com a crise da saúde, pensou-se em entregar ao judiciário a gerência dos problemas já que há muito as internações hospitalares e medicamentos aos pobres são funções da justiça. Com a ausência dos cirurgiões nos boxes do Pronto-Socorro, chamou-se uma empresa de saúde com nome de museu – MASP, do Rio Grande do Sul, totalmente desconhecida em Porto Alegre e conhecidíssima aqui.

A solução salvadora encontrada pelo Governo Estadual foi jogar o problema da urgência e emergência para o privado Hospital Geral Universitário (HGU). Outro hospital universitário do Governo Federal – Hospital Universitário Júlio Muller (HUJM), não aceitou a deferência governamental. O HGU nem pronto atendimento possui. O pronto socorro do HGU é o fechado e em crise, Pronto Socorro de Cuiabá.

Estou acreditando que o Governo Estadual gostou da idéia do MASP, e está criando o seu MASP em Cuiabá, que é o HGU. Não vai resolver o problema da população pobre. Na primeira semana da alternativa estadual, as estatísticas estão aí: desastre total. E o pior é a vaidade das autoridades em não admitir que erraram mais uma vez. Fizeram política partidária na saúde, e o resultado veio a galope.

Gabriel Novis Neves
04 de Novembro de 2009

* Também publicado no http://www.gnn-cultura.blogspot.com/

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

HOMENAGEM

Sempre achei estranho essa mania de se homenagear pessoas vivas dando-lhes nomes de prédios, escolas, hospitais, pontes, ruas e tantos outros artifícios para escravizar o homenageado.

Com cinqüenta anos de atividades profissionais, após ter construído uma cidade e espalhado por todo o estado, do novo e velho Mato Grosso, conquistas arquitetônicas, jamais aceitei ter o meu nome utilizado nessas construções. Ao deixar a UFMT implantada e consolidada, o Conselho Universitário, por unanimidade, denominou o campus do Coxipó com o meu nome de batismo. Isto não passou de um ato de reconhecimento e nunca foi utilizado. Os prédios que construí não possuíam nomes de pessoas. Passados os anos, algumas reformas foram realizadas e os prédios re-inaugurados, agora têm os nomes de pessoas vivas.


No toma lá da cá é preferível viver sem ser homenageado para evitar a incômoda posição de devedor de favores, a quem não devemos. Há pouco tempo fui comunicado que uma grande obra teria o meu nome. Agradeci e justifiquei que vivos precisam de solidariedade. Homenagens prestamos aos mortos que merecem ser lembrados.

Cuiabá está cheia de ruas, avenidas, escolas, etc., com nomes de parentes de pessoas influentes que nem conhecemos. Receber homenagem é fácil, difícil é merecê-la, e como tem fantasmas por aqui. Prefiro ter amigos a ser amigo de pessoas influentes. Essas pessoas influentes fazem lobby político para colocar o homenageado como refém de uma gratidão. Acompanhei o sofrimento de um ilustre cuiabano que virou nome de prédio. Ideologicamente não se afinava com o idealizador da homenagem. Houve constrangimento e necessidade de explicações éticas. Graças a Deus, eu e a minha família estamos protegidos desse mal da homenagem que não é sincera ou por mérito.

Pobre do meu avô homenageado em um terreno que chamo carinhosamente de Pracinha do Vovô. O seu busto não tem identificação. Em compensação, até o operário que transportou a areia para a construção do pedestal tem o seu nome na enorme placa do peixinho. Vontade tive de trazer para casa o busto do meu avô e deixar a pilastra de sustentação com o nome da diretoria.

Não é mania, mas entre os cuidados que tenho estão as de evitar certas homenagens. Quero, enquanto vivo, apenas solidariedade.


Gabriel Novis Neves
23 – 10 - 09

O Anúncio

Perto da minha casa diariamente vejo um enorme outdoor com uma linda morenaça anunciando um bronzeador para o verão. O que vou fazer com um bronzeador? Passar na minha velha carcaça coberta de pele e ficar exposto ao sol cuiabano na tentativa de mudar a minha pigmentação para a cor da morena? Prefiro ficar “brancão” e contrariar a proposta da mulher perfeita da propaganda - provavelmente com o auxílio do photoshop. Acho melhor a modelo do que o produto anunciado.

A tecnologia vende estas mentirinhas, como a da beleza perfeita, tão necessárias a nossa auto-estima. Ultimamente não vejo mais fotos com pessoas feias.

Uma revista famosa editou uma matéria com celebridades, em que mostrava como a pessoa era, e como ficou após o trabalho de digitalização da imagem. Com a digitalização todas as imperfeições adquiridas com o tempo são corrigidas. Acaba-se com as rugas, papadas, bolsas do globo ocular, estrias, celulites, aquela barriguinha, e os seios e bumbuns aparecem suspensos e fixos. Os lábios carnudos são feitos de silicone. Chegamos assim à perfeição da imagem da moça que foi escolhida para vender o produto que bronzeia a pele.

Ainda que artificial, prefiro a modelo da propaganda ao bronzeador.

No mundo das frustrações e desencantos, é preferível este mundo irreal que o bronzeador produz para esconder as nossas feiúras. Os brancos só procuram ser morenos por pura vaidade. Ninguém suporta este sol, às vezes causador de queimaduras e doenças malignas. O seu único efeito terapêutico é produzir benefícios embelezadores!

Não vou ao sol, nem comprar o bronzeador, mas ficaria satisfeito em conhecer a vendedora com o seu uniforme de trabalho – o biquíni.

Gabriel Novis Neves
03 de Novembro de 2009

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

O SAPO

Conversando com uma amiga, não da minha idade, mas um degrau e meio abaixo, surgiu o assunto inocência. Como a geração antiga era inocente no seu todo e não no essencial!

Começamos lembrando a extinta figura do sapo. Fiz um teste e perguntei as minhas netas universitárias se conheciam o termo sapo. Todas se referiram ao anfíbio de pele rugosa e seca. Se esta pergunta me fosse feita com a idade delas diria que era um velho conhecido das nossas casas. Prestava serviços também em laboratórios para o teste que diagnosticava a gravidez. Você levava o sapo ao laboratório e saía aliviado ou não com o resultado do exame.

Mas não são desses sapos que recordávamos. Eram daquelas pessoas que ficavam na porta da igreja para assistirem a entrada da noiva, dos padrinhos e madrinhas, do noivo e todo aquele povão do casamento. Havia os que escolhiam as portas das casas marcadas com símbolos mortuários, para assuntar quem tinha falecido e como estava o ambiente. Outros preferiam as portas dos clubes no carnaval para sapearem como as coisas aconteciam. Marcavam os que cheiravam lança-perfume e os amassos embora discretos daquela época. O sapo estava tão presente na vida da cidade que foi criado o verbo sapear que significa observar sem participar. É mais ou menos o mesmo que bisbilhotar.

No outro dia surgiam comentários salgados e venenosos dos sapos. O sapo adorava dar palpite. Não ouço mais essa palavra com este sentido. Há muito tempo desconheço alguém que sai de casa para sapear algum evento. Vou confessar que certa ocasião fui vitima do sapo. O meu pai fechava o bar aos domingos logo após o término da retreta na Praça Alencastro, às vinte e uma horas. Meia hora depois estava em casa. Vinha sempre andando - nunca possuiu um veiculo. Morávamos quase colados ao Clube Feminino, então no apogeu. Na época das férias os pais solicitavam a direção do clube, noite dançante aos domingos até as vinte e três horas. O objetivo era impedir que a molecada de férias migrasse para o Beco do Candeeiro - na época zona do baixo meretrício. Meu pai antes de chegar em casa parava em frente ao Clube Feminino para sapear e me viu numa mesa onde estava uma linda menina. Acontece que meu pai não suportava o pai da menina. Vamos logo ao resultado, pois essa história é longa. Nunca mas fui ao Clube Feminino para salvar a honra do meu pai.

Que sapo hein?

Gabriel Novis Neves
06-07-2009

MARIPOSAS

Mariposas são insetos de hábitos de vôo noturno. As moças em bando, quando saem à noite, se são pobres são chamadas de mariposas. Se ricas, são estudantes que vão se divertir. Esta é a nossa eterna desigualdade. O termo mariposa, quando empregado às moças em grupo, tem um significado de maldade social. Mariposas são as mulheres que saem à noite à procura de amor comercializado.

Era manhã ainda escura, quando dois automóveis populares e bem rodados, param em um posto de gasolina. Estavam cheios de mariposas. Procuravam um pequeno “quartinho” nos fundos de um estreito corredor, para eliminar os produtos desnecessários ao seu organismo. O corredor era tão estreito que seria impossível, em uma emergência, para adiantar o serviço, alguém ficar na porta do quartinho esperando a saída da usuária. Noto o espetáculo das mariposas, diga-se de passagem, muito bonitas e jovens. No desespero uma delas grita: “- Vem cá, merda!” Logo apareceu a aliviada para a alegria da desesperada. As outras dançavam e exalavam estrogênio tão abundante nessa idade! Diminuo o que posso os meus passos para não perder o espetáculo. Descubro que à noite, mariposa não usa calça comprida (jeans) e nem tampouco a outra. Uma pequena saia é o suficiente para dar-lhe proteção a uma infração penal de atentado ao pudor, e ao mesmo tempo, facilitar sobremaneira a sua vida comercial e biológica. No caso que relato foi fácil o esvaziamento do tanque de detritos dos rins – creio. A curtíssima saia, serve também, para esquentar, e como, a dança da moda, o “funk”, assim como eventuais emergências sexuais. Na dança do trenzinho quando acidente acontece só o DNA para esclarecer. Faço o meio contorno do posto de gasolina para entender melhor os efeitos do comportamento das pessoas quando em grupo. Há uma interação tão grande de serotonina, com expressões de uma pureza lingüística que, se pronunciada à luz solar, seria no mínimo falta de educação. À noite, ou no escuro, aquele rosário de frases que todos nós pronunciamos, ou pensamos, tem um sentido de poesia: “-Vem cá, merda!”; “- Sua fdp, deixa um pouquinho na latinha!”; “- Vá tomar no... !”; “Ainda quer uma saideira, sua fresca!”; “- Por que não pediu lá?”

Com os pneus dos carros cheios de ar e a cabeça cheia de álcool, partem deixando no seu rastro toda a maravilha da vida como ela é. Lindas meninas! Adormecerão durante o dia, e à noite continuarão a ser mariposas nos seus vôos de prazeres e ilusões.

Gabriel Novis Neves
10-08-2009

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Vale a Pena ?

Todos os países desenvolvidos do mundo têm em comum uma história: investiram em educação. No grupo dos oito, o famoso G8, não existe uma exceção. Todos os países integrantes têm uma educação bem diferenciada daqueles que estão fora do grupo.

Aqui no Brasil fala-se muito em educação. O último grande programa de impacto na educação brasileira foi o já fracassado Exame Nacional do Ensino Médio, o famoso ENEM. Os problemas que esta simples seleção causou na educação brasileira foram maiores que os possíveis benefícios. Atingiu o calendário escolar com diminuição do ano letivo e da sua carga horária, gerou estresse nos professores, alunos, pais e, para finalizar, corrupção com relação às provas.

Houve vazamento das questões e o tal do ENEM foi adiado, até segunda ordem, para dezembro. Os alunos pintaram as suas caras e saíram às ruas para manifestar toda a sua indignação pelos fatos ocorridos. Nada conseguiram a não ser um pronunciamento do Ministro da Educação em cadeia nacional, confirmando o vazamento das questões da prova e marcando outra data para sua realização.

Nova empresa foi contratada para realizar os exames e evidentemente com novos custos, que nós contribuintes iremos pagar sem termos sido consultados.

Estudantes brasileiros vieram do exterior para prestar os exames, assim como muitos estudantes brasileiros foram obrigados a se deslocarem para lugares distantes para a seleção de ingresso na universidade. Como estes gastos inúteis serão reembolsados? Com certeza no dia do São Nunca.

No Brasil a educação não é levada a sério, os projetos são improvisados para efeitos eleitorais. Mas sempre existem aqueles que, com enormes sacrifícios conseguem estudar, na tentativa da sua inclusão social. É desanimador estudar no Brasil!

Uma revista de circulação nacional noticia no pé da página que quarenta e cinco pessoas com doutorado em diversas áreas de conhecimento se inscreveram no Rio de Janeiro no concurso para garis. Há também vinte e dois candidatos com mestrado e mil e vinte e seis com nível superior completo. Ao todo são cento e nove mil inscritos para mil e quatrocentas vagas. Pela leitura podemos tirar algumas conclusões:

- o ensino superior no Brasil não vale para nada - talvez para fabricar profissionais qualificados para limpezas de ruas;

- os que terminam o curso superior, com certificado de profissões outrora nobres, têm que se contentar com salários de oitocentos reais mensais - caso dos médicos em Cuiabá;

- é possível que exista um sério problema de absorção de mão-de-obra qualificada no Brasil - nesses casos muitos migram para o exterior;

- é grande o número de desempregados no Brasil.

Penso também na inutilidade desses cursos, especialmente de pós-graduação. São aqueles que fornecem atestados de cursos ornamentais e ociosos.

Será que vale a pena estudar em um país onde os trabalhadores de nível superior recebem menos atenção que os trabalhadores de movimentos sociais?

E o único meio de se conseguir a justiça social é através da educação. Acho que existe alguma coisa errada para que este objetivo seja atingido.

Gabriel Novis Neves
02-11-2009

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Dois de Novembro

Jesus expulsou os fariseus do Templo. Bem que Ele poderia percorrer os nossos cemitérios no Dia dos Mortos. Tenho certeza que aquela cena voltaria a se repetir.

O campo sagrado, onde descansam os nossos entes queridos, virou centro de malandragem com ladrões, assaltantes, aproveitadores e negociantes para todos os gostos.

A entrada do cemitério já me causa revolta. Parece mais um centro de negócios de baixo padrão. Vende-se de água até milagres. Aquele espetáculo comercial de péssima qualidade, dizem os de vanguarda que é tradição. Ultimamente até chá com bolo é servido na entrada da Casa da Saudade. Tradição uma ova, como dizia a minha mãe.

O espírito de luto e perda estampado no rosto dos visitantes de antigamente desapareceu. Dois de novembro é um dia de recolhimento e de encontro com o passado. Hoje as visitas que vão ao cemitério, além de pisotearem sobre os que partiram deste mundo, praticam a bisbilhotice dos túmulos tomando suco e comendo bolo de arroz.

Triste dia, duas vezes para mim, o Dia dos Mortos. Primeiro pela ausência do convívio com aqueles que partiram e segundo pela falta de respeito como são tratados. Hoje não irei ao cemitério. Não tenho receio em ser julgado pela minha ausência. Irei discretamente como sempre fiz, fora da data marcada no calendário, visitar as pessoas queridas que lá moram. Quero ficar rezando em silêncio sem ser importunado com o oferecimento de negócios ou doações as mais incompreensíveis possíveis.

Ficarei em casa vendo o mundo tão pequeno na grandiosidade da nossa vida eterna.

Gabriel Novis Neves

02-11-2009

domingo, 1 de novembro de 2009

TRUQUE

Acredito em Mula-sem-cabeça, Pé de Garrafa, Saci-Pererê, Pai do Mato, Alma do Outro Mundo, Branca de Neve, Lobisomem e tantos outros personagens considerados fantasias. Não acredito em promessas de políticos, ideologias, transparências, e outros clichês da moda. Há poucos dias conversando com um cuiabano amigo, com farta experiência em administração municipal, estadual e federal, ele me relatou um fato muito utilizado pelos nossos gestores: o truque.

Truque é um meio hábil de se fazer algo sem mostrar como. Interessei-me pelo assunto e ele pacientemente me deu um exemplo de truque administrativo. O governo estadual por lei é obrigado a investir 25% do seu orçamento em educação. Ele faz o seguinte truque matemático: infla e maquia esses 25% da educação para cumprir a lei. Na hora de destinar 12% do orçamento para a saúde, o cálculo é feito a partir dos 75% que restaram com o truque matemático. O pior é que nas despesas da saúde são colocados: alimentação de presos, pagamento de aposentadoria dos servidores da saúde, planos de saúde, etc. Além de não cumprir a constituição dos 12% para saúde, despesas que não são investimentos na saúde são ali colocadas.

Por isso faltam recursos para saúde e não há o mínimo interesse dos governos para a aprovação da Emenda Constitucional 29, que há anos está mofando no Congresso Nacional. Esta Emenda disciplina o que são os recursos para a saúde pública. Conseguimos “resgatar a cidadania” do povo brasileiro trazendo os Jogos Olímpicos para o Rio de Janeiro com muito choro e “refrigerante”. Essa emendinha 29 não conseguimos fazer com que ande do outro lado do Planalto.

Qual a diferença que existe entre Brasília e Copenhague? De truque em truque, vamos assistindo à morte desta nação em que “se plantando tudo dá”. Até os truques.

Gabriel Novis Neves

Cuiabá, 03/10/09.