quarta-feira, 31 de maio de 2023

ALEGRIA COM O CLIMA


Domingo no final da tarde recebi de um irmão, que há muito tempo possui uma casa num Condomínio da Chapada, um vídeo mostrando uma chuva torrencial que caía na cidade.


Ele é apaixonado pela cidadezinha, e quando pode sobe a serra para se esconder uns dias por lá.


Vi o vídeo e lhe perguntei se era antigo.


Ele me respondeu que era de agora.


Cuiabá fazia um calorão, que só o ar refrigerado para melhorar o ambiente.


À noite a minha cuidadora, antes de fechar a persiana do meu quarto para dormir, olhou para o céu, que estava “avermelhado”, e me disse que amanhã não teríamos sol pela parte da manhã e poderia haver mudança de clima.


Minha cozinheira que veio de moto, chegou de casaquinho dizendo que o tempo estava bom.


Tempo bom para o cuiabano é quando os termómetros estão marcando abaixo dos quarenta graus.


Tomei o meu café com o bolo de polvilho e de queijo que sobrou do dia anterior, e fui para o meu escritório arrumar as minhas coisas no computador, as de sempre.


No silêncio do escritório ouço a minha funcionária e cuidadora do período matutino dizer, numa explosão de alegria vestida com o seu casaquinho: “que clima gostoso está fazendo hoje! “- e continuou fazendo a sua tarefa.


Será que os moradores de lugares de climas mais amenos são mais felizes que os de clima quente o ano todo?


Embora tenha nascido e criado em Cuiabá, prefiro o clima ameno para viver e trabalhar.


As pessoas me perguntam se eu estou acostumado com o nosso calor, pois estou com oitenta e oito anos de idade, nasci e vivo aqui.


Saí para estudar e senti como é gostoso morar em cidade de clima ameno, e retornei para o calorão para exercer a minha profissão.


Não é meu hábito me acostumar com as coisas desagradáveis, e o calorão é para mim.


Como é bom um clima ameno, quando a gente se veste melhor, e é gostoso se vestir bem!


Nossa comida é diferente, e procuramos restaurantes suíços e alemães, para comer joelho de porco, fondue de carne e queijo suíço, com bons vinhos.


Uma feijoada completa com torresmo e um aperitivo da nossa cachaça, nunca podem ser esquecidas nesses dias.


Gemadas, chocolate quente caseiro com torradas, tudo faz parte de climas amenos, assim como os chás.


Quase meio dia, o sol não apareceu e a manhã está com clima gostoso.


Vou almoçar mojica de pintado à cuiabana.


Gabriel Novis Neves

29-05-2023




terça-feira, 30 de maio de 2023

PEQUENOS DETALHES


Hoje reservei o dia para a releitura de algumas crônicas que ainda não publiquei. São vinte crônicas.


O objetivo principal foi corrigir erros gramaticais.


Também procurei ter o cuidado de eliminar as repetições e cortar o desnecessário para não incorrer em redundância.


É uma tarefa que exige muita atenção, paciência, conhecimento da nossa gramática, e nos leva à exaustão.


É o chamado trabalho de formiguinha, que não aparece, no entanto, uma vírgula colocada incorretamente poderá invalidar todo o trabalho de interpretação da crônica.


Uma frase mal construída dificulta a leitura, tornando-a desinteressante.


E com frequência cometo esse erro, precisando de muita atenção para não repetir esse deslize.


Nesse trabalho de releitura, sempre leio em voz alta, pois isso me ajuda a perceber as implicações da pontuação, a compreensão do que se lê e o ritmo da leitura.


Eu tenho defeitos de linguagem adquiridos na infância, não chegando, no entanto, a trocar o “l” pelo “r”.


Procuro ficar muito atento às concordâncias gramaticais, mas de vez em quando cometo equívocos.


Às vezes sou tentado a escrever ignorando os meus próprios erros, mas logo refuto a ideia e peço ajuda à revisão.


Quem escreve diariamente sabe que é importante deixar amadurecer um assunto, para só então iniciar a escrever.


No desenrolar da escrita muitos atalhos poderão surgir para enriquecer o assunto, mas nunca perdendo o “fio da meada”.


Quantos ensinamentos colhemos ao desenvolvermos um texto literário, menos acadêmico e mais coloquial para nós nos comunicarmos!


Sendo um homem que vive só, através das minhas crônicas converso com centenas de pessoas, algumas bem longe de mim.


Valorizo sempre o trabalho, pois este é o verdadeiro companheiro do homem.


Os pequenos detalhes são importantes ao manipularmos o nosso difícil vocabulário de um “idioma único. ”


Isso faz a diferença de um bom texto.


Conhecer bem a língua portuguesa, prestar muita atenção ao escrever e pesquisar.


A dedicação e vocação são necessários para exercer esse trabalho, muito mal remunerado.


Hoje quem escreve tem graduação universitária, especialização, mestrado e doutorado, existindo, mas têm os leigos esforçados como eu.


Os grandes veículos de comunicação de massa e governos contratam jornalistas e redatores que tenham nível superior.


Os outros escrevem livros impressos e entram para as Academias de Letras.


Gabriel Novis Neves

24-05-2023




segunda-feira, 29 de maio de 2023

PUBLICIDADE


A publicidade que se faz pela propaganda sempre foi a alma do negócio desde tempos remotos.


Uma das minhas netas abriu uma cozinha para vender saladas de todos os tipos, com variados tamanhos.


Vende no balcão e entrega em casa no endereço fornecido.


Ela é orientada por nutricionista e destina-se a um público que não faz refeições em casa, como médicos, dentistas, advogados, empresários, funcionários públicos.


É nutritiva, excelente para o pessoal que malha em academias e não tem cozinheira em casa.


Já provei todos os tipos de saladas produzidas pela sua empresa, achei deliciosas.


Um prato tamanho família é mais que suficiente para refeições de cinco pessoas, com preços convidativos.


Recebi por whtsap a sua última novidade: um novo tipo de salada, como as outras, ricas em proteínas e sais minerais, com molho acompanhando e pimenta do reino.


Enviei para alguns amigos que almoçam sanduiches nos seus escritórios.


Todos se interessaram em provar a Salavitte.


Minha neta, que é noiva de um rapaz que trabalha muito bem com marketing, não colocou o telefone da Salavitte que entrega a salada onde você quiser e horário.


O layout da salada com a descrição do seu conteúdo está de dar água na boca, e seu preço convidativo.


Só tive acesso a essa foto com telefone e preço após reclamar.


Éramos três cuiabanos da mesma turma de médicos de 1960, da Faculdade Nacional de Medicina do Rio de Janeiro.


O único que retornou casado com uma argentina carioca, já gestante com o parto normal programado para cinco semanas depois, fui eu.


Marcondes e Canavarros vieram logo após a colação de grau, com ótima formação médica.


Ambos estavam noivos e se casaram com moças daqui e, quando cheguei para ficar e trabalhar, já tinham filhos.


Também faziam sucesso profissional pela excelência dos seus atendimentos.


A sogra do Marcondes morava na rua 13 de junho, próxima à casa da sogra do Dr. Aécio Moreira, que concluiu o seu curso de medicina três anos antes e retornou para Cuiabá.


Ela sempre falava, sentada na cadeira de balanço na porta da sua casa, as maravilhas do seu genro Aécio.


As difíceis cirurgias que ele realizava diariamente na Santa Casa da Misericórdia e Maternidade de Cuiabá, eram contadas em prosa e verso em voz alta a todos os transeuntes.


Marcondes realizava todos os procedimentos com o mesmo sucesso do seu colega Aécio, porém era pouco conhecido ainda.


A sua sogra, inconformada, dizia para ele: “Marcondes, diz que você é bom e opera igual ao Aécio”.


Sabiamente ela sabia que a propaganda era a alma do negócio!


Gabriel Novis Neves

26-05-2023




sábado, 27 de maio de 2023

OS PITORESCOS 68


Bem antigamente, não dispúnhamos de amplos meios de comunicação.


Hoje, temos tantas ferramentas para nos comunicarmos, porém continuamos isolados.


Somos vítimas da violência urbana, ficando cada um em sua “jaula”, fugindo das trombadinhas, balas perdidas, lutas de gangues e da polícia.


A guerra do trânsito e pedintes dos faróis, muitos travestidos de bandidos.


Os eventos públicos como assistir a um show de artistas famosos é um convite para a “guerra do pó”, que termina muitas vezes, com mortes de inocentes.


Até a paixão do brasileiro que é o futebol, cada vez fica mais perigoso de assisti-lo, com o encontro das torcidas na entrada e saída das modernas arenas, os antigos estádios de futebol.


Hoje, algumas dessas arenas estão interditadas para a prática desse esporte popular.


Antigamente tínhamos mais escolas que estádios de futebol, e o esporte praticado lá era para diversão, lazer, distração.


Hoje, futebol virou um negócio internacional, rendoso e os clubes viraram empresas rendáveis para príncipes árabes e bilionários.


Envolve uma roda gigante de interesses de pessoas graúdas da terra.


Antigamente, ninguém usava segurança ou guarda-costas para sair em carros blindados à rua para ir ao médico, por exemplo.


Hoje, é uma loucura a saída dessas pessoas pela nossas ruas e avenidas, especialmente se forem autoridades do governo.


A “escolta” conta com elevado número de seguranças com coletes protetores no tórax.


Carros blindados em alta velocidade, sirenes ligadas.


Não respeitam sinais de trânsito, prioridades, como portadores de deficiência física, veículos comunitários, sempre causando sérios desastres.


Tudo isso para levar a madame ao cabelereiro.


Antigamente, tínhamos sérias dificuldades na comunicação telefônica, mesmo depois de implantado em Cuiabá, o telefone fixo de parede.


Era movido a manivela até a Central Telefônica, quando uma funcionária fazia a ligação para o aparelho solicitado.


Quem implantou o telefone preto de parede, foram os irmãos italianos Lotufo, na primeira metade do século XX.


Hoje com a internet, telefonia móvel e tantas plataformas para comunicação, fiquei dois dias isolados.


Procurei a operadora que me atende para saber o motivo, pois as minhas contas estavam em ordem.


O técnico me disse que as falhas foram detectadas e eles estavam tomando providências para restabelecer o atendimento.


No primeiro caso um caminhão não autorizado a trafegar em determinado bairro pela sua altura, arrastou todo a sua rede elétrica, danificando vários bairros, inclusive o meu.


A polícia foi chamada, prendeu o motorista e o encaminhou à Delegacia.


Outro dia, ladrões roubaram boa extensão de fiação da operadora.


Os dois casos eram de polícia, e não tecnologia.


Às vezes culpo o excesso e facilidades para a gente se comunicar, de comprometer certos sentimentos como a saudade de alguém que está distante.


Antigamente, quem estava distante recebia e escrevia cartas.


 Quando era coisa urgente, alegre ou triste, passava-se telegrama.


Quantas cartas recebi da minha mãe quando estudava no Rio de Janeiro, e respondia.


Durante esse longo período que lá morei, só me lembro de ter passado um telegrama para o meu pai.


Os dizeres nunca esqueci:


“Pai, passei no vestibular de medicina da Praia Vermelha. ”


Esse telegrama foi comemorado durante alguns dias, e a todos que iam ao Bar do Bugre, ele mostrava o telegrama recebido do seu filho, que saiu de Cuiabá para se tornar médico pela melhor Faculdade de Medicina do Brasil.


Foi a maior alegria que dei ao meu pai.


Hoje meu neto está terminando a Universidade Mackenzie em São Paulo, e passou no exame da OAB nacional.


Antigamente, esse exame era realizado após à conclusão da graduação em Direito.


Hoje, esse exame é realizado no início do último ano do curso.


Fala diariamente, várias vezes ao dia com seus pais, família, amigos por vídeo chamada.


Será que ele sente saudades dos seus como antigamente a gente sentia?


Gabriel Novis Neves

24-05-2023




VÍCIO SAUDÁVEL


Estou viciado com a gentileza do meu neto “postiço”, casado com a minha neta Isabelle, que me faz todos os domingos no café da manhã.


Mikhael manda entregar no meu apartamento duas caixas de isopor com salgadinhos: bolo de arroz, de queijo e de polvilho frito em rodela.


Os salgadinhos são uma tentação e nem sei como irei fazer a programação do seu “desaparecimento”.


Tenho como parceira apenas minha acompanhante dos domingos.


Nós dois fazemos controle de peso, ela necessitando de mais do que eu.


Tem metade da minha idade e altura menor, e seu peso está nas “grimpas”.


Meu desejo era de tomar o café com dois bolos de arroz, mas, a gula me fez “abater” um bolo de queijo.


Almocei um delicioso prato simples de massa, que ela diz que faz no almoço do Natal em sua casa numa “travessona” para todo mundo, pois todos gostam, e muito.


Aqui ela preparou uma “travessinha “da massa, que almocei com moderação, pensando nos salgadinhos...


Ela me disse que o que tinha na “travessinha” acabou no almoço e seu jantar.


No lanche da noite para acompanhar a xícara de café com leite, solicitei um bolo frito de polvilho, com um bolo de queijo.


No final senti “saudade” do bolo de queijo, pedi mais um, e terminei assim o meu domingo de comilança.


As duas bananas de prata que como diariamente antes de dormir é medicamento para ajudar o sono fisiológico e restaurador.


No café da manhã do outro dia comi um bolo frito de polvilho e outro de queijo.


Minha cuidadora e cozinheira terminaram com os bolos do isopor.


Agora é torcer para o meu neto não se esquecer das caixinhas de isopor com os bolinhos para meu próximo café do domingo, pois já estou viciado com esse agrado carinhoso.


Gabriel Novis Neves

22-05-2023






sexta-feira, 26 de maio de 2023

DIA DE MUITO, VÉSPERA DE POUCO


É um antigo ditado popular muito repetido pela minha mãe Irene para me educar a pensar sempre no dia de amanhã, nunca dependendo de ninguém.


Se conseguimos boas notas nas cadernetas escolares, deveremos nos preparar mais para as avaliações futuras, e não termos surpresas de uma reprovação no final do ano.


Assim foi toda a minha educação, com ela sempre me alertando para o “dia posterior” ao dia da bonança.


Após concluído o meu curso superior, já no exercício da minha profissão, nunca esqueci do ditado tão repetido pela minha mãe.


Se em um mês havia feito dez partos, tinha que redobrar meus esforços para no mês seguinte melhorar a minha produção médica.


Não sofri paralisia do “dia de muito” para não me faltar no dia de amanhã.


Sempre me preocupei com o amanhã, mesmo quando tudo corria “às mil maravilhas”comigo.


No “dia do muito”, sempre pensei no meu futuro distante para não sofrer humilhações financeiras.


Tenho uma vida tranquila, sem sobressaltos, e por isso não sou milionário, e pago corretamente as minhas contas, que não são poucas.


Quando administrador dos bens públicos, nunca senti o “dia de muito”, pois sempre faltou esse dia.


A conquista de um benefício público era apenas um avanço para a conquista de outros infindáveis, nunca “véspera de pouco”.


Há anos uma médica e mãe, especializada em educação infantil, conduta e comportamento, me disse ser errado cobrar das crianças o “dia depois”.


A criança deve aproveitar ao máximo o “dia de muito”, pouco se importando de como será o amanhã.


Disse que as crianças reprimidas geralmente tornam-se adultos neuróticos, e estão sempre insatisfeitas com aquilo que têm.


Dei sorte – comentei com ela.


Fui educado pela minha mãe seguindo esse ditado popular, e acho que tudo deu certo bem superior as minhas expectativas de vida.


Não me tornei um neurótico, meus três filhos concluíram “cursos imperiais” em universidades, como os meus seis netos, todos trabalhando sempre para um “dia de muito”.


Os ditados populares são sábios, verdadeiros doutores nessa difícil ciência que é a vida vivida.


Gabriel Novis Neves

24-05-2023




quinta-feira, 25 de maio de 2023

ESPERANDO O PAISAGISTA


Aguardo a chegada do paisagista Henrique que irá fazer a manutenção dos vasos de flores da parte inferior do apartamento e uma adequação no jardim da cobertura.


Retirei em definitivo a piscina que ficava nesse piso superior por seus inúmeros problemas de vazamentos, e que atingia o meu banheiro, que fica no piso inferior a ele.


Essa foi a segunda e última piscina da cobertura.


Ainda dispensava atenção especial para o tratamento da sua água para não ser fonte do mosquito transmissor da dengue.


Fico triste pelos urubus e pássaros que perderam uma referência para beber água.


Quantas vezes me assustei com o tamanho e quantidade de urubus que aproveitavam a água da piscina para beber e tomar banho, ou para dar uma molhadinha no corpo, pois aqui faz muito calor até para os urubus.


Com a retirada da piscina ficou um enorme espaço nobre no jardim, que precisa ser bem preenchido.


Prefiro vasos com trepadeiras amarelas para cobrir as grades de ferro que protegiam as crianças que subiam a escadinha de mármore, junto ao muro do jardim, para tomar banho na piscina.


Acredito que quatro vasos grande sejam suficientes para preencher o vazio que a piscina deixou, junto ao muro.


Ali seria o local ideal para deixar a mesa do jantar e colocar um pequeno estrado para um conjunto de som.


O paisagista ainda fará manutenção e trocas nos outros vasos do jardim.


Quero vê-lo pronto e estou animado com a beleza que ficará, pois ele sempre foi lindo.


Depois, inaugurá-lo com uma festa à noite para a minha família que é numerosa, mas se aloja muito bem naquele espaço.


A Regina fazia inúmeras festas lá, como dos nossos aniversários, das netas, Natal e Ano Novo.


Tudo era muito bonito e a minha família comparecia em peso.


Com a sua partida deste plano existencial, acabaram-se as festas.


Houve apenas uma exceção. No meu aniversário de oitenta anos. Os filhos não aceitaram deixar passar desapercebida essa data tão especial.


Isso aconteceu há oito anos, quando a cobertura do meu apartamento ficou lotada de familiares e alguns amigos.


Será que estou preparando a festa dos meus noventa anos?


Gabriel Novis Neves

17-05-2023




quarta-feira, 24 de maio de 2023

COBRANÇA IMPLACÁVEL


Fui obrigado a fazer um serviço não programado e urgente no meu apartamento.


Canos da piscina da cobertura, pelos anos de uso, se romperam e a água caiu no meu banheiro, danificando o teto de gesso e obrigando o pedreiro a fechar as torneiras da piscina.


Terminado o serviço com a retirada da piscina, houve aumento da área do jardim.


Foram cinco dias integrais de serviço e seu custo bastante salgado para o meu gosto, dividido em duas parcelas.


Metade no início dos trabalhos e a outra parte após trinta dias.


O dia combinado para o pagamento da segunda parcela da obra venceu em um sábado, e eu esperava a visita do cobrador na segunda-feira.


Estava tranquilamente trabalhando no meu escritório quando o interfone tocou e a minha cozinheira atendeu.


Era a cobrança do pedreiro.


Paguei como sempre faço com as minhas dívidas e retornei ao trabalho.


Fiquei lembrando dos meus serviços prestados sábados, domingos, de madrugada e da dificuldade que tinha para receber meus honorários, quando recebia.


Herdei do meu pai esse hábito de não cobrar ninguém e ser pontual para pagar as dívidas.


Durante cinquenta anos no bar, diante da sua “Caixa Registradora”, meu pai vendeu fiado.


Anotava a compra, o valor e o nome do freguês em um pequeno pedaço de papel de embrulho que pegava na hora.


Ele ficava sentado em um banco alto de madeira com quatro longos pés.


Na mesa, à sua frente, ficava a Caixa Registradora.


Enfiava em uma pequena haste metálica com suporte de uma pequena rodela de madeira para não perder.


Quando ia para casa almoçar ou jantar, ele as arrancava da haste e as guardava no seu escritório, que ficava nos fundos do bar.


O lugar ficava atrás das prateleiras, escondido e protegido pelos armários, e era proibida a entrada de pessoas.


Meu pai trabalhava naquela “espelunca “calorenta sequer com um pequeno ventilador, e sempre com a porta fechada com chave.


Trajava sapatos pretos com cadarços, meias pretas, calça cinza comprida de casimira inglesa, camisa de manga comprida e gravata.


Seus sapatos eram engraxados diariamente e seu escritório estava sempre com a porta fechada com chave, que ele carregava na cintura, hábito na época.


No outro dia, antes de abrir o bar, passava tudo isso em livros chamados de “guarda-livros”.


Meu pai foi cobrador antes de inaugurar o bar em 1920, porém no bar nunca teve cobradores.


Ele não cobrava seus devedores e estes, quando podiam, pagavam tudo de uma vez ou em parcelas ditadas por eles.


Meu pai nunca jogou fora documentos e anotações de dívidas.


Também não permitia que limpassem o seu escritório, que era um quarto cheio de livros comerciais e montões de papéis. 


Teias de aranha por todo o escritório, uma cadeira de palhinha sem braços e um canto, de uma enorme mesa redonda, com coisas para ele escrever.


Uma burra com dinheiro e documentos.


Meu pai nunca teve contas em banco e as faturas que chegavam ele pagava em dinheiro no Banco do Brasil


Quando fui estudar no Rio de Janeiro em 1953, o bar do Bugre completaria 33 anos em 29 de junho, eu abri uma conta no Banco do Brasil onde ele depositava a minha mesada.


Quando meu pai encerrou as suas atividades comerciais em 1970, fui ao seu escritório e encontrei uma infinidade de contas para receber e a “burra” vazia.


Meu pai não faltou a um dia de trabalho, pois nunca adoeceu.


Talvez se ele tivesse cobrado aos sábados os seus devedores, não tivesse morrido apenas com a aposentadoria do INSS de dois salários mínimos, que deixou para a minha mãe como pensão.


Gabriel Novis Neves

20-05-2023




terça-feira, 23 de maio de 2023

CUIABÁ DE OUTROS TEMPOS


Como as pessoas mais velhas, principalmente aquelas com mais de sessenta anos, gostam de ler como era a Cuiabá de antigamente!


Gostam de saber como eram as antigas festas natalinas, as festas de São Benedito, as festas juninas de Santo Antônio, São João, São Pedro e Paulo.


E o carnaval de antanho, a Semana Santa e as festas cívicas.


A participação da população nessas ocasiões era integral.


Os moradores de bairros mais distantes, como os da Várzea da Ana Poupino ou Coxipó da Ponte e do Ouro, pouco participavam.


Quando vinham à cidade era para participarem de algumas procissões da Catedral e ouvirem os sermões de Dom Aquino Correa.


Uma moradora da antiga Várzea da Ana Poupino, nascida e criada lá, hoje moradora de Cuiabá, com seus oitenta anos, lê diariamente as minhas crônicas.


Escrevo muito sobre a Cuiabá da primeira metade do século XX e ela comenta comigo que não conhecia nada de Cuiabá daquela época.


Sempre me pede para escrever mais, especialmente sobre o nosso Centro Histórico.


Das ruas de Baixo, do Meio e de Cima com seus casarões e histórias impregnadas de bom humor do cuiabano da época dos apelidos.


Como é bom saber que a rua 13 de junho era chamada de rua “Bela do Juiz”!


Cuiabá de antanho não era sede de Comarca, e uma vez por mês recebia juízes de outros Estados para julgamentos de pessoas ditas “malfeitoras”.


Durante muito tempo a entrada e saída de Cuiabá eram feitas pelo cais do Porto do rio Cuiabá.


Diz a lenda que um juiz ficou apaixonado por uma bela moça que morava na rua que chegava ao Centro de Cuiabá.


Seus moradores, observadores, começaram a chamar a rua de “ Bela do Juiz”, depois trocada por 13 de junho, data da retomada de Corumbá dos paraguaios.


Fatos do cotidiano davam nomes às ruas do centro de Cuiabá.


“Travessa da Alegria” foi trocada pela rua Voluntários da Pátria.


“Linda” era a rua do Campo, atual Barão de Melgaço.


“Formosa”, a Joaquim Murtinho e “Bela” a 13 de junho.


“Largo Cruz das Almas”, para onde os condenados à forca eram levados para o “sacrifício”, foi depois denominado de Praça Marques de Aracati, em homenagem ao governador da Capitania de Mato Grosso que elevou Cuiabá de Vila à Cidade em 1818, e hoje é a atual Praça Ipiranga.


A rua Antônio João era uma ruela sem nome, com muitos chiqueiros, por isso apelidada de rua dos “Porcos”.


Hoje homenageia um dos heróis da Guerra do Paraguai, segundo o historiador Aníbal Alencastro estudioso da Cuiabá de outros tempos.


Com exceção da rua da “Bela”, da travessa da “Alegria” e do “Largo das Almas”, que já conheci com os nomes atuais, as outras citadas são da minha geração, e até hoje o trato pelos apelidos tão poéticos e históricos!


Como é bonito morar em uma cidade cujas ruas são chamadas de Baixo, do Meio, de Cima, do Campo, Linda, Formosa, Alegria e Bela do Juiz!


Becos, travessas, morros, prainhas, tanques, lava-pés, e o máximo para mim, a “rua sem saída. ”


Sei que das pessoas antigas poucos se lembrarão desses logradouros escolhidos como exemplos para esta crônica, e matarão a saudade.


Outros, com certeza, irão sentir inveja desta Cuiabá que não volta mais.


Percorrerão os nossos logradouros públicos e não se identificarão com parte dos nomes escolhidos para serem homenageados, sem trabalhos prestados à cidade e sem poesia.


Gabriel Novis Neves

12-05-2023












segunda-feira, 22 de maio de 2023

ESQUECIMENTO RÁPIDO


O grande historiador cuiabano Estevão de Mendonça cunhou uma frase que não envelhece nunca:


“Quem morre em Cuiabá morre duas vezes; uma da “morte morrida” e outra da morte do esquecimento. “


Há um mês faleceu entre nós o pioneiro da ortopedia e traumatologia em Cuiabá e Estado de Mato Grosso.


Foi também o primeiro professor de ortopedia da nossa faculdade de medicina da UFMT e construiu o primeiro hospital ortopédico e de traumatologia privado da cidade.


Foi Secretário Estadual de Saúde no governo de José Fragelli e membro fundador da Academia de Medicina de Mato Grosso.


Foi lembrado apenas pela Câmara Municipal de Cuiabá, com uma “Moção de Pesar” apresentada pelo vereador Lilo Pinheiro.


A universidade e o governo do Estado, pela Secretaria de Saúde, já esqueceram do seu professor e secretário.


Ele jamais será esquecido por seus familiares, amigos, colegas e população pelo muito que fez por nossa cidade.


Ando por Cuiabá e encontro tantos nomes de pessoas que nunca fizeram nada pela nossa cidade, tampouco moraram aqui, dando nomes a obras importantes como viadutos, praças, ruas, avenidas e outros logradouros públicos.


Também os nativos foram substituídos no poder, não participando de nada nesta cidade ou Estado, sendo úteis apenas para bater palmas nas solenidades oficiais quando convidados.


Até a nossa pronúncia está sendo substituída pelo chiado dos cariocas ou italianonês de São Paulo, não contando com o “tchê” dos sulistas.


Os cuiabanos de “pés rachados” estão há muito sendo substituídos pelos chegantes à “terra agarrativa e linda. “


Dante de Oliveira foi lembrado na substituição de uma avenida que já existia, e a troca não pegou, sendo chamada de avenida dos Trabalhadores.


O próprio Estevão de Mendonça, para não ser esquecido, substituiu a antiga rua do Caixão, e a mudança pegou, é a rua onde moro.


Não sou cobrador de honrarias indevidas, apenas respeito ao passado de quem muito fez quando esteve conosco.


Ao justo o que lhe é justo, e não devemos homenagear àqueles que não justificam ou representam nada para nossa terra.


Gabriel Novis Neves

22-05-2023




domingo, 21 de maio de 2023

PITORESCO É DA IDADE


Esta fase da minha vida está cheia de “pitorescos”, que me fazem recordar de fatos de “bem antigamente”, “daquele tempo”, comparados aos de hoje. 


Meus poucos colegas de infância e faculdade que ainda sobrevivem são uma minoria. 


Quando nos telefonamos, coisa muito rara, logo a conversa chega aos pitorescos do - você se lembra?


Segue com a ladainha do “bem antigamente”, “naquele tempo”, lembra-se do fulano e beltrano?


Hoje tudo está tão diferente e não conhecemos mais ninguém.


Nada mais pitoresco que alertar ao nosso contemporâneo que a única diferença de “antigamente” para “hoje”, é que nós ainda estamos por aqui.


Só entendem o nosso antigamente os da nossa idade e os poucos mais velhos.


Meu avô achava o seu hoje tão diferente daquele de antigamente dele, assim como o meu pai e eu agora.


O bem antigamente sempre foi moderno e nós é que envelhecemos, saindo da moda.


Escrevo crônicas diárias e sobre os assuntos dos mais variados, mas que nos levam sempre aos pitorescos.


É inevitável a comparação quando caminhamos, pois a idade avança e adquirimos saudade daquilo que passou e não volta mais, não importando que sejam boas ou más recordações.


Antigamente aos domingos almoçava na casa do meu avô.


Depois de casado na casa dos meus pais.


Meus filhos e netos por muito tempo almoçavam aos domingos comigo e a Regina na nossa casa.


Hoje, com filhos, netos e bisnetos, almoço com a minha funcionária de plantão.


O almoço de domingo continua, e o jeito de ser é moldurado pelas gerações que nos sucedem.


Bem antigamente nas aulas de catecismo aprendi com a minha catequista professora Oló, que no tempo de Jesus Cristo, “Ele” nos ensinou a “Lei dos 10 Mandamentos”.


Hoje no catecismo, a Bíblia Sagrada nos ensina a religião católica.


Inicia seus ensinamentos sempre com o antigamente, quando Jesus Cristo falava aos seus discípulos, profetas e seguidores, naquele tempo cada vez mais distante.


Hoje todos os ensinamentos religiosos que aprendemos aconteceram naquele tempo que Jesus Cristo estava na terra, a mais de dois mil anos atrás.


O núcleo dos nossos “Os Pitorescos” é relatar o antigamente dos fatos e comparar com os de hoje.


A não ser nos dogmas de fé, cujos valores são imutáveis, os de hoje são transitórios.


Mesmo na antiga política partidária os métodos de uma disputa eleitoral eram outros, mas os resultados de antigamente são iguais aos de hoje.


Como existem expressões antigas, e que hoje significam a mesma coisa!


As coisas boas de bem antigamente, desde que Adão e Eva foram expulsos do Paraíso, continuam sendo boas no mundo de hoje, das doenças e das guerras sem fim.


Mudaram-se os costumes de se conseguir as coisas boas, sempre desejadas.


Bem antigamente os apreciadores das coisas belas e boas da vida, hoje curtem este momento que sempre é transitório.


Ninguém é capaz de ser feliz o dia todo, a semana toda, o mês todo, o tempo todo ou a vida toda.


Hoje sabemos que vivemos de instantes felizes e precisamos curti-los, pois eles passam e não sabemos quando voltarão ou se voltarão.


Bem antigamente vivíamos no Paraíso, com a flora e fauna, o sol e a lua, quando nada nos faltava.


Expulsos criamos a “lua de mel” que tem dia e prazo para iniciar e terminar.


O “antigamente e o hoje” embora distantes, parecem cada vez mais próximos, porém, com menos qualidade.


É só praticar a longevidade de viver para constatar essa realidade, traduzida sempre em saudade, sendo a palavra mais utilizada pelos poetas e amantes.


Naquele tempo, ou bem antigamente, sofríamos de sentir saudades, o sentimento mais humano.


E a gente só sente saudade daquilo que foi bom um dia, passou e não volta mais.


Hoje tenho um presente lindo, repleto de amores, que são a minha família, mas saudade é do meu passado remoto, tão distante de mim.


Sempre em nossa vida encontramos “os pitorescos”, que também nos deixam saudades.


Gabriel Novis Neves

27-03-2023