sexta-feira, 27 de setembro de 2013

CHUVA FINA

A despedida do inverno parecia inverno. Chuva fina, ventos fortes, temperatura amena. Cerração nas cidades montanhosas e suas vizinhas. Até as praias apresentavam baixa visibilidade.
Os meteorologistas, que com tecnologia atual não falham, assim anunciaram a chegada da primavera, estação de preparo para o verão, sinônimo de férias e festas sem fim.
Pessoas apressadas procuravam abrigo seguro para retornarem às suas casas.
Os mais afortunados, numa cidade grande, conseguem táxi, extremamente raros nos dias chuvosos. Por que será?
O melhor mesmo é ficar em casa nesses dias em que a natureza nos faz mais aconchegante.
Ociosidade, nem pensar!
O tempo é que é muito curto para se desfrutar de tudo que um verdadeiro lar tem a nos oferecer.
A arte do diálogo, por si só, já preenche de alegria todas as nossas necessidades intelectuais. Como se não bastasse, os programas televisivos ficam altamente atraentes em dias de decisões políticas para o país, quando a mídia se esmera em debates brilhantes. O mesmo acontece à noite para os amantes do futebol, desde que estes não sejam torcedores do Bota.
O tempo é curto. O sono chega. A noite finda para surgir  um novo dia.
Jornais na mesa do café da manhã. A frustração de um país descrente  pela decepção da derrota.
Manchetes fúteis encobrem a tristeza generalizada que domina a nação das impunidades dos poderosos.
Lá se foi o meu tempo nesta bela cidade pré-primavera.
Retorno para a região das duas únicas estações do ano: calor com chuva e calor sem chuva.
Assim é a natureza com seus caprichos e o ser humano com as suas múltiplas facetas.

Gabriel Novis Neves
19-09-2013

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Críticas

Muito fácil fazê-las, difícil é realizar alguma coisa que as mereçam. Extremamente saudável quando no âmbito da troca de ideias e profundo respeito por opiniões contrárias às nossas.
A verdade não tem dono. Pertence a cada um nos seus diferentes momentos de vida.
A justa discussão através da inteligência costuma levar a patamares cada vez melhores, chegando-se, normalmente, ao chamado consenso.
Isso seria uma das propostas para chegarmos aos sistemas democráticos, que tanto nos agradam. Seres livres, com opiniões várias e respeitadas.
Infelizmente, existem pessoas com mentes menos brilhantes e mais emperradas, e que partem sempre para o ataque pessoal, talvez por lhes faltarem inteligência  para um debate de ideias mais elaborado.
Além disso, respeito é a mais nobre condição para uma convivência civilizada e racional. No entanto, ao que parece, não é tão comum quanto gostaríamos.
A grande maioria das pessoas funciona na zona de conforto da omissão, no tocante aos temas de interesse social, quer por alienação, quer por falta de uso de sua capacidade pensante.
A crítica saudável é sempre muito bem aceita e nos leva a reflexões adicionais.
Entretanto, a crítica agressiva e de caráter pessoal traz à tona apenas - além da má educação - a falta do pensamento dinâmico, fundamental à formação de um indivíduo razoavelmente equilibrado.
Enfim, nossos ancestrais demoraram séculos para passarem de quadrúpedes a bípedes. Esta transformação custou muito caro aos nossos sistemas ósteo articular e córtico cerebral.
Situação lastimável, mas que é constatada com frequência em todos os aglomerados humanos nos dias atuais.

Gabriel Novis Neves
20-09-2013

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

DESPREZO?

Não muito tempo atrás, o desfile cívico-militar de 7 de setembro era esperado com grande expectativa pelo povo cuiabano. As casas eram enfeitadas com as cores da nossa bandeira, assim como as ruas e logradouros públicos.
Os estudantes do primário, ginásio e médio (não existia ensino superior em Cuiabá), eram mobilizados para o preparo de uma bela disputa no desfile da Independência para conquistar o troféu de melhor escola no evento.
Os treinamentos eram intensos e ocupava os primeiros meses do segundo semestre do ano letivo.
Carregar a bandeira da agremiação  escolar era o prêmio maior para um guri daquela época, onde até luvas usava. Tinha de ter boa altura e excelente aproveitamento escolar. Também era uma honra pertencer à fanfarra.
O uniforme era o de gala, muito bem cuidado, com sapatos engraxados.
O local do desfile variou muito nestes últimos anos. Lembro-me que o primeiro que participei foi na Rua 13 de Junho.
Depois da Praça da República descendo pele Rua Joaquim Murtinho e terminando no colégio dos padres.
Avenida da Prainha foi o local escolhido no final da década de sessenta. Por alguns anos, o desfile acontecia na Avenida Presidente Vargas.
Mudou-se para a Avenida Mato Grosso e, ultimamente, está morrendo na Avenida do CPA.
Em todos esses locais chamava atenção a presença popular. Famílias inteiras se deslocavam dos seus bairros distantes para assistir ao esperado desfile de 7 de setembro.
O palanque das autoridades ficava apinhado de gente, havendo necessidade da presença do Chefe do Cerimonial do Governo, para não deixar ninguém do poder ficar de fora. Era uma ofensa imperdoável!
As residências próximas e os prédios públicos ficavam abarrotados de gente, especialmente crianças.
Os pais iam torcer pelo sucesso da escola dos seus filhos e, claro, por eles.
Após a passagem das escolas, onde era evidente o ufanismo dos meninos e meninas, o batalhão da Polícia Militar e o 16º Batalhão de Caçadores encerravam a grandiosa festa.
Todos deixavam o local com orgulho de ser brasileiro, e pensando no desfile do próximo ano.
Não preciso dizer da presença obrigatória do governador do Estado e de todo o seu staff, assim como a do Prefeito de Cuiabá. Presentes os chefes dos outros poderes constituídos: Legislativo e Judiciário. Autoridades Eclesiásticas, civis e militares. Políticos eram presenças obrigatórias.
Queriam estar ao lado do povo. Naquela época o político era bem visto e admirado pela sociedade.
Isso permaneceu assim até o ano de 2003 quando, o então governador do Estado foi homenageado por um certeiro ovo, até hoje lembrado como o início da rejeição popular explícita.
A partir daí, por coincidência, os nossos políticos passaram a faltar ao desfile e, em seus lugares, mandavam pessoas inexpressivas, próprias para receberem as merecidas vaias.
Grande maioria do povo deixou de frequentar esse evento, e deu lugar aos manifestantes de protestos, presentes em grande número em todo o Brasil, inclusive aqui em Cuiabá.
Este ano, com o acúmulo de escândalos, houve desprezo, falta de civismo e, principalmente, falta de educação e respeito pelas nossas tradições por parte dos nossos passageiros políticos no trono do poder, e o desfile na cidade da Copa beirou ao deboche à nossa população.
O pior foi a desculpa esfarrapada dada por quem não poderia faltar à solenidade: “tinha um compromisso agendado anteriormente”.
Paciência tem limite! Há 191 anos está agendado que todo dia 7 de setembro o Brasil comemora o Dia da Independência.
Melhor fez o presidente do Senado Federal e da Câmara dos Deputados que não compareceram ao fortemente protegido palanque da Presidente da República em Brasília.
Eles temiam o povo. Aqui faltou sinceridade ao porta-voz do governo, que tem pavor do povo.
Prefere os currais eleitorais para as comemorações dos avanços do agronegócio, mineração e outros negócios.
Sugiro a extinção do Dia da Independência e a criação do Dia da Vergonha! 

Gabriel Novis Neves
10-09-2013

terça-feira, 24 de setembro de 2013

Companhia

Nas inúmeras viagens que fiz na minha vida sempre encontrei uma companhia para amenizar as preocupações de certos deslocamentos. Poderia ser uma pessoa conhecida ou, quem sabe, a descoberta de um novo amigo.
Certa ocasião, um casal amigo aguardava o passar do tempo para a chamada de embarque e conversava animadamente comigo, demonstrando uma falsa tranquilidade.
A simples chamada para o voo fez com que um dos cônjuges se deslocasse apressadamente para à toilette.
Num tempo inesperado de demora, a angústia do grito dos microfones por embarque imediato me deixava inquieto, contrastando com a pseudocalma do outro cônjuge.
Saí às pressas rumo às escadas do avião, onde quase todos os passageiros já se encontravam a postos, com exceção, do casal companheiro, causa da minha grande preocupação.
A porta do avião já se encontrava em ritmo de fechamento quando, afoitamente, chega a dupla por mim esperada.
Foram demoradamente aplaudidos pelos demais passageiros, que nem imaginavam o motivo do atraso.
Assim que o avião decolou dormi profundamente, e até sonhei que havia perdido o voo.
Como num pesadelo de terror, acordei feliz da vida com a aeromoça me perguntando se estava tudo a contento. 
- Minha filha – respondi – eu quero apenas recuperar a tranquilidade perdida e pousar o mais breve possível no meu destino.
Os melhores companheiros de viagens são aqueles que respeitam o horário de embarque previsto, e o tempo que se afigura como prazeroso é o infinito.

Gabriel Novis Neves
14-09-2013

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

AEROMOÇA

Certa ocasião, durante uma viagem, pedi à aeromoça um pedaço de papel. Gostaria de escrever sobre um fato que acabara de presenciar a dez mil metros de altura.
Ela me respondeu se guardanapo servia. Respondi que sim, e recebi um pacote deles.
Papel fininho. Escrevi com todo o cuidado para aproveitar aquela oportunidade, antes que o natural esquecimento esvaziasse o consciente e enviasse aquelas informações para o arquivo do inconsciente.
Afoitamente iniciei a escrever, com todo o cuidado que a situação exigia.
No seu retorno com o carrinho de coisas - verdadeiro mercado ambulante dos longos corredores dos modernos aviões, ela me perguntou se precisava de mais "munição".
Expliquei-lhe que tinha observado tanta coisa curiosa e que aceitaria o reforço oferecido.
Ela sorriu, abrindo a possibilidade que eu pretendia: conhecer alguns fatos repetitivos nos voos e que incomodavam a tripulação de bordo que atende ao público durante as viagens.
Pedi então que ela me contasse um fato que a incomodava.
Ela falou que “tem muita gente que pensa que piso do corredor de avião é esterilizado. Impressionante como deixam os seus bebês engatinhar no carpete contaminado que forra a longa avenida dos modernos intercontinentais”.
Tenho vontade de informar às famílias que assim procedem que, o mais pesado que o ar percorre, em questão de horas, o planeta Terra, trazendo com ele bactérias e vírus até então desconhecidos para nós.
O mais grave é que esses organismos, só vistos ao microscópio de grande resolutividade, sofrem inúmeras mutações produzindo, inclusive, doenças desconhecidas à ciência.
O povo chama essas patologias desconhecidas como a "doença do avião".
As criancinhas, alegres com a novidade da brincadeira, ficam com as mãozinhas, corpo e vestuário imundos da sujeira perigosa. 
E, mesmo assim, os pais lhes oferecem guloseimas que são agarradas com as mãos perigosas dos seus rebentos.
Como faz falta a educação voltada para a vida!
Muitas vezes essas viagens são programadas para países desenvolvidos para, desde cedo, mostrarem às crianças outras culturas.
Entretanto, os pais se esquecem dos fundamentos da educação, que é aprendida em casa, e que começa com as noções básicas de higiene, dentre elas: lavar as mãos antes de qualquer refeição.
O grande filósofo Eduardo Portela - aquele intelectual que foi convidado a fazer a abertura da educação do regime de exceção para a democracia e que marcou a sua presença ao dizer que estava ministro - muito bem definiu o tipo de educação tão em moda atualmente - a “Educação ornamental e ociosa".
Precisamos de muita educação voltada para a vida das pessoas. Só esta produz a ascensão social.
Pais! Cuidem dos seus filhos. Não os preparem para terem na sala de visitas um diploma de decoração.

Gabriel Novis Neves
15-09-2013

Baianinho

Com o surgimento do “Novo Mato Grosso”, slogan do governo de transformação de Pedro Pedrossian, “os filhos de ninguém”, finalmente tiveram vez e voz neste Estado.
Com certeza um dos mais brilhantes dessa geração foi o economista Edson de Souza Miranda.
Polêmico, o inquieto aluno de Mário Henrique Simonsen, era portador de uma pressa incomum.
“Tudo é possível de ser realizado” – era a sua ideologia.
Como outros da sua geração, alicerçaram o jovem governador a decisões importantes que viabilizaram a transformação de ideais em obras físicas no velho Estado Curral.
Tornaram-se camaradas o baianinho de Poxoréo e o armênio de Miranda.
Pedro brincava que na sua administração existiam auxiliares com profissões definidas (médicos, engenheiros e advogados) e os outros chamados de “professores”.
O professor Edson Miranda não foi apenas um pioneiro de uma nova ciência, mas acima de tudo, um grande provocador social.
O seu maior legado não foi a modernização que implantou no sistema fazendário do Estado, e sim, a sua visão burocrática de como assessorar o reitor da então recém-criada UFMT a não entregar o ouro ao “inimigo”.
Por meses o acompanhou ao maior teatro de ilusionismo com números matemáticos para evitar a inviabilidade da nossa UFMT.
Usou de toda a sua habilidade técnica para evitar que se consumasse a morte prematura de uma das melhores universidades públicas brasileiras da atualidade, com excelente escola de medicina como referência.
O reitor combinava fazer o papel de um alienado e ele de um economista ininteligível.
O baianinho foi de extrema lealdade com os objetivos iniciais da UFMT.
Jamais, em vida, teve o seu valor reconhecido pela Instituição.
Era um andarilho com faro ligado para os cérebros aproveitáveis na nossa missão de transformar o Estado, pela educação. Deu oportunidades a muitos jovens. Aposentou-se e iniciou uma nova frente de trabalho, voltada sempre para o social.
A Rádio Comunitária do Araés, o trabalho com as crianças ensinando-lhes a informática, o carnaval do Largo da Mandioca e, a sua permanente atividade cultural, o tornaram muito querido, especialmente, nas camadas mais necessitadas da nossa população.
A sua existência terminou em um esqueleto abandonado, hoje, moderno hospital centro de referência em ensino médico.
Nosso baianinho de Poxoréo aproveitou todos os segundos que a vida lhe concedeu, sempre com um sorriso de ironia.
Até, amigo!

Gabriel Novis Neves
16-09-2013 

SABEDORIA DOS VELHOS

Meu avô saiu de Cuiabá para estudar medicina na Bahia na segunda metade do século XIX.
Partiu do Porto do rio Cuiabá em um pequeno vapor e, após uma semana, chegou à cidade de Corumbá.
Lá embarcou num pequeno navio nas generosas águas do rio Paraguai e foi até o Rio da Prata.
Trocou de embarcação e subiu - já em águas do Atlântico - rumo a Salvador.
Ele vivenciou um emaranhado de surpresas e novidades nesses dois meses de viagem.
Angústia? Muita. Necessidade de sucesso premente. Fracasso inaceitável.
Deixei Cuiabá em 1953 para estudar medicina no Rio de Janeiro. Peguei um  velho avião DC-3, herança da Segunda  Guerra Mundial.
Repetiu-se em mim, como num filme, a mesma angústia  que mobilizou meu avô na sua decisão rumo ao novo.
Na  minha despedida de Cuiabá ele me deu uma verdadeira aula de distâncias. Disse-me que eu viajaria para uma nova e importante etapa de vida, na qual só seria aceitável  vencer ou vencer.
Tomaria café em Cuiabá e jantaria no Rio de Janeiro, com várias pousadas e decolagens.
Lembrou-me que viagens aéreas só contavam com dois riscos, decolagem e aterrissagem.
Agora, estou a dez minutos do aeroporto do Galeão.
Não sei por que me vieram essas lembranças tão antigas, talvez Freud explique.
Olho pela janelinha e observo a natureza que tanto nos esforçamos para destruir e ela, teimosamente, resiste às nossas vis intenções.
A beleza estonteante vista de cima contrasta com a pobreza e a violência que se afigura das moradias de muitos de seus habitantes.
Nenhum gênio da pintura seria capaz de reproduzir as inúmeras e variadas telas  de tamanha grandiosidade dos acidentes geográficos dessa monumental metrópole cercada de matas, montanhas e mar.
As nuvens brancas  no azul celeste mais parecem bailarinas festejando a nossa chegada.
Dia agressivamente ensolarado prenunciava uma estada cheia de calor e surpresa.
O piloto automático, qual maestro de uma grande  orquestra dirige o jogar do mais pesado que o ar em direção ao seu “grand finale”.
Tempo do espetáculo: duas horas e vinte minutos com uma única decolagem!
Chegamos. É a tecnologia!

Gabriel Novis Neves
14 -09-2013

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Tempo vencido

Dia desses recebi a visita do zelador do meu prédio. Vinha cumprir uma missão. O morador do apartamento debaixo do meu queixou-se que a água do meu banheiro estava pingando no teto do dele.
Homem de bem esse zelador! Evangélico, responsável, esforçado, de total confiança. Tanto é assim que está conosco há vinte anos, ou seja, desde a construção do prédio. Entende de tudo um pouco e sabe realizar pequenos reparos domésticos com muita eficiência.
Às vezes o consulto sobre problemas de saúde.
Com a sua maleta de ferramentas em punho, levo o zelador até o meu banheiro, falo para ele ficar à vontade e vou para a minha sala de parto (lugar onde nascem os meus artigos).
Instantes depois ele me chama e diz que o problema está resolvido: era apenas uma pequena troca de válvula.
Gentilmente me pergunta se tinha mais algum probleminha para resolver.
Pra que! Desfio logo um rosário de probleminhas que precisavam de atenção. Apesar de pequenos, traziam um grande incômodo - principalmente para mim que sou uma nulidade em reparos domésticos. Com os avanços tecnológicos então... aí é que para tudo de funcionar em casa.
Relatei as queixas ao eficiente trabalhador e retornei à “sala de parto” para concluir um trabalho.
Nem meia hora se passou e o competente Nelson, com um sorriso nos lábios, me procura e diz que já está tudo resolvido.
 - Você já arrumou o fogão, a máquina de lavar roupa e os aparelhos de televisão? Não acredito! - exclamei incrédulo.
 - Sim doutor, tudo resolvido – e continuou: - Os aparelhos de TV não tinham nenhum problema. O problema estava nos controles remotos, foi só regular e pronto. No final da semana a criançada vem para cá e isto acontece mesmo.
Concordei com ele e perguntei sobre os outros aparelhos. Ele respondeu:
- No fogão apenas apertei um parafuso frouxo, por onde vazava o gás. A máquina de lavar roupa estava programada para enxugar, e não, para lavar.
- Que maravilha! Tão simples, né? De qualquer forma é preciso saber onde mexer – falei admirado.
 Logo a seguir acrescentei:
- Como sou ignorante e ultrapassado em aparelhos domésticos!
 Educadamente o moço me responde:
 - Em tecnologia doméstica o seu tempo está vencido, “seo” doutor.
Ele tinha toda razão.

Gabriel Novis Neves
26-08-2013

quinta-feira, 19 de setembro de 2013

INGENUIDADE

Somos realmente muito ingênuos quando nos surpreendemos com espionagem explícita nos nossos quadros governamentais. 
Através da mídia, tomamos conhecimento que os presidentes do Brasil e seus assessores, bem como o presidente do México, vêm sofrendo espionagens sucessivas nos seus emails e nas suas ligações telefônicas. 
Afinal, elas sempre existiram, e foram até alvo de glamour de vários filmes de época. Depois da era da Internet essas técnicas se sofisticaram, e o elemento humano passou a não ter tanta relevância, apesar de ainda ser importante. 
Sabemos, inclusive, que todas as embaixadas pelo mundo afora, mantêm funcionários com essa finalidade.
Também não é segredo que as grandes potências mundiais, que mantêm negócios milionários nos vários recantos da terra, praticam espionagem constante uns com os outros.  A quem reclamar? À ONU, à OMC, que também usam as mesmas práticas nos seus organismos?
Declarar isso como “séria violação à nossa soberania”, como fizeram as nossas autoridades competentes, é no mínimo, muita ingenuidade. 
O que temos de fazer é melhorar os nossos serviços de contraespionagem e de inteligência  que, ao que parece, não andam muito eficazes. 
Cortar as conexões de Internet nos casos mais sigilosos também poderia ser uma medida eficiente a ser adotada entre os  detentores  dos  segredos  de estado. 
Precisamos amadurecer rapidamente diante desse novo mundo que eliminou a privacidade e aprender a lidar com isso, e não nos portarmos como figuras histéricas, cobrando bravatas desnecessárias e ridículas. 
Todas as grandes potências usam e abusam desses métodos no dia-a-dia, e essa é a realidade que se nos apresenta. 
Nos dias atuais, não apenas a segurança, mas principalmente as relações comerciais são sempre o alvo dessas espionagens. 
Como todo mundo espiona todo mundo, o importante mesmo é que se aumente o serviço de contraespionagem. 
Claro, se um país começa a comprar aviões de caça e material bélico de outro, suspeitas começam a ocorrer quanto ao seu poder de ataque.
Isso ocorre no mundo inteiro. 
Não podemos nos dar ao luxo de sair cortando relações comerciais com este ou aquele país por motivos tão óbvios.
Sejamos sim, mais atentos e menos ingênuos.
A nova ordem mundial é de disputas, e não, de falsos pruridos morais.

Gabriel Novis Neves
02-09-2013

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

Voto decisivo

Há muito não vemos momentos tão delicados no setor judicial de nosso país em que um ministro da mais alta corte fica, através do seu voto, com a responsabilidade de um julgamento de tamanha importância.
Sim, porque anulada a credibilidade já tão arranhada da justiça em virtude dos últimos desmandos, pouca coisa mais resta a não serem frustrações e desesperanças generalizadas.
Quando a justiça perde a credibilidade, todos os outros poderes desabam sucessivamente.
Estamos no limiar dessa insatisfação já que a mais alta corte do país não consegue cumprir o seu papel prioritário, refazendo a todo o momento os seus parâmetros de julgamento.
Triste e preocupante a situação de um povo que oprimido pelo Estado, já não tem mais em quem depositar as suas esperanças.
Apesar de estarem em julgamento algumas figuras de relevância no combate recente aos vinte anos de ditadura que assolaram o país e tantas outras também já condenadas, é importante entender que são pessoas, todas, incriminadas em lesão do erário público.
Ousaria mesmo dizer que do voto do Ministro Celso de Melo, dependerá o rumo político de toda uma era.
 A sociedade civil não mais aguenta o desprezo com o qual vem sendo tratada.
Se ela se afastou das ruas, isso não significa que ela esteja omissa, e sim temerosa com os rumos violentos para onde têm caminhado as últimas manifestações.
Nem sabemos a origem real de uns poucos black blocs que insistem em destruir patrimônio e desencadear ações repressivas violentas de uma policia truculenta, despreparada para manifestações democráticas.
A grande massa popular se mostrou ordeira e principalmente cônscia das suas justas reivindicações, apenas tendo ao que parece se afastado temporariamente das ruas não só para se mostrar contrária a movimentos anárquicos, mas também para não ser asfixiada pelas ondas de gás lacrimogênio fartamente distribuídas. Talvez até fosse essa a intenção do poder, que historicamente usa de todas as artimanhas para calar a voz do povo.
O nosso Congresso, abrigando um presidiário, deveria estar cercado por grades e não por parlamentares em sua grande maioria, descompromissados com o bem público, vinculados essencialmente com corrupção e corporativismo.
Que as nossas autoridades se acautelem, pois a carneirada não é a mesma do passado.
Não é prudente minimizar a insatisfação popular, que é nítida para quem tem um olhar atento.
Os limites populares são sempre imprevisíveis e, a história está ai para confirmar isso.
No atual mundo digital, tudo pode acontecer do inesperado.
Protestos populares de resultados imprevisíveis através das redes sociais são planejados em horas.
Desse julgamento a ser realizado hoje pelo Supremo Tribunal Federal, presidido pelo ilustre Ministro Joaquim Barbosa, com o voto do eminente decano Celso de Melo teremos ou não a chave da tão almejada justiça social.
Aguardemos, portanto, que alguém de bom senso consiga manter digno esse pilar fundamental, que é o poder judiciário de uma nação.

Gabriel Novis Neves
14-09-2013

terça-feira, 17 de setembro de 2013

SABER A HORA

O poeta tinha razão quando disse que “quem sabe faz a hora, não espera acontecer”.
Há um ano, pensei em fazer “minha hora” como médico de consultório.
Excelente de saúde física e mental quis o destino que as articulações dos meus joelhos me avisassem que tinha chegado ao final a carreira profissional de médico das urgências e emergências, que é o mundo da obstetrícia.
Já enfrentei várias situações em que não me sentia preparado - desde o meu nascimento em casa, em morte aparente e com baixo peso.
Os primeiros estudos em Cuiabá. O sonho de ser médico, formado pela melhor escola de medicina do Brasil, a nossa querida Faculdade da Praia Vermelha, no Rio de Janeiro.
Casamento, filhos, luta pela sobrevivência, a viuvez não esperada.
O recomeço e o tempo passando. Tudo mudou. Éramos nove irmãos. Somos oito. Minha família, agora, sou eu. Meus filhos constituíram novas famílias, assim como meus irmãos, sobrinhos e primos.
Passei a publicar os meus sonhos na imprensa. E o tempo passando deixando saudades daqueles que partiram.
Temo ficar sem contemporâneos para conversar. Novas amizades neste período são mais difíceis de serem feitas. Desconfio ser o idoso mais seletivo e exigente nas suas escolhas.
Quando isso acontece, é importante guardar o prêmio recebido no cofre forte das emoções.
Sempre temia o momento do afastamento do atendimento aos meus clientes.
Precisei de energia - que nem sei onde a encontrei - para evitar essa separação do velho aparador de crianças que, por mais de meio século, cortou muitos cordões umbilicais.
Não fosse a minha psicoterapeuta, estaria amargurando o sabor de uma derrota evitável. Muito trabalho, disciplina e obstinação, restituíram-me ao meu ambiente: a sala de partos. Após um ano de ausência voltei a cortar o umbigo de uma menininha - a minha grande vitória.
É o feitiço virando contra o feiticeiro. O tempo, e só ele, seria capaz de me separar da razão de tudo que sei e aprendi, e que foi adquirido com esse contato diário com os meus pacientes.
Sinto que afastado deles perco metade de mim. É o inevitável ciclo vital, cuja fuga é impossível.
Quem sabe faz a hora. Esta felizmente ainda não chegou para mim.
Continuarei, espero que por longo tempo, nessa missão e em outras frentes de trabalho humanizado.
“Toda gente é capaz de sentir os sofrimentos de um amigo. Ver com agrado os seus êxitos exige uma natureza muito delicada.” Oscar Wilde.

Gabriel Novis Neves
27-08-2013

segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Ferrovia

Quem ouviu o programa “Bom Dia Governador”, uma novidade surgida recentemente com o chamado “governo da verticalização”, chegou à fácil conclusão que jamais teremos em Cuiabá o “trem do Vuolo”.
Este só chegou aqui no idealismo do Senador - que muito lutou por este sonho cuiabano - e no enredo da Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira.
Vuolo, Cartola, Carlos Cachaça, Nelson Cavaquinho, Dona Ivone Lara, Ivo Meireles e o nosso “imortal” escritor-historiador Fernando Tadeu, foram os únicos passageiros desse trem que nunca existiu.
Nos tempos modernos o “trem do Vuolo” é o petróleo extraído da camada do pré-sal existente nas profundidades da nossa costa atlântica.
Ninguém ainda retirou um barril do ouro negro para comercialização, e a distribuição dos lucros já foi dividida por Estados e municípios.
Tudo isso após discussão no Congresso Nacional e sancionado em lei pela presidente da República.
Igualzinho ao “trem do Vuolo”.
A lei do pré-sal determina que seus lucros só poderão ser investidos nas duas áreas mais prioritárias ao Brasil: educação e saúde.
O trem do Vuolo já foi inaugurado inúmeras vezes nesses últimos vinte anos, pelos presidentes da época.
No último programa “Bom Dia Governador”, o governo convidou todos os brasileiros para a inauguração do terminal ferroviário de Rondonópolis rumo ao porto de Santos, no próximo mês pela presidente.
Não se falou no prosseguimento até a capital da Copa.
Foi anunciado também que a ferrovia do norte do Estado caminha a todo vapor, com um traçado bem distante da ex-Cidade Verde. Seu destino será rasgar as fazendas de soja, milho, carne suína, bovina, algodão, óleo vegetal e minérios.
Deverá procurar o Estado de Tocantins e o porto do Maranhão.
Em estudos outra saída para a ferrovia do Nortão - pelo Estado do Pará.
Não se fala mais, mesmo em época pré-eleitoral, em ferrovia para Cuiabá como antigamente, em que promessas eram feitas e nunca cumpridas.
Mesmo considerando Cuiabá como o maior colégio eleitoral, esse projeto do trem está definitivamente enterrado.
Resta-nos o consolo de em breve (quando?) inaugurarmos os trilhos do VLT, que é um trem de passageiros na linha pioneira ligando o velho e obsoleto aeroporto de Várzea Grande ao CPA!
Confirma–se assim a velha história centenária que diz: quem não tem cão, caça com gato.
Trem para Cuiabá, nunca mais.
Somos uma cidade subdesenvolvida, na visão dos homens de negócios.

Gabriel Novis Neves
10-09-2013

ENCONTREI!

Procurei por muito tempo um boteco que me lembrasse dos pontos de encontro da minha já longínqua infância.
Queria achar um espaço onde as pessoas pudessem se desligar por alguns instantes ilusórios das misérias deste mundo egoísta e consumista, que tantos males causam à nossa gente.
No Morro do Tambor descobri um que me fez regredir emocionalmente aos tempos dos botecos da Rua do Meio.
Claro que modernizado, pois, afinal, ninguém é de ferro, muito menos em se tratando de boteco.
A música de excelente qualidade era eletrônica, bem diferente dos enormes discos de vinil emitindo mais ruídos que notas musicais.
Os enfeites de antigamente foram substituídos por fina decoração, exaltando a nossa flora, fauna e folclore.
Os frequentadores do boteco eram puro caldo de cultura de uma civilização pré-colombiana, portuguesa e africana, produzindo essa gente maravilhosa que vive aqui.
O local do pedacinho do céu na Terra fica em um bairro que homenageia o nosso maior e carismático poeta – Dom Aquino!
Pastelzinho de queijo, caldo de feijão (individual) - o fino da delicadeza - coscorão, bolinho de bacalhau, mandioca frita, quibe apimentado, coração de frango, revirado cuiabano com farofa exclusiva da casa e a consagrada Maria Isabel.
Pessoas alegres ao natural, dedicando dois dedos de prosa ao velho parteiro para confidências de vidas vividas, muitas vezes sofridas.
Sem mágoas o passado é recordado em verdadeira catarse sem cicatrizes.
Casamentos desfeitos são tratados como troféus. Os que não foram realizados, como caprichos do destino. Amores refeitos. Amores nascendo, pois o amor não morre, apenas muda de endereço.
Este boteco, tão simples, atende pelo nome do Bar do Jarbas, assim como gerações de cuiabanos chamavam o Bar do Bugre.
Marca da nossa cultura, em que o nome do proprietário do estabelecimento comercial era mais forte que o registrado na Junta Comercial. Puro charme! As pessoas eram respeitadas, amadas e admiradas.
Onde menos esperava, em uma adaptada garagem, estava tudo que precisava para oxigenar e renovar as minhas emoções.
Tudo com muito respeito, como exigem as leis das pessoas simples.
Como foi bom localizar este cantinho num antigo bairro desconhecido (felizmente) pela elite brega!
Inicia suas atividades, após o por do sol - repositório das surpresas do dia. Adoro e me orgulho do meu tempo!
Eu saí de um boteco (Bar do Bugre), mas o boteco não saiu de mim.

Gabriel Novis Neves
06-09-2013

As barreiras emocionais

A grande barreira a ser ultrapassada na vida de todos nós é sempre “O Outro”.
Ela é tão forte que poucas são as pessoas que conseguem essa verdadeira proeza durante o período de uma existência.
São tantas as zonas ocultas de nossa personalidade que, até para nós mesmos, fica difícil lidar com elas. E o que dizer com relação ao “outro”?
Até porque, nos encontramos no dia-a-dia com inúmeras contradições, cuja intensidade fazemos questão de ocultar.
Os temores e os desencantos com relação ao próximo são tão grandes e tão distantes que com frequência nos sentimos sós,  mesmo no meio da multidão.
Por mais que tentemos desnudar e desvendar o “outro”, sempre nos deparamos com um profundo abismo de sentimentos e emoções.
Talvez por isso seja tão raro encontrar o tão propalado amor, aquele com que sonham os poetas.
O encontro das peles é bem mais fácil que o encontro das almas.
O fluxo energético que emana dos corpos é paradisíaco e, se associado ao encontro que emana  das mentes, é absolutamente mágico!
Nada mais falso do que imaginar que os opostos se atraem.
Somos todos narcisistas, em maior ou menor grau, e o  que nos fascina mesmo  é encontrar refletido no espelho alguém parecido conosco, não só nas nossas contradições, mas, principalmente, nas nossas singularidades.
A face oculta de cada um é um manancial de surpresas.
Somente quando incorporamos em nós o “outro” é que nos identificamos como nós mesmos, livres de máscaras sociais para os momentos ditos apropriados.
Lindas essas reações de construção e desconstrução que se processam na nossa mente e que fazem com que a vida seja uma benção se valorizados os momentos únicos que ela pode oferecer!
Essas multifacetas do ser humano o tornam o animal mais atraente da face da terra.
O que mais se ouve são as lamentações de termos convivido tantos anos com alguém e não chegamos a conhecê-lo de fato.
Será que realmente estávamos interessados nisso, ou apenas  nele colocávamos uma fantasia  que no fundo só servia para nos manter numa zona de conforto?
Imagino que na busca de reais encontros há que valorizar “o ser”, e não, “o ter”, coisa não muito frequente na nossa tão falada sociedade de consumo, cujo grande lema é “tempo é dinheiro”.
Só muito mais tarde, no ocaso da vida, vamos nos dar conta de quão falsas são essas palavras.
A própria natureza começa a nos dar indícios que estamos no caminho errado, infringindo todas as suas leis de sobrevivência.
Com o avançar dos anos, cada vez mais vamos fazendo o balanço de nossas vidas e constatamos que apenas os momentos em que conseguimos nos entregar a uma real autenticidade é que foram os realmente plenos.
O tempo que perdemos em ter coisas, apenas nos afasta e nos aliena das verdadeiras descobertas emocionais para as quais fomos programados e que, com certeza, é o ápice de nossa existência.

Gabriel Novis Neves
31-08-2013