O
poeta tinha razão quando disse que “quem sabe faz a hora, não espera
acontecer”.
Há
um ano, pensei em fazer “minha hora” como médico de consultório.
Excelente
de saúde física e mental quis o destino que as articulações dos meus joelhos me
avisassem que tinha chegado ao final a carreira profissional de médico das
urgências e emergências, que é o mundo da obstetrícia.
Já
enfrentei várias situações em que não me sentia preparado - desde o meu
nascimento em casa, em morte aparente e com baixo peso.
Os
primeiros estudos em Cuiabá. O sonho de ser médico, formado pela melhor escola
de medicina do Brasil, a nossa querida Faculdade da Praia Vermelha, no Rio de Janeiro.
Casamento,
filhos, luta pela sobrevivência, a viuvez não esperada.
O
recomeço e o tempo passando. Tudo mudou. Éramos nove irmãos. Somos oito. Minha
família, agora, sou eu. Meus filhos constituíram novas famílias, assim como
meus irmãos, sobrinhos e primos.
Passei
a publicar os meus sonhos na imprensa. E o tempo passando deixando saudades
daqueles que partiram.
Temo
ficar sem contemporâneos para conversar. Novas amizades neste período são mais
difíceis de serem feitas. Desconfio ser o idoso mais seletivo e exigente nas
suas escolhas.
Quando
isso acontece, é importante guardar o prêmio recebido no cofre forte das
emoções.
Sempre
temia o momento do afastamento do atendimento aos meus clientes.
Precisei
de energia - que nem sei onde a encontrei - para evitar essa separação do velho
aparador de crianças que, por mais de meio século, cortou muitos cordões
umbilicais.
Não
fosse a minha psicoterapeuta, estaria amargurando o sabor de uma derrota
evitável. Muito trabalho, disciplina e obstinação, restituíram-me ao meu
ambiente: a sala de partos. Após um ano de ausência voltei a cortar o umbigo de
uma menininha - a minha grande vitória.
É
o feitiço virando contra o feiticeiro. O tempo, e só ele, seria capaz de me
separar da razão de tudo que sei e aprendi, e que foi adquirido com esse
contato diário com os meus pacientes.
Sinto
que afastado deles perco metade de mim. É o inevitável ciclo vital, cuja fuga é
impossível.
Quem
sabe faz a hora. Esta felizmente ainda não chegou para mim.
Continuarei,
espero que por longo tempo, nessa missão e em outras frentes de trabalho
humanizado.
“Toda
gente é capaz de sentir os sofrimentos de um amigo. Ver com agrado os seus
êxitos exige uma natureza muito delicada.” Oscar Wilde.
Gabriel
Novis Neves
27-08-2013
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