Estudei
na Escola Modelo Barão de Melgaço no período de 1942 – 1945, e lá concluí o meu
curso primário. Tive excelentes educadoras, e chamava-as de professora.
É
complicado voltar tanto assim no tempo. Não que seja complicado relatar
vivências dessa época – o que pega são os nomes. Já passei vexames abomináveis
por causa disso. Sempre me esqueço de citar alguém. E nesse caso não será
diferente. Com certeza me esquecerei de citar o nome de várias professoras. Mas
vou arriscar assim mesmo, e antecipadamente me desculpo pelos nomes
omitidos.
Feito
o devido esclarecimento, cito a minha professora Oló, professora Diva,
professora Calú, professora Nélia, professora Célia, professora Corininha,
professora Ione, professora Delza e professora Jaira.
Entre
todas as minhas educadoras, uma, porém não era chamada de professora, e sim de
dona. Por questões que fugiam a minha compreensão, a professora Alina Tocantins
era a única a ser chamada de dona. Dona Alina - a nossa simpática e amiga
diretora. Todas as nossas reivindicações eram feitas na diretoria, para dona
Alina. Não era uma diretora autoritária, nem incutia medo nos alunos, muito
pelo contrário, era amada e respeitada por todos.
Mesmo
depois de me formar médico, continuei a chamá-la de dona. Guardo muitas recordações
boas da dona Alina! Tanto dentro como fora da escola.
Uma
das mais marcantes é a imagem de Dona Alina na sua cadeira de balanço. Todas as
tardes ela sentava-se na sua cadeira de balanço em frente à sua casa na Rua 13
de junho – na calçada naturalmente, como era costume na época - elegantemente
vestida com um enorme leque para espantar o calor de Cuiabá. Ao seu lado,
também sentado em uma cadeira de balanço, o eterno namorado Odorico Tocantins.
E conversavam. E balançavam. Como tinham assunto para conversar! Todas às vezes
que por lá passava, com a curiosidade própria das crianças, observava aquela
cena que, hoje sei o que significava: amor, companheirismo! Eles conversavam e
riam, naquela camaradagem que só o verdadeiro amor produz. Mas não era só a conversa
entre o casal que fazia a felicidade da dona Alina. Todos os que passavam por
ali, paravam para um dedinho de prosa. Não raro dona Alina tinha que solicitar
de sua auxiliar doméstica mais cadeiras na calçada. Essas conversas
ficaram famosas e algumas pertencem ao nosso folclore.
A
mais conhecida delas é um diálogo imaginário da dona Alina com o seu afilhado
Firmino - conhecido pelo apelido de Guaporé. Dizem que a dona Alina estava na
sua inseparável cadeira de balanço, num domingo à tarde, quando se aproxima o
seu afilhado: banho tomado, barba feita, roupa limpa e engomada, sapatos
engraxados. Para diante da dona Alina e de mãos postas pede-lhe a benção. “Deus
te abençoe”, responde a sua madrinha. Guaporé, que era oligofrênico, fica
quieto.
Dona
Alina puxa conversa com ele: “- O que foi Firmino? (ela nunca o chamou pelo
apelido), você me parece triste e abatido”. E ele meio desconsolado responde:
“Ah, minha madrinha, muito trabalho! É o dia todo carregando água da prainha
para a Pensão Pécora. Folga só domingo, após o almoço”.
A
madrinha o consola e a conversa se estende, com dona Alina sempre muito
atenciosa. É notável e sempre digna de registro a sua habilidade ímpar no trato
com os desiguais. Um dia talvez escreva uma peça de teatro sobre esse diálogo,
tão apreciado pelos cuiabanos!
Obrigado
dona Alina, por ter sido uma personalidade marcante na minha formação como
cidadão!
Gabriel
Novis Neves
01/05/2010
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