sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Transformação

O grande “conto do vigário”, prática ingênua, e algumas vezes folclórica, muito comum no início do século passado, transformou-se numa elaborada e sofisticada fábrica de altos lucros.
Sempre me contaram para que tivesse cuidado com pessoas de aparência humilde, com discursos envolventes, confusos e promissores de altas benesses.
A capital desse “conto” até então era o Rio de Janeiro, onde todos se sentiam ameaçados.
Por razões históricas, segundo o mestre Antenor Nascentes, essa denominação teve a sua origem ligada a fatores eclesiásticos.
As oferendas dos fiéis na igreja eram empacotadas e entregues a alguém de confiança da paróquia para serem guardadas.
Como a moeda da época era o “réis”, e o pacote continha um conto de réis, logo essa prática recebeu o nome de “conto do vigário”.
À medida que as necessidades sociais da paróquia exigiam, essas quantias eram repassadas para suas devidas finalidades.
Como nem sempre esses guardadores tinham a esperada confiabilidade, as doações eram discretamente surrupiadas, não cumprindo assim a sua real finalidade.
Essa é a origem do chamado “conto do vigário”.
Nos tempos atuais, com as mentes muito mais sofisticadas e impulsionadas pela alta tecnologia, os deslizes financeiros assumiram caráter de alta periculosidade.
Diariamente temos informações pela mídia dos mêgalos “contos de vigário” institucionalizados pela nossa política e já totalmente fora de controle de conotações éticas.
Os responsáveis pelo erário público não mais têm o mínimo pudor em dilapidá-lo escancaradamente.
Nada acontece, tudo permanece blindado, pois o pequeno e ingênuo “conto do vigário” virou uma grande e forte instituição.
Não somente nós éramos menos informados, mas também os artifícios usados para que a humanidade fosse se aperfeiçoando no desprezo mútuo, foi aumentando com o passar dos anos.
O homem tem sido cada vez mais o próprio algoz de si mesmo.
O estado atual de mentiras, hipocrisias e violência, é apenas o resultado de uma espécie que ainda não atingiu a sua suposta racionalidade.
A desvalorização e a decadência do próximo têm sido diretamente proporcional ao nosso desenvolvimento tecnológico, esse último, motivo de grande orgulho para os habitantes desse nosso planeta.
Tudo sob a égide de uma das maiores democracias do mundo.
Quem pensaria que um dia teríamos saudades dos pequenos golpistas, dos surripiadores do nada, dos artífices das pequenas mentiras?

Gabriel Novis Neves
18-01-2014

VOCÊ E A SUA CRIANÇA

Em que época da vida você acertou as contas com a sua criança?
Essa é uma pergunta que costuma ocorrer a todos os adultos especulativos.
Em que momento aqueles sonhos que você havia programado como meta de vida foram destruídos ou substituídos por outros valores mais próximos à realidade?
É impressionante como isso ocorre em épocas diferentes para cada um de nós. Alguns, só têm esse insight depois de um grande sofrimento, muitas vezes auxiliados por uma terapia. Outros passam a vida buscando isso e culpando os circunstantes por não terem conseguido esse momento.
À medida que a seriedade dessas programações de adolescente vai se tornando mais leve, maior a possibilidade de um adulto mais feliz despontar.
Ao contrário, uma criança, muito cobrada em termos éticos, morais e religiosos, dificilmente conseguirá minimizar os efeitos disso na sua personalidade e, quanto mais tarde o fizer, maior a “sensação de vida que poderia ter sido e não foi”.
Quantas vezes nos pegamos fazendo cobranças pessoais difíceis de cumprir, nos amando de menos e subestimando os nossos mais profundos desejos.
Todas práticas patológicas, dependendo do grau em que ocorram.
Quanto mais cedo for feita essa catarse, maiores as possibilidades de encarar o passar dos anos com a tão necessária leveza que a própria velhice exige.
Por incrível que pareça já tinha feito todas essas considerações quando, numa dessas estadas no Rio de Janeiro, tive a oportunidade de assistir à encenação de um texto do grande poeta português Fernando Pessoa.
Tratava-se de um monólogo, aliás, brilhantemente interpretado pelo ator Rafael Camargo, na Casa de Cultura Laura Alvim.
Nele, o fantástico ator interpreta as três personagens do escritor no momento em que se confronta com os seus três “eus”: Fernando, o adulto, Alberto a criança e Ricardo, o escritor.
Num jogo de palavras, assombrosamente bem elaborado, somos levados pela vida afora a vestir cada um desses personagens a cada momento, como se o próprio Fernando Pessoa fôssemos.
A criança desprotegida aparece com toda a sua força alternada com o adulto culpado e reprimido em que, praticamente, todos nós nos tornamos.
Espetáculo absolutamente imperdível para todas as pessoas de sensibilidade e, que, por acaso, gostem de pensar.

Gabriel Novis Neves
20-01-2014

quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Medicina chinesa

Não tenho nenhuma barreira que me impeça de experimentar novos conhecimentos científicos, ou empíricos, na área da minha formação médica.
Tenho sede de entender culturas de outros povos. A minha formação médica é humanística - quando a França era a casa do conhecimento médico.
Depois da minha graduação, a tecnologia médica americana tomou conta do mundo, principalmente do ocidente. Os custos dessa medicina inviabilizaram a sua utilização universal.
Estudiosos ocidentais passaram a estudar a milenar medicina oriental e a sua aplicabilidade em nossa cultura.
A qualidade da medicina ocidental, com ampla cobertura da mídia, bancada com recursos da indústria farmacêutica e de equipamentos, selou na nossa gente o falso princípio da eficiência tecnológica.
Qualquer paciente ocidental tem como parâmetro de qualidade do bom atendimento em saúde o número de exames laboratoriais pedidos e o preço dos medicamentos receitados.
Comecei a me interessar pela medicina chinesa devido ao meu desencanto com a tecnologia ocidental na área da saúde, que só é alcançada por poucos.
Quando se fala em medicina chinesa, erroneamente fazemos logo uma associação com acupuntura.
E, em nome dessa confusão, aparecem espertalhões praticando o exercício ilegal da medicina, já que acupuntura é, por lei, uma especialidade médica.
Estou dando os primeiros passos como paciente nessa arte da cura sem máquinas e sem medicamentos proibitivos de última geração.
Tão simples a diferença que nem preciso lembrar que, enquanto a medicina chinesa é voltada à prevenção das doenças priorizando o paciente, a medicina tecnológica esquece o paciente e se foca somente na doença, diagnosticada por máquinas.
O paciente hoje no Brasil dificilmente tem oportunidade de falar sobre seus males ao médico que o atende durante uma consulta.
Ele perde a sua condição de ser humano e fica resumido a uma região topográfica.
Para ser atendido pela medicina chinesa, o médico precisa de tempo, que lhe é negado pela medicina tecnológica.
Este é o fundamento principal. A medicina oriental tem no tempo dedicado ao paciente, o único caminho para a cura. Na tecnológica, é a máquina.
O Brasil possui uma quantidade expressiva de médicos. Por outro lado, o governo não disponibiliza recursos para a aquisição de equipamentos suficientes para o bom desenvolvimento do atendimento aos pacientes. Esses equipamentos, portanto, ficam concentrados nos grandes centros. As cidades do interior sofrem pela falta de médicos justamente porque não encontram as mínimas condições de trabalho.
Não há uma política de interiorização do médico saído das nossas universidades, que é o médico tecnológico.
Não estou, em absoluto, tentando substituir o médico ocidental pelo oriental. Apenas jogando informações sobre o nosso maior problema social, que é a falta de uma boa medicina para todos.
Será que a poderosa indústria de equipamentos médico-hospitalares e farmacêuticas não iria interferir na estrutura curricular dos mais de duzentos e vinte cursos de medicina no Brasil caso se priorizasse ações voltadas para o paciente e, com isso, deixando os exames complementares apenas como auxiliar, e não, como agentes de diagnóstico, como é feito hoje?
Como solução emergencial o governo decidiu alugar médicos por tempo determinado e de qualificação científica duvidosa.
É difícil mudar uma ideologia. Há necessidade de tempo, e na saúde tempo é vida.
Em vésperas de eleição seria importante discutir, pelo menos, o que é importante para a sociedade.
A nossa saúde pública está no topo dessas prioridades.
Pelo menos vamos tentar o debate?

Gabriel Novis Neves
13-01-2014

terça-feira, 28 de janeiro de 2014

SER VELHO

Vinicius de Moraes disse certa vez que muitas pessoas com o avançar dos anos, e com a proximidade da morte, “começam a fechar as portas do seu passado”.
Talvez, por pudor, os idosos não gostem de mostrar a sua decadência física ou mental.  No meu entender, é um ato de pura proteção contra comentários de alguns jovens: “gozem a vida que ainda lhes resta”.
Qualquer idoso, sem a “Doença do Alemão”, percebe isso com facilidade, especialmente quando está em lugares públicos.
Os “brotos”, atualmente "galera", de um modo geral, detestam idosos, principalmente sem uma boa identidade (cartão de crédito).
Essa invenção capitalista tem o poder da transformação: transformam velhos gagás em jovens simpáticos, com futuro brilhante pela frente, pois, afinal, a expectativa de vida vem aumentando dia a dia.
Esse cartão é tão maravilhoso, que é um símbolo de cultura, dado a sua possibilidade de se exprimir em vários  idiomas.
É o companheiro ideal que um velho tem para, com conforto, e em ditas  boas companhias, dar a volta ao mundo.
E, com que satisfação, os garotos dizem que o cartão é milagroso e resolvem todos os seus anseios.
No caso do velho, ajuda, e muito. Não resolve, mas dá para enganar.
A figura do idoso criada pela sociedade é de um poupador contumaz - muitas vezes irrita seus herdeiros quando a gorda poupança demora a chegar às suas mãos.
O velhinho não é bem visto gastando o seu dinheiro ganho com anos de trabalho.
É interpretado como um dilapidador do patrimônio da família. O velho ideal é o sofredor. A alegria maltrata os jovens, que reinvidicam esse sentimento de prazer como sendo deles.
O bom velhinho é o hipocondríaco, que não tem limites para pagar consultas médicas, exames laboratoriais e uso indiscriminado de medicamentos, alguns ainda em fase de experimentação.
Velho namorar é visto como alguém irresponsável, já com o pé na cova.
Velho alegre, só o desconhecido. É enquadrado como personagem folclórico. O aceitável é o depressivo ou com uma doença incurável.
Ficar em casa com reumatismo esperando a morte também compõe o perfil do velho ideal.
Ser velho no Brasil, este país tropical, das praias, dos jovens e do carnaval, é uma arte difícil de elaborar.

Gabriel Novis Neves
13-01-2014

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Condenação

Talvez a biológica seja a pior das condenações que um ser humano pode sofrer.
Nascemos, temos o nosso tempo de criança, entramos na adolescência, atingimos a vida adulta e somos “condenados” à maturidade.
É uma violência, onde a parte interessada, que somos nós, sequer somos ouvidos sobre se aceitamos ou estamos conscientes de que agora somos seres na maturidade e, como tal, considerados verdadeiras santidades.
Na prática sabemos que a biologia não funciona assim, obedecendo a tempo e datas.
Na vida há tempo para tudo, e esse tempo não é mensurável.
Diante do fato consumado, muitos procuram fugir desse estigma, que é considerado como a idade onde o erro humano não é permitido, pois a maturidade não permite.
Alguns fogem para o pior, tentando substituir maturidade por “melhor idade”, onde tudo diz ser permitido.
Que coisinha mais falsa essa denominação, onde o idoso, que é o maduro quando está bem, é de acordo com a sua idade.
Melhor idade é uma cretinice que alguns adotaram para servirem de deboche às crianças, aos adolescentes, pessoas maduras e idosas.
Dá até impressão que para se chegar a tal da maturidade, incorretamente adotada por alguns como a fase da melhor idade, somos obrigados a esquecer do período de criança, onde a inocência não dá espaço às maldades, privilégio dos adultos; das descobertas que acontecem na adolescência e dos encantos do período da reprodução, onde o ser humano se torna mais útil à sociedade pelos conhecimentos adquiridos e em pleno vigor físico e intelectual.
A maturidade nos é dada pela sabedoria, e não, adjetivando frases de autoestima de forma compulsória.
Como somos férteis em criarmos bobagens para preencher períodos estatísticos que nos resta de vida para fechar o nosso ciclo biológico!
Isso é inevitável, pois a vida continua longe das futilidades.
Como sinto falta da simplicidade! O caminho mais fácil para encontrarmos a felicidade que procuramos desde que nascemos.

Gabriel Novis Neves
02-01-2013

domingo, 26 de janeiro de 2014

CONTOS

Conheço vários “contos” onde vigaristas profissionais conseguem, num trabalho teatral, convencer inocentes, ou ambiciosos, com as suas histórias de caipira analfabeto.
Quem nunca ouviu alguém contar, ou já leu em jornais, a incrível história de um matuto que trocava um bilhete de loteria premiado por uma passagem de ônibus na rodoviária e, mais algum dinheiro em espécie, para providenciar o enterro do pai falecido em um distante município do Estado? E o pseudossortudo fazia o bom negócio com o falso “artista”.
O termo “artista” foi massificado recentemente como sinônimo de esperteza pelo ex-presidente da Câmara de Vereadores de Cuiabá, ao se referir aos seus colegas vereadores.
“Lá só tem artista”, teria dito o presidente da Câmara para se defender das acusações de deslizes administrativos.
Um ex-presidente da República, quando deputado federal dos mais relapsos, afirmou que no Congresso Nacional existia, pelo menos, trezentos “picaretas”, que é uma forma rude de tratar seus colegas.
Em sendo assim, é promissor o futuro político do criador de “artistas” na Câmara de Cuiabá.
O tempo responderá!
São tantos os “contos”, antigamente chamados de golpes, que o mais utilizado hoje, com grande margem de segurança e sucesso, é o de exportar jovens para arrumar empregos rentáveis, especialmente na Europa, com infindáveis alternativas, inclusive para a indústria do entretenimento cantando nas melhores boates e com chances de ingressar no cinema.
E as “espertas” brasileirinhas vão correndo para o continente das artes e dos jogadores famosos de futebol de todo o mundo atrás dos fáceis euros.
Logo descobrem que caíram no “conto” das escravas do sexo, e que agora pertencem a um empresário que nunca viram.
Algumas conseguem fugir para o Brasil, outras morrem por lá, vítimas da exploração do comércio das escravas.
Já conversei com muitas dessas meninas. Confesso que mesmo para um velho médico acostumado a acompanhar muitas misérias humanas, é impossível não se emocionar perante essa tragédia social.
Assistimos de braços cruzados ao desespero de centenas de famílias vítimas desta audácia do crime organizado no nosso país.
Em uma nação que fornece bolsa alimentação para cerca de 10% da sua população, a fome faz com que uma menina aceite ser bem “empregada” na Europa. Assim, poderá salvar da fome, miséria e analfabetismo seus irmãozinhos e ajudar seus pais.
Não são apenas os bandidos os responsáveis por essa rota do crime de prostituição, e sim, os nossos governos que abandonaram a nossa juventude.
Oh! Gente! Vamos criar “contos” sociais para evitar essa desumanidade?

Gabriel Novis Neves
02-01-2014

Mora com ele

Minha mãe, quando ouvia elogios a determinadas pessoas que ela conhecia muito bem, ironicamente, respondia: “mora com ele”.
Realmente, só com a vida a dois sabemos quem é o outro.
E como somos diferentes daquilo que, às vezes, mostramos ser!
Os homens parecem que tem certa preferência por mulheres sofredoras, pois sabem que elas desenvolvem o sentimento da culpa.
Quando este se manifesta clinicamente, tudo que dá prazer é desprezado, e a mulher se permite autoanular por completo, se coisificando no dia-a-dia.
E, quando alguém não se ama, é impossível amar o outro. São abolidos, ou, o que é pior,  vividos sem emoção, as viagens, compras, vida cultural e comidas sofisticadas em restaurantes renomados. Isso seria o substituto material daquele pobre ego em total penúria afetiva.
Triste, é que, com o passar dos anos, essas coisas vão se agravando sucessivamente e, quando se vê, não se reconhece mais aquela pessoa que um dia pareceu ser importante em nossas vidas.
Um grande número de casais aparentemente felizes, um dia se descobre nesse estágio. Projetos juntos para o futuro? Perdem todo o sentido. Resta apenas o afundamento no trabalho como fuga que, mal ou bem, ajuda a empurrar o tempo.
Os mais arrojados partem em busca de novas relações, mesmo sabendo do alto preço a pagar, não só em termos econômicos, mas, principalmente, em termos sociais, principalmente em comunidades mais conservadoras.
Sinto uma tremenda inveja daqueles que não trabalham e vivem bem, sem nenhuma preocupação.
Estes sonham em encontrar, para sempre, um abrigo seguro para suprir as suas necessidades vitais.
O bom é que se divertem, sem o mínimo sentimento de culpa.
Se forem casados, dizem que sua vida afetiva anda às mil maravilhas e que os filhos não dão o mínimo trabalho, nem em casa e nem no colégio, recebendo rasgados elogios dos seus mestres pelos seus excelentes desempenhos escolares.
São crianças estudiosas e educadas.
Esses seres invejáveis querem tudo do bom e do melhor que a vida lhes pode oferecer, mesmo sabendo que estarão sacrificando alguém.
Vendem uma felicidade que não têm, e, o pior é que tem gente que acredita nessa falsidade.
Representam o verdadeiro quadro da hipocrisia social, que só é desfeito pela sábia observação da minha mãe.
“Mora com ele...”.

Gabriel Novis Neves
20-12-2013

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

RUAS

Com que facilidade nossas autoridades de plantão mudaram o nome de algumas ruas da nossa cidade!
Praticamente todas elas perderam o seu nome original, motivados, talvez, pelo oportunismo político que sempre existiu e que jamais será extinto.
Citarei uma das mais emblemáticas troca de nomes.
A antiga Rua da Boa Morte teve seu nome alterado para Rua Coronel Antonio Paes de Barros (Totó Paes) ex-governador do Estado de Mato Grosso. Depois sofreu outra alteração, e passou a ser denominada Rua Cândido Mariano da Silva Rondon – o maior sertanista do Brasil e cognominado Bandeirante do século XX, segundo o historiador cuiabano Rubens de Mendonça em seu livro Ruas de Cuiabá.
Imagino o constrangimento do grande humanista ao receber, em vida, essa solidariedade dos políticos da sua terra, ao ter de substituir o homenageado falecido.
Rondon é conhecido no mundo todo como pacificador, botânico, estudioso da nossa flora e fauna, militar disciplinado e disciplinador, mas, em sua cidade é chamado, pelos mais antigos, como Cândido Mariano.
Considerado um dos cinco maiores andarilhos da Terra. Por duas vezes foi indicado, por entidades estrangeiras, para o prêmio Nobel da Paz da Academia de Estocolmo. Mas, infelizmente não levou o troféu em nenhuma das vezes. No entanto, a distinção pelas indicações, já nos oferece a dimensão do seu trabalho e importância.
Seis anos após a sua morte, em 20/01/1958 no Rio de Janeiro, uma grande obra em sua cidade, o Aeroporto Internacional de Cuiabá e Várzea Grande foi batizado com seu nome.
Mais uma vez o destino das homenagens foi cruel com o nosso grande herói sertanista. Ele sempre preferiu andar a voar.
Só foi lembrado para emprestar o seu nome ao nosso aeroporto graças ao movimento político que assumiu os destinos desta nação àquela época.
Substituiu, por consenso, o nome oficial do aeroporto, que era Aeroporto Maria Thereza Goulart. Ela foi a responsável única pela construção da nova obra, e esposa do Presidente deposto João Goulart.
No afogadilho de agradar aos poderosos transitórios, muitas ruas tiveram seus nomes trocados, mas sem apoio do povo, que continuou a se referir a elas pelo nome antigo. Fato que prevalece até hoje.
Esse fenômeno deve acontecer em todo o Brasil, com certeza.
Apenas lamento essa dança de interesses explícitos que nos colocam muito mal no mundo civilizado.

Gabriel Novis Neves
23-12-2013

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Vida difícil

Não está nada fácil para o trabalhador brasileiro pagar as suas contas.
Tudo encareceu. Os preços dos alimentos e materiais de primeira necessidade chegaram a patamares alarmantes.
Essa verdade é comprovada nos vinte milhões de brasileiros que sobrevivem com os recursos públicos da Bolsa Família, segundo dados oficiais.
Existem ainda outras bolsas, como a bolsa presidiário, cujo valor varia segundo o número de filhos do beneficiário, chegando, alguns, a receberem o equivalente a um bom DAS, que é o valor que se paga a um comissionado (aquele que não faz concurso) e presta serviços de assessoramento superior aos órgãos públicos.
Agora, temos até bolsa para médicos importados, no valor de dez mil reais por mês. Um médico brasileiro concursado, após trinta e cinco anos de serviços, recebe de aposentadoria minguados um mil e seiscentos reais, como no Estado do Rio de Janeiro.
Nesta terra do agronegócio, qualquer diretor de quinto escalão do governo se dá ao cuidado de guardar no criado-mudo, para despesas eventuais, mais de cem mil dólares.
A sociedade aceita e aprova os novos ricos, geralmente jovens dotados de talento para os negócios.
Essas fortunas nascidas do dia para a noite são frutos de mutações genéticas, praga nesta região.
A mídia informa como é tratado o dinheiro dos impostos que recolhemos, e providências não são tomadas por quem de direito.
Os antigos contavam historinhas para as crianças dormirem. Uma delas era a do homem do rabo preso. Quem não conhece essa fábula maravilhosa consulte os antigos ou o Google.
O Tribunal de Contas aponta falhas na aplicação do nosso suado dinheiro e tudo termina com a notícia.
Os pequenos infratores da lei continuam lotando os nossos desumanos depósitos de presos, chamados de penitenciárias.
Antes tarde do que nunca descobriram, com a prisão da trinca da quadrilha na Papuda, que o nosso sistema penitenciário não funciona e nem apresenta condições para receber infratores da lei.
Os trabalhadores que sabem o custo de um prato de comida são os mais revoltados com a situação em que se encontra o nosso país.
Nem as obras ornamentais que estão sendo executadas para o torneio internacional da FIFA, encobrem essa frustração nacional.
A falta de respeito pela “coisa pública” atingiu o seu clímax.
Existe muita grana saindo pelo esgoto da corrupção, tornando cada vez mais difícil a vida do trabalhador.
Isso acontece com o beneplácito dos nossos “estadistas”.
Não há luz no final do túnel.

Gabriel Novis Neves
28-12-2013 

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

TUDO CONTINUA

 O Ano Novo terminou no dia dos Santos Reis Magos, e agora tudo é carnaval até a primeira semana do mês de março.
Depois, não dá nem para respirar, pois vem a Semana Santa, Copa do Mundo e Eleições.
Conhecido o nome do vencedor, e acertados o loteamento dos ministérios, já começa o comércio a atacar com músicas de Natal. E lá se foi mais um ano, completamente perdido.
Como o país é exemplo de ética, a posse dos novos governantes inicia-se à zero hora do primeiro dia do novo ano.
É a lei do sofá sendo chamada para evitar um ato ilícito, outrora muito praticado, quando os novos governantes eram empossados no dia 15 de março e encontravam os cofres do Tesouro do Estado vazios.
Pelos tipos de arranjos que já estão sendo tomados, tanto no plano federal como no estadual, teremos grandes festas e emoções neste promissor ano de 2014, que ficará gravado na nossa história como o ano de aluguéis de médicos do Caribe.
A Presidente candidata à reeleição tem todas as condições de liquidar a fatura logo no primeiro turno, não pela sua competência como gestora, mas pela ausência de uma oposição, viciada em receber pequenos favores do poder.
Dos mais de vinte partidos existentes até ontem, pelo menos vinte apoiam incondicionalmente a Presidente.
Só não chegaremos ao partido único, sonho do Planalto, pela resistência do senador Randolfo e o seu minúsculo PSOL da vereadora Heloisa Helena.
O mais cômico nesse teatro programado é que o discurso da Presidente para “convencer” os eleitores a votarem nela, é que serão feitas profundas mudanças estruturais e éticas nesta nação.
Acontece que, como todos sabem, há doze anos a nação vem sendo administrada pelo seu grupo político e está fazendo o Brasil andar para trás na educação, saúde, segurança, ciência, tecnologia, pesquisa, inovações tecnológicas, infraestrutura, cultura, turismo, lazer e desenvolvimento humano, principalmente.
Mudança só é discurso de quem está no poder e faz tudo para não largar o osso.
Quem estiver no poder tem de prestar contas e responder às inquietações da nossa gente.
Explicar porque não se investe como manda a nossa Constituição, os percentuais de recursos em educação e saúde, maquiando os orçamentos.
Por que cortaram recursos do orçamento do Ministério da Saúde, e onde foram investidos?
Por que “emprestou” dinheiro do BNDES para saneamento em Cuba e Angola e não revela, alegando segredo de justiça, o nome das empreiteiras brasileiras que executam essas obras?
Por que perdoou dívidas contraídas por ditadores sanguinolentos de países miseráveis africanos?
Por que a inflação voltou sorrateiramente e o país deixou de crescer como seus competidores ditos emergentes?
No bruto jogo do poder os escrúpulos são jogados nos esgotos da ética e princípios.
O sistema ditatorial do Executivo aniquila e deforma os outros poderes constituídos.
Uma candidata que promete mudar o Brasil e apresenta na sua linha de frente, Sarney, Collor, Renan, Jader, Cabral, Roseana, e que tem como apoiadores os maiores banqueiros e empreiteiros desta nação e como modelo de empresário empreendedor o Eike Batista, só falta convidar o Tio Patinhas para tomar conta do Banco do Brasil.
O resto é o resto, tudo farinha do mesmo saco.
Enquanto isso, tudo continua no mesmo.
Até quando teremos sempre esse cenário, onde as esperanças surgidas logo desaparecem na mesmice de sempre?

Gabriel Novis Neves
06-01-2014

terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Atenção básica

Após implantar a Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e colocar em funcionamento o seu curso de medicina, fui desempenhar minhas funções de docente no Hospital Universitário Júlio Muller (HUJM).
Permaneci nessa atividade até a minha aposentadoria.
Sem privilégios, e como um recém-contratado, o chefe da clínica a que pertencia (Ginecologia-Obstetrícia), designou-me para o ambulatório de obstetrícia no período da tarde, às quartas-feiras, onde, facilmente, a temperatura beirava aos quarenta graus centígrados.
Na época, as salas não eram climatizadas e o velho ventilador de pé jogava o ar quente pelo ambulatório.
Nos outros períodos da semana trabalhava no pronto atendimento; visita com os alunos na enfermaria e centro cirúrgico. Esses blocos de trabalhos acadêmicos, em média, deveriam durar cerca de quatro horas para atender a minha carga horária contratual.
Reunião semanal dos docentes e um plantão noturno de doze horas semanais.
Fazia medicina assistencial com os meus futuros colegas, permutando conhecimentos na difícil profissão de médico.
Tudo corria na mais perfeita harmonia e, finalmente, eu realizava a tarefa mais importante na universidade, que é a docência expositiva.
Por ocasião do reconhecimento do curso, o antigo Conselho Federal de Educação nomeou para relator do processo nosso ex-professor de Clínica Médica e paraninfo dos internos (1959-1960), Clementino Fraga Filho, o professor Fraguinha, assim chamado pelos seus alunos.
Acompanhado do reitor esteve inspecionando o HUJM. Ao me encontrar no ambulatório com os alunos, chamou-me discretamente para uma política caminhada pelo longo corredor do hospital e logo me perguntou:
 “Você acabou de deixar a reitoria e está no ambulatório? É castigo”!
Acalmei-o dizendo que todo o reitorado era de jovens que me ajudaram a implantar a universidade, e eram meus amigos queridos.
Clementino Fraga havia sido reitor da UFRJ e, nos grandes centros (!), após ocupar por quatro anos esse cargo, o ex tem que ser “protegido” em alguma função inacessível aos estudantes.
É também da vaidade acadêmica que os mestres mais titulados fiquem nos fundos dos hospitais.
Visão elitista do nosso ensino, onde o importante na formação do aluno de medicina é que tenham, na porta de entrada do hospital e na rede básica de saúde, os melhores professores.
É no “postinho” de saúde onde simples sinais têm que ser entendidos e esclarecidos. Os médicos dos PSFs, Policlínicas e Prontos Atendimentos devem ser muito bem qualificados e protegidos por uma estrutura que possibilite uma resolutividade ao seu trabalho.
Ali, não é lugar para tratar de sintomas, e sim, de observar  o paciente com uma visão holística e humanista.
Dizer que “qualquer um” serve para essas ações, é cometer um crime.
Vamos valorizar o atendimento à Atenção Básica de Saúde?

Gabriel Novis Neves
09-12-2013

domingo, 19 de janeiro de 2014

TERRA DE ÍNDIOS

Havia um tempo que era pejorativo chamar alguém de índio ou morar na terra, ainda, deles.
Nasci, fui educado, estudei e, quando tive oportunidade, tentei apagar esse preconceito.
Como o índio morava na selva, hoje quase em extinção, denominei de “Universidade da Selva” a burocrática Universidade Federal de Mato Grosso, isso em 1971, durante o Primeiro Encontro dos Reitores das Universidades Públicas em Brasília.
Era a nossa meta de intenções para esta parte do Brasil - tão cobiçada pelas nações estrangeiras!
O primeiro marco da nova casa de ensino superior foi o Museu Rondon, em homenagem ao grande pacificador das etnias existentes em nosso Estado.
Para meu orgulho sou filho do “Bugre do Bar”, apelido que o meu pai ganhou pela cor indígena da sua pele.
Percorri toda a área de atuação da Missão Anchieta ao norte do nosso Estado, cuja sede ficava localizada em Utiarity.
Seus membros eram jesuítas, e desenvolveram um trabalho extraordinário durante o choque inevitável dos homens brancos, dito civilizados, com os povos não aculturados.
Muitas mortes foram evitadas, porém, o número de mortos quase dizimou civilizações inteiras.
Aprendi muito também com os irmãos Villas-Bôas, com Apoena e com Chico Meirelles.
Todos foram contratados como professores colaboradores da nossa incipiente UNISELVA.
Fui médico de índias e operei algumas delas. Posteriormente, tivemos conosco na UNISELVA o saudoso cacique Mário Juruna, de quem recebeu o seu famoso gravador. Brizola, que era a favor do respeito às minorias, o elegeu Deputado Federal pelo Rio de Janeiro, a eterna capital da cultura brasileira.
Diante de tanta sabedoria e felicidade que encontrei nesses povos das florestas, sempre indagava o motivo de terem lhes tirado quase tudo. Bens materiais e imateriais. Afinal eles eram os verdadeiros donos.
Certa ocasião, assistindo no Xingu o Quarup, em homenagem a Noel Nutels, o russo médico dos índios, Cláudio respondeu a minha pergunta inquietante sobre a razão de tanta felicidade dos povos ainda não aculturados.
 “Eles não conhecem o dinheiro, nem o casamento, nem a propriedade”, disse-me o antropólogo do mato.
 “Não tinham noção da posse das coisas ou pessoas”.
 “Fico imaginando - continuou o pensador - até que ponto foi ‘negócio’ comprarmos, massacrando os verdadeiros donos das terras, o conforto, a riqueza material em troca da felicidade perdida.”
Como era bom ter nascido no Brasil antes de 1500, e ser chamado de índio!

Gabriel Novis Neves
27-12-2013

Os olhos falam

Costumo dizer que os olhos são a porta de entrada para atingir a alma das pessoas.
O esquizofrênico, por exemplo, tem um olhar impenetrável. Talvez por ser possuidor de uma lesão congênita do núcleo afetivo localizado no cérebro, não conseguimos atingir a casa desse sentimento humano que, dizem os poetas, fica no coração – onde a alma se abriga.
Todos sabem que os artistas não têm compromisso com a verdade, e sim, com a beleza.
Os poetas abusam dessa prerrogativa estética.
Cartola conversava com as rosas. Noel com a lua. Caymmi com o mar. Tom com a natureza. Vinicius com o amor. Maria com a solidão. O “Rei” com os botões da blusa.
Pelo olhar se percebe o bem querer, a amizade, o ódio e, até, o desejo em encerrar uma conversa.
O olhar denuncia os nossos mais primitivos sofrimentos. É cúmplice.
O pior olhar é o da descrença, onde não existe mais a esperança de uma reconciliação, muitas vezes provocada pela vaidade, inveja e rivalidade material entre pessoas.
Nesse momento o ser humano abdica da sua condição de racional e vira bicho.
Que coisa maravilhosa e, ao mesmo tempo, terrível, são os olhos! Esses pequenos instrumentos da nossa vida sensitiva.
Não era à toa que os antigos, em caso de dúvida, propunham uma conversa franca - “olho no olho”.
Os religiosos cuiabanos quando fazem a leitura de um olhar e percebem uma inverdade, apelam para o nosso milagroso Senhor Divino.
Muitos perguntam ao suspeito do “delito” sobre a veracidade da leitura.
Quando a resposta é negativa e, para terem certeza que aqueles olhos não estão mentindo, perguntam:
 “O Senhor Divino pode furar os seus olhos”?
Não há mentira resistente neste momento, e a verdade aparece.
Somente a fé cura a “cegueira” dos sentimentos projetada nos olhos, esses pequeninos grãos de areia que falam.

Gabriel Novis Neves
31-12-2013

VERÃO

Para muita gente o verão sempre foi o período predileto do ano.
Verão significa férias, 13% salário, festas de dezembro até o carnaval, viagens, temperaturas elevadas, praias principalmente para o pessoal do interior do Brasil, aulas de academias com reforço para preparar o corpo á apreciação do “seleto público” nas praias e na Sapucaí. Sem contar o tão desejado bronzeamento da pele, que apesar de representar morte celular, continua conhecido como a cor do pecado, símbolo da sedução que permeia o verão.
A superexposição dos corpos aos raios solares, incrementados com produtos químicos, algumas vezes maléficos, libera um pigmento chamado  melanina responsável pela mudança de coloração da pele quando atingida após às 10 hs da manhã.
O ideal seria que todos ao contrário, se expusessem ao sol antes desse horário  por pelo menos 30 minutos ao dia,  aí sim sendo beneficiados pela absorção da vitamina D, absolutamente necessária a uma boa integridade óssea.
Lamentavelmente, razões comerciais, as mais diversas, impedem que se divulguem  os benefícios  dos raios solares nas primeiras horas do dia, sem necessidade  de protetores químicos.
Os idosos, os maiores beneficiados , se privam dessas práticas, ficando assim mais vulneráveis à tão temida osteoporose.
Entretanto, pelo que nos informa o Serviço de Meteorologia, agora com credibilidade tecnológica, a temperatura no Rio de Janeiro capital dos corpos mais sarados nas suas inúmeras praias, chegará aos quarenta graus centígrados com sensação térmica de cinquenta.
Até os brancos paulistas estão enfrentando horas de estradas para molhar o corpo nas águas do mar.
O pior, é que em muitas cidades de Estados ditos desenvolvidos economicamente, falta água potável, a água para beber.
Como é justo o Regente deste Planeta! Dá em abundância a água salgada, sol e areia para alimentar a vaidade humana e, retira aquela da sua sobrevivência.
Talvez este seja o verão inesquecível para muita gente, que acredita na beleza do corpo, esquecendo que a nossa parte mais valiosa fica escondida em algum lugar, moradia perpétua dos nossos sentimentos e emoções.
Teremos muitos verões este ano de 2014, sendo dois imperdíveis: o da Copa do Mundo e das Eleições.
Vamos mudar de assunto e pensar sobre o próximo outono que já emitiu seus primeiros sinais como a volta da inflação, o aumento real do subemprego, salários aviltantes para aqueles que estudam e trabalham, e proliferação do bichinho da inflação?
Bem, com relação ao pagamento das dívidas bancárias construídas para as obras da Copa, deixa pra lá.
Estamos no verão.

Gabriel Novis Neves
04-01-2013