quarta-feira, 30 de junho de 2010

SEM FIM

A minha professora Valéria está me ensinando a escrever “SEM FIM.” Estou gostando das aulas, entretanto já fui alertado por ela sobre o risco de transformar essas histórias de “sem fim” em tradição - um fato muito repetido, primeiro vira verdade, e com o passar dos anos, em tradição. Citou-me um exemplo bem corriqueiro: numa família de vários filhos é frequente ouvirmos que fulano ou fulana é o/a predileto/a do pai ou da mãe. Esta colocação, de tão recorrente transformou-se primeiramente em verdade e hoje se acredita mesmo que sempre existe um filho/a favorito. Virou tradição.

Sou filho, pai e avô – totalmente habilitado para ser bi. Quando criança ouvia os adultos – sempre eles - comentarem que o pai gostava mais do filho tal, e a mãe do filho que nunca coincidia com o “escolhido” pelo pai e vice-versa.

Tenho três filhos. Amo os três com a mesma intensidade. Reconheço que são desiguais, para serem chamados de normais. Talvez por este fato, sempre ouço de alguém que o filho preferido é o beltrano. Com as netas – cinco lindas moças - a chata história se repete. “Todas são educadas e lindas, mas você tem preferência por sicrana”, é o que costumo ouvir. Com o neto não acontece comparações, pois é o único descendente varão. Sempre aparece um espírito de porco e comenta na frente das meninas que elas perderam a preferência. Justificativa: “ele é o único neto homem e por azar de vocês tem o nome do velho.” Briga formada da maioria esmagadora, contra o meu inocente xará.

A história do SEM FIM da professora termina em tradição. Exemplo recente. A nossa querida UFMT irá completar em dezembro quarenta anos de registro do seu nascimento. Pois bem. Para abrigar o seu aparato de trabalho foi construída, na segunda metade do século passado, uma cidade no então Distrito do Coxipó da Ponte, por sinal, moderníssima até hoje. Participei da compra do pedaço de uma chácara onde iria ser construída, e de todo o processo do desenho arquitetônico da futura Cidade Universitária, que abriga a sede da UFMT. É a única cidade que possui Teatro e não auditório, Biblioteca, Museus, Zoológico, Orquestra Sinfônica e Coral. Parque Aquático com dimensões oficiais, campo de futebol, Ginásio de Esportes para seis mil espectadores, pistas de atletismo. Restaurante para alunos, professores e técnicos administrativos. Núcleo de Documentação Histórica, os Cursos com os seus laboratórios e Casas para estudantes. Por motivos óbvios, fora dos limites da Cidade Universitária, a quarentona UFMT, é proprietária de um Hospital Universitário, útero dos cursos de saúde, que para orgulho da nossa população pariu e cria um dos mais conceituados cursos de Medicina do Brasil. Também por motivos técnicos essa moderna Cidade possui uma Fazenda Experimental, a poucos quilômetros da sua sede. Enfim, ela está como uma metástase benigna em todos os bairros de Cuiabá.

Mas a “Conversa SEM FIM” deixou filhos em Rondonópolis, Pontal do Araguaia, e óvulos fertilizados nos principais pólos de Mato Grosso. Em Aripuanã, uma cidade Científica - Cidade de Humboldt. Nas glebas de Cáceres as nossas impressões digitais. Sempre solidários dividimos a nossa pobreza do século passado com Rondônia e Acre. O Instituto Nacional de Pesquisas Amazônicas em Manaus era a nossa segunda casa. E por dois anos fomos os embaixadores utópicos do polígono de conhecimentos da Amazônia. Se implantado à época, impediria a quase destruição das nossas florestas.

Professora Valéria chama a minha atenção para concluir o trabalho, pois o curso continuará. Esta conversa foi para mostrar que pais não têm preferência por filhos. A beleza citada da nossa cidade universitária com a riqueza dos seus mestres, servidores técnicos e administrativos, a sua razão de existir que são seus alunos tem um símbolo escolhido pelo povo e imortalizado pela imprensa que é a voz do povo. A logomarca que o povo escolheu para identificar o seu arrimo foi o prédio da Biblioteca Central! Perdoe-me, como representante dos pais daquele sonho, eu amo o cerrado da Cidade Universitária, os animais do zoológico, a alma e o DNA de tudo aquilo que vejo e de tudo o que para mim representa.

A identificação da imprensa e comunidade com a beleza plástica da arquitetura da Biblioteca é tradição de uma CONVERSA SEM FIM.

Gabriel Novis Neves
24/06/2010

segunda-feira, 28 de junho de 2010

Casa de caboclo

O cancioneiro nacional nos ensina que “numa casa de caboclo, um é pouco, dois é bom, três é demais”. A aparente simplicidade dessa frase encerra uma gama de entendimentos para a vida real. Quando três ou mais pessoas reprovam recorrentemente certas atitudes nossas, alguma coisa está acontecendo. Provavelmente estamos errados e devemos corrigir os erros apontados. Na prática isso é difícil, ou quase impossível de acontecer, especialmente entre os poderosos.

Hoje pela manhã encontro casualmente com uma querida colega e paramos para bater uma rápida “prosinha”. Além de possuir todos os títulos acadêmicos, e ser professora concursada do curso de Medicina da nossa querida UFMT, ela é uma pessoa muito entendida em política. Neste mês de Copa do Mundo dois assuntos são obrigatórios na pauta dos brasileiros – Futebol e Política. Conversamos sobre a política no nosso estado. Absurdos, absurdos e mais absurdos, foi a nossa conclusão. “Como o senhor me explica que um político que promoveu um retrocesso institucional no estado, tenha tanta aprovação nas pesquisas?” - ela me pergunta, e a seguir emenda: “para certas pessoas que conheço este modelo administrativo, que ele diz ter implantado, é ultrapassado, e digno de um coronel do século XIX no poder.” Respondo que não há um fator determinante para tamanho insucesso e sim um conjunto deles. Cito dois que considero os mais importantes para esta falsa imagem: o desrespeito de compromissos assumidos com a população e não cumpridos, e a ausência da auto-estima da nossa população.

No recheio desse bolo, tudo o que é da pior qualidade é encontrado. Traições pessoais, políticas não republicanas sendo adotado como símbolo de modelo gerencial, desinteresse com o passado, o presente e o futuro da nossa gente. Basicamente estes foram os temas da conversa, entre o velho professor e a sua ex-aluna. Infelizmente tivemos que interromper a nossa “prosinha”, pois com tantos casos pra cá, casos pra lá, a “prosinha” já estava no caminho de se transformar num “papo sem fim”. Afinal, nos lembramos que somos trabalhadores, como a grande maioria do povo brasileiro, e temos que garantir o pão nosso de cada dia.

Marcamos um encontro para aprofundar o assunto em um dos feriados da Copa do Mundo, com pessoas da sua família, para evitar a monotonia de um simples diálogo. Voltando para casa fiquei matutando sobre a nossa inesperada conversa, assim como diante de uma catástrofe: como é que pode! “É extremamente fácil enganar a si mesmo, pois o homem geralmente acredita no que deseja.” - Demóstenes - Grego.

Gabriel Novis Neves
28/06/2010

domingo, 27 de junho de 2010

CUSPINDO PRA CIMA

A manobra política milionária que o Palácio Paiaguás está desenvolvendo com recursos públicos para inviabilizar uma candidatura que representa o novo, chega a assustar até os mais experientes políticos.

A população de Mato Grosso deseja mudanças. Nada de continuidade com o que não deu certo. Em 2002 o eleitor apostou no novo, que era velho, e se estrepou todo. Enganado e cansado da mesmice, elegeu o mais conservador governo da história da Nova República. Um fracasso em todos os setores, especialmente nos programas sociais. Com todo o poder, e sem oposição, não quis, ou não teve a competência ou sensibilidade para, pelo menos encaminhar os nossos principais e inadiáveis problemas. Houve um total desmanche das nossas conquistas. Deixou-nos como legado principal um paupérrimo quadro de sucessores.

Na falta de opções, uma das mais brilhantes ovelhas do rebanho dos utópicos foi o escolhido - pelos eternos sonhadores - como o seu representante. Tem uma tarefa difícil pela frente: desmistificar aquilo que é dito como realizado e não feito, e atender o que o povo implora. Com uma história de vida muito mais rica que a do herdeiro de uma fortuna, o destemido goiano-matogrossensse, aceitou deixar a tranqüilidade da sua vida e se oferecer como alternativa política. Tem enfrentado crises e mais crises para abandonar o projeto político que não é seu, mas daqueles que cansaram de esperar. Todos os dias é vítima de fuxicos. Não teve ainda tempo de apresentar as suas propostas ao grande herói silencioso – o senhor eleitor.

Este sofrimento dos utópicos tem um limite: 30 de junho. Viabilizada a candidatura da chamada terceira via, aqueles que no silêncio aguardam a escalação do time titular irão, não para as “arenas”, mas para as ruas mostrar ao povo que o seu desejo foi consolidado. Este bombardeio de poder e dinheiro em cima dos pequenos partidos políticos que dão sustentação as mudanças urgentes, tem um nome – a certeza da derrota.

Enquanto isso... Continuarão a cuspir para cima. Vou comprar todo o estoque de lenços do comércio, e no dia 1º de julho os doarei a todos que cuspiram para cima. Esqueceram daquele velho ditado popular: “Tudo que é lançado para cima cai.” A terceira via para a eleição de governador foi conseqüência do fiasco do governo anterior, que traiu todas as suas propostas de campanha, especialmente a transparência dos seus atos.

Cuspiram para cima, agora – as conseqüências.

Gabriel Novis Neves
23/06/2010

A moda pegou

Sou um velho apreciador do futebol arte. Da época dos ídolos forjados pela excelência do seu futebol. “Mata no peito, deixa a redonda escorrer pelo seu corpo, olha para os lados, dribla um, dois e faz um lançamento de 40 metros, colocando o companheiro na cara do gol.” Como era lindo o espetáculo de uma partida de futebol! Esses ídolos populares, que assinavam contratos em branco, dificilmente mudavam de time a não ser para servir à Seleção Brasileira.

Os jogadores brasileiros que jogavam no exterior não podiam ser convocados. Essa história terminou na Copa de 1974, em que a participação do Brasil com “estrangeiro” foi um desastre. Atualmente a seleção canarinho possui jogadores nascidos no Brasil, mas funcionários muito bem pagos pelas empresas de futebol estrangeiras. Existem dois tipos de jogadores, os craques de times e os de seleção. Todos os apaixonados pelo futebol logo identificarão o que estou dizendo.

O caso mais marcante dos últimos anos foi de um ídolo do clube mais popular do Brasil. No clube ganhou todos os títulos que um clube tem direito. Na Seleção Brasileira, em três Copas do Mundo que participou, nunca trouxe o caneco para casa. Na primeira convocação, foi “Campeão Moral”. Na segunda, participou da seleção que “encantou o mundo e perdeu a Copa”. Na sua última tentativa, deixou como recordação um pênalti perdido, que eliminou o Brasil. Sempre voltou das Copas com as mãos abanando. No clube continuava sendo um jogador fora de série. No final da carreira foi pegar uns dólares em clubes pequenos da Itália, onde não ganhou títulos. Depois encerrou a carreira de jogador em um clube japonês, de uma indústria de materiais eletrônicos. Voltou ao Brasil milionário. Alguém da CBF entendeu que ele era um exímio estrategista em futebol. Acompanha o vitorioso e velho Lobo à Copa da França, como auxiliar técnico. A sua maior contribuição para a façanha do vexame da seleção canarinho, foi o corte do nosso principal artilheiro – o Baixinho da Copa de 94, e a sugestão para o velho Lobo escalar um jogador, que acabara de ter alta hospitalar, com um diagnóstico não muito bem esclarecido. O resultado é lembrado por todos: Zidane 3X0 Brasil. Não é que na Copa do Japão ele foi técnico da seleção do Japão? Pobre dos “japonas”! – foram eliminados precocemente.

A seleção do Japão se classificou para continuar na Copa da África vencendo a favorita Dinamarca, pelo placar de 3X1, com dois gols em cobranças de falta. Sem que ninguém perguntasse, sabem o que disse o ex-técnico do Japão? “O mérito da vitoria do Japão era dele, que ensinou o japonês a cobrar faltas.”

Depois dessa, desliguei a televisão, com a certeza que a megalomania, tão em moda neste país, pega.

Gabriel Novis Neves
25/06/2010

sábado, 26 de junho de 2010

A VIDA REAL

Como dizia o Nelson Rodrigues, “há cinco mil anos estava escrito” que no século XXI eu iria morar no bairro e na quadra de metro quadrado mais caro de Cuiabá. Este Pobre Marquês, (direitos autorais da expressão para o Vila), tem uma vizinhança pra lá de importante, composta por altas personalidades da política nacional, representantes graduados das administrações públicas estaduais, municipais, federais e empresários bem sucedidos.

Médico é o profissional que melhor sabe administrar o tempo. Consegue no mesmo horário trabalhar em vários lugares com eficiência. Mas o médico é um péssimo administrador das suas finanças. As exceções existem, para confirmar a regra. Lembro-me de apenas dois médicos que sabiam cuidar de dinheiro: na República Velha, o médico homeopata Joaquim Murtinho, e na recente, o médico sanitarista Antonio Palocci. Ambos foram ministros da Fazenda do Brasil, e pasmem, com bons desempenhos.

O Brasil teve muitos planos econômicos fracassados, até que um sociólogo da USP criou o Plano Real que é “imexível”. Houve uma época em que os leigos, diante do confisco da poupança, foram aconselhados pelos entendidos em economia para investirem em apartamento. A receita era simples: comprar um apartamento no lançamento e vender na conclusão da obra. O lucro era certo. Tentei a experiência com um apartamento pequeno, e fui bem sucedido. Repeti a dose agora, comprando dois pequenos, resultado bom, apesar do lucro pequeno. Resolvi então comprar uma cobertura e faturar alto. Mas, os planos econômicos mudaram, e não consegui fazer negócio nenhum. Descobri que para a comercialização, os pequenos são os mais rentáveis. Fui obrigado então a vender o meu casarão do Porto para ficar com a gaiola.

Muito bem. Fiz esse preâmbulo para contar a seguinte história. A minha ajudante doméstica deixa o trabalho às 16 h. O ponto do ônibus fica praticamente em frente a uma clínica de grande movimento e de um prédio onde moram várias autoridades - a uma distância de menos de cinqüenta metros do meu edifício. Foi assaltada por um menino dependente de droga, conhecido como delinqüente por todos os porteiros deste pedaço e que nas horas vagas “trabalha como flanelinha” nas proximidades dos restaurantes mais grã-finos da cidade.

E ainda tem gente que pensa que a violência é um problema pontual, das áreas mais pobres da cidade. O crime em Cuiabá é metastático e já atingiu todos os bairros. Esse é o retrato da vida real na cidade do Senhor Bom Jesus de Cuiabá.

Orai por nós Senhor!

Gabriel Novis Neves
11/06/2010

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Democracia

Não ouvi pelo rádio o debate político, entre o Presidente de um partido político no estúdio de uma emissora de rádio com o seu candidato a candidato a governador, que o interrompeu pelo telefone. Também não fiquei sabendo de nada. Qual não foi, portanto a minha surpresa ao ler no jornal do grupo de comunicação do rádio, os pontos principais do entrevero. Nem o Nelson Rodrigues teria inspiração para escrever sobre o inusitado diálogo! A impressão causada em mim foi a melhor possível. Diferente de outros políticos, que no esconderijo jogam as suas mágoas para debaixo dos tapetes aveludados do poder, estufas da traição.

Há poucos dias a nossa guerreira Senadora fez o mesmo com o Presidente, sempre o Presidente, do seu partido. Chego até a acreditar que os tempos são outros. Ainda existem os coronéis na política, mas sem o poder imperial de outrora. Os dois correligionários do rádio falaram o que todo mundo já sabia. Até os mosquitinhos da dengue em seus passeios noturnos, comentavam o que ouviam das suas vítimas sobre esse Presidente também voador de partidos políticos. Tal mariposa procura sempre a lâmpada do poder. Muda de roupa com a maior facilidade, conforme a cor da luz produzida pela lâmpada mágica. Por longos anos usou roupas estampadas de tucanos, depois por pouco tempo mudou o estampado por estrelas vermelhas. Agora usa o uniforme das antigas ligas camponesas.

Democracia é assim que se pratica, mostrando ao eleitor aquilo que se passa entre as quatro paredes de uma reunião política. Opiniões divergentes entre membros do mesmo partido são salutares para a democracia. É uma forma pedagógica de esclarecer o eleitor, que precisa de informações as mais fidedignas possíveis, para votar consciente naqueles que irão decidir sobre o futuro do nosso país. Também é uma estratégia democrática para exterminar uma prática maligna da política que é a fofoca. Lembrei-me da época da universidade onde os embates eram duríssimos, alimentados pela juventude dos universitários. Também tudo acabava no debate, verdadeiros combates, sempre respeitando a vontade soberana da maioria.

Ninguém dessa geração passada guardou rancores em seus corações. Muito pelo contrário, me ensina meio século de vida acadêmica, como aluno, docente e reitor. Só fiz amigos na minha vida acadêmica. O mesmo não posso dizer da politicagem praticada, na política. No final da memorável divergência pública inédita em nosso estado houve um grande vitorioso, que foi a democracia, e claro, o eleitor. Quem saiu melhor na fotografia? Sinceramente não tenho conhecimentos técnicos para avaliar uma foto. Sei que existem detalhes que influenciam no seu resultado, como uma boa iluminação, a cor da camisa, o tipo de penteado e a expressão facial transmitida pela foto. Só o eleitor na solidão da cabine, diante da urna eletrônica, deixará no teclado o número do vencedor.

Assim funciona a democracia. Prato feito é atraso, meio caminho para se chegar à ditadura. O silêncio nesses momentos é covardia e traição. Vamos às divergências públicas candidatos do Brasil! Este país não suporta mais sujeiras debaixo dos tapetes e fofocas na versão moderna de dossiê.

Gabriel Novis Neves
09/06/2010

40 ANOS

Li uma notícia em uma coluna social das mais badaladas de Cuiabá, que “A Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) lança, nesta quinta-feira, as comemorações de seus 40 anos de história. Na ocasião, haverá palestra do pesquisador italiano Massimo Canevacci, e apresentação do quinteto de metais da Orquestra Sinfônica da instituição. A contribuição da universidade, em todas as atividades humanas, é de valor incalculável para este Estado.”

Nada mais justo que a nossa ex- Universidade da Selva traga da Europa tão ilustre personalidade para abrilhantar a abertura das homenagens da nossa querida agora UFMT – orgulho e arrimo do povo mato - grossense. Neste momento de retrospectiva histórica, em que os seus principais fundadores são apenas “saudades,” a decisão dos responsáveis pelos eventos foi acertada. Merecem aplausos e demonstra à sociedade do nosso estado e à comunidade acadêmica, a preocupação dos atuais dirigentes universitários em preservar o nosso passado.

É também uma forma elegante de desdizer o nosso maior historiador Estevão de Mendonça, que cunhou a imortal frase: “Morre para sempre quem morre em Cuiabá.” Pobre historiador! A maior casa de cultura, pesquisa e ensino do nosso estado modificou-a para: “Morre para sempre quem vive muito em Cuiabá.”

Fico pensando na velhice dos três principais fundadores da ex-Universidade da Selva (UNISELVA). Ainda bem que continuam jovens, porém alienados da história da UFMT. Mesmo assim lembro-me da aventura que foi erguer em pleno cerrado uma Universidade para o futuro, sem o ranço do passado. Três alunos da Escola Modelo Barão de Melgaço, foram os predestinados para transformar o antigo estado curral, em estado de oportunidades. Eles construíram a Universidade reconhecida internacionalmente e respeitada desde o seu nascimento. O modelo gerencial escolhido foi o colegiado, onde o mérito sempre foi a sua única moeda. Esses meninos contrariaram poderosos interesses de grupos. O compromisso deles, sempre foi com o coletivo, especialmente com os pobres habitantes da periferia do poder. Não traíram as suas origens de pais sem nível médio e superior, mas cidadãos honrados e de Ficha Limpa. Conheci os pais desses meninos, todos casados com mulheres de lides domésticas. Um era dono de bar. Outro pequeno comerciante de poaia. E o terceiro modesto fabricante de ladrilhos. Todos tinham além da honradez, o compromisso de educar os seus filhos, enfrentando todo o tipo de dificuldades. Dois desses meninos que sempre estudaram em escolas públicas são advogados. Fizeram concurso público para o Ministério Público Estadual. Ambos passaram em 1º lugar. O outro é médico, formado também em escola pública. O grande papel histórico do médico foi o de “desencaminhar” os colegas de infância da Escola Modelo para a grande aventura – implantar uma universidade pública federal na sua cidade. Muitos colaboraram, a maioria de origem humilde, participando dessa epopéia. Não citarei nomes, pois a lista é enorme.

Na minha juventude do crepúsculo da vida o esquecimento faz parte do cenário. Compreensível para os que insistem em acrescentar “vida nos seus dias.” Do céu poético onde vivo, estarei abraçado com os colegas do curso primário da Praça Ipiranga, comemorando em silêncio, o majestoso evento de abertura da nossa utopia juvenil – os 40 anos da UFMT!

Gabriel Novis Neves
21/06/2010

terça-feira, 22 de junho de 2010

SENTI FALTA

Ninguém duvida da existência de um ser superior - nosso Criador. Ele é conhecido no mundo com vários nomes. Deus para os católicos, protestantes, evangélicos, adventistas, espíritas, entre as inúmeras religiões do ocidente. Os muçulmanos, judeus, budistas, asiáticos, também acreditam num Criador, só que com outros nomes. Os nossos irmãos africanos, que tanto influíram na nossa cultura religiosa, possuem inúmeros deuses. Até os mais primitivos dos povos tinham os seus deuses, a quem temiam e veneravam. Os agnósticos ”acreditam” também, apesar de negarem o seu Deus.

Sou da cultura religiosa que chama o Criador de Deus. Que fez o mundo em seis dias, e no sétimo descansou com a sua obra concluída. Acredito no Deus do Bem, que tez a terra, os rios, os mares e oceanos. As florestas, desertos, cerrados, pântanos e geleiras. As montanhas, as serras e os picos mais altos do mundo. As flores, os espinhos. O céu, a lua, o sol, as estrelas, as nuvens. O frio, o calor, a chuva e a seca. As tempestades e a bonança. A vida no fundo dos oceanos, mares e rios. A vida na terra. Foi Deus que criou também, para habitar esta maravilha criada por ele, os seres racionais – que somos nós, e os irracionais. Todos somos filhos do mesmo Deus, destinados a perpetuar a vida na Terra.

Caminhando pela calçada da Avenida Miguel Sutil senti falta de alguma coisa. Mas, de quê? As calçadas da avenida continuavam as mesmas: imundas de detritos que o serviço público ausente tornou normal para a maioria dos animais racionais desta cidade, permutando com os terrenos baldios as suas sujeiras. Confesso que ao longo da caminhada o resultado da permuta ficou empatada.

Tudo parecia igual ao de sempre, mas eu não conseguia atinar o motivo da minha sensação de que algo estava diferente. Recorri então ao meu Deus pedindo uma luz para clarear o meu entendimento. Sei que ELE deve estar bastante ocupado com problemas mais graves do que a de um velho desmemoriado numa Avenida de Cuiabá. Mas, como fui ensinado que todo pedido feito a ELE não fica sem resposta, arrisquei. Após ter feito o pedido dei uma olhadinha para o céu, assim como para me desculpar por sobrecarregar o SEU trabalho com coisa tão pequena. E... Aconteceu! ELE de pronto me atendeu – assim penso eu. Não vi as propagandas vinculadas em enormes Front-lights que ficam no trajeto da minha caminhada. ELE me atendeu despertando a minha razão. Lembrei-me de uma lei obrigando a retirada dos enormes painéis de material de propaganda enganosa. A conduta da retirada daquele material ecologicamente incorreto do nosso visual foi uma medida salutar. O que não consigo entender, e desta vez não irei importunar o meu Deus, é porque não fizeram o trabalho completo de despoluição visual retirando os imensos postes de sustentação dos painéis dos Front-lights.

O canteiro central das avenidas foi construído, não com a única finalidade de separar as pistas de automóveis, mas também para plantar palmeiras, ou qualquer outra planta. Ficando como está, com as pesadas armações, dá a todos a impressão que a lei deixará de existir após as eleições. Bem que um amigo me disse outro dia, que a presença das armações dos Front-lights, sugere uma cova de cemitério com o caixão colocado na profundidade regimental sem terra por cima. Que é inexplicável é.

Daí o meu sentimento de falta, que permanecerá enquanto esses monstrinhos não forem retirados. Talvez as nossas autoridades estejam esperando a autorização da FIFA, que durante a COPA DO MUNDO, poderá utilizá-la para propaganda. A FIFA pode. Será que, com a poluição visual durante a COPA, não irei mais sentir falta, ao caminhar pela Avenida?

Gabriel Novis Neves
17/06/2010

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Sonhos

Para a criança tudo é sonho, imaginação e brincadeira. É o período em que a fantasia reina absoluta. Os contos de fada - onde o bem sempre vence o mal, fazem parte do brincar. É por excelência, o mais alegre e descontraído período da nossa vida. A criança, na sua pureza de sentimentos, desconhece os valores dos adultos: dinheiro, orgulho, ambição, competição, vaidade e tantos outros. O sinal mais forte de que já chegamos à fase adulta é quando paramos de fantasiar e brincar.

Na minha transição de criança para adulto, sonhei em ser médico. Nasci e fui educado em uma pequena cidade do interior do Brasil – Cuiabá. Conhecia todos os médicos da minha cidade, que em atividade, não chegavam a vinte. Observava o ambiente em que viviam e como exerciam a sua profissão: com dedicação, humanidade, desprendimento, e acima de tudo, solidariedade. Esses foram os ingredientes que me impulsionaram para a escolha de ser médico. Infelizmente os tempos agora são outros. Estou completando neste ano as minhas bodas de ouro como médico. Participei da transformação da medicina humanística e solidária, para a medicina tecnológica e de disputa de mercado. Aquele grupo pequeno e unido da minha infância faz parte da história da Medicina. Hoje temos grupos de médicos em disputas internas e externas pelo mercado. Nesta verdadeira guerra desaparecem a ética e a solidariedade, e impera a desunião. O motivo, na maioria das vezes, é oriundo de interesses pessoais.

Não queria abordar este tema, mas acho que devemos refletir sobre a união da classe médica, não no aspecto do saudosismo, mas visando resgatar os antigos valores da nossa profissão. Fui pesquisar a fonte de inspiração para um assunto tão polêmico. Acho que descobri! Anda lendo críticos, letristas da música popular brasileira e poetas. Só quem leu que “o sonho é o domingo do pensamento” coloca em discussão um tema politicamente incorreto para muitos. Os médicos devem voltar a ter sonhos como as crianças, e o tratamento é a união da classe.


Vou contrariar Luis de Camões no seu secular alerta: “coisas impossíveis, é melhor esquecê-las que desejá-las”. Mesmo assim, conclamo os colegas a se lembrarem de que o “desejo de ser curado, faz parte da cura”.

Gabriel Novis Neves
17/05/2010


* Publicado simultaneamente no http://www.gnn-cultura.blogspot.com/

domingo, 20 de junho de 2010

QUASE FIQUEI CEGO

Há poucas semanas escrevi um artigo sobre os perigos de se caminhar pelas ruas de Cuiabá. Citei os perigos básicos e fiz uma referência especial aos cães bravos. Santa ingenuidade a minha! Existem inúmeros outros perigos a que somos expostos, e que só são percebidos ao acaso, quando somos nós as vítimas.

Hoje, durante a minha habitual caminhada matinal me expus a um desses perigos. O fato aconteceu na reta final da caminhada. Vinha subindo sozinho pela ladeira de uma conhecida avenida de mão dupla, com muitos carros trafegando, quando aconteceu o imprevisto. Passava em frente a uma casa com proteção de grades de ferro justamente na hora em que um operário acionava a sua máquina de serra elétrica nas grades. Fagulhas de fogo por todo lado, claro. Vi-me envolvido por essa nuvem de fagulhas. Num ato reflexo paro. Levo as mãos ao rosto para proteger meus olhos. Evidentemente fiquei ansioso pelas eventuais consequências caso alguma fagulha tivesse alcançado os meus olhos. Mas, os meus óculos amenizaram uma possível tragédia.

Este fato, de usar óculos, me levou a uma reflexão. Só necessito de óculos para o conforto da leitura e escrita. Há oito anos tenho duas excelentes próteses oculares, substituindo os meus velhos cristalinos. Por que então uso óculos na caminhada? Nunca tinha pensado nisso. Hoje fiquei ainda mais convencido de que não existe causalidade. Tudo tem sua razão de ser.

Mas, vamos ao desdobramento do caso. O trabalhador assustado desliga a sua serra elétrica e vem ao meu encontro para saber como eu estava. Fiz um rápido auto-exame oftalmológico e fiquei tranqüilo com a possibilidade de uma lesão das córneas. As lentes desnecessárias que uso serviu de anteparo para uma lesão ocular que poderia ser grave. Senti apenas uma ligeira irritação nos olhos, semelhante aquela que sinto quando enfrento ventos fortes de frente. O trabalhador a tudo observava em silêncio. Antes de continuar a caminhada dirijo-me a ele para tranqüilizá-lo. Digo a ele que sou médico e que caminho todos os dias para “acrescentar vida nos meus dias”. Ele esboça um leve sorriso, meio sem entender o que eu disse, mas demonstra certa preocupação. Digo para não se preocupar comigo, pois estava tudo bem e ele não tinha a mínima culpa. Despeço-me fraternamente do meu novo amigo.

Este trabalhador foi mais vítima do que eu. A grande maioria dos trabalhadores deste país sofre pela incompetência, descaso e demagogia dos nossos políticos. Compram máquinas e esquecem-se dos homens que irão trabalhar com elas. Acontece com trabalhadores de todos os níveis escolares. Dos formados pelo sistema ‘S’, até pelas secretarias de casamentos e carnavais promovidos para idosos, apelidadas de secretarias sociais - que cuida da qualidade de vida do trabalhador. Nunca esquecendo que não estão salvos dessa tragédia social os privilegiados de diploma superior e com carteirinhas de pós- graduação.

Quando o nosso sistema educacional consegue qualificar alguém, o máximo que faz é formar bons técnicos. Não existe a preocupação com o lado humano do trabalhador. Preocupação no sentido de prepará-los adequadamente para que saibam evitar prováveis acidentes, tanto com eles como com os outros. Contudo o pior não é a falha na qualificação de um trabalhador: é a falta de oportunidade. Muitos aprendem por esforço próprio, por ausência gritante de programas sociais que atendam toda a demanda. O resultado? Eu poderia ter ficado, não digo cego, mas com graves problemas oculares.

Tudo isso me faz pensar que o termo do momento não é “falsos indicadores econômicos”, e sim “falta de humanismo”.

Gabriel Novis Neves
17/06/2010

Nova linguagem

Vivemos em pleno século do “novo”. Os nossos novos políticos são os mais antigos na atividade, só que em embalagens novas. O maior ladrão de terras públicas do Brasil, agora virou cidadão especial - no entender do maior político brasileiro e autor das duas citações. Os antigos terroristas são os atuais pais da pátria. Os velhos e novos ditadores mundiais são exemplos a serem seguidos. Os cientistas, pesquisadores e professores deste país do novo, humilhados com salários indignos. Os antigos parasitas dos cofres públicos são os nossos atuais estadistas. Até o nosso esporte mais popular - o futebol - tem também um linguajar novo. Os antigos amantes do futebol arte precisam agora de um intérprete para entender uma narração atual de um jogo do esporte favorito do povo brasileiro.

Esta semana em que o Brasil estreou contra a fortíssima Coréia do Norte, em que todos os seus jogadores são funcionários públicos do governo democrático e popular, recomendo a leitura de um artigo do Roberto Pompeu de Toledo. Ele fala do futebolês ao alcance de todos. É uma crítica inteligente sobre o novo linguajar utilizado pelos narradores e comentaristas de futebol. No seu artigo PomItálicopeu nos esclarece o significado de várias expressões. Irei citar algumas.

Segundo Pompeu, “caiu em desuso dizer que um time, ou um jogador é bom. Diz-se que tem qualidade. Qualidade é a palavra chave. É qualidade para cá, qualidade para lá.” Prosseguindo ele esclarece: “não vá o desavisado chamar estádio de “estádio”. É arena. Arena já foi partido político e local onde os gladiadores se estripavam, entre si ou de encontro às feras. Já estádio indica o local das exibições de ginástica e das provas olímpicas.”

Outras expressões são mais técnicas e exige do leigo redobrado empenho se deseja atualizar-se. “Assistência não é público na arquibancada, nem à necessidade de ambulância para socorrer algum ferido. Significa o último passe antes do chute em direção ao gol. Antigamente o Didi deixava o Garrincha “na cara do gol”. O Príncipe Negro fazia lançamentos de quarenta metros, e jamais aceitaria ser chamado de jogador-assistência. Valorizar a posse da bola era a velha “fazer cera”. Proposta de Jogo é a disposição que o time tem quando entra em campo. Chamar a si a responsabilidade é um elogio ao melhor jogador da partida. Observador técnico é o velho e manjado espião.

Finalizando o seu maravilhoso e esclarecedor artigo, Pompeu de Toledo também deu um novo conceito de Copa Do Mundo: “é um torneio dos times europeus recombinados, já que a maioria dos jogadores em campo joga lá.”

O exemplo vem de casa. Todos os jogadores que vestiram a camisa canarinho no dificílimo jogo contra os funcionários públicos da Coréia do Norte jogam em clubes europeus.

Isso é o novo. Deu para entender?

Gabriel Novis Neves
15/06/2010

sexta-feira, 18 de junho de 2010

HISTÓRIAS DE ELEIÇÕES

Na noite de 29/10/1945, José Linhares, então Presidente do Supremo Tribunal Federal, estava com a sua família em uma festa, quando foi chamado ao Ministério da Guerra. Sem desconfiar do motivo, em poucos minutos era recebido pelo General Góis Monteiro. Ficou então sabendo que seria empossado Presidente do Brasil às 14 horas do dia seguinte. O General alagoano esclareceu a José Linhares que Vargas tinha deixado o governo, dando por encerrada a Segunda República. Foi orientado que escolhesse os seus ministros, para um governo de 93 dias, de comum acordo com os dois candidatos principais – o General Dutra e o Brigadeiro Eduardo Gomes, e que apresentasse as indicações antes da posse para a aprovação dos dois candidatos.

Algumas horas depois o Presidente do Supremo aparece com a lista. Presentes à reunião, Dutra e o Brigadeiro. Ao ler os nomes escolhidos, o Brigadeiro balançou a cabeça afirmativamente concordando com todos os nomes. Dutra, porém não gostou nem um pouquinho. Era o próprio diretório da UDN, partido do Brigadeiro. Dutra era candidato do PSD. Ficou muito aborrecido e não concordou com a lista. Ainda mais que o seu colega do golpe de 1937 e 1945, o General Góis Monteiro, fiador da transição, não aceitava permanecer no Ministério da Guerra. A reunião terminou com a derrota do cuiabano Dutra. Este começa então um trabalho fantástico. Articulou para que nenhum general aceitasse o cargo de Ministro da Guerra. O primeiro da lista foi o general Canrobert. Diante da situação, permaneceu o amigo do Dutra no Ministério mais importante. Vargas auto exilou-se em São Borja, na sua fazenda do Rio Grande do Sul. Dutra não tinha carisma e iria perder as eleições. Precisava de uma palavra de apoio de Vargas, que permanecia mudo. Até que um líder paulista chamado Hugo Borghi, após inúmeras viagens a São Borja, consegue do ex-ditador a frase salvadora: “- Ele disse - vote em Dutra”. Vargas não gostava do Brigadeiro, e o derrotou duas vezes nas eleições presidenciais. O Brigadeiro deu o troco quando fundou a “República do Galeão”- para desmoralizar o Presidente em 1954, levando-o ao suicídio.

A frase “Ele disse” correu o Brasil, porém precisava de mais alguma coisa para o Dutra chegar à Presidência. Neste momento entra mais uma vez o Hugo Borghi. Ele manda confeccionar milhões de panfletos, e de teco-teco joga nas principais fábricas e indústrias, redutos de trabalhadores do Brasil. Foi o tiro de misericórdia na candidatura do Brigadeiro. O que dizia o panfleto? Apenas um fuxico, que até hoje ganha eleições: “O Brigadeiro é bonito, é solteiro e Não Quer Voto de Marmiteiro!” Dutra eleito com o “Ele Disse” e “Não quer voto de marmiteiro”, tomou posse como Presidente da República, no dia 31/01/1946 e instala a Terceira República que teve o seu final em 31/03/1964.

Na história das eleições, escritas pelos vencedores sempre existiram traições, mentiras, calúnias, difamações e dinheiro. Como bem diziam os antigos: sexo de criança e resultado de eleição só se sabe depois do acontecido. Hoje essa história vale como lembrança do passado. A ultrassonografia nos dá com precisão matemática o sexo das crianças. As pesquisas eleitorais, antes das convenções partidárias, indicam o vencedor do pleito. Só uma coisa não mudou: fofoca e dinheiro ganham eleições.

Gabriel Novis Neves
14/05/2010

Depois...

Os detentores do poder acham que estão acima do bem e do mal. Tudo para eles é permitido. Quando algumas lambanças por eles praticadas chegam ao conhecimento da opinião pública, é aquele Deus nos acuda. Lamentam-se e afirmam que estão sendo perseguidos, incompreendidos, vítimas de infâmias, inveja e preconceitos. Não sabem de nada, nunca ouviram sequer um comentário sobre assuntos não éticos divulgados, e continuam na santa paz as suas vidas.

Sei que é difícil ser político no país da impunidade dos poderosos. Para se conseguir uma sombra protetora – na política todos tem donos - o candidato a fazer carreira nessa difícil profissão, é obrigado a abrir mão de todos os seus valores éticos e morais. É a regra da política nas republiquetas disseminadas pelo mundo. Se assim não fosse, como aceitar dinheiro na cueca, na meia, na bolsa, nos paraísos fiscais, nas mãos do governador? Como canonizar políticos que não fizeram outra coisa a não ser roubar terras, dinheiro da merenda escolar, dos medicamentos e das estatais?

A justiça não tem o poder de prender, mas não consegue julgar os poderosos. As contas dos poderosos são julgadas por ocupantes de cargos geralmente comprados com dinheiro público, com aval do executivo. O último nomeado, dizem, que custou aos cofres públicos cinco milhões de reais. Dessa maneira os detentores do poder formaram uma tribo unida e fortíssima, para se transformarem em pessoas acima do bem e do mal.

O que dizer da próxima eleição presidencial, cuja candidata chegou a um partido democrático onde tudo era resolvido pelo resultado das divergências? O atual presidente mesmo com boa avaliação no seu primeiro mandato teve que enfrentar um adversário na convenção partidária. E agora o que ele fez? Há um ano escolheu, sem ouvir o seu partido, a sua candidata à Presidência da República. Pronto. Escolheu, tá escolhido e os membros do partido ficaram calados. Todos engoliram este fato inédito entre eles.

Assim agem os detentores do poder. Depois...

Gabriel Novis Neves
04/06/2010

quarta-feira, 16 de junho de 2010

CONVERSA DE BAR

Fui criado no bar do meu pai, o Bar do Bugre. Perambulando por ali escutava as conversas dos freqüentadores - escutava e admirava. Tinha razões para isso, pois a nata da intelectualidade da época era freqüentadora assídua do bar. Juízes, desembargadores, promotores de justiça, políticos famosos, historiadores, poetas, jornalistas, profissionais liberais, professores, acadêmicos, músicos, compositores, leitores de mãos para desvendar o futuro, mágicos, e até o padre secretário-particular de Dom Aquino Corrêa. Os mais variados assuntos eram ali comentados e discutidos, com especial destaque à política. Discutia-se, sempre de forma muita acirrada, a política e os políticos da época, assim também como a política e os políticos de priscas eras.

Pois bem, fui para o Rio de Janeiro estudar Medicina. Terminados os estudos, voltei e iniciei minha carreira profissional. Atuei na Medicina, educação e política. Mas, não é esse o foco desse texto. O que quero deixar hoje aqui registrado é que, apesar do longo tempo decorrido entre a minha meninice no Bar do Bugre até os dias de hoje, ainda tenho guardadas na minha memória certas conversas ouvidas naqueles anos longínquos. E, hoje, enojado da bagunça nacional, recordo-me de uma delas contada por um ilustre professor – O Sermão do Bom Ladrão, pregado pelo Padre Antonio Vieira, em 1655. Vou transcrever um trecho do sermão, atualíssimo, apesar de ter sido escrito há mais de dois séculos.

“Navegava Alexandre em uma poderosa armada pelo Mar Eritreu a conquistar a Índia, e como fosse trazido à sua presença um pirata que por ali andava roubando os pescadores, repreendeu-o muito Alexandre de andar em tão mau ofício; porém, ele, que não era medroso nem lerdo, respondeu assim. — Basta, senhor, que eu, porque roubo em uma barca, sou ladrão, e vós, porque roubais em uma armada, sois imperador? — Assim é. O roubar pouco é culpa, o roubar muito é grandeza; o roubar com pouco poder faz os piratas, o roubar com muito, os Alexandres. O ladrão que furta para comer, não vai nem leva ao inferno. Os ladrões que eu trato, são os ladrões de maior calibre e de mais alta esfera... os quais debaixo do mesmo nome e do mesmo predicamento distingue muito bem São Basílio Magno. Não são só ladrões, diz o Santo Basílio, os que cortam bolsas, ou espreitam os que vão se banhar, para lhes colher a roupa: os ladrões verdadeiros são aqueles a quem os reis encomendam os exércitos e legiões, ou o governo das províncias, ou a administração das cidades, os quais já com a manha, já com força, ROUBAM E DESPOJAM OS POVOS. Os outros ladrões roubam um homem, estes roubam cidades e reinos; os outros furtam debaixo do seu risco, estes sem temor nem perigo; os outros, se furtam, são enforcados; estes furtam e enforcam...”

Bem atual não é mesmo? Um sermão que não sai de moda e que se identifica muito com a promiscuidade política que vivemos hoje. Tristemente deduzo que não é de hoje que o povo sofre as mesmas chagas da ganância e das inescrupulosas atitudes de nossos governantes. Será sempre assim? Será que daqui a três séculos este Sermão ainda estará atual? Sim, será atual, caso não trabalhemos urgentemente para engrandecer e fortalecer o caráter e os valores morais das gerações que estão por vir.

Gabriel Novis Neves
14/06/2010

terça-feira, 15 de junho de 2010

Noite movimentada

É noite de sábado. Debruçado na janela da minha varanda observo a cidade toda iluminada. O céu, sem uma nuvem, está todo estrelado. A lua, preguiçosa, está atrasada, ainda não apareceu. Nas ruas, percebo um movimento incomum de automóveis. Muitos carros trafegando. Estranho um pouco, pois geralmente aos sábados nesse horário quase não se nota carros transitando. Muitas pessoas, ou já tomaram o rumo para a Chapada, Manso, Pantanal, chácaras, ou estão em casa assistindo televisão, recebendo amigos, ouvindo uma boa música, ou simplesmente fazendo nada, só curtindo o sábado, assim como eu, debruçado na janela da minha varanda.

Contemplando a cidade nessa agitação de carros indo e vindo, fico a imaginar o motivo: “O que será que houve?” - pergunto a mim mesmo. Deixo a janela com esta indagação martelando na minha cabeça. Sou curioso sim, principalmente com as coisas da minha cidade. Passo pelo meu jardim e observo minhas roseiras. As rosas não falam - como bem nos disse Cartola - mas sinto o cheiro delicioso exalado por elas. As rosas me fizeram lembrar também de Heliophar que disse que as flores são como poesia: não murcham, não fenecem e não morrem.

Depois dessas divagações, vou para a minha “sala de parto” - meu cantinho predileto da casa – onde nascem os meus textos. Ligo para alguns amigos para comentar sobre o frango que o goleiro da Inglaterra jantou nesta noite. Os que atenderam ao meu chamado estavam, ou de saída para levar os netinhos para a festa junina no colégio, ou para jantar fora com a namorada, noiva ou esposa para comemorar o Dia dos Namorados. Ah, por fim a resposta que procurava: o movimento incomum dos carros era devido às festas juninas de várias escolas e ao Dia dos Namorados.

Da “sala de parto” começo a ouvir o pipocar de fogos. Vou até a janela olhar. Em vários pontos da cidade assisto e escuto o show dos fogos de artifício. Misturado ao som agradável dos fogos, a luminosidade de um avião de carreira, que passa sempre por cima da minha cabeça para o procedimento final do pouso.

Logo após os fogos eu escuto a voz de um animado locutor, com som nas grimpas, convocando a criançada, ou adultos, para as danças da quadrilha, e outras típicas da festa caipira. Agora escuto as músicas. Músicas tradicionais juninas, e também as regionais – o rasqueado. Coisa bonita de se ouvir sô! Fico só imaginando a festa. Bandeirolas de papel multicoloridas se cruzando pelos ares, balões, palha de coqueiro e bambu enfeitam o local da festa. Barraquinhas de pescaria, bebidas e comidas. A bebida tradicional é o quentão. Comida é paçoca de pilão, mandioca cozida, milho assado, espetinho de carne, arroz branco com galinha caipira, canjica e pamonha, tudo com muita fartura. Churrasco com farinha de Mimoso. Refrigerante é de suco de frutas da região. A fogueira não pode faltar, assim como o mastro e a bandeira do Santo. A roupa das muié tem que ser de chita estampada com flores e chapéu de paia, e a cara pintada com exagero. Os homi usam camisa quadriculada, carça apertada remendada com panos coloridos e um pouco abaixo do joelho, chapéu de paia, bigode pintado de preto. Todos vestidos à moda caipira. Tem leilão, pau de sebo e bingo. A música não para de tocar. Em algumas festas tem até show com cantores regionais. O povão dança e pula fogueira.

E o Dia dos Namorados? Os amantes demonstram o seu amor com presentes, dos mais caros aos mais simples. Tudo é válido no amor! “Que ele seja infinito enquanto dure”. Só a poesia é infinita, esta não morre nunca.

Fecho a janela da “sala de parto” porque a brisa está gelada e a crônica acabou. As festas lá fora continuam. A criançada está feliz, os namorados estão felizes, e eu vou dormir feliz, com a energia da felicidade pairando no ar.

Gabriel Novis Neves
12/06/2010

CONTRADIÇÕES

Existem pessoas que exercem cargos importantes e conseguem transformá-los em cargos sem a mínima importância. Outras transformam cargos sem grande importância em prioritários.

Como exemplo recente, sem medo de errar, eu lembro o Ministério do Meio Ambiente, o mais importante do Brasil, mas sempre ocupado por políticos profissionais. Era um Ministério ocupado por representantes do loteamento do poder, e o grande responsável pela implicância dos países do primeiro mundo conosco. Bastou a Marina Silva assumir o ministério, para transformá-lo no mais importante do Brasil, e respeitado pelo mundo civilizado do planeta, onde é reconhecida e admirada como o próprio meio ambiente. Deixou o cargo por pressões políticas. Estava defendendo a natureza, mas prejudicando poderosos empresários do agronegócio. Os resultados dessa política todos conhecem. São divulgados diariamente pela mídia nacional e internacional, em capítulos de uma novela sem fim.

No Dia Internacional do Meio Ambiente a programação do noticiário televisivo é interrompida, e aparece a imagem de uma senhora totalmente desconhecida para a maioria absoluta do povo brasileiro. Pensei logo em pane na minha televisão. Só fiquei sabendo que era substituta da Marina pela legenda colocada abaixo da sua imagem, pela leitura da mensagem oficial sobre a data, e os nossos compromissos. Claro que ninguém acreditou no que ouviu da funcionária do poder! O Ministério sem a Marina ficou quase invisível, só é encontrado com lupa e com os escândalos.

Pobre Brasil que não sabe reconhecer os seus próprios filhos! Onde falar que estudo é considerado coisa de imbecil, e não utilizar a Lei do Gerson é característica de atrasado. De gente que ainda não percebeu que o mundo agora é dos espertos. Todos querem tirar proveito de tudo, é a lei criada pela civilização moderna, contaminando todos os grupos sociais.

Como reclamam que só apresento propositalmente problema e não solução, eu farei uma concessão neste caso. A única solução possível para esse quadro será uma bárbara revolução – pela educação. Não vejo outra saída. Com a palavra o revolucionário, que é o eleitor. Se as coisas continuarem como estão, os únicos culpados seremos nós que, consciente ou inconscientemente erramos o tiro, digo o voto. Basta de contradições.

Gabriel Novis Neves
06/06/2010

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Minha formação acadêmica

Não possuo o curso superior de jornalismo e para não trabalhar na clandestinidade, com o atestado do professor Rubem Alves (Teólogo e Psicanalista) sobre a minha saúde mental, resolvi estudar em casa, para evitar o vestibular do ENEM. Contratei três perfis de professores: formação básica, consultoria e ensino a distância. Como sou defensor da transparência em meus atos, citarei os seus nomes e respectivos endereços.

A) Ensino básico

Prof. Vila
Pioneirismo, humor, música sertaneja, dietas especiais para os enfermos.
WWW.supersitegood.com

Profª. Valérinha
Cinema, carnaval, noções da função de porta-estandarte de escola de samba.
WWW.nogargalo.blogspot.com

Profª. Adriana
Música erudita e como escrever longe da censura.
WWW.prosaepolitica.com.br

Prof. Enock
A arte do contraditório, movimentos sociais e censura.
WWW.paginadoenock.com.br

Profª. Cristina
A arte do PPS (não confundir com o partido político), funcionária concursada do Bar do Bugre.

Prof. João
Direito penal e o risco da profissão. Proprietário dos:
WWW.bar-do-bugre.blogspot.com
WWW.gnn-cultura.blogspot.com

B) Consultores:

Prof. Coutinho
Com o olhar direto
WWW.olhardireto.com.br

Prof. Ramon
Aulas de inglês
WWW.midianews.com.br

Prof. Fernando
Como freqüentar a alta sociedade
WWW.fernandobaracat.com.br


Prof. Everton
Reflexões sobre frases imortais e tudo sobre o Botafogo.
WWW.pnbonline.com.br

Prof. Cláudio e Valdomiro
Atenção com o documento
WWW.odocumento.com.br

Prof. Juacy
Justiça e solidariedade.
WWW.justicaesolidariedade.com.br

Profª. Marta
Cá entre nós e segredos.
WWW.martha-caentrenos.blogspot.com

Prof. Arnaldo e Trindade
A importância do horário na profissão.
WWW.24horasnews.com.br

Profª. Kéka
Novidades acadêmicas e sindicais
adufmat@terra.com.br

Prof. Luiz e Neila
A história da imprensa de Cuyabá.
WWW.aimprensadecuiaba.com.br

Profª. Fernanda
A história do Jota Maia.
WWW.jornalcorreiodasemana.com.br

Profª. Tânia
Como escrever para o cuiabano.
WWW.diariodecuiaba.com.br

Profª. Márcia
Como entrar no circuito.
WWW.circuitomt.com.br
portal@circuito.com.br

Profª. Margareth
Certeza de revisão do texto e disciplina com o número de caracteres.
WWW.gazetadigital.com.br

Prof. Robson
Notícias do pantanal-sul.
WWW.opantaneiro.com.br

C) Ensino a distância:

Os meus professores e professoras solicitaram a omissão dos seus nomes e endereços. Motivo: não há vagas nos próximos 10 anos.

Meus agradecimentos aos meus mestres, que muito me ajudam na arte da comunicação, um dos três prazeres fundamentais do ser humano.

Gabriel Novis Neves
13/06/2010

domingo, 13 de junho de 2010

ABOBRINHAS

O tempo no mundo político está tão cheio de nuvens escuras, que o melhor mesmo é falar abobrinhas. O tema não é nada original, mas, com certeza sofri influência dos meus ídolos do jornalismo nessa escolha.

O meu catedrático diariamente me brinda com uma receita de culinária politicamente correta. Isso me ajudou muito no tratamento para eliminar meu excesso de banha. Muitas vezes o rigoroso catedrático chega ao limite de atingir o prazer mais importante da nossa vida, que é comer bastante – e encher a barriga com sólidos e líquidos (da redondinha).

A minha professora de samba no pé, e porta estandarte do clube do meu catedrático, publica as práticas não éticas do Celito e a imbecilidade irritante do Sandrão. É pura provocação para que eu fure a minha dieta com um super sorvete.

A minha orientadora de música clássica, substituta, por mérito, do meu saudoso colega de tempos de academia Paulo Alberto, conhecido como Artur da Távola, insiste no meu aprendizado em música clássica no final da semana, publicando as imortais sinfonias.

O meu mestre - cujo prazer maior é o contraditório, e participação em movimentos sociais - cisma em me ensinar a verdadeira música popular brasileira, e publica sempre músicas que são também as prediletas do meu professor catedrático.

Todos os meus mestres acima citados têm um ponto em comum: querem, porque querem, além de acharem necessário, me transmitirem certos truques para que eu não adquira novos inimigos, e saber administrar aqueles que eu já tenho.

Deixei para o final a minha sócia cultural (!). Final de semana só fala em PPS – não confundir com o partido político. Quer que eu aprenda esta nova forma de comunicação. Gosto e muito dos PPS, que possui a magia de transformar um texto medíocre em poesia. Mas com a minha idade está difícil aprender alguma coisa nova. Até aula de formatação a danada me deu no domingo passado na hora do jogo Botafogo X Time do Gordo!

É isso então! Nesse final da semana de jogos da Copa do Mundo, abobrinhas verdes e amarelas para vocês.

Gabriel Novis Neves
11/06/2010

sábado, 12 de junho de 2010

Fatalidade

Não acredito em coincidência, azar ou sorte. Acredito sim na fatalidade. Da imutabilidade do destino ninguém escapa. Triste, dolorosa e cruel, todos somos sujeitos a ela - independe de raça, religião, ideologia política, idade, sexo, rico ou pobre, atleta ou deficiente, poderoso ou não, benemérito ou bandido.

A fatalidade, mais uma vez, alcançou o nosso estimado Nélson Mandela – laureado com o Prêmio Nobel da Paz em 1993. Bravo combatente pela justiça social. O negro que por longos anos amargou uma cela de prisão para negros. Um batalhador para que todos os cidadãos fossem iguais e tivessem os mesmos direitos e oportunidades. A cor da pele da sua gente jamais poderia servir de punição. Estou falando superficialmente sobre uma das maiores personalidades do mundo contemporâneo, pois Nelson Mandela dispensa maiores louvores.

Mesmo com as limitações impostas pela idade, o nosso Mito do Bem estaria, no dia 10 de junho, compartilhando com seu povo da alegria de ver a festa mundial da paixão dos povos: a Copa do Mundo no Continente Africano, que ele ajudou a libertar. A fatalidade, entretanto desta vez se abateu sobre um membro querido da sua família. A morte por acidente sempre é uma morte violenta, inesperada e incompreensível. Ainda mais quando a vítima é uma criança de apenas 13 anos, bisneta do negro da paz. A África chora. O mundo chora. Eu chorei diante dessa fatalidade. A Copa da África não será mais a mesma. Não há lugar para alegria diante da fatalidade que deixou triste o inigualável e único responsável pela festa mundial de confraternização dos povos pelo esporte-rei. Beijos, Nelson Mandela.

Gabriel Novis Neves
11/06/2010

sexta-feira, 11 de junho de 2010

O PECADOR

Quem sou eu para atirar a primeira pedra? Pecadores? Todos nós somos, entretanto não freqüento a escola cujo professor de religião é um pecador contumaz. Na minha casa aprendi que o melhor professor é aquele que ensina o que faz, e a melhor pedagogia é a do exemplo.

Vivemos um momento em que a maioria dos homens faz o que diz condenar. Essa contradição é gritante na política, mas também a encontramos em outras áreas, só que em menor escala.

Esta semana vejo a foto da governadora do estado com o menor índice de qualidade de vida do Brasil, vestindo uma camiseta de um partido que sempre a combateu. Vale tudo para tentar o seu tetra mandato para governadora do pobre estado, e que tem dono. O seu professor é pós-doutor em dizer o que não faz. Como o poder corrompe os fracos de caráter! Também pudera! Com certeza essa moça do nordeste não recebeu os ensinamentos básicos de como identificar um bom professor. Ou se aprendeu, já desaprendeu, em nome de cobiças inconfessáveis.

A falência da educação não é privilégio somente daquele pequeno pedaço do território nacional. Em todo o Brasil a educação caseira, familiar, praticamente não existe mais. Com o empobrecimento da população todos os membros de uma família, aptos para o trabalho, vão à busca do pão de cada dia. Cansados, após um dia de estafante trabalho, não lhes sobram ânimo para dar atenção às crianças. Estas então ficam à mercê da única educação possível: a da escola pública. Dupla calamidade: sem orientação familiar e praticamente sem instrução escolar. O resultado está aí: um país cada dia mais desigual e incompreensível.

Vejam o trabalho de casa que recebemos. Escolher os nomes dos nossos melhores representantes para governar o Brasil nos próximos anos. Temos que pegar um mapa, ou melhor, um álbum com jogadores de todos os países que participarão da copa, como tem o meu neto para preenchê-lo, e comentar sobre as qualidades e fraquezas de cada um. O meu neto xará comenta com detalhe sobre os jogadores da África e Ásia. E se o álbum fosse dos candidatos que governarão o Brasil? Conseguiríamos pelo menos identificar, e comentar sobre os futuros governadores e congressistas? Nenhuma criança, e muitos adultos, abortariam de saída essa brincadeira cívica, o que é muito preocupante.

O Dunga trocou os craques da seleção por jogadores, que no dizer do nosso técnico, “amam o nosso país”. O que falar dos políticos? Os craques foram substituídos exatamente por aqueles, que de um modo geral, não amam o Brasil, e sim os seus interesses. São desanimadores os nomes que nos são apresentados! Geralmente são mais conhecidos nas páginas policiais, que nos editoriais sobre o seu trabalho em benefício da nação. Os comentários sobre os bandidos sem representatividade ocupam mais espaços na mídia do que os fabricantes de escândalos públicos.

Estamos em um beco sem saída, para a alegria dos profissionais do poder. Mais uma vez os pecadores assumirão o poder.

Gabriel Novis Neves
25/05/2010

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Copa do Mundo

Acompanhei todas as Copas a partir de 1950. As primeiras pelo rádio. Foram as mais lindas – filhas das nossas fantasias. Depois surgiu o VT. A gente assistia então aos jogos do Chile pela televisão, só que na noite do dia seguinte ao jogo, no Rio de Janeiro. Mas, a Copa de 1970, apesar de ver a transmissão do jogo pelo VT, passou aqui em Cuiabá na mesma noite do jogo realizado. Tudo em preto e branco, gravada em Campo-Grande que recebia o sinal direto do México, via São Paulo. A diferença de fuso horário nos favorecia para as emoções da noite. Quem transportava o VT era o Eli, piloto do avião da Cemat. A ordem para a missão era do governador do estado, torcedor do Botafogo.

Hoje, graças à alta tecnologia das transmissões, eu prefiro assistir aos jogos pela televisão a ir ao estádio.

Em 1950, por ocasião da inauguração do Maracanã, acompanhei aquele fatídico jogo pelo rádio – que chiava muito. A transmissão foi da Rádio Nacional do Rio de Janeiro. Os locutores eram Antonio Cordeiro e Jorge Cury. Em campo o Luis Alberto. Na retaguarda, tenho a impressão, que era o eterno Léo Batista. Claro que não acreditei na nossa derrota! Fiquei triste, mas do fundo do coração acho que foi uma lição para o nosso treinador. Ele era técnico do nosso arquiinimigo, o Clube de Regatas Vasco da Gama, e escalou o seu time para a Copa, com três ou quatro jogadores de outros clubes. Na convocação trouxe todo o time cruzmaltino, e uns reservas do clube!

Naquela época o Nilton Santos estava no apogeu da sua carreira. Acabara de conquistar o Campeonato Carioca em 1948. Nilton jogava nas duas laterais. Em São Paulo, no jogo contra a Suíça, que naquela época só entendia de relógios, o técnico escalou um tal de Alfredo, do Vasco, na lateral esquerda. Resultado do Pacaembu: 2X2. Nos outros jogos, inclusive na decisão do Maracanã, no dia 16/07/1950, o lateral direito era um membro da Polícia Especial que jogava no Vasco. E o Nilton Santos? No banco! Por onde surgiu o gol uruguaio, que calou 200 mil torcedores no Maracanã? Exatamente pelo lugar que de direito pertencia ao jogador do banco, Nilton Santos. Muita coincidência, e que mostra quanto custa uma birra do treinador.

Todas as vezes que o treinador não ouve o povo o desastre é quase sempre mostrado no resultado. Em 1954 o Garrincha jogava o fino do futebol arte. Por capricho do treinador, nem convocado foi. Levou o Maurinho. Alguém sabe quem foi esse atleta? Coutinho não levou o Falcão para a Copa da Argentina. Ganhamos o título de Campeões Morais dessa Copa. Inteligente foi o Parreira, que não suportava o Romário, mas atendeu o clamor popular e o convocou. Ele foi eleito o melhor jogador da Copa e o Brasil Tetra nos Estados Unidos.

O que comentar sobre o pavor do Dunga pelo craque? Vamos ter que pagar para ver, e desejar boa sorte aos jogadores convocados, que não são culpados pela birra do treinador.

Gabriel Novis Neves
31/05/2010

quarta-feira, 9 de junho de 2010

O TRANSFORMISTA

Hoje a arte dos transformistas é uma das mais valorizadas no mercado de diversões no Brasil – exige do artista um grande talento. A apresentação de um bom transformista, seja em teatro, casa noturna, filme, e até mesmo em novela, é sucesso garantido de público.

Temos uma infinidade incrível de pessoas exercendo essa arte. Sou apreciador de toda manifestação de arte. Mas, há uma categoria de transformistas que realmente abomino. É aquela em que seus integrantes se empenham, não em se autotransformarem, mas sim em transformar os outros. Nesta categoria podemos incluir, sem medo de errar, alguns políticos. Sim, alguns políticos são verdadeiros transformistas. Conseguem transformar o bem em mal, e o mal em bem!

Fatos recentes nos mostram esse criativo trabalho. A população lembra-se de Dezembro de 2002 com certeza. O único bandido “organizado” do estado foi preso após meses de perseguição numa operação da Polícia Federal, cumprindo a uma determinação da Justiça Federal. Algemado, filmado e fotografado à vontade, foi colocado na ala estratégica de segurança máxima do presídio Pascoal Ramos em Cuiabá. Estava terminado o reinado do poderoso Comendador, título outorgado em sessão solene pela nossa Câmara Municipal. Chefe do crime organizado era muito paparicado pela nossa sociedade e especialmente pelos políticos, que jamais suspeitaram de algum erro de conduta do seu Comendador. Era uma honra receber um convite do grande benemérito para um jantar, ou uma viagem à Miami no seu moderníssimo jato, com autonomia de vôo – Cuiabá-Miami.

O Promotor Federal que ofereceu a denúncia contra o Comendador foi o Pedro Taques, e o Juiz Federal que acatou a denúncia e tomou as providências mandando a Polícia Federal desbaratar o esquema criminoso, foi o Julier. Foram transformados em heróis da pátria pela população do estado, e num ato de traição ao Comendador até pelos nossos políticos – seus amigos.

Vejam agora o que os transformistas estão tentando fazer com Pedro Taques e Julier. Apoiado por 16 lideranças políticas, um deputado federal ingressou com uma representação, junto ao Conselho Nacional de Justiça e ao Ministério Público Federal, contra Julier e mais três Procuradores Federais. Ficou fora da lista o ex-Procurador Federal, por ter pedido demissão do seu cargo vitalício, conseguido através de concurso. O Pedro Taques foi reconhecido pelos políticos como o Chefe da Quadrilha dos Magistrados citados na queixa ao CNJ e CNMP. O motivo da briga com os antigos heróis teve como causa a Operação Jurupari. Vale à pena consultar os nomes dos assinantes da representação, onde todos mostram as suas caras, misturando-se no mesmo saco, como farinha. Será que irão transformar Pedro Taques e Julier em bandidos, para o show das eleições? Esses transformistas são mesmo muito criativos!

Gabriel Novis Neves
03/06/2010

terça-feira, 8 de junho de 2010

Metralhadora verbal

Em recente artigo falei que crocodilo não chora, e expliquei o mecanismo das suas lágrimas – as famosas “lágrimas de crocodilo”, aquelas que rolam pelo rosto, mas o coração nem sabe. Iguaiszinhas aquelas que presenciamos dias atrás nos rostos de algumas autoridades que deixavam o poder, assim como pelas que entravam. Foi uma choradeira nacional! Entretanto, não basta chorar: o “chorador” tem que demonstrar emoção.

Outro dia assisti pela televisão um choro, ou melhor, assisti a um arremedo de choro, as tais lágrimas de crocodilo. Desta feita o caso ocorreu em Brasília. Não me contive – fui às gargalhadas. Difícil acreditar na sinceridade daquele choro. A pessoa que chorava, foi preparada para não chorar - acho que até mesmo diante da morte. A idade pode produzir degeneração cerebral, comprometendo assim a parte afetiva levando, às vezes, as pessoas à labilidade emocional. Assim sendo...

Hoje ouvi pelo rádio uma entrevista super interessante com uma autoridade de Cuiabá. O que me chamou a atenção na entrevista foi a velocidade com que essa autoridade respondia as perguntas do jornalista. Em poucos minutos, o tempo exato do programa, ela conseguiu resolver todos os problemas centenários de Cuiabá. Tenho a impressão que tinha um chip implantado em seu cérebro. Mal o jornalista terminava a pergunta e lá vinha a resposta na ponta da língua. E, de tão pronta, as palavras saíam tal qual uma rajada de metralhadora. E quanta eficiência! E ainda se colocou à disposição de todos para resolver qualquer problema. Tudo enganação! As palavras fluíam sem a mínima emoção. Se eu por acaso, um dia, precisar de tais serviços, agradecerei comovido, mas, para não me aborrecer, passarei bem longe “daquilo”. Tudo o que não foi realizado em quase uma década, será realizado “semana que vem”. Milagres do ano eleitoral!

Toda autoridade que vai à Brasília consegue milhões de reais e resolvem, como num passe de mágica, os problemas pendentes na agenda de trabalho. Só para refrescar a memória: o novo Hospital Universitário da estrada de Santo Antônio está quase pronto; os recursos conseguidos para a conclusão do Hospital de Várzea-Grande permitiram o seu funcionamento desafogando Cuiabá; o velho Hospital Universitário Julio Muller (HUJM) está funcionando a todo o vapor, pois os nossos representantes em Brasília, não deixaram cortar as horas extras dos seus funcionários e professores. E por aí segue a fantasia que querem nos vender de um falso prestígio. Prestígio, na verdade, tem os trabalhadores de Mato Grosso que fazem com honestidade o seu trabalho, e pagando escorchantes impostos mantém, a duras penas, o desenvolvimento deste estado - recebendo muito pouco do governo como contrapartida. Não temos educação, saúde, segurança, infra - estrutura e políticas sociais. É um perigo a metralhadora verbal!

“As pessoas que falam muito, mentem sempre, porque acabam esgotando seu estoque de verdades” –
Millôr Fernandes

Gabriel Novis Neves
09/04/2010

segunda-feira, 7 de junho de 2010

A LEI DO NADA

No Brasil existe essa mania de transformar coisas sérias em nada e nada em coisas sérias. Veja o recente episódio do Projeto Ficha Limpa. Esse Projeto nasceu nas ruas, numa demonstração clara e inequívoca do desespero dos brasileiros diante de tanta impunidade. Cerca de dois milhões de pessoas assinaram o documento. Pessoas que ainda não tinham perdido a esperança por uma Nação sem corrupção. O Projeto Ficha Limpa foi então encaminhado ao Congresso Nacional, e lá começou a sua lenta peregrinação.

Finalmente, após calorosas e polêmicas discussões, o Projeto foi encaminhado ao Presidente da República para ser sancionado. Entretanto, o Projeto que chegou à mesa do Presidente apresentava tantas alterações, que em nada se assemelhava aquele nascido das aspirações populares. Diante deste fato abominável, muitos acreditavam, e tinham esperanças, embora longínquas, do veto do Presidente às alterações imorais feitas pelo Congresso. Mais uma vez o povo foi enganado. O Presidente sancionou o monstrinho sem vetos. Sancionou-o na íntegra, assim, na maior cara de pau, como quem não sabe de nada, não viu nada e não leu nada - bem ao seu estilo. Em plena campanha eleitoral e com alguns pecados mortais em seu currículo de governante, o Presidente, que faz política de interesses pessoais vinte e quatro horas por dia, só podia agir mesmo desta forma.

Um objetivo político-partidário ficou bem claro para nós: confundir a opinião pública. Esse ato será muito bem explorado durante a campanha para eleger um poste, com amplo apoio da mídia. Ele irá se intitular como o Presidente Moralizador. Será mais um engodo, puramente eleitoral. Até o povo entender que João Germano não é gênero humano, já tem um novo Presidente.

É uma lástima impor mais uma frustração ao povo brasileiro. Na verdade o Presidente sancionou uma lei que não vale nada. Só não poderão candidatar-se nas eleições de 2012 os condenados criminalmente, ou por improbidade administrativa. Trocando em miúdos – ninguém. O Collor e Maluf, só para citar os políticos mais emblemáticos, foram absolvidos. A maior injustiça dos tempos modernos foi cometida com o Collor, que perdeu o mandato por corrupção. Com essa lei aprovada, jamais isso aconteceria.

O Projeto Ficha Limpa oficialmente virou Ficha do Nada. Haja frustração! Acreditar? Em quem? Este país não é sério mesmo! Continua tudo como tá - valendo a impunidade e a corrupção.

Gabriel Novis Neves
05/06/2010

domingo, 6 de junho de 2010

Feriado

Domingo é domingo, feriado é feriado. Os dois dias podem até, aparentemente, parecer iguais, mas são tão diferentes! A única semelhança é a folga no trabalho, e só. Domingo é tradicionalmente um dia dedicado à família, ao lazer e aos cultos religiosos. Feriado é dia de não se fazer nada, e melhor ainda, sem nenhum sentimento de culpa.

O domingo começa com os cultos religiosos, sempre com roupa limpa e bem passada. Depois vem o almoço com a família, geralmente na casa da matriarca – avó – ou num restaurante. Domingo é dia também de se fazer visitas a amigos, parentes, ou recebê-los em casa. O lazer nesse dia é quase como uma obrigação. Tem que se passear no domingo, mesmo que não se queira – é tradição. As rotas preferidas são: Lago do Manso, Chapada, Águas Quentes, Pantanal. Outras opções: ir ao parque com as crianças, cinema, andar à toa pelo shopping, ou dar uma passadinha pela Padaria Viena na hora de maior movimento para um cafezinho. Ah, domingo também é dia de futebol. O pior do domingo são as noites, quando vem à nossa lembrança que no dia seguinte é segunda-feira, e que vai começar toda uma semana de trabalho.


Já o feriado... É outro departamento. Não temos obrigação de fazer nada. Não se exige nada de nós. O único compromisso no feriado é nos dedicarmos a nós mesmos. O feriado me dá uma grande sensação de paz! Pela manhã caminho com muito mais tranquilidade, sem a preocupação com o horário. À tarde durmo à vontade, sem o futebol obrigatório. Leio, escrevo, navego pela Internet, tudo na santa paz, sem nenhuma daquelas obrigações impostas pelo domingo. À noite também é tranquila. Não me vem à lembrança que no dia seguinte tenho trabalho, afinal eu ganhei um dia de lambuja de folga. Tenho mais é que agradecer.

E quando o feriado cai no meio da semana? Aí vem outra tradição bem brasileira – enforcamento oficial do dia seguinte – o chamado feriadão. Só de pensar que daqui a menos de duas semanas teremos a Copa do Mundo com muitos feriados pela frente, sinto-me feliz.

Gabriel Novis Neves
03/04/2010

sábado, 5 de junho de 2010

COMPARAÇÃO

Não gosto muito de fazer comparações, pois “uma coisa é sempre totalmente diferente da outra, a não ser quando as duas se assemelham.” Mas, não posso deixar de reparar – e comparar – como a lei é aplicada de maneira diferenciada entre a população.

Saí de uma experiência muito traumática com a doença da minha mulher, agregada a cinqüenta anos de consultório. Sei que somos tratados como desiguais, por exemplo, na saúde pública, ferindo a Constituição Brasileira que diz, que “A saúde é um dever do Estado, e um direito do cidadão.” Neste caso da saúde, a desigualdade é tamanha que reflexamente sinto a necessidade da comparação.

Os meios modernos de comunicação diariamente identificam os brasileiros diferenciados. São aqueles que quando adoecem não precisam marcar consultas nos postos de saúde. Operam sem respeitar a fila da Central de Regulação. Dificilmente acreditam na medicina oferecida a maioria dos brasileiros. Refugiam-se nos melhores hospitais dos grandes centros, entenda-se São Paulo, com médicos que não trabalham para o SUS ou Planos de Saúde.

O destino me fez perambular pelos ditos melhores hospitais do Rio de Janeiro e São Paulo, a procura do impossível. As despesas quase todas foram pagas com meu dinheiro. Para isso vendi um apartamento nobre em Cuiabá, e não me arrependo. O meu plano de saúde fez um reembolso dos serviços hospitalares, respeitando a sua tabela. Traduzindo, quase nada. Os medicamentos importados? Nem pensar em reembolso. A desculpa para os desiguais é que a ANVISA não tinha ainda aprovado a droga utilizada em todo o mundo humanizado. O interessante é que a ANVISA não se opunha a importação privada.

Todo cidadão, por mais humilde, na sua dor faz a comparação e sente a humilhação do desprezo. Tenho duas clientes idosas que possuem um plano de saúde igual ao de um general famoso. Acompanho o calvário dessas pacientes para os seus exames anuais. As consultas elas pagam do pequeno soldo que as viúvas de militares recebem. Esta semana, no retorno ao consultório para trazer os exames complementares, antes de quaisquer perguntas veio o desabafo. Com a revista ISTOÉ nas mãos, diz que a partir de hoje fará as suas consultas e exames médicos, no hospital mais famoso e caro do Rio de Janeiro. Lá as despesas são encaminhadas ao Ministério e pagas sem discussões. Leio a matéria, entendi a revolta da minha cliente e concordei com a sua decisão. Apenas alertei a minha amiga que o Ministério Público Militar está investigando o tratamento privilegiado. Terminei a consulta, com uma frase de André Guillois: “Um mosquito é uma pequena criação da natureza para nos fazer pensar melhor sobre as moscas”.

Gabriel Novis Neves
23/04/2010

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Armadilha

Cresci na Rua do Campo, quase vizinho de Estevão de Mendonça. Freqüentava a sua casa e naquela época não sabia por que ele guardava tantos jornais, cartas e documentos. Era tanto papel velho, que chegava a prejudicar a minha respiração. Ao escutar-me tossindo, sempre dizia que, para agüentar todo aquele mofo, só fumando cigarro de palha, com fumo bom. Estevão de Mendonça, quando acordado, estava sempre com o seu cigarro de palha entre os dedos amarelados. A sua produção pulmonar era abundante e impressionava aqueles que não o conheciam. Não me aconselhou o uso de cigarros, claro, mas sim uma colher de mel antes de penetrar na sua biblioteca – casa. Foi ali que cunhou a célebre frase: “Morre para sempre quem morre em Cuiabá.”

Há vinte anos moro na Rua Estevão de Mendonça. Todos os dias eu pronuncio o seu nome várias vezes, e a frase famosa, não sai dos meus pensamentos – “Morre para sempre quem morre em Cuiabá.”

Lembrei-me da frase imortalizada para a injustiça que praticamos com Rondon. Dia 5 de Maio foi aniversário de nascimento de Rondon, para os amigos Cândido Mariano. O governo brasileiro para homenagear o militar sertanista, e um dos cinco maiores andarilhos do mundo, instituiu esse dia – 5 de Maio, como o Dia das Comunicações. Rondon entre outros trabalhos realizados implantou a comunicação telegráfica entre Cuiabá e Manaus, com um detalhe importante - a pé. Ia e voltava pelas picadas abertas, fazendo reparos na rede.

Pois bem. Este ano não escrevi nada sobre o nosso herói de Mimoso, seu local de nascimento. Com exceção de uma televisão, cujo responsável pelo jornalismo é o pai do menino número quinze mil aparado por mim, não se falou do desbravador amazônico. Fiquei sabendo inclusive que é também comemorado o Dia da Parteira nesse dia! E haja tempo na televisão para a matéria! Tenho uma admiração especial pelas parteiras, pois sou parteiro. Inclusive escrevi um artigo, e publiquei, sobre as atividades de uma parteira muito antiga de Várzea-Grande, tendo o carinho de mandar entregar o jornal que publicou, em suas mãos.

Passar despercebido pela mídia é até compreensível, mas não deixa de ser inaceitável. Mas e a nossa UFMT, cujo primeiro projeto cultural implantado foi o Museu Rondon? E o busto de Rondon, inaugurado na entrada do campus universitário no dia do seu aniversário, e patrocinado pelos Amigos de Rondon? Isto sim é incompreensível e inaceitável. Não sei nem se esse cinco de Maio foi lembrado em Rondonópolis. Com certeza não.

O governo do estado muito preocupado com os recentes e vergonhosos acontecimentos, nem uma nota em jornal se dignou a fazer. Entretanto os anúncios de ficção eleitoral eram incontáveis. A armadilha deu certo. Patrolaram o Rondon da nossa história.

Gabriel Novis Neves
06/05/
2010

ELEIÇÃO DE EXPLICAÇÃO

Após as convenções partidárias, ou melhor, após a Copa do Mundo, começa legalmente a campanha eleitoral. A nossa responsabilidade é enorme, pois iremos escolher um governador, dois senadores, deputados federais e estaduais, além do presidente da república. Na verdade a campanha já iniciou há muito tempo. O atual presidente da república já foi multado duas vezes pelo Superior Tribunal Eleitoral por propaganda eleitoral extemporânea. Na nossa história política nunca, jamais, em tempo algum, aconteceu fato semelhante.

Há muito tempo que a pedição de voto já começou por aqui. Todas as atividades políticas giram exatamente sobre este compromisso – “vote em mim”. Os espaços da mídia são todos dedicados às propagandas enganosas, campanhas políticas disfarçadas e extemporâneas. Um fato inusitado começou a freqüentar as manchetes dos jornais e televisões, com reprise nacional. A Mirian Leitão escreveu um artigo detalhado sobre a nossa política ambiental, onde confessa que um dia foi iludida. O editorial do estadão é sobre a liberdade de imprensa aqui implantada. As redes nacionais de televisão disseminam notícias e imagens que sujam o nosso estado e humilham o seu povo. Este é o ambiente que os candidatos encontrarão nos cento e quarenta e um municípios mato-grossenses.

Eleição é festa. Carreatas, passeadas, com direito a almoço ou jantar na casa de algum eleitor, geralmente pago pelo próprio eleitor. Algumas visitinhas rápidas na casa do eleitor também acontecem: cafezinho ou suco de frutas da região, um docinho ou biscoito, que o candidato tem que aceitar para não perder o voto. Finalmente o grande espetáculo – o comício, geralmente na principal praça da cidade ou na carroceria de um caminhão com excelente sistema de som, abraços e beijos nas crianças, as grandes vítimas das eleições pelo número excessivo de abraços e fotos obrigadas a suportar. Esses teatros montados em época de eleições, para um público totalmente descrente, só tinham um enredo: promessas, promessas e promessas. O povo escutava, mas o discurso entrava por um ouvido e saia pelo outro.

Este ano todo esse ritual eleitoreiro, com certeza, estará prejudicado. Pelos últimos escândalos revelados pela mídia, os pedidores de votos terão muita dificuldade em explicar o inexplicável. Como convencer a população que o governo pagou quase cinqüenta mil reais a mais para comprar um simples caminhão? Que o secretário de segurança fala em lavagem de dinheiro, sem explicar de quem? Que o resultado dessa auditoria foi feito pelo estado, e os prejuízos aos cofres públicos são bem maiores que os iniciais encontrados por um simples levantamento? E os critérios de concessões da lei de incentivos fiscais? Que não existe saúde no interior, porque foi decidido substituir os postos de saúde pelas ambulâncias? Que o PAC empacou por aqui. E a explicação para a prisão de funcionários graduados do governo federal, estadual e municipal? O que dizer das estranhas gravações feitas pelo Ministério Público Federal?

Os problemas que verdadeiramente atormentam e fazem sofrer a nossa população, como saúde, educação, segurança, obras de infra- estrutura e propostas de desenvolvimento para o nosso estado, nem serão abordados. O tema desta campanha será apenas “explicar”. Meu pai sempre me dizia para fugir da possibilidade de passar a minha vida tendo que prestar explicações. Não é um sinal de um passado correto. Dois mil e dez será, em Mato-Grosso, a eleição da explicação.

Gabriel Novis Neves
26/05/2010

O madrugador

Em 1971 eu era Reitor da Universidade Federal de Mato Grosso e o Josué Montelo da do Maranhão. Eu conhecia e admirava a fabulosa e extensa obra desse maranhense. No mundo acadêmico e intelectual, Josué Montelo foi um marco. Jornalista, professor, teatrólogo, escritor, orador, fundador da Universidade Federal do Maranhão e Reitor.

As nossas Universidades eram as mais jovens do Brasil. Tive várias oportunidades de conversar com o ilustre professor. O Conselho de Reitores das Universidades Públicas reunia-se periodicamente, e eu estava sempre presente, igualmente o Josué. Eu era um jovem desconhecido e ele já era um dos patrimônios intelectuais do Brasil, com obras publicadas em todo mundo. Os nossos deslocamentos eram sempre feitos de ônibus.

Certa ocasião eu estava sentado sozinho na primeira poltrona do ônibus. Gentilmente escuto alguém pedindo permissão para ocupar a outra poltrona. Levanto-me, e com prazer incontido vejo o Josué acomodar-se ao meu lado. De tão inibido permaneci calado. Ele encosta a sua mão esquerda no meu joelho e pergunta: “– você é médico, não?” Respondi que sim. A seguir me relatou mais ou menos o que se segue: “- Vou lhe contar um caso médico, que poderá lhe interessar. Há muitos anos não consigo dormir mais que quatro horas por noite. Mesmo assim, durante o dia não sinto sono nem cansaço. Fiquei preocupado com esta situação e procurei os maiores especialistas do mundo. A resposta sempre era a mesma. Que eu não precisava me preocupar, porque o meu organismo não necessitava de mais horas de sono para me recuperar do desgaste físico e mental do dia. Novis, sempre quando acabo de jantar o sono aparece imbatível, vou para o quarto e durmo com facilidade. Mas, quatro horas depois acordo. Ainda é madrugada e já estou pronto para começar o dia. Vou à biblioteca, leio e escrevo. Dizem na Academia Brasileira de Letras que a minha insônia é a grande responsável pela minha imensa produção literária.”

Lembrei-me desse episódio porque hoje também sou adepto da madrugada. Durmo pouco e acordo antes do sol se levantar. Numa dessas madrugadas reli uma entrevista nas páginas amarelas da revista Veja. O entrevistado dizia que numa campanha presidencial nos países do primeiríssimo mundo, o eleitorado praticamente exige saber o currículo acadêmico do candidato. A propaganda de qualquer candidato tem que anunciar sua formação acadêmica: “doutor em economia e ciência política”, ou Ph.D. em física,” coisas deste tipo. Senti certa inveja da consciência política daqueles eleitores. Ao mesmo tempo vergonha de pertencer a um país onde o carro chefe para se eleger a qualquer cargo público é o dinheiro, acompanhado de muita esperteza.

Analisemos agora o currículo acadêmico dos nossos candidatos a governador. O currículo apresentado ao eleitorado, e super valorizado pelos marqueteiros, é o que faz referência ao sucesso dos mesmos na vida política e empresarial. Todos nasceram de mãos abanando, de famílias paupérrimas, são humildes e trabalharam muito. Uns dizem com orgulho onde fizeram o curso superior, mas outros nunca fizeram referência a isto; não sabemos se tem curso superior, qual, e onde estudaram. Só sabemos que, trabalhando no interior, hoje são milionários. Com essa formação acadêmica secreta, como poderão comandar doutores e pós- doutores?

Estamos muito distantes das transformações desejadas pela população. Não há possibilidade de alguém sem conhecimentos básicos escolares, entender que a preservação da floresta não impede o desenvolvimento sustentável do estado, e é barato. No estado atual da degradação da nossa floresta, a sua recuperação é caríssima e inviável aos cofres públicos. Enquanto a Coréia do Sul com cinqüenta milhões de habitantes forma o dobro de engenheiros que aqui no Brasil, com quase duzentos milhões, e tem uma economia fortíssima, pensar o quê do nosso futuro? Esta reflexão dura, mas que é a mais pura realidade, é filha do madrugador.

Gabriel Novis Neves
29/05/2010

terça-feira, 1 de junho de 2010

SOLUÇÕES

Tenho alguns amigos virtuais que, após lerem meus artigos, me fazem sempre a mesma pergunta: “- por que você não apresenta soluções para os problemas que enfoca?” E respondo sempre a mesma coisa: “- conheço o meu gado...” As críticas, quando as faço, não têm nenhum cunho pessoal, e sim, governamental. Infelizmente nem todos entendem assim. Acham que existe certa dose de agressividade nas minhas palavras.

Outro dia alguém me disse: “- você está parecendo aquele soldado do pelotão que era o único de passo certo quando foi alertado pelo sargento que estava marchando de pé trocado. Vai fazer críticas a alguém que tem oitenta por cento de aprovação da opinião pública pelo Ibope?” Está encerrada toda possibilidade de discutir sugestões para se resolver qualquer tipo de problema.

Os nossos governantes, de um modo geral, não toleram observações que contrariem o que fazem ou pensam. Daí surgiu um novo jeito de governar. Terceirizar o governo com os seus apoiadores políticos e amigos. No alto escalão das decisões a terceirização é feita com os policiais. Esse pessoal não reclama de nada, a não ser uma promoçãozinha. A parte intermediária dos que trabalham no governo, são os considerados “imexíveis” colocados por aqueles que apóiam o governo. Esse silêncio tem um custo muito alto: os escândalos. A história está aí para nos contar. Os personagens mudam, mas a história é sempre a mesma. Vargas foi traído dentro de casa, com final infeliz.

Como um cidadão comum irá apresentar sugestões aos poderosos que utilizam a lei do Gérson como bússola? Meus amigos virtuais – certos presos recebem visitas de autoridades e são ouvidos com atenção. Não que essas autoridades estivessem comovidas por aquela situação, e sim pelo pavor da delação premiada. A hipocrisia é um parágrafo da lei de Gerson. O resultado de todo esse imbróglio é o motivo principal da queixa do meu amigo virtual. Falta de soluções populares.

Gabriel Novis Neves
27/05/2010