De minha mãe herdei o gene
da pressa com a sua máxima: “Nunca deixe para amanhã, aquilo que pode
fazer hoje”.
Ao longo da minha vida não
tive como fugir desse gene. De tanto fazer tudo apressadinho, me coloquei em
cada situação!
Mesmo com o auxílio da
ciência médica e da passagem do tempo, a sua agressividade continua inalterada.
Continuo a querer fazer tudo de forma apressada e imediatista.
Amigos sempre me alertam
que apressadinho come cru, mas não tomo jeito.
A cultura de adquirir pelo
trabalho honesto bens materiais para garantir uma velhice discreta - sem
maiores preocupações financeiras - foi apenas uma terapia para a cura da pressa
genética.
Para atingir essa meta
materialista, troquei muitos prazeres da minha juventude pela doce ilusão da
tal velhice sem problemas, confundido por muitos como a própria felicidade.
Não consegui. Apenas
transferi essa pressa - que na verdade é uma ansiedade - ao futuro dos meus
filhos e netos. Quero logo vê-los com as suas vidas encaminhadas, para iniciar
todo o processo da nova pressa com a chegada dos bisnetos.
Da boca para fora já
escrevi, inclusive, que consegui ser egoísta e ególatra com o auxílio da
psicanálise.
Tudo de mentirinha, pois o
meu gene não me permite a esses arroubos de independência do tempo.
Tenho pressa em cuidar da
minha saúde para não depender da lentidão de terceiros.
Sou um professor de teoria
que na vida tudo passa lentamente. Na prática sei que o tempo voa.
Há muito aprendi que
devemos evitar viver das lembranças do passado, pois elas podem nos conduzir ao
inútil e sofrido saudosismo, tão bem diagnosticado pelo meu professor de
neurologia Pedro Nava – que nas suas poucas horas vagas era escritor e membro
da nossa Academia Brasileira de Letras.
“Moro onde não mora
ninguém, onde não passa ninguém, onde não vive ninguém, e eu me sinto bem,”
dizia o saudosista poeta brasileiro Agepê, lembrando-se da sua infância de
menino pobre do interior.
Evito a solidão da
multidão, e nessas ocasiões tenho pressa em ficar só.
Para o meu consolo também
herdei da minha mãe o gene colado ao da pressa, que é o do humor, que nutre a
minha alma apressada para chegar logo onde pressa alguma tenho.
Voltando ao assunto da
minha genética pressa que sempre me causou aborrecimentos incompreensíveis. Dia
desses um minúsculo descuido me fez passar um melancólico final de semana.
Na ansiedade de querer
tudo em seu devido lugar, resolvi arrumar a conexão do meu laptop na tomada
elétrica.
Provoquei um curto
circuito no pequeno condutor descartável do computador, que acabou queimando.
Isso interrompeu a chegada
da energia elétrica à minha pequena máquina.
Estava instalado o caos.
Como enviar o meu artigo diário à mídia?
O apressado sempre enxerga
as pequenas coisas com lentes de possantes binóculos.
Queimou o meu computador,
pensei.
Dormi infeliz, como se
aquele pequeno acidente merecesse tanto destaque.
Acordei muito cedo e
recuperei a razão embotada pela pressa.
Troquei a pequena peça
intermediária que estava ali exatamente para se sacrificar e salvar a máquina.
Em segundos, tudo
resolvido e, pelo menos nesse puerpério da pressa, estou mais cauteloso com os
impulsos que recebi de herança.
Até quando, não sei.
Gabriel Novis Neves
27-12-2012
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