Estou
pagando caro por um vício que adquiri há mais de sessenta anos - o de ler
jornais.
Aqui
em Cuiabá, quando eu era bem jovem, meu pai me escalava para ficar de plantão
na porta da Livraria e Papelaria Santa Therezinha, ao lado do Bar do Bugre,
para esperar a chegada do “O Jornal”, vindo do Rio de Janeiro.
O
horário da chegada do lote de jornal era imprevisível – geralmente após as 16
horas. Era transportado pelos antigos aviões DC3.
O
avião decolava de madrugada do Rio com os passageiros e os esperados jornais,
mas os aviões pousavam na ex-Cidade Verde quando podiam.
Naquela
época, criança era proibida de participar das rodas de adultos que se
acumulavam à espera do jornal.
O
papo rolava solto no bar do meu pai. Desembargadores, juízes, promotores,
políticos, profissionais liberais, funcionários públicos letra “O” de penacho,
professores, poetas, jornalistas, enfim, a nata da inteligência cuiabana.
Eu
ficava sempre de ouvidos atentos, querendo decifrar as coisas que os mais
velhos conversavam, especialmente sobre política.
Tudo
que é bom nesta vida dura pouco – diz o ditado popular. Deixo a minha
cidadezinha para estudar no Rio.
Chegando
à minha nova cidade fiquei deslumbrado com a variedade de jornais existentes.
Existiam
os jornais matutinos, os vespertinos e os da noite.
Tinha
até um especializado em esportes.
Em
praticamente toda esquina havia uma imensa banca de jornal. Algumas funcionavam
vinte e quatro horas. Sem contar os meninos que vendiam jornais por todas as
partes da cidade.
Os
meus deslocamentos pela ex-Cidade Maravilhosa quase sempre foram de bonde.
Quando
o meu plantão era na Penha, lia quatro jornais: dois na ida e dois na volta.
O
vício da leitura de jornal tornou-se para mim crônico e incurável.
Acabo
de saborear o meu vício na leitura das mais recentes notícias.
O
ex-presidente, que recentemente deixou o cargo como herói nacional, agora foi
denunciado na Procuradoria Geral da República como chefe de uma gang que
assaltava os cofres públicos.
Sua
imagem foi mortalmente atingida perante a opinião pública.
Os
marqueteiros do governo estão superpreocupados com os escândalos que brotam
abundantemente em todos os níveis de poder, agora em tempo real graças aos
modernos meios de comunicação.
Acham
que tais notícias irão desconstruir a imagem dos super-heróis que acabaram de
deixar o poder em todos os níveis: federal, estadual e municipal.
Esses
fatos, sobre o exercício do poder público no Brasil, são a mais doce repetição
de tudo que li em mais de meio século, quando o poder muda de dono, apesar de
quase todos serem da mesma família.
A
única diferença são as fantasias e os nomes dos personagens.
Tudo
seria simples de se resolver caso os desvios de conduta praticados pelos nossos
governantes fossem divulgados na época do ocorrido.
Havendo
o silêncio do zelo e o elogio premiado, geralmente construído pelos
marqueteiros pagos com o nosso dinheiro e a sua ampla divulgação, o grande
público, que é o eleitor, só tomará conhecimento dos motivos dos seus
sofrimentos e do atraso desta nação, após a saída dos seus ídolos do poder.
Agora
é tarde.
Sobra
o lamento pelo leite derramado, tão simples de ser evitado.
Gabriel Novis Neves
20-01-2013
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.