quinta-feira, 12 de julho de 2012

O DOENTE PSIQUIÁTRICO


Assim que iniciei minha vida profissional em Cuiabá fui designado para administrar o Hospital Colônia de Alienados do Coxipó da Ponte.
Era o único hospital existente no Estado, ainda não dividido, para atender pacientes de um território com mais de um milhão e duzentos mil quilômetros quadrados.
Pelo nome oficial do hospital estadual, senti o preconceito com relação a esses pacientes, chamados de loucos.
O hospital possuía apenas dois médicos, e ninguém sabia o número de internados.
Era uma verdadeira prisão de seres humanos. Os pacientes em surtos psicóticos eram colocados em celas e acorrentados.
Mais de quarenta anos são passados desde aquela época. O Estado foi dividido e, mesmo com o seu território menor, a situação dos pacientes piorou.
Além dos discursos, das promessas e das placas de inauguração, não vejo nenhuma providência concreta por parte do governo para minorar o sofrimento do doente psiquiátrico, família e amigos.
O nosso Estado tem um déficit alarmante de psiquiatras, tanto no interior quanto na capital.
Um atendimento mais humanitário a esses pacientes envolve investimentos em recursos humanos multidisciplinares e espaços físicos adequados. 
Sem esse binômio, é impossível falar em tratamento humanizado na saúde pública mental.
Recentemente o presidente Obama fez uma reestruturação da saúde pública nos Estados Unidos para iniciar em 2014.
Ele constatou que nos presídios americanos existe mais de meio milhão de pacientes psiquiátricos necessitando de ajuda.
Com o fato agravante de que as instituições carcerárias não estão preparadas para esse atendimento.
O caso do doente mental em nosso Estado é problema da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.
Os nossos loucos são “tratados” pior que os animais. Estes, pelo menos, têm associações atentas para quaisquer maus tratos sofridos por eles.
O louco só é lembrado quando, abandonado pelos órgãos públicos, sociedade, família, entra em crise psicótica e comete um ato chocante.
Recentemente tivemos alguns casos por aqui. Esses doentes mentais foram conduzidos a um presídio sem as mínimas condições para prender sequer um assassino “normal”, que dirá para entender o surto psicótico de um pobre ser humano desassistido.
Em médio prazo não vejo nenhuma providência governamental para cumprir a Constituição Federal, que assegura saúde a todos, com medidas para, pelo menos, minorar esse sofrimento - que não é apenas do paciente, mas de toda a sociedade.
Nossa preocupação no momento é com as obras atrasadas da Copa do Mundo, e sem recursos financeiros para a sua conclusão.
Faltam psiquiatras em Cuiabá, especialmente na rede pública de saúde. Sobram OSS e outras decorações estatísticas, para tentar encobrir o que vemos perambulando pelas ruas da cidade.
Doentes correndo risco de morte e cidadãos sujeitos a serem vítimas de um surto psicótico.
Pergunto: diante desse silêncio criminoso, a quem apelar?
“Só se vê bem com o coração. O essencial é invisível aos olhos.”

Gabriel Novis Neves
01-05-2012



* Publicado simultaneamente no www.gnn-cultura.blogspot.com

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