quarta-feira, 11 de julho de 2012

Conferencista


Minha filha participou de um Congresso de uma grande multinacional em São Paulo.
Durante o dia as palestras são técnicas: planejamento estratégico, mercado e marketing. Sempre coordenadas pelos melhores especialistas da área, tanto brasileiros quanto estrangeiros. À noite sempre é convidado um vencedor para a conferência; não se exige currículo acadêmico.
Já passaram por lá ex-presidentes da República, escritores, empresários, atletas, artistas, etc.
Neste congresso, o conferencista que encantou minha filha foi um conhecidíssimo personagem do mundo esportivo, e como ela não acompanha futebol, nunca tinha ouvido falar dele.
Após a conferência, de tão entusiasmada que ficou, esqueceu-se até do fuso horário e me telefonou - acordando-me - para saber se eu conhecia um técnico de futebol cujo nome falou embaralhado, mas logo traduzi: Murici.
Ele mesmo! O Murici Ramalho, atualmente é técnico do Santos. Dei essa informação para ela.
- Pai, o senhor precisa assistir a uma conferência dele. É um espetáculo, e todo mundo gostou, foi aplaudido de pé após a sua fala – disse minha filha, muito empolgada.
- Minha filha – falei - conheci o Murici como jogador de futebol. Nunca foi essas coisas. Era jogador mediano de clube. Todos os domingos eu assisto às suas mal-humoradas entrevistas. Para mim é uma surpresa saber que o Murici é conferencista, e que causa esta reação agradável nas pessoas, ainda mais em um Congresso Internacional.
- Pai, foi a maneira como ele se apresentou – explica minha filha, e reproduziu mais ou menos para mim o teor da conferência:
 “Sou feio, baixo, gordo, barrigudo, nada simpático, grosso e mal-educado no tratamento das pessoas; segundo a maioria, não me visto bem, tampouco frequento lugares da moda e badalados”.
 “Falo o que penso, e isso não é agradável para ser ouvido, tanto no futebol quanto em outras atividades. Politicamente, meu comportamento de empregado não é o correto”.
 “Sou técnico de futebol por profissão. Os grupos que comandei conquistaram inúmeros títulos:  foram cinco de campeão brasileiro de futebol e outros estaduais”.
 “Atualmente trabalho no Santos, onde há dois meses ganhamos o título de campeão paulista de futebol. Apesar desse feito recente, posso ficar desempregado se o meu grupo não obtiver bons resultados”.
 “A minha profissão exige resultados, e todo o trabalho que realizo com o grupo está centrado em resultados positivos. Não pratico a auto-estima com os meus atletas, porque isso não lhes falta”.
 “Trabalho intensamente nos treinamentos táticos e físicos, sempre lembrando aos atletas que o meu emprego, e o deles, depende de resultados”.
 “Acredito que, no caso da multinacional, a metodologia também seja essa. Se os resultados não forem alcançados, a empresa vai à falência, levando os seus proprietários para o brejo, e os seus funcionários ao desemprego".
 “A única empresa onde os resultados não causam preocupações é a empresa Brasil”.
Escutei sem interrompê-la. E pensei cá comigo: - Era tudo o que os donos da multinacional queriam que os seus funcionários ouvissem, e pela voz de um ídolo nacional.
Em mim esse fato fez renascer um passado não muito distante, em que vencedores sem títulos acadêmicos davam aula na UFMT.

Gabriel Novis Neves
27-06-2012

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.