A
história me obriga ir ao passado para esclarecer fatos desconhecidos, ou
esquecidos, em que fui protagonista.
Faço
isso, não por vaidade pessoal, mas para deixar às futuras gerações depoimentos
da história não falsificada.
Escrevo
o cotidiano da minha cidade, ouvindo, sentindo, palpando, cheirando e vendo o
simples, que sempre foi o importante. Muitos dos meus artigos têm essa
genética.
Nunca
tinha pensado em escrever sobre a história do primeiro restaurante estudantil
de Cuiabá.
Isso
aconteceu há quarenta e quatro anos, motivado pela intensa migração da
população do interior.
Era
o início da ocupação desordenada do nosso imenso território, onde o trabalhador
rural foi expulso pelas máquinas.
Sem
qualificação para o trabalho urbano, esse produtivo camponês começou a ocupar a
periferia da cidade com a sua numerosa família passando necessidades básicas,
como educação para as suas crianças e alimentação para a família toda.
A
merenda escolar não era suficiente para um aluno. A evasão escolar no ensino
médio era assustadora, assim como a taxa de analfabetismo no Estado.
O
governo Pedrossian determina à Secretaria de Educação que faça uma adaptação na
antiga garagem do Estado – ao lado da Academia de Letras – para o funcionamento
de um restaurante para estudantes. Nascia assim, na Rua do Campo, o primeiro
restaurante estudantil de Cuiabá.
Essa
medida social atraiu estudantes pobres de todo o interior do Estado para
frequentar alguns cursos superiores que estavam iniciando na velha capital.
Eram
os famosos cursos de cuspe, carinhosamente chamados pelos meninos, em que todo
o arsenal didático se constituía em uma sala de aula calorenta, lousa, giz,
apagador e o professor borrifando saliva.
Com
o surgimento da universidade, os alunos do ensino superior passaram a
frequentar o restaurante onde hoje funciona o Museu Rondon.
Um
restaurante maior foi construído na Praça Universitária, oferecendo condições
excepcionais para atender alunos, servidores e professores. Do projeto
original, apenas metade foi entregue a comunidade universitária, há trinta e
dois anos.
Como
não faço diários, anotações, nem tampouco pretendo escrever uma enciclopédia
sobre a implantação do ensino superior em Mato Grosso, preencho o espaço de um
artigo para relembrar certos eventos que marcaram a vida desta cidade.
Muitos
detalhes sobre esses três restaurantes me são trazidos pelos atores de diálogos
que não me recordo, pois nunca trabalhei com o objetivo da cobrança.
Dia
desses um dos candidatos a reitor da nossa universidade, o professor doutor em
química Edinaldo de Castro e Silva, que veio de Barra do Garças para estudar na
recém nata UFMT, perguntou se eu me lembrava para quem tinha dado a primeira
autorização para usufruir do restaurante da piscina da UFMT. Respondi que não
me recordava.
Exultante,
ele me contou minúcias do encontro e da satisfação em ter sido o primeiro
estudante a provar a boa comida do nosso restaurante.
Satisfeito
fiquei em saber que as calorias do bandejão foram úteis à inserção de um menino
pobre do interior ao pico da carreira universitária, com a conquista dos
títulos acadêmicos e o orgulho de pretender comandar a universidade onde
estudou.
Gabriel
Novis Neves
09-03-2012
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