Sou
de uma família numerosa, e o mais velho dos nove filhos. Crescemos embolados,
onde os mais velhos cuidavam dos mais novos. O tempo não passou rápido, como se
diz, nós é que passamos.
Há
bilhões de anos o tempo cumpre a sua rotina, e as gerações vão se sucedendo,
assim como tudo o mais que é transitório - menos ele, o tempo.
Impérios
foram substituídos, culturas desapareceram, valores transformados. As religiões
se multiplicam a uma incrível velocidade. Mas, nesse turbilhão existe um
sentimento imutável.
Refiro-me
ao sentimento de perda que a maioria das mães sente ao casar os filhos do sexo
masculino.
Sei
que estou comprando metros de briga com as mulheres, mas é a mais pura
realidade, com as honrosas exceções.
Em
situação privilegiada de pai e, principalmente, de médico, observo, com muita
nitidez, essa preocupação de perda, que acho ser cultural.
As
mulheres costumam dizer, na sua imensa sabedoria e baseada no sexto sentido,
que ganharam um filho quando casa uma filha.
Entretanto,
intrinsecamente, quando um filho casa, a sensação é de perda.
A
origem do preconceito contra a sogra, fonte inspiradora de humoristas e
artistas, talvez esteja arraigado nesse patrimônio cultural.
As
meninas eram incentivadas em casa, muitas das vezes, a arrumar um bom casamento
(entenda-se um parceiro com dotes). Os meninos quando arrumavam, ainda na
adolescência, uma namoradinha, logo era alertado pela mãe:
“Ela
é muito bonitinha meu filho, mas não se esqueça: beleza não põe mesa.”
Esse
conselho foi muito utilizado.
A
sabedoria da frase funcionava como um balde de água fria nos hormônios de um
adolescente que, antigamente, não questionava conceitos maternos.
Como
arrumação da natureza, muitos rapazes acabavam se casando com moças feias,
porém prendadas.
Era
tão sério isso que, até hoje, prendas domésticas funciona como profissão - e
aceita nos registros de identificação da polícia, o famoso RG.
Antigamente,
as feias continuavam feias a vida toda, e as belas, com os anos, envelheciam.
Beleza
não põe mesa, mas que ajuda, ah! - isso ajuda. Que me perdoem as feias, mas,
concordo com o Vinicius de Moraes, beleza é fundamental.
A
tecnologia médica contribuiu muito nesse mercado de tentar esconder idade, das
meninas com ou casadas com dotes.
Verdadeiros
milagres são alcançados, embora esse processo seja altamente seletivo, pois o
SUS e a maioria dos planos de saúde, não oferecem cobertura a essas mágicas
temporárias.
Nossas
mulheres eram conhecidas pela fartura dos glúteos e os generosos quadris. Esses
requisitos eram sinais de poder.
Até
que uma linda baiana de olhos verdes perdeu o título de mulher mais bonita do
mundo exatamente por possuir duas polegadas a mais no quadril que a sua
vencedora.
A
derrota da baiana foi mais chorada que a derrota do Brasil para os uruguaios em
1950 no Maracanã.
Essas
polegadas a mais desencadearam entre nós a cultura da beleza moldada pelo
bisturi.
No
Brasil acontece o absurdo dos absurdos.
Quando
uma mulher, após os vinte anos, é considerada velha e, estimulada pelo meio em
que vive, inicia-se a ladainha da mulher artificial que quer competir com
o tempo.
Próteses
são colocadas em todos os pontos estratégicos que elas acham ser atraentes para
os homens.
Preenchimentos
onde a natureza encerrou o seu trabalho.
Laser
pra cá, laser pra lá. Botox, massagens, drenagens linfáticas, acumputura,
cremes e óleos milagrosos, não se esquecendo das aulas de academia com personal
training e o seu imenso cardápio de sofrimentos.
Certas
academias possuem nutricionistas para uma dieta de desprazer.
E
pensar que essa vida neurotizante, foi causada pela maldição dos dotes no
casamento, e da beleza não põe mesa!
Gabriel
Novis Neves
04-04-2012
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