quarta-feira, 23 de abril de 2014

TARDE DE DOMINGO

Existe coisa mais triste que final de tarde de domingo? Não sei explicar o porquê, mas tenho esse sentimento de melancolia desde a infância.
Tinha de quatro para cinco anos de idade quando mamãe nos levava - eu meus irmãos - para passar as tardes de domingo na casa do vô Alberto. Enquanto isso, meu pai ia trabalhar no Bar do Bugre para cobrir o descanso semanal do tio Tinô, e só retornava para casa quando terminava a retreta na Praça Alencastro, às 21 horas.
Antes do anoitecer, mamãe nos levava de volta para casa. Íamos a pé, e até hoje me recordo da tristeza que se abatia sobre mim ao ver o sol se pondo, apesar da tarde agradável que sempre passávamos na casa de meu avô.
Fazia um rápido lanche de leite com achocolatado e procurava a cama para dormir. Nessa época não frequentava a escola e, ao acordar, tinha o dia todo para brincar no enorme quintal da minha casa.
Minha imaginação nessa hora corria solta. Brincava de tudo que minha mente infantil fabricava: construção de estradas no chão, surgimento de rios, armação de pontes.
Quando a fome chegava, o quintal me abastecia, principalmente  com mangas de várias espécies e suculentas jabuticabas.
Cresci neste ambiente até alcançar a idade para ir para escola primária estadual, onde tudo era novidade para mim, pois ingressei analfabeto e nunca tinha visto uma carteira escolar.
Mas, o final das tardes de domingo, apesar de todas as novidades, continuava  sempre muito melancólico para mim.
Aos 17 anos deixo Cuiabá para continuar meus estudos no Rio de Janeiro. A minha tristeza nesse período aumentou diante da beleza do mar. Senti com maior profundidade esse desconforto olhando o sol mergulhar no fundo do oceano.
Nunca procurei ou encontrei alguém que me desse uma explicação convincente, que julgo ser psicológica, para esse fato.
Sou da geração em que os adultos, quando provocados sobre tais assuntos, com rispidez respondiam: “Pare com essas besteiras menino! Vá estudar!” Crianças nunca eram levadas a sério nas suas angústias existenciais.
Muitos jogam a culpa na pobre da segunda-feira, o dia da semana menos desejado.
Confesso que não participo dessa corrente, pois considero a segunda-feira o meu dia de sorte.
Recentemente, lendo uma estatística de neurociências, tomei conhecimento que muitos passam pelas minhas sensações de humor no final da tarde de domingo.
O tratamento proposto pelos neurocientistas é o da substituição. Nesse período você desvia a sua atenção para qualquer outra atividade, um filme por exemplo.
Para agravar o meu desespero, no sentido de encontrar a cura da doença do final da tarde de domingo, a neurociência explica que escrever não é substituição, pois, quem escreve, escreve por não ser feliz.
Enfim, o inconsciente tem razões que a neurociência ainda não explica.
Continuo achando que os finais das tardes de domingo são muito melancólicos.
Consola-me tomar conhecimento que essa mesma sensação é compartilhada por  muitos, principalmente por aqueles que, assim como eu, atrevem-se a questionar as suas angústias.

Gabriel Novis Neves
20-03-2014

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