domingo, 13 de abril de 2014

PERIGO

Dia desses resolvi organizar as minhas coisas. Tenho o hábito (péssimo) de guardar tudo que recebo pelo correio: contas, documentos, livros, convites etc. e sem ler, coloco nas inúmeras gavetas que possuo em casa.
Sei que não perco nada, mas em compensação encontrar essas preciosidades é papel de escanfradista.
A organização da minha vida bancária é a mais complicada. Tenho pavor a números. Não aprendi interpretar o que recebo dos bancos. Apelo sempre a um tradutor.
Holerite nem pensar em saber o que significa aquele entra e sai de números que no final é uma mixuruca.
Para dar fim a essa balbúrdia, resolvi organizá-los seguindo aquele adágio popular de cada macaco em seu galho.
Comprei uma pasta com vários compartimentos. Teoricamente desta vez a minha vida iria ser organizada.
Descobri que esse trabalho só é possível para pessoas especiais.
Passado três meses encontrei nos separados compartimentos as mais variadas combinações.
Com o comprovante do pagamento da energia, encontrei também o do condomínio e até a prestação do terreno sagrado que adquiri para a minha derradeira moradia.
Tinha até CD com conta da Sky e internet.
A do telefone estava com as prestações do novo fogão. Desisti de ser organizado.
Em compensação, achei tanta coisa interessante como fotos que revelavam momentos especiais da minha vida.
Sofri um ataque agudo do tempo passado, embora esse estado emocional não tenha deixado sequelas.
Apenas, aquela recordação que o tempo passou muito rápido e eu não percebi.
Acho uma bobagem tentar reconstruir um passado. Ele não volta mais, com os seus bons e maus momentos.
Insistir nessa tarefa é convidar a melancolia para se apossar de nós.
Somos hoje e, programamos viver o amanhã.
Não é só o tempo que passa, nós também passamos.
Devemos estar preparados para vivermos intensamente o hoje e, não perdendo tempo arrumando correspondência.
Nosso objetivo será sempre o amanhã com qualidade de vida.
Alimentar-se de gavetas organizadas e recordações daquilo que elas guardam, é o caminho para quem o futuro é incerto.
Recordar não é viver. Sofrer, sim. É o sofrimento inútil.

Gabriel Novis Neves
28-03-2014

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