segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Iludir


Confesso que tive dificuldade para escolher um verbo para o título deste artigo. Não gosto do modelo Lupi na escolha de verbos para se defender.
O verbo amar, que utilizou no Congresso para tentar impedir a sua demissão a pedido, foi simplesmente desrespeitosa para com a presidente.
Existe uma liturgia para quem exerce funções públicas de alto nível. Imagine um ministro declarar à presidente da República: “Eu te amo Dilma.”
Na mais benévola observação, essa declaração exprime uma cafajestada de quem não está absolutamente preparado para respeitar o cargo que ocupa. Quem não respeita a liturgia do cargo, no cargo não deve continuar.
Li na revista “Veja” uma entrevista do atual ministro da Saúde, causa da minha dificuldade para o título do artigo.
Entre os atos de enganar, ocultar, esconder a verdade, mentir, escolhi o suave iludir. Ao responder uma pergunta do jornalista Otávio Cabral, o ministro não foi sincero. Utilizou-se de artifícios para esconder a verdade que dói. Respondeu ao repórter que o ex-presidente não escolheu um hospital do SUS para tratar o seu câncer, pois há mais de trinta anos paga um plano de saúde particular e nada mais correto que o utilizasse agora.
“Veja” lembrou ao ministro que existe uma corrente na internet dizendo que seria bom se o antigo metalúrgico experimentasse na própria pele o que o povo brasileiro sente quando procura a rede pública de saúde, que ele classificou como excelente, chegando a recomendar ao Obama que implantasse o nosso modelo nos Estados Unidos da América do Norte.
Para concluir, perguntou ao ministro da Saúde se o SUS é tão ruim assim. Respondeu o professor que o SUS está preparado para tratar de câncer. Os medicamentos que o ex-presidente está recebendo no Sírio Libanês são os mesmos fornecidos pelo SUS.
Ah! Dá licença, assim é abusar da nossa paciência! O ministro precisa conhecer o SUS e como funciona a sua Farmácia de Alto Custo. E saber, também, que o plano de saúde que o Sírio Libanês aceita, é aquele que o ex-presidente conquistou em oito anos de mandato.
Vagas hospitalares e profissionais de oncologia para o SUS faltam em todo o Brasil. No próprio Estado de São Paulo, em centro de excelência como Barretos, e outras cidades, inclusive na capital, em 24 horas é impossível marcar uma consulta oncológica, encontrar vaga em UTI, fazer biópsia, obter o resultado e no outro dia iniciar a quimioterapia.
O ilusionista ministro contraria as pesquisas que mostram que o brasileiro considera a saúde o pior serviço prestado pelo governo. Para quem tem o plano de saúde do Planalto, falta apenas obsessão pela qualidade.
Qualidade requer investimentos, e o ministro foi mais realista que a presidente, quando afirmou que sem financiamento público não haverá qualidade.
Acho que o presidente agiu acertadamente procurando o melhor, pois conhece muito bem o funcionamento do SUS.
Sei como funciona o SUS, e, principalmente, o setor oncológico - como médico e vítima dessa doença em pessoa da minha família, tratada com recursos próprios nos melhores hospitais do Brasil.
Até medicamentos utilizados em todo o mundo, a ANVISA proibia o seu uso no Brasil, para que os pobres não tivessem acesso.
Com o plano de saúde do planalto, tudo é possível.
Ministro, o povo brasileiro não suporta tanto sofrimento com a pílula dourada que o senhor nos quer jogar goela abaixo.
Saia de Brasília, anonimamente, e visite os hospitais de Câncer que atendem o SUS.
O resto é ilusão.

Gabriel Novis Neves
14-11-2011

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