quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Eles voltaram

Eu era diretor da faculdade de Medicina da UNIC (Universidade de Cuiabá), quando fui procurado por um grupo de jovens professores daquela Instituição de Ensino Superior.

Conhecia-os bem, pois alguns deles foram meus alunos na faculdade de Ciências Médicas da nossa Universidade Federal de Mato Grosso.

Todos, além de terem sido ótimos alunos na graduação, possuíam Residência Médica, especialização, e alguns estavam fazendo a pós- graduação (mestrado).

Eram concursados do serviço público, lecionavam por mérito e atendiam em consultório. Parecia uma receita perfeita para a felicidade pessoal e profissional.

Eles procuraram o velho colega para um desabafo juvenil, período das nossas vidas onde não se admite concessões.

Estavam totalmente desiludidos com o tipo de trabalho que realizavam no sistema público, com as suas péssimas condições de trabalho e honorários oferecidos.

A clínica privada de qualidade, e acessível à grande parcela da sociedade, morreu na cidade de Santos em 1956, quando da implantação da primeira cooperativa de serviços médicos. A agonia foi longa, e, hoje, medicina de qualidade é privilégio de políticos e milionários.

A solução intermediária, ilusória e coberta de propaganda enganosa, ficou com os planos privados de saúde e cooperativas médicas.

Num país de pobres, o SUS fica com a fatia maior do desumano tratamento oferecido pelo governo - com o dinheiro dos nossos impostos.

É tão precário o atendimento do SUS, que todas as autoridades responsáveis pelo sistema, estão entupindo os hospitais de São Paulo, principalmente o “oficial” Sírio Libanês!

Os miseráveis, que atingem milhões de brasileiros, morrem sem atendimento médico.

Estes jovens colegas tinham todo o perfil necessário ao sonhado processo de interiorização do médico. Eram neurologistas, pneumologistas, intensivistas, radiologistas.

E, o mais importante: estavam motivados em iniciar um trabalho com maior retorno social e profissional.

Eles escolheram uma nova cidade do Nortão do Estado - cujo prefeito também era médico da nossa UFMT - para realizar o sonho de um trabalho baseado nos ensinamentos de Hipócrates.

Não demorou muito tempo para verem os seus sonhos transformarem-se em terríveis pesadelos.

Decepcionados com o descaso do governo para com a saúde pública, e a politicagem no seu trabalho, eles retornaram, um a um.

Na verdade, só se ouve falar em fixação do médico no interior, de quatro em quatro anos, durante o período eleitoral.

Depois, o que funciona é a farta e escandalosa distribuição de ambulâncias aos municípios do interior para a rebocoterapia!

Triste país dos privilégios e da mentira aos pobres, onde não se cumpre nem a Constituição Federal: “Saúde é um direito do cidadão e dever do Estado”.

Na prática, o governo, além de não respeitar a lei maior da nação, que é a sua Constituição, não fiscaliza o cumprimento das leis atuais. Maquiagens contábeis diminuem recursos destinados por lei à saúde pública.

Eles voltaram.

Crianças com convulsões e adultos com AVC (acidente vascular cerebral), por exemplo, ou morrem no interior ou usam o rebocoterapia, cujos preços materiais e sociais são incompatíveis com os orçamentos destinados à saúde e à dignidade humana.

Voltaram por culpa de políticas públicas inexistentes para a interiorização da medicina de qualidade.

Considero essa volta uma catástrofe de magnitude superior às catástrofes programadas da natureza, que só produzem mortes nesse período.

Desta vez, quem é o culpado? Heim?!?


Gabriel Novis Neves

20-01-2011

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