domingo, 4 de março de 2012

GAMBÁ BOÊMIO


“É um pequeno mamífero marsupial preto e branco de hábitos noturnos. No Brasil o seu nome varia por regiões, onde é chamado por mucura, raposa, taibu, taraca, ticoca, sarigué, sariguê, sariguele, sauê, micuê e habita desde o sul dos Estados Unidos até a América do Sul.
Na natureza tem como principal predador, o gato-do-mato, enquanto nas grandes cidades, são frequentemente atropelados por terem a visão ofuscada pelos faróis e por terem pouca mobilidade, exceto nas árvores.
Os gambás não vivem em grupos, mas na época da reprodução, eles formam casais e constroem ninhos com folhas e galhos secos em buracos de árvores.
Boêmios saem dos seus esconderijos ao escurecer para a caça e coleta de alimentos. Alimentam-se praticamente de tudo: raízes, frutas, insetos, moluscos, crustáceos, serpentes, lagartos e aves (ovos, filhotes e adultos).
Os gambás produzem um líquido fétido das glândulas axilares. Esse líquido é utilizado pelo animal como defesa.
Na fase do cio a fêmea exala esse odor para atrair os machos. Fingem-se de mortos até que o atacante desiste. Tem predileção por sangue”.
Esse é o perfil do personagem deste artigo.
Saía do meu edifício para a caminhada do medo, quando encontrei o porteiro do meu edifício no meio da rua. Quando me viu, ele colocou as mãos na cabeça e disse: “Se o senhor tivesse chegado um minuto antes teria a oportunidade de ver um espetáculo.”
O porteiro falava com tanta emoção que eu não tinha a mínima ideia do espetáculo que acabara de perder. Perguntei o que havia acontecido que o fez abandonar a sua cabine de trabalho e fosse para o meio da rua.
“Doutor: o senhor perdeu. Um cachorro quase pega um gambá. Ele não é bom para correr, e o que o salvou foi aquela grade. Ele subiu como um foguete e se o senhor se aproximar poderá fotografá-lo”.
“Mas, será que ele não se assustará com a minha presença?” – indaguei.
“Doutor – me explicou o porteiro - enquanto o cachorro estiver embaixo, ele não desce”.
Aproximei-me do belo animal e ele até posou para as fotos. O porteiro, satisfeito, tinha toda a razão. Brincou comigo e com ar maroto perguntou-me: “ainda sai hoje?”
“Até as onze horas estará divertindo o pessoal que acorda tarde” - respondi.
Gostaria de entender a linguagem do gambá, para perguntar o que fazia na rua àquela hora, onde os primeiros raios de sol estavam brotando e o dia clareando.
Mau cheiro não senti, o que me leva a crer que estava diante de um gambá macho. O que o teria feito perder a hora de voltar para o seu esconderijo e, “escoltado” por um cachorro com cara de pouco amigo, ser obrigado a se refugiar no muro?
Lembrei-me da minha infância onde esses animais, não raro, trafegavam pela nossa casa da Rua do Campo. Papai sempre parava de ler o Jornal do Brasil do Rio de Janeiro e avisava mamãe: “Irene, passou um gambá por aqui”.
Nunca mais me esqueci de uma cena fantástica de um aviso de mau pressentimento. Mamãe, antes de o dia clarear totalmente, ia ao imenso quintal da nossa casa levar alimento para a turma de aves do galinheiro, fazia a limpeza e recolhia os ovos das galinhas poedeiras.
Era comum ela retornar do quintal revoltada: “Gambá fez um estrago essa noite!” - e lamentava o desaparecimento de frangos, pintinhos e ovos quebrados.
Volto ao Gambá do século XXI. O que fazia na rua esse animal bonito, fora dos seus hábitos? Será que o bonitão não fedido e bem nutrido estava ficando com a filha do cachorro que, com ódio o perseguia para esganá-lo?
Após a desistência do cachorro, como disse o porteiro, ele desceu do muro e desapareceu para, com toda a certeza, sair à noite mais comportado e com hora certa para voltar para casa.

Gabriel Novis Neves
08-01-2012

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.