Completei
dois meses que, cirurgicamente, retirei um tumor maligno da pele da cartilagem
do meu nariz.
Sinto-me
curado e, pelo que diz a imprevisível medicina, não tenho motivos para
preocupações.
O
tipo de câncer de pele que me atacou não produz metástases, mas poderá voltar
em outra parte da pele, o maior órgão do corpo humano.
Se
isso acontecer vou torcer para que tenha o mesmo sobrenome daquele que morou na
aba do meu nariz.
Desse
tipo existem três sobrenomes (tipo histológico) diferentes. O meu é considerado muyamigo,
e é tratado intimamente de baso.
Sua
grande virtude é não sair da sua casa (metástase) para outras regiões.
O
cirurgião para tapar o buraco que ficou com a retirada do “meu amigo” teve que
fazer uma cobertura especial, chamada de enxerto de pele, pois não se consegue
aproximar com fios uma cartilagem do nariz.
Não
tive nenhuma complicação nesse pós-operatório remoto. Única recomendação médica
foi que usasse pequena placa de silicone, para facilitar o nivelamento da pele
implantada.
Fiquei
esse tempo todo com a cobertura visível no nariz. No início algumas pessoas
ainda me perguntavam o que era aquilo, mas isso foi temporário. Logo todos se
acostumaram com aquela situação.
Situação
semelhante nós observamos quando alguém encontra pela primeira vez crianças
dormindo na rua. A reação é de revolta. Após a primeira semana, as crianças são
vistas como mais um problema do governo, e o sentimento de indignação
desaparece.
Essa
doença que tive é vista pela sociedade com certo preconceito, e foi muito
importante para mim.
Precisava,
e preciso ainda, de muitas lições para tentar entender essa fantástica criatura
que é o ser humano.
Tão
forte e tão poderoso, torna-se admirável pela sua extrema fragilidade para
enfrentar as pedras colocadas no caminho da vida.
Retirei
o curativo no período das festas de Momo. Proibido de tomar sol, fiquei em casa
com tranquilidade, saindo apenas para a caminhada e a passada na padaria.
O
dermatologista orientou-me para, de vez em quando, dar um descanso ao rosto
evitando a barba diária.
A
unanimidade queria saber se depois de velho iria usar barba revolucionária.
Em
um país em que as mulheres não possuem pelos e no carnaval a fantasia predileta
é a pintura do corpo nu, uma barba de cinco dias chega a assustar.
E
viva a minha cura! Mesmo com as invencionices do capitalismo decadente da venda
de corpos femininos pintados na Sapucaí.
Não
é a toa que a indústria que mais cresce no mundo é a pornográfica, e, a que
mais decresce no Brasil, são hospitais e pesquisas para a cura do câncer.
Gabriel
Novis Neves
27-02-2012
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