terça-feira, 17 de maio de 2011

Raiz

Nos tempos da minha meninice os ditados populares eram uma constante em qualquer diálogo. Minha mãe recorria frequentemente a eles na hora de nos passar princípios morais, regras para a boa convivência ou, ainda, dependendo do contexto em que era empregado, nos persuadir a aceitar certas ideias ou conceitos que achava ser o correto. E ela sempre tinha razão.

Por isso, possuo armazenados em minha memória incontáveis ditados. Ficam lá arquivados e, às vezes, alguns deles afloram, principalmente quando estou diante de uma situação delicada e tenho de tomar alguma decisão.

Dia desses aconteceu esta situação. Então, lá veio um velho ditado aflorando na voz da minha mãe: “Menino! Corte o mal pela raiz!”

Não era um problemão. Era na verdade um probleminha. Mas tão delicado! Fui convidado para um compromisso social. Por razões que não vêm ao caso, eu tinha que comparecer. Até confirmei presença. E estava muito propenso a ir.

No entanto, momentos antes do horário marcado para o início do compromisso, eu estava realizando um trabalho caseiro bastante prazeroso para mim. Estava feliz. Via, agoniado, a hora da festa se aproximando, e com ela a paralização do meu trabalho. Naquele instante não sentia nenhuma motivação para interromper a minha felicidade. A felicidade, além de difícil de encontrar, é tão fugaz que achei que deveria aproveitá-la à exaustão.

Se fosse um jogador de truco, poderia até acreditar que poderia estourar o jogo da felicidade, partindo para um tudo ou nada arriscado, como todo o jogo.

Na vida estamos sempre nos defrontando com a moeda de duas caras - a famosa cara ou coroa.

Pois bem. Estava neste impasse: ir, ou não ir. Ir significaria ter que renunciar – mesmo temporariamente – a um trabalho prazeroso. Com um agravante: eu poderia me aborrecer na nova situação. Não ir significaria ser mal interpretado, ferir suscetibilidades. Com um agravante: minha fama de solitário se consolidaria ainda mais.

Esta indecisão estava me deixando exasperado. Fiquei pensando por um momento... e decidi – não iria. “Cortei o mal pela raiz.” Que alívio! Nem pensei mais no compromisso e retornei ao trabalho e à paz de espírito que ele me trazia.

Tomada a decisão – sem nenhuma pontinha de culpa –, outro daqueles velhos ditados aflorou à minha mente: “Nunca troque o certo pelo duvidoso”. Creio que tomei o caminho da sensatez. E a sensatez me diz que, na minha idade, já alcancei o privilégio de me dedicar às coisas que me dão prazer.

Obrigado, mãe.

Gabriel Novis Neves

25-01-2011

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