quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

APAGÃO

A propaganda é a alma do negócio, dizem os vendedores de publicidade. O Chacrinha cunhou uma frase que é muito repetida para chamar a atenção daqueles que trabalham em surdina: “Quem não se comunica, se trumbica.”

Um dia, em plena tarde de calor insuportável, o meu bairro foi vítima de mais um apagão. Já perdi a conta neste ano que ainda não terminou, do número de vezes que o apagão - ou corte brusco da energia elétrica - sem previsão de retorno, nos visitou.

Não existe um determinado horário ou período para este fenômeno agudo acontecer, nem motivos aparentes.

Madrugada, início da noite ou na hora do futebol; pela manhã, ao meio dia ou à tarde; com ou sem chuva, ventos ou relâmpagos.

Também não há preferência por mês ou dia da semana.

Uma interrupção prolongada de energia elétrica em uma cidade onde a temperatura média é de 38% produz efeitos colaterais os mais diversos possíveis.

Em mim foi um princípio de desidratação, patologia muito frequente em idosos - e a certeza que fui mais uma vez enganado pela propaganda oficial.

Fui criado na cidade do apagão, a velha Cuiabá. Todos os seus poucos moradores, desde a mais tenra idade, eram educados para enfrentá-lo, assim como, ensinados a manejar as armas provisórias para suportá-lo: lampiões de querosene, caixa de velas e de fósforos compunham o kit apagão, que ficava em local que todos conheciam.

Cuiabá entra na era da modernização, e o governo anuncia que apagão já era. De 2003 para cá existia até uma propaganda bem humorada, dizendo - xô apagão.

A ministra de Minas e Energia da época do final oficial do apagão no Brasil, por coincidência, é a atual presidente da República.

E não é que o apagão voltou mesmo, só faltando o racionamento de energia como nos tempos do FHC?

Perguntei a um especialista que me explicasse o retorno dos apagões, apresentados como carro chefe de problema resolvido pelo governo anterior.

Ele foi curto e grosso na resposta: “falta de financiamento para expansão do consumo de energia, e de manutenção”.

Teve também aquela clássica resposta-amortecedora: “os apagões foram acidentes técnicos perfeitamente aceitáveis, que atingiram apenas alguns setores pontuais”.

Descobri, e já estou providenciando a minha mudança, pois, infelizmente, moro em uma rua do setor pontual.

Aqui de casa ouço o roncar dos motores dos geradores dos edifícios e o barulho infernal da longa fila de carros pela falta de iluminação do semáforo.

Tão simples seria para nós se aqueles carrinhos comprados na Rússia com os seus raios laser pudessem nos ajudar, pelo menos, no trânsito engarrafado, que está com os seus dias contados com a implantação do VLT.

A impressão dos cuiabanos que foram criados com a cultura do apagão, lampiões e velas, é que estamos voltando aos velhos tempos, onde todos os eventos da cidade eram planejados com o fenômeno do apagão.

Se as coisas caminharem como estão, em breve teremos a inauguração da Casinha da Luz, no Morro da Luz, para alguns, ou da Prainha, para outros.

Depois, a arrojada obra do super gerador do Rio da Casca, na Chapada dos Guimarães.

Dizem que sou pessimista ou estou de mal com a vida. Que sou da seita do quanto pior melhor. Acontece que relatei, sem desdém, uma mentira que nos foi pregada e que nos faz sofrer. Apenas isto.

Torço, como se isso fosse possível, ao retorno da Cuiabá inocente onde os seus graves problemas eram pecados veniais.

No caso do apagão de antigamente, ou era defeito comum no gerador no Morro da Luz, ou coisa mais séria no rio de nome lindo pela delicadeza do seu invólucro - Rio da Casca, onde as nossas ilusões e fantasias estão nessa palavra tão primitiva e poética - casca.

Sorte a minha de ter vivido nessa época e poder ter constatado que a mentira tem perna curta.

Durante anos mentiram a nós que apagão nunca mais, e que agora, somos Estado exportador de energia.

Quem entende de energia é eletricista engenheiro, e não, Lobão.

O apagão continuará, ou sairá na próxima Veja.

Gabriel Novis Neves

02-11-2011

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.