domingo, 31 de julho de 2011

Meu consultório

Anos atrás, quando eu era reitor da UFMT, o nosso programador visual, poeta Wlademir Dias Pino, ao retornar de uma das suas viagens, encontrou o seu laboratório em outro local – mais uma vez.

Procurou-me na reitoria para se queixar e me fez, delicadamente, a seguinte confissão:

“Quero te agradecer pelo meu novo local de trabalho. A sala é bem maior e confortável. Estou bem instalado. Entretanto, trabalho com papéis, desenhos, pinturas, recortes, documentos, e sou desorganizado. Estou na minha terceira mudança e três mudanças, para mim, correspondem a um incêndio.”

Realmente ele tinha razão. Existe maior transtorno que uma mudança? Mudei seis vezes de consultório: dois incêndios. Na Rua Corumbá, estou há vinte e cinco anos.

Por ocasião da instalação deste último consultório, tinha em mente criar um espaço que transmitisse uma atmosfera de bem-estar e relaxamento para as minhas clientes.

Não tinha a mínina idéia de como fazer isso. Busquei alguns prontuários e fui pincelando as maiores preocupações das futuras mamães por ocasião do Pré-Natal.

Selecionei aquelas que pareceram ser as principais. Entre elas: gravidez deixa o corpo feio; amamentar faz o seio ficar flácido; meu marido vai perder o interesse sexual; como será o parto; se o neném vai ser perfeito; como me localizar na hora do parto; o valor das despesas médicas. Pronto, pensei - vou trabalhar em cima dessas preocupações.

Solicitei auxílio de artistas plásticos, escultores, pintores, fotógrafos e ceramistas. Queria peças que, de alguma forma, dialogassem com minhas clientes. E assim foi feito. O resultado foi materializado em um ambiente que exala simplicidade e reflexão. Diria que funciona como um ambiente de verdadeira terapia visual.

Assim que a cliente entra no consultório, depara-se com uma foto em preto e branco de uma mulher grávida. A foto ocupa toda a extensão da parede. "Que coisa linda"! Exclamam algumas clientes. Eu respondo: "ela está grávida"!

Em cima do aparador, que é uma porta de igreja do século XVIII, duas esculturas. Uma índia pré-colombiana e uma negro-africana: ambas amamentando os seus filhos.

Na parede, a pintura de uma mulher do século XXI, também deixando o seu filho sugar suas mamas. Aleitamento não é moda que passa, mas um valor definitivo na história das mulheres.

Nesse mesmo aparador, uma escultura em madeira retrata o namoro de uma mulher grávida e o marido. A gestação não interrompe, não impede e não atrapalha o namoro.

Algumas outras dificuldades que pesquisei como: meu filho será perfeito, tipo de parto, a certeza de me encontrar aos primeiros sinais e o custo dos honorários; estão explicados em outras esculturas e quadros de pintores cuiabanos.

Assim é meu consultório. Enquanto realizo procedimentos médicos, a gestante, visualmente, vai mudando seus valores, sem perceber que está sendo preparada para o parto humanizado.


Gabriel Novis Neves

24-07-2011

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