Estava no meu sobradinho, quando de surpresa apareceu o nosso prefeito para uma visita - isso no início do ano passado.
Era um sábado, por volta do meio-dia. As cadeiras de balanço já estavam ocupadas pelos seus titulares, o pastelzinho rolando e a redondinha descendo.
Gosto de receber amigos aos sábados e aos domingos pela manhã para longos e agradáveis bate-papos. Mas não os convido. Convite para mim soa como uma intimação, e os meus íntimos sabem disso.
Eles vão aparecendo. Uns de surpresa, outros, mais precavidos, avisam antes.
Pois bem, nesse histórico sábado nosso prefeito, que à época só tomava refrigerante e vinho na Chapada, me convidou a descer para me mostrar uma obra que, segundo ele, acabaria definitivamente com os inúmeros buracos no asfalto da minha rua.
Fui. Confesso que fiquei impressionado com a espessura do asfalto - quase meio-metro!
Eufórico com a minha satisfação, ele não se conteve e disse: - Estou fazendo esse asfalto especial para impressionar o poderoso Diretor Geral do DNIT que mora na esquina. Ele viu a obra e me disse que esta era a melhor pavimentação urbana do Brasil.
De volta ao sobradinho - ninguém tinha arredado pé, nem deixado de molhar a garganta, muito menos de saborear os pasteizinhos -, relatei o que vi, e as palavras do prefeito: - "os moradores dessa rua jamais terão problemas com o asfalto¨.
Um pessimista, ou do contra - não consigo fazer esse diagnóstico diferencial, ouviu em silêncio as opiniões sobre a grande conquista que tantos transtornos causavam aos seus moradores.
Depois de um gole duplo da redondinha sentenciou: - Não vai aguentar a primeira chuva!
“Hummm!” Foi o murmúrio coletivo e severo que recebeu dos presentes. E estava implícito: - lá vem ele de novo com o seu pessimismo!
A conversa debandou para assuntos mais amenos, e a reunião foi encerrada, indo cada um para a sua casa. Não. Eles não ficam para almoçar.
As chuvas de março chegaram. Logo apareceu uma área de afundamento no grosso asfalto. Nenhuma providência foi tomada.
O afundamento não era nada desprezível. Ainda mais numa pista de movimento muito intenso de caminhões, ônibus, carros e motos. Era um orifício no centro do asfalto lesionado, e sem assistência - semelhante aquele produzido por sondas para perfuração de poços artesianos.
O orifício foi se transformando, sucessivamente, em buraco, buracão e cratera. Nada de providências. O risco de acidentes era evidente, e o total desabamento era questão de horas.
Os funcionários do edifício em frente ao fenômeno da incompetência governamental resolvem, por conta própria, sinalizar o perigo colocando pequenas folhas mortas de palmeiras no buraco. Depois colocaram um cavalete pequeno em cima. Aquele tradicional de “carga e descarga” que todo edifício tem.
Diante das mensagens fotográficas do site que ninguém lê, e em Cuiabá abandonada, os governos estaduais e municipais tomaram providências.
Convocaram o famoso caminhão tapa buracos para a missão.
Os trabalhadores oficiais, diante da gravidade do problema e na iminência de um grande desabamento, colocaram uma enorme placa oficial, que quase interrompe o trânsito da rua, com os seguintes dizeres: ”Cuiabá. Todos contra a dengue!”
Santa ironia! A placa foi colocada exatamente na porta da casa do mosquitinho que pica e mata!
O problema da ex-Cidade Verde é a falta de saneamento básico – o crônico problema das obras enterradas. Isto sim iria resolver em definitivo o problema, e não uma grossa camada de asfalto.
Lembrei-me da previsão da boquinha maldita do ano passado: “não vai aguentar a primeira chuva”.
Gabriel Novis Neves
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