sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Questão de sorte

Rodou pela internet uma entrevista do Chico Anísio interpretando uma velha senhora. Num ambiente formal o jornalista faz a primeira pergunta:
- Minha senhora, qual a sua profissão?
- Puta.

Consternação geral. A resposta foi como um soco na boca do estômago do jornalista. Atordoado, repete a pergunta:
- Qual é mesmo a sua profissão?
- Puta. Repetiu ela. Depois: - É puta mesmo, p-u-t-a. Puta.
- Na sua família todos tem essa profissão? Quis saber o jornalista.
- Não. A minha falecida mãe era professora primária. Minhas duas irmãs solteironas são professoras e o meu pai era farmacêutico. Isto quer dizer que... – a velhinha deu de ombros e acrescentou – sim, sou a única puta da família.
- A que a senhora atribui essa vocação?
- Questão de sorte. Responde convicta.

Acabamos de sair da maior greve de médicos da rede pública de Cuiabá. Mais de dois meses de paralisação oficial. Agora – nova paralisação. Motivo? Falta de médicos especialistas para atender os pobres. Não é que vamos começar tudo de novo? Vamos acabar entrando no livro dos recordes na categoria “prejudicar pobres.”

O Presidente da Associação dos Docentes da Universidade Federal de Mato Grosso (ADUFMAT), Professor Carlos Alberto Eilert, publicou uma carta – “Ao povo de Mato Grosso.” Nela denuncia o crime cometido pelo Governo Federal contra o Hospital Universitário Júlio Müller, que abriga uma das melhores escolas de Medicina do Brasil. O único no Estado que atende cem por cento pacientes do SUS. A nossa fraca bancada federal - que só sabe balançar a cabeça em sentido vertical para agradar o governo - e as nossas “prestigiadas” lideranças estaduais, não se manifestaram.

O Governo Federal reduziu as 22 mil horas, com as quais o hospital funcionava, e bem, para 6 mil horas. Essas horas, chamadas de extra, são necessárias para o pagamento de plantões. Não cito aqui o papel da Reitoria porque as universidades públicas brasileiras não possuem autonomia - são apenas mais uma repartição do governo. A direção do hospital teve que escolher os setores que deixarão de atender aos pobres.

O nosso Presidente afirmou que o brasileiro está na merda. Com o fechamento do único hospital de ensino federal, “ele” nos mostra como se faz para tirá-lo de lá. Deixando de atender aos pacientes pobres - eles irão morrer. Logo teremos menos gente na merda!

O setor de pronto atendimento sem funcionar, deixará de atender, por dia, 100 pacientes pobres, entre crianças e adultos. O número de leitos na UTI neonatal será reduzido de 10 para 6, e o de adultos de 8 para 6. A lavanderia também não funcionará mais 24horas. E assim, aos poucos, o hospital vai fechando. Prejuízo na formação dos futuros médicos e falta de assistência aos mais necessitados - justamente aqueles que estão na merda, segundo o Presidente.

Enquanto todos brigam pelo aumento do número de leitos hospitalares e pela construção de novos hospitais, o governo fecha hospitais, diminui o número de leitos, incentiva o fechamento de outros e sufoca a precária rede hospitalar privada sem leitos suficientes para atender a demanda local.

Sabem por que a população cuiabana e mato-grossense está sofrendo tanto, especialmente com a saúde pública? Por “Questão de sorte”.

Escolhemos mal os nossos governantes - bem diferente da personagem do Chico!

Gabriel Novis Neves
06/01/2010

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