sábado, 5 de março de 2011

Chorou

Escrever sobre saúde pública é caminhar para dentro de um túnel sem fim. O pior é que, quanto mais se procura a tão falada luzinha da salvação da saúde pública, mais ela se afasta.

No nosso Estado a situação da saúde pública não é diferente da de outros Estados desta abençoada nação.

Como médico do interior, conheço os meus limites provincianos.

Soube do depoimento espontâneo de um médico, nascido no antigo Hospital Geral da Rua 13 de junho - na ex-Cidade Verde -, feito no plenário do Conselho Regional de Medicina. Ele é o atual Diretor Clínico do Pronto Socorro do Hospital Municipal de Várzea Grande.

O diretor clínico de um hospital não é nomeado por políticos. É eleito pelos médicos que compõem o corpo clínico do hospital. Tem mandato de dois anos e representa o CRM dentro da instituição. Trabalha com uma diretoria, também eleita pelos médicos. Dentre os diretores, existe um responsável pela ética médica, outro pela infecção hospitalar etc.

Pois bem. O depoimento desse colega emocionou os mais velhos, e ele desabou em um vale de lágrimas ao relatar, com fidelidade, a situação do Pronto Socorro de Várzea Grande.

O problema por lá é crônico. Piora ano a ano devido à ausência do poder público. Remendos, puxadinhos, “inaugurações” e muitas promessas não cumpridas. Até que a represa estourou.

Houve interferência direta do Ministério Público, dando um prazo para as reformas necessárias.

O CRM também interditou o hospital e concedeu um mês para que os médicos atendessem dignamente os pacientes que se encontravam nas macas, cadeiras, redes e até no chão.

O prazo concedido venceu e o Pronto Socorro não tem condições para funcionar.

Para humilhação dos médicos, um oficial de justiça é plantonista no PS - para verificar se existe médico faltoso e, assim, legalizar o crime cometido pelas nossas autoridades.

Findo o prazo concedido pelo CRM, os médicos que aceitarem trabalhar nas condições atuais serão punidos.

O governo conseguirá um mandado de segurança obrigando os médicos a praticarem a eutanásia, e o grande culpado pelo não funcionamento da saúde pública será o de sempre: o médico.

A “reforma” do PS é uma malfeita obra cosmética.

Os buracos nas paredes continuam, apenas receberam uma mão de tinta. Os pisos quebrados não foram substituídos - uma massa de cimento cobriu o estrago. O consultório da pediatria só recebeu uma pintura terapêutica graças à doação da tinta feita pela pediatra.

O diretor clínico, preparado para o enfrentamento da morte, jamais se preparou para o desdém das nossas autoridades diante do sofrimento dos pobres.

Chorou.

Gabriel Novis Neves

02-03-2011

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