domingo, 7 de novembro de 2010

Avecista

Consegui o telefone do velho amigo. Risco o seu número pelo meu celular. Timidamente perguntei ao atendente do chamado se poderia falar com o senhor Lomba, pois não confiava muito no fornecedor do endereço. Era o próprio! Não é que o Lomba identificou com rapidez impressionante que a voz era a minha? Surpreso, comentei o fato com ele.

Para quem não sabe, o nosso companheiro da Universidade da Selva há dois anos enfrenta a recuperação de um acidente vascular cerebral - AVC. Como médico, acompanho a sua luta dramática para viver. Foi acometido de todos os tipos de complicações possíveis com esse grave acidente. Está agora fora da UTI. Faz fisioterapia diária, uma alimentação controlada. Apresenta muito bom humor, sabe e opina sobre tudo que acontece no nosso planeta.

Como é possível não ficar sem uma seqüela cognitiva? Perguntei. Surpreso, escutei a resposta: “Ora meu velho! Na última ressonância magnética que fiz, constatou-se que metade do cérebro foi perdida com o AVC. O médico me mostrou a enorme mancha escura, que significa a perda do cérebro. É como se houvesse um apagão. Acontece, professor, que descobri com este AVC que para viver antenado, meio cérebro basta! Temos muito cérebro.”

Fiquei em silêncio, saboreando o que ele me transmitia do Rio de Janeiro. Não acredita na fisioterapia e nos especialistas. Tem aprendido muito nas horas em que fica na sala de espera, aguardando consulta médica. Brada que na época que o seu avô clinicava, a Medicina era bacana. E me diz que hoje ele evita, em uma consulta neurológica, queixar-se de uma coceira na garganta.

Imediatamente a consulta é interrompida e o paciente encaminhado ao médico especialista em coceira de garganta. Acha que o AVC é a doença da moda. Mata mais que acidente de trânsito, bala perdida, violência urbana, seqüestro com morte, drogas, desnutrição e doenças sociais. Sabe de todos os seus contemporâneos que foram atingidos pela doença da moda. Vários “ativistas” do Projeto Aripuanã estão na sua situação. Tem certeza que a ciência médica hoje empregada não cura os pacientes que dela necessitam.

Percebi que a conversa já estava longa para um avecista que acabara de acordar, se bem que no horário do Rio era hora do almoço. Ao despedir-se, me faz um alerta: “Fique tranqüilo, professor, com a minha saúde. Eu não vou morrer. E não se esqueça que a inteligência nos afasta e a burrice nos une. Somos uma humanidade unida.”

Este é o Lomba!


Gabriel Novis Neves (7.5 + 16)

22-07-2010

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