domingo, 28 de novembro de 2010

RESSACA

Dois feriadões em quinze dias produziram em mim a sensação de uma grande ressaca. Fiquei confuso com relação aos dias da semana. Estava me preparando para os afazeres de certo dia, quando fui alertado pelo cuidador do meu irmão - ele conhece toda a minha rotina – do equívoco.

Antes ele não tivesse me avisado! Não estava psicologicamente preparado para viver o pós-feriadão desse jeito. O descondicionamento mental não é fácil, ainda mais na minha idade onde a máquina cerebral já apresenta alterações próprias de enferrujamento.

Queria mais era fugir da encrenca em que me meti. Queria ir para o trabalho para fugir das furadeiras, martelos, perfuradoras, gesso, pó branco, e todos esses irritantes apetrechos que invadiram meu apartamento. E no meio dessa confusão toda, perdi o meu bom humor.

Estou verdadeiramente desolado! Minha casa está de pernas para o ar. Lembro-me de uma velha tia reclamando que, sempre quando a visitávamos, a casa ficava de pernas para o ar. Agora eu entendo o sentimento da minha tia.

O cenário atual da minha casa é de deixar qualquer um louco. Móveis encapuzados e fora do lugar, quadros arriados das paredes, tapetes enrolados no corredor do meu quarto de dormir. Como se não bastasse esta desordem irritante, fico tropeçando em pedreiros, gesseiros e pintores. O pior é que todo este cenário não tem data certa para a conclusão.

De manhã, logo que acordo, a primeira coisa que faço é sair apalpando o gesso molhado, implorando a sua colaboração para que mude logo de cor - para o branco da secura. Pelo menos certeza teria de um prognóstico do final dos serviços.

Este impulso de apalpar gesso úmido é parecido com o gesto de uma mãe apalpando a testa do seu filho para saber se a febre acabou.

Diante da minha inquietação, tento me consolar: fui eu o causador de toda essa lambança. Mas, como dizem que o acaso não existe, e que ele é responsável por muitas descobertas, fico consolado. Descobri uma coisa, para mim muito importante: se não fizesse este serviço, perderia, para o calor insuportável e desumano, a companhia da minha família no almoço de final de semana.

Ficaria igual político em fim de mandato: almoçando sozinho. Prefiro uma reforma com todos os seus contratempos a uma solidão motivada pelo calor da minha cidade.

Os aborrecimentos são passageiros assim como a sensação de uma ressaca de um feriadão.


Gabriel Novis Neves (7.5+133)

16-11-2010

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