sexta-feira, 26 de dezembro de 2025

O FUTURO QUE NÃO ME INTERESSA


Só quem passa por essa situação tem noção do que seja futuro. 

 

O futuro, para mim, deixou de ser horizonte e virou ruído distante. 

 

Não faço planos longos, não cultivo expectativas, não negocio com o amanhã. 

 

Aprendi a respeitar o hoje, esse território curto, porém intenso, onde cada pequeno gesto ganha valor. 

 

Acordar, levantar com cuidado, preparar o café, ler o jornal, escrever algumas linhas — isso basta. 

 

O futuro sempre foi uma invenção dos jovens e dos inquietos. 

 

Ele exige pressa, ambição projetos. 

 

Na minha idade, ele cobra demais e oferece pouco. 

 

Prefiro o ritmo lento do presente, que não promete nada, mas entrega o que pode. 

 

Um telefonema inesperado, uma visita breve, uma memória que chega sem aviso. 

 

O tempo, agora, não corre. 

 

Ele caminha. 

 

E caminha comigo. 

 

A ausência da companheira não aponta para o futuro; ela pesa no agora. 

 

Está na cadeira vazia, no silêncio da casa, na falta de opinião sobre o almoço ou o noticiário da noite. 

 

Não é dor espetacular, é ausência cotidiana — dessas que não fazem barulho, mas ocupam espaço. 

 

Vivo cuidando do que ainda está sob meu alcance: a saúde possível, a casa que insiste em envelhecer comigo, os textos que escrevo para organizar pensamentos e lembranças. 

 

Escrever, aliás, é meu modo de permanecer. 

 

Não penso em legado; penso em arrumar o dia. 

 

O futuro não me interessa porque ele não me pertence mais. 

 

O presente, sim. 

 

Ele é meu, inteiro, mesmo curto. 

 

E enquanto houver manhã, palavra escrita, memória viva e algum afeto circulando, estarei em dia com a vida. 

 

O resto é apenas calendário. 

 

Gabriel Novis Neves 

12-12-2025




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