Só quem passa por essa situação tem noção do que seja futuro.
O futuro, para mim, deixou de ser horizonte e virou ruído distante.
Não faço planos longos, não cultivo expectativas, não negocio com o amanhã.
Aprendi a respeitar o hoje, esse território curto, porém intenso, onde cada pequeno gesto ganha valor.
Acordar, levantar com cuidado, preparar o café, ler o jornal, escrever algumas linhas — isso basta.
O futuro sempre foi uma invenção dos jovens e dos inquietos.
Ele exige pressa, ambição projetos.
Na minha idade, ele cobra demais e oferece pouco.
Prefiro o ritmo lento do presente, que não promete nada, mas entrega o que pode.
Um telefonema inesperado, uma visita breve, uma memória que chega sem aviso.
O tempo, agora, não corre.
Ele caminha.
E caminha comigo.
A ausência da companheira não aponta para o futuro; ela pesa no agora.
Está na cadeira vazia, no silêncio da casa, na falta de opinião sobre o almoço ou o noticiário da noite.
Não é dor espetacular, é ausência cotidiana — dessas que não fazem barulho, mas ocupam espaço.
Vivo cuidando do que ainda está sob meu alcance: a saúde possível, a casa que insiste em envelhecer comigo, os textos que escrevo para organizar pensamentos e lembranças.
Escrever, aliás, é meu modo de permanecer.
Não penso em legado; penso em arrumar o dia.
O futuro não me interessa porque ele não me pertence mais.
O presente, sim.
Ele é meu, inteiro, mesmo curto.
E enquanto houver manhã, palavra escrita, memória viva e algum afeto circulando, estarei em dia com a vida.
O resto é apenas calendário.
Gabriel Novis Neves
12-12-2025
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