sábado, 6 de dezembro de 2025

CONTAS PAGAS


Aprendi com meu pai que uma dívida deve ser paga sempre antes do prazo, para evitar transtornos de última hora.

 

Meu pai era de uma geração em que a palavra empenhada precisava ser cumprida, e pagar uma conta se transformava em motivo de satisfação.

 

Não sei viver devendo.

 

Envelheci sem contas a pagar, com tranquilidade, mantendo a vida sob controle.

 

Não me acostumo com a geração atual, em que a palavra empenhada pouco vale e as contas não têm prazo definido.

 

Os juros bancários rolam livremente, formando verdadeiros bolões.

 

Tenho a impressão de que as gerações antigas carregavam maior sentido de responsabilidade quando o assunto era honrar compromissos.

 

O sonho era chegar à velhice com serenidade, controlando a própria vida e pouco se importando com o saldo bancário.

 

Na Cuiabá da minha infância, seus habitantes tinham padrões sociais semelhantes e todos viviam relativamente bem, sem que lhes faltassem o essencial.

 

As crianças frequentavam a mesma escola pública, o mesmo postinho de saúde, a mesma igreja, e passeavam no mesmo jardim público.

 

Tudo era simples e prazeroso: as visitas aos domingos, a mesa farta em casa, onde quase tudo era produzido nos quintalões cuiabanos.

 

O que faltava, o rio Cuiabá oferecia, generoso, com sua variedade de peixes.

 

Poucos possuíam automóveis numa cidade em que tudo ficava perto.

 

Quando a primeira mulher passou a dirigir um carro, as pessoas iam às janelas para contemplar tamanha novidade.

 

Meu pai nunca comprou um automóvel; minha jovem cuidadora, por sua vez, tem um recém-tirado da loja.

 

Com o passar dos anos, nossa vida foi se tornando mais complexa, até chegarmos ao estado atual: dependentes de vários especialistas para controlar a própria existência.

 

O pior é que envelhecemos e esquecemos da tranquilidade que ficou para trás.

 

Com tristeza vivemos hoje em uma cidade dividida por classes sociais, gerando conflitos, onde as crianças crescem separadas e a régua que mede as pessoas passou a ser o dinheiro.

 

Gabriel Novis Neves

04-12-2025




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