Aprendi com meu pai que uma dívida deve ser paga sempre antes do prazo, para evitar transtornos de última hora.
Meu pai era de uma geração em que a palavra empenhada precisava ser cumprida, e pagar uma conta se transformava em motivo de satisfação.
Não sei viver devendo.
Envelheci sem contas a pagar, com tranquilidade, mantendo a vida sob controle.
Não me acostumo com a geração atual, em que a palavra empenhada pouco vale e as contas não têm prazo definido.
Os juros bancários rolam livremente, formando verdadeiros bolões.
Tenho a impressão de que as gerações antigas carregavam maior sentido de responsabilidade quando o assunto era honrar compromissos.
O sonho era chegar à velhice com serenidade, controlando a própria vida e pouco se importando com o saldo bancário.
Na Cuiabá da minha infância, seus habitantes tinham padrões sociais semelhantes e todos viviam relativamente bem, sem que lhes faltassem o essencial.
As crianças frequentavam a mesma escola pública, o mesmo postinho de saúde, a mesma igreja, e passeavam no mesmo jardim público.
Tudo era simples e prazeroso: as visitas aos domingos, a mesa farta em casa, onde quase tudo era produzido nos quintalões cuiabanos.
O que faltava, o rio Cuiabá oferecia, generoso, com sua variedade de peixes.
Poucos possuíam automóveis numa cidade em que tudo ficava perto.
Quando a primeira mulher passou a dirigir um carro, as pessoas iam às janelas para contemplar tamanha novidade.
Meu pai nunca comprou um automóvel; minha jovem cuidadora, por sua vez, tem um recém-tirado da loja.
Com o passar dos anos, nossa vida foi se tornando mais complexa, até chegarmos ao estado atual: dependentes de vários especialistas para controlar a própria existência.
O pior é que envelhecemos e esquecemos da tranquilidade que ficou para trás.
Com tristeza vivemos hoje em uma cidade dividida por classes sociais, gerando conflitos, onde as crianças crescem separadas e a régua que mede as pessoas passou a ser o dinheiro.
Gabriel Novis Neves
04-12-2025
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