sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Praça Popular

O dia amanheceu diferente. Uma simpática garoa molhava as ruas e um friozinho obrigava o cuiabano a usar roupas mofadas de baús lacrados. Não estamos acostumados com a friagem. Olho para cima e vejo um tapete de chumbo sobre a cidade indicando mudança climática.

Saio de casa assim mesmo para proteger a minha saúde sabendo dos riscos que enfrento. Um seqüestro por engano ou relâmpago, um assalto à mão armada para roubarem o meu velho tênis ou uma brincadeira dos meninos de família voltando das baladas. Já fui escolhido para inúmeras dessas gracinhas. A mais recente que os meninos de família inventaram é obrigar os velhinhos caminhantes das madrugadas a pularem uma corda imaginária jogando na direção de seus pés latinhas da redondinha e outros apetrechos. Eles se divertem.

No meu caso faço um exercício não programado, com humor. Dá medo quando são bombinhas. Aí penso logo em tiros. A juventude é irreverente. Isto passa. Com todos os riscos optei pelo cuidado da minha saúde, e ao sair de casa peço proteção a Deus e sempre mudo de rota.

Como em uma ausência epilética, acordei hoje na Praça Popular. Passo sempre por lá, pela manhã e de carro, não percebendo os detalhes da sua transformação. A pé percorri lentamente o seu entorno. Está totalmente modernosa. Restaurante japonês, italiano, árabe, francês e até brasileiro com sobrado. Casas de chá, doces, salgadinhos, sorveterias. Lugares apropriados para drinks e jogar conversa fora. Encontrei lojas chiquérrimas e outras necessidades da burguesia. Na praça notei ainda a presença de árvores centenárias, quadra esportiva de múltiplo uso para crianças, jovens e para aqueles que estão bem (velhos).

Estranhei, e muito, a falta de um banheiro público. Com certeza foi um descuido das nossas autoridades sanitárias, e uma baita falta de respeito para os que vão apenas curtir a praça. À noite, dizem, que é o lugar predileto da sociedade.

O trânsito noturno fica proibitivo para os que residem naquela região. Ninguém consegue sair ou chegar em casa de automóvel. Todas as ruas ficam congestionadas, e ninguém do trânsito se faz presente. O barulho da praça de lazer e residencial não respeita as leis do silêncio. Providências não são tomadas.

Pela manhã a festa é dos cachorros que engaiolados nos apartamentos são trazidos à praça para fazerem as suas necessidades fisiológicas. E pensar que a minha geração utilizava a praça popular para de madrugada ser levada pela família para a cura da coqueluche. O oxigênio da praça foi substituído pela fumaça das cozinhas e restaurantes. O odor da clorofila, pela mistura de cheiros de pizza, churrasquinho e restos fisiológicos de humanos e cachorros.

Onde está a Praça Popular da cura da coqueluche?

Gabriel Novis Neves
13-06-09

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