sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Decoreba



Muitas pessoas me perguntam se sou a favor da decoreba. Quem respondeu “sim”, errou. Tenho motivos suficientes para abominar a pedagogia da memorização ou do papagaio amestrado. Várias gerações passaram e continuam passando por esta desgraça. Quando criança, freqüentava a escola pública pela manhã. A tarde toda decorava a lição. No dia seguinte, de madrugada, muitas vezes utilizando a luz das velas ou lamparinas, sentava-me em uma cadeira de balanço e minha mãe em outra. Era o momento de “tomar a lição”. Com o livro aberto a minha mãe acompanhava o que eu dizia. Eram páginas e páginas de textos memorizados. Qualquer esquecimento da minha parte ela pedia que repetisse tudo de novo. A aprovação da minha mãe era o balanço da cabeça afirmativamente. Até problemas de matemática eu decorava.

Como conceito de normalidade é estatístico, achava normal aquele modelo educacional, pois não conhecia outro. Vou estudar no Rio de Janeiro. Logo descubro que fui enganado. Graças a Deus, às orações da minha mãe, a minha força de vontade e ao balconista da Farmácia Jacy no Catete, o seo Anísio Silva (famoso cantor de boleros da Rádio Nacional) que me indicou o uso de anfetamina para suportar vinte horas de estudos, passei no vestibular dificílimo da Praia Vermelha – a Matriz.

Sofri e, muito com a pedagogia da memorização. Temos que acabar com isto. O processo de interpretação e compreensão do conhecimento inicia-se na educação infantil que, no Brasil, atende a uma faixa quase desprezível da população, especialmente a de baixa renda. Cumprir a lei da promoção automática no ensino fundamental é um engodo. Ninguém respeita a legislação que obriga o estado a recuperar os alunos promovidos, porém com deficiências no aprendizado. O ensino médio é o grande gargalho da nossa precária educação. A evasão é grande e não serve para nada, a não ser para alguns poucos que conseguem chegar à Universidade.

Num bom sistema educacional o vestibular seria dispensável. O aluno automaticamente iria para a Universidade que deveria ser a seqüência natural do processo educacional. Avaliação anual rigorosa, bons cursos com professores qualificados e motivados impediriam a formação de analfabetos funcionais com nível superior.

No Brasil, por falta de estrutura para acolher os alunos do ensino médio, criou-se a barreira do vestibular. Ruim para os alunos pobres. Agora resolvem acabar com o velho vestibular, filho da falta de educação de qualidade, com uma proposta de reforma do ensino que começa pelo teto da casa.

Para esta empreitada precipitada inventaram que o novo vestibular veio para acabar com a decoreba.

E o pior é que tem gente que acredita.

Gabriel Novis Neves
23-06-09

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