terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

VIDA AO CONTRÁRIO

É frequente nas entrevistas que dou para estudantes que estão formatando teses de conclusão de curso universitário ou pós-graduação, responder a pergunta: “Doutor, como tudo começou?”
Sempre fui muito honesto em minhas respostas aos jovens e, há anos, sempre a declaração é a mesma - minha vida profissional começou ao contrário.
A curiosidade juvenil aumenta. Quer saber como alguém construiu uma vida cheia de realizações nas áreas da saúde e educação ao contrário, e no poder público.
Simplesmente aconteceu, reafirmo.
Explico: ao terminar o meu curso de medicina no Rio de Janeiro, e não me sentindo seguro para ser médico do interior, aquele que, não sendo especialista, tinha de conhecer todos os males do corpo e da alma, preferi ficar no Rio por conta de uma própria programação e estagiar nas mais diferentes clínicas da medicina básica.
Embora o meu foco fosse, desde cedo, a ginecologia e obstetrícia.
Hoje esses médicos são chamados de “médicos da família”, e o Brasil está importando esses profissionais.
Quando adquiri conhecimentos científicos que me tranquilizaram, retornei à minha Cuiabá.
Ao chegar, meus dois colegas de turma já eram profissionais muito bem conceituados no mercado de trabalho.
Fiquei apenas um ano como médico generalista, atendendo os “indigentes” na Portaria da Santa-Casa - nome mais tarde alterado para Pronto Atendimento e Partos na Sociedade Beneficente de Proteção a Saúde da Mulher e da Criança, duas entidades filantrópicas.
Nesse período recebi ajuda dos meus colegas mais antigos para sobreviver, auxiliando-os nas suas cirurgias particulares.
Isso demorou pouco mais de um ano, quando fui convocado a assumir a direção do único hospital psiquiátrico público no Estado ainda não dividido.
Foi o começo da minha carreira profissional ao contrário.
Dois anos depois, nova e perigosa missão. Fui “promovido” para ocupar o cargo de secretário de educação do colossal Estado.
Três anos se passaram e o grande desafio da minha vida: implantar uma universidade federal na selva.
O pior é que não me julgava capacitado para o exercício dessas funções, sempre ocupadas por servidores de carreira como prêmio final antes da aposentadoria.
Nunca pensei em ser administrador público. Preparei-me para ser um útil médico do interior, o que me foi negado pelo destino.
No início recebi essas missões como coisas ruins, opinião compartilhada pelos meus colegas.
Depois, reparei que elas foram mais facilmente metabolizadas por mim do que as boas coisas.
Tudo que é considerado bom costuma ter um início amargo. A vida é mesmo incompreensível, e essa genética do contrário continua a prevalecer na minha vida afetiva e profissional.
As artimanhas do acaso continuam me surpreendendo pela vida afora...
Continuo vivendo ao contrário, e muito feliz.

Gabriel Novis Neves
05-02-2014

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