sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Princípio

A vida me ensinou que nunca devemos retornar àqueles lugares que não fazem parte do nosso cotidiano e que representa um pedaço da nossa existência. Tenho evitado ao máximo essas situações, quase sempre frustrantes.

Deixei Cuiabá adolescente para estudar Medicina no Rio de Janeiro. Como em um filme, recordava-me da minha cidadezinha: seus becos, ruas estreitas, avenidas longas, igrejas majestosas, o movimentado cais do Porto com navios ancorados, gente chegando e gente partindo. O hidro avião que me levou pela primeira vez para longe de Cuiabá. O imenso muro de terra batida em frente a minha casa, e tantas e tantas recordações.

Anos após, venho passar uns dias com os meus pais. Os sonhos produzidos pela distância, na visão do menino do interior, não existiam. O muro, em cuja calçada de terra jogava bolitas de vidro e as meninas amarelinho, era baixinho - sua altura era inferior a minha (1.85m). Tudo era diferente dos meus sonhos de saudades.

Já médico, e ocupando um cargo público, faço parte das autoridades que recepcionaram os alunos da Escola Superior de Guerra, cujo Diretor era um ilustre cuiabano.

No discurso de agradecimento ao governo do Estado, o nosso conterrâneo do Baú, há muito ausente desta cidade linda, assim se referiu a sua nova capital: “Cuiabá mudou muito e se transformou em metrópole. Aproveitando uma folga na minha apertada agenda, fugi e fui ver se existia ainda o buraco que fiz no grosso muro de barro do quintal da minha casa. Encontrei-o intacto. Meti a mão e retirei de lá a bolita de vidro dos jogos de buque, que havia colocado há trinta anos, quando fui estudar para a carreira militar.”

Por motivos profissionais, retornei dia desses, a um dos lugares que mais me toca ao coração. Existe sonho, utopia, trabalho, sacrifício, dedicação, renúncia e compromisso de toda uma geração, naqueles oitenta hectares do Coxipó da Ponte.

Senti tristeza em vez de saudade. Frustração, e não, orgulho. Abandono, e não, aconchego. Distância, e não, proximidade. Terminei o meu compromisso e, sem olhar para trás, com receio de virar estátua de sal, voltei para casa.

No trajeto, mil coisas passaram-se pela minha cabeça, que logo tratei de afugentar. Em casa não encontrei com quem desabafar. O que faço agora na telinha do computador.

Jamais voltarei aos lugares que amo!

Gabriel Novis Neves

25-10-2011

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