segunda-feira, 3 de junho de 2013

HIPOCONDRIA

Data do século XVII a última peça de teatro escrita pelo grande dramaturgo francês Molière: a comédia satírica “Le Malade Imaginaire” (“Doente de Cisma” ou “Doente Imaginário”)
O personagem principal é Argan – vivido pelo próprio Molière. Um velho hipocondríaco, carente, muito rico e avarento burguês, que se julga doente, sem de fato o estar e, dessa maneira, acata indiscriminadamente todas as ordens de seu médico que, por sua vez, se aproveita da situação.
É uma obra de extrema importância social e satiriza a medicina daquela época. Trata friamente da relação médico-paciente e denuncia a má fé dos poderosos, num tempo em que os que se intitulavam médicos eram, quase todos, charlatães.
Com o passar dos séculos as queixas da relação médico-paciente continuaram. E, nos dias atuais, esta relação tomou uma proporção bem maior, em razão, talvez, da priorização da tecnologia em detrimento da troca emocional afetiva, que sempre deveria estar presente nesses encontros.
Os hipocondríacos aumentam diariamente, pois as carências ocorridas em decorrência do mundo moderno só fazem crescer.
Todos nós nos sentimos uns abandonados crônicos; quer pelo Estado, quer pela sociedade consumista que nos descarta facilmente no dia-a-dia, quer pelos difíceis relacionamentos afetivos do mundo moderno.
Nesse quadro forma-se o caldo ideal para o aparecimento das doenças psicossomáticas que enchem os consultórios.
Na verdade, um forte componente histeroide, aliado à baixa autoestima e carência afetiva, faz com que algumas pessoas apresentem uma baixa do tônus cortical e, portanto, mais sujeitas a quedas imunológicas repentinas e mais suscetíveis a contrair todo tipo de patologia.
O consumo exagerado e livre de medicamentos está sempre presente, o que, aliás, muito agrada à indústria farmacêutica.
Quem não conhece aquela pessoa que ao ouvir o relato de alguma enfermidade passa logo a sentir todos os sintomas referidos?
Ou então, aquela pessoa que tem como preocupação primordial frequentar consultórios médicos? Chega até a demonstrar grande desapontamento quando seus esculápios não prescrevem grande quantidade de remédios. Algumas, inclusive, confessam adorar exames laboratoriais seguidos e desnecessários, assim como todas as outras práticas médico-hospitalares.
Com certeza, aí se esconde uma grande carência afetiva crônica, praticamente um grito por ajuda. As intoxicações medicamentosas são frequentes nesses casos, e sempre mais perigosas do que as próprias doenças inexistentes.
Em países de primeiro mundo, em que a vida humana é levada mais a sério, usam-se placebos como medicamento, e a psicoterapia é a única indicação.
Só uma longa e detalhada anamnese e uma profunda interação médico-paciente poderão minorar o sofrimento desses pacientes, tanto mais frequentes quanto os desencontros da própria vida.
Que a classe médica atente para esses verdadeiros gritos de socorro!

Gabriel Novis Neves
03-04-2013

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