Data
do século XVII a última peça de teatro escrita pelo grande dramaturgo francês
Molière: a comédia satírica “Le Malade Imaginaire” (“Doente de Cisma” ou
“Doente Imaginário”)
O
personagem principal é Argan – vivido pelo próprio Molière. Um velho
hipocondríaco, carente, muito rico e avarento burguês, que se julga doente, sem
de fato o estar e, dessa maneira, acata indiscriminadamente todas as ordens de
seu médico que, por sua vez, se aproveita da situação.
É
uma obra de extrema importância social e satiriza a medicina daquela época.
Trata friamente da relação médico-paciente e denuncia a má fé dos poderosos,
num tempo em que os que se intitulavam médicos eram, quase todos, charlatães.
Com
o passar dos séculos as queixas da relação médico-paciente continuaram. E, nos
dias atuais, esta relação tomou uma proporção bem maior, em razão, talvez, da
priorização da tecnologia em detrimento da troca emocional afetiva, que sempre
deveria estar presente nesses encontros.
Os
hipocondríacos aumentam diariamente, pois as carências ocorridas em decorrência
do mundo moderno só fazem crescer.
Todos
nós nos sentimos uns abandonados crônicos; quer pelo Estado, quer pela
sociedade consumista que nos descarta facilmente no dia-a-dia, quer pelos
difíceis relacionamentos afetivos do mundo moderno.
Nesse
quadro forma-se o caldo ideal para o aparecimento das doenças psicossomáticas
que enchem os consultórios.
Na
verdade, um forte componente histeroide, aliado à baixa autoestima e carência
afetiva, faz com que algumas pessoas apresentem uma baixa do tônus cortical e,
portanto, mais sujeitas a quedas imunológicas repentinas e mais suscetíveis a
contrair todo tipo de patologia.
O
consumo exagerado e livre de medicamentos está sempre presente, o que, aliás,
muito agrada à indústria farmacêutica.
Quem
não conhece aquela pessoa que ao ouvir o relato de alguma enfermidade passa
logo a sentir todos os sintomas referidos?
Ou
então, aquela pessoa que tem como preocupação primordial frequentar
consultórios médicos? Chega até a demonstrar grande desapontamento quando seus
esculápios não prescrevem grande quantidade de remédios. Algumas, inclusive,
confessam adorar exames laboratoriais seguidos e desnecessários, assim como
todas as outras práticas médico-hospitalares.
Com
certeza, aí se esconde uma grande carência afetiva crônica, praticamente um
grito por ajuda. As intoxicações medicamentosas são frequentes nesses casos, e
sempre mais perigosas do que as próprias doenças inexistentes.
Em
países de primeiro mundo, em que a vida humana é levada mais a sério, usam-se
placebos como medicamento, e a psicoterapia é a única indicação.
Só
uma longa e detalhada anamnese e uma profunda interação médico-paciente poderão
minorar o sofrimento desses pacientes, tanto mais frequentes quanto os
desencontros da própria vida.
Que
a classe médica atente para esses verdadeiros gritos de socorro!
Gabriel Novis Neves
03-04-2013
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