Uma lâmpada indecisa revela segredos da noite e ilumina memórias que ninguém pediu.
Era comum nas casas cuiabanas deixar no corredor uma lâmpada que piscava.
As crianças tinham horror à escuridão, e minha mãe deixava essa luz trêmula acesa durante toda a noite.
Até hoje — e não sei o motivo — não consigo dormir no escuro breu.
Preciso ter um ponto luminoso como referência, mesmo que seja o do computador.
Quantas lembranças um tiquinho de luz é capaz de despertar, mesmo as que tentamos esconder nas gavetas do tempo.
A cuidadora cobre o moldem do computador que fica em seu dormitório para poder dormir.
Eu, ao contrário, só consigo adormecer com uma tênue claridade iluminando o meu quarto.
É como se aquela pequena luz piscando no corredor de antigamente continuasse me acompanhando, fiel guardiã das horas silenciosas.
A luz que pisca no corredor de um quarto de casal revela segredos que ninguém ousou pensar.
A noite é misteriosa, mesmo dentro de casa.
Ela traz medos antigos, vultos imaginários, diálogos interrompidos, sonhos que não chegaram a nascer.
E também faz aflorar lembranças que ninguém pediu: a infância na rua do Campo, o barulho do vento que não chegava, os passos da minha mãe indo verificar se estávamos cobertos.
É quando a noite espanta o sono e deixa a intranquilidade reinar.
E como é ruim não poder dormir!
Uma noite mal dormida é o outro dia quase perdido.
A cabeça pesa, o pensamento embaralha, e o humor se perde pelo caminho.
Com a idade, o corpo aprende a negociar com a escuridão.
Já não ouso desafiar o breu.
Aprendi que uma mínima claridade é companhia, quase uma conversa silenciosa que nos acalma.
Aquela mesma luz que piscava no corredor da minha infância continua piscando em mim.
E, por incrível que pareça, depois de tantos anos e tantas mudanças, o melhor remédio que conheço ainda é esse: a luz que pisca no corredor.
Gabriel Novis Neves
24-11-2025
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