Havia um instante mágico, quase sagrado, quando as luzes do cinema começavam a se apagar.
O burburinho cessava, os cochichos se calavam e, no escuro, o coração batia mais forte.
Era o sinal de que algo ia começar — uma aventura, um romance e um mundo inteiro que cabia naquela tela iluminada.
Lembro-me bem: o cheiro do carpete, o estalar das poltronas de madeira, o brilho das lanterninhas guiando os retardatários até seus lugares.
As luzes se apagavam devagar, como se o tempo também diminuísse o passo.
E, de repente, o silêncio.
Um silêncio cheio de expectativa, de sonhos que vinham de Hollywood e pousavam, por alguns minutos, em Cuiabá.
As crianças se ajeitavam nas poltronas, os casais se davam as mãos e os vendedores de balas faziam sua última corrida pelos corredores.
A projeção começava, e todos éramos transportados para outro mundo.
O Cine Teatro, o Bandeirantes, o Tropical, o São Luiz — cada sala tinha seu cheiro, sua alma e sua plateia fiel.
As luzes que se apagavam não apenas anunciavam o início do filme, mas o começo de uma emoção compartilhada.
Hoje, nos shoppings modernos, o escuro continua o mesmo, mas o encanto é outro.
Falta o ruído das bobinas, o chiado do projetor e o murmúrio de espanto na hora do beijo final.
Fecho os olhos e ainda vejo as luzes se apagando devagar, como se anunciassem o sonho que estava por vir.
Era o momento em que a realidade se recolhia — e o menino que eu fui sentado na poltrona do cinema, acreditava que tudo era possível.
Gabriel Novis Neves
Cuiabá, 11 de novembro de 2025
FOTOGRAFIA DO ACERVO DO HISTORIADOR FRANCISCO DAS CHAGAS ROCHA
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