quarta-feira, 15 de junho de 2011

Numerologia

“A numerologia atualmente não é mais vista por algumas pessoas como arte divinatória ou magia, mas como ciência, mesmo a ciência não a aceitando.”

Ela não prevê o que vai acontecer no futuro, mas indica algumas possibilidades, afirmam alguns.

Tomei conhecimento dessa possibilidade de previsão do meu futuro em 1955. Tinha acabado de passar no vestibular de Medicina da Faculdade da Praia Vermelha, como era conhecida a atual Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Meu pai era um homem de instrução primária, mas cedo adquiriu o hábito de ler os jornais locais da época - O Estado de Mato Grosso, Social Democrata, o Combate e a Cruz.

Do Rio de Janeiro, o seu favorito era O Jornal, líder dos Diários Associados. Com a falência deste, passou a ler o Globo.

Mantinha-se muito bem informado com tudo o que se passava no Rio de Janeiro e no mundo. Lia também a revista O Cruzeiro, as crônicas de Rachel de Queiroz, na última pagina, o Pif-Paf, do Millôr Fernandes, O Amigo da Onça, do Péricles e as reportagens detonadoras do David Nasser.

Sabia, por exemplo, que na época em que o seu filho enfrentou o vestibular, havia apenas vinte e três escolas de Medicina no Brasil, e a da Praia Vermelha era a mais famosa.

Quando lhe mandei um telegrama dizendo: “Passei na Praia Vermelha”, o velho Bugre comemorou a conquista, até a minha formatura em 1960!

Assistiu aos atos solenes da colação de grau no Teatro Municipal do Rio, Missa na Igreja da Candelária e baile no Hotel Glória, com a orquestra Tabajara e Spilman. Fez questão de comprar o anel de ouro com a pedra de esmeralda verde.

Após a maratona que foi o vestibular, vim passar uns dias com a minha família. Depois da soneca estatutária pós-prandial, tomava banho e ia para o bar ficar ao lado do papai na máquina registradora ajudando-o.

O Bar do Bugre era o grande centro de vivência de Cuiabá. Tudo passava por ali, inclusive a massificação da notícia que eu era estudante de Medicina da Praia Vermelha.

Certo dia, lá pelas quatro horas da tarde, só havia uma mesa ocupada, bem na frente do enorme salão do bar. Um senhor fazia correções num monte de cadernos. Reconheci ser o homem das festas infantis – rodeado pelas suas inúmeras cadelinhas. Utilizava aquele espaço como escritório, e nem uma água mineral decorava a sua mesa, que era de trabalho.

Olhou para o meu pai, e me vendo ao lado dele pergunta:

- Bugre, esse é o menino que passou na Praia Vermelha?

Papai com o cigarro no canto da boca, e um leve sorriso de satisfação, balança a cabeça afirmativamente.

- Moço, dê um pulinho aqui - pede o professor.

Olho para o meu pai e ele me disse:

- Vá.

Aproximei-me da mesa do mestre e ele me pede para sentar. Com uma folha de papel nas mãos diz que quer me dar um presente.

- Dê-me o seu nome completo, data, horário e local de nascimento – solicita.

A tudo observo e respondo. Ele realiza inúmeras contas em silêncio. Depois me pergunta:

- Você vai ser doutor, não é?

- Não – respondo. - Estou estudando para ser médico.

- Não adianta, todo médico é doutor – disse ele muito sério.

Acalma a algazarra das suas cadelinhas, olha para mim e diz, assim como profetizando:

- Você nunca assine seu nome precedido pelo doutor. Não é bom. Nem com os sobrenomes dá certo. Não se esqueça disso menino, nunca na sua vida.

Não sou supersticioso, no entanto, tem aquele velho ditado: “No creo en brujas, pero que las hay, las hay”.

Por via das dúvidas, nunca, em mais de cinquenta anos de profissão, e mesmo na vida pública, assinei doutor antes do meu nome, mesmo nos meus blocos de receituário e carimbos.

O professor que interferiu misticamente na minha vida profissional foi Ezequiel de Siqueira, mestre em numerologia e autor da letra do Hino de Cuiabá.

Gabriel Novis Neves

21-04-2011

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