domingo, 26 de outubro de 2025

TARDES DE PREGUIÇA NAS REDES


Uma das coisas que eu mais gostava de fazer, antes de viajar para o Rio de Janeiro, era passar as tardes preguiçosas deitado na rede do meu quarto.

 

De olhos semicerrados, pensava no que me aguardava longe de casa: a difícil prova do vestibular, com candidatos vindos de todo o Brasil.

 

Naquela época existiam apenas catorze faculdades de Medicina, concentradas no Sul do país, e mais cinco espalhadas por Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Paraíba e Ceará.

 

Quase todas públicas — e de qualidade.

 

Hoje, são quatrocentas e quarenta e oito em funcionamento, a maioria particular.

 

Para esquecer o peso do futuro, buscava o balanço compassado da rede.

 

Ela embalava conversas, cochilos e pensamentos.

 

Muitas vezes chegava a adormecer, apesar da responsabilidade que me aguardava.

 

Aqui o ensino era fraco, mas o esforço dos alunos era tanto que superávamos os obstáculos.

 

Nas pensões em que morei nunca encontrei as redes cuiabanas; substituías por medicamentos que afastavam o sono.

 

Naquele tempo não se exigia receita médica para adquiri-los e muitos eram indicados pelos próprios balconistas das farmácias.

 

Foi assim com Anísio Silva, da Farmácia Jacy, no Catete — que mais tarde se tornaria cantor popular e ídolo nacional na Rádio Nacional, gravando sucessos perfeitos para se ouvir deitado numa rede.

 

A rede cuiabana, fabricada também em Várzea Grande, é até hoje símbolo da nossa cultura.

 

Quando reitor da UFMT, eu costumava presentear visitantes ilustres com uma bela rede confeccionada por famílias de artesãs várzea-grandenses.

 

Lembro-me de Jarbas Gonçalves Passarinho, ministro da Educação, nascido em Xapuri, no Acre, e educado em Belém do Pará.

 

Oficial do Exército e político versátil, foi governador do Pará, senador, ocupou vários ministérios e acabou fixando residência em Brasília.

 

A rede que lhe dei, ele mandou instalar na sacada do apartamento.

 

Ali repousava, recebia visitas para conversar e também curtia as suas tardes de preguiça.

 

Hoje, o cuiabano perdeu o hábito de ter redes em casa.

 

Prefere ir ao shopping para refrescar a cabeça e descansar.

 

Gabriel Novis Neves

09-09-2025



Tece Arte e o legado da Rede em Várzea Grande


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