terça-feira, 14 de outubro de 2025

FACA, ALICATE, PEDRA DE AMOLAR

 

No quintal descansava a pedra de amolar — companheira fiel das facas da cozinha e do canivete do meu pai.

 

Seu som áspero, quando usada, lembrava o cuidado de preparar o instrumento antes da refeição ou do trabalho.

 

Soube da profissão de amolador de facas em 1953 quando fui estudar no Rio de Janeiro.

 

Geralmente era exercida por migrantes portugueses de pouca instrução.

 

Eles adaptavam, sobre uma pequena carrocinha de mão, uma roda de ferro que girava com o impulso de um cabo de aço manual.

 

Em contato com o metal, a roda produzia um ruído agudo que se ouvia de longe.

 

O afiador, para anunciar sua chegada, entoava um bordão em voz alta e musicada, chamando a atenção dos moradores.

 

Os interessados logo desciam dos apartamentos com facas, canivetes, tesouras e alicates nas mãos.

 

Na zona rural amolavam-se também facões, foices e enxadas.

 

O serviço era feito ali mesmo, na calçada, junto ao meio-fio, sob o olhar curioso das crianças.

 

Esses comerciantes ambulantes eram queridos pela população e recebidos com simpatia, sobretudo nos bairros da zona sul, onde morei.

 

Recentemente, a enfermeira cuidadora que mora no bairro Dr. Fábio me contou que ainda tem em sua casa uma pedra de amolar facas — uma raridade nos dias de hoje.

 

Na casa dos meus pais, as cozinheiras costumavam cruzar com força uma faca contra a outra, tentando recuperar o fio das lâminas cegas.

 

Hoje, com o avanço da tecnologia, temos à disposição uma infinidade de instrumentos práticos e eficazes.

 

Não me recordo de ter visto em Cuiabá algum carrinho de mão com o amolador de facas, como os portugueses do Rio.

 

E já não sei se esse serviço artesanal ainda resiste na Cidade Maravilhosa.

 

A profissão, que tem longa história, corre o risco de desaparecer, substituída por comércios fixos e máquinas modernas.

 

Mas eu guardo na memória e no coração, o som inconfundível e o bordão desses artesãos de rua — parte viva de um tempo que não volta mais.

 

Gabriel Novis Neves

13-10-2025












Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.