terça-feira, 2 de abril de 2024

ONDE EU ESTAVA?


Até hoje muitos me perguntam sobre onde eu estava no dia 31 de março de 1964.


Tinha 29 anos e trabalhava no Hospital e Pronto Socorro Municipal Souza Aguiar do Rio de Janeiro, como médico concursado.


31 de março de 1964, caiu em uma terça-feira, dia do plantão da equipe Cata Preta, do qual fazia parte no Souza Aguiar.


Estava recém-casado, preparando a minha mudança para Cuiabá.


Minha mulher gestante com data provável do parto para início de setembro.


Almocei no restaurante Lisboeta, próximo ao hospital.


Lá chegando notei um movimento incomum. Ninguém sabia explicar o que estava acontecendo.


Uma nuvem de ‘boatos’ povoava o céu do Rio de Janeiro.


Vesti o uniforme e antes de assumir o plantão, como era hábito, fui a cantina do hospital tomar o cafezinho.


Eis que o locutor do alto falante instalado em todo o hospital, inclusive na cantina, me convocava com Augusto Paulino Neto para comparecer com urgência ao gabinete do diretor Dr. Brito Cunha.


Eu e o Augusto, não tínhamos a mínima ideia do motivo daquela convocação inusitada.


Ao chegar no gabinete do diretor, me assustei. O Dr. Brito Cunha portava uma metraradora em seu peito.


Os móveis formavam barricadas. A Polícia Militar instalou uma estação de rádio, já que os telefones foram cortados.


Neste cenário preocupante o diretor nos recebeu com as seguintes palavras: ‘Vocês foram escolhidos por merecimento para defender o governador Carlos Lacerda, no Palácio Guanabara. Não sabemos o que irá acontecer nas próximas horas. As tropas do Almirante Aragão estão a caminho do Palácio Guanabara, em Laranjeiras. Montamos um ‘hospital de campanha’ dentro do Palácio.


Vocês ficarão responsáveis por ele, e que Deus os proteja.


Vocês irão em uma ambulância da Cruz Vermelha deitados no piso, para chegar com segurança até lá’.


Morrendo de medo, no Palácio nos apresentamos ao governador Lacerda, que nos recebeu muito bem.


Fez questão da nossa presença nas reuniões, inclusive no cinema, cuja sessão foi interrompida por Lacerda, pois Aragão estava no Largo do Machado em marcha para bombardear o palácio e prender o governador.


O padre da paróquia do Largo do Machado foi chamado pelo capelão do Palácio, para rezar uma missa.


Lacerda comungou, portava um metraradora e anotei poucas pessoas para defender o Palácio e aqueles que lá estavam.


Silveirinha dono das fábricas Bangu, amigo íntimo de Lacerda, fez de tudo para retirá-lo de lá.


Mas o governador estava no firme propósito de resistir.


Eu só pensava na minha mulher gestante e viúva.


O resto pertence a história do Brasil.


E você onde estava no dia 31 de março de 1964?


Gabriel Novis Neves

31-03-2024
















Equipe Cata Preta, do Hospital e Pronto Socorro Souza Aguiar do Rio de Janeiro, 1964


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