terça-feira, 10 de março de 2015

Fragilidades


Todos nós temos os nossos pontos frágeis prestes a se romperem por causas consideradas por terceiros como desprezíveis e injustificáveis.
Durante a vida criamos, através da repetição de momentos desagradáveis que nos tocam negativamente, verdadeiros focos de atrito aos menores estímulos.
A gama de tons que eles desencadeiam, nubla os nossos dias e, até mesmo, pequenos momentos na convivência do dia a dia.
Incrível imaginar a força das palavras, que é totalmente diversa de pessoa para pessoa.
Dependendo do dito, somos capazes de transformar um copo d’água num oceano de lamentações e de infelicidades, tudo em função de uma frase mal formulada, num momento inoportuno.
Não por acaso, os verdadeiros sábios falam pouco.
O silêncio não aproxima, mas também impede o erro.
Palavras não ditas são sempre sábias na sua essência, exatamente porque permanecem ocultas e versáteis no imaginário de cada um.
Talvez por isso tenhamos tanta dificuldade em expor os nossos mais profundos sentimentos.
Preferimos que eles permaneçam no mesmo túmulo em que um dia repousarão também os nossos corpos.
Quem sabe por essa razão tenhamos tanto medo da morte, que sinaliza para a grande solidão humana.
Com o acesso moderno à tecnologia digital eliminamos os últimos resquícios de privacidade que, mal ou bem, não só nos protegia como também escamoteava os nossos sentimentos, algumas vezes não tão nobres.
Com o advento da Internet, palavras são lançadas intempestivamente sem o menor pudor, invadindo a privacidade de todos.
Queremos a qualquer preço sermos vistos e, de preferência, admirados, sem nos preocuparmos se o outro concorda ou não com essa invasão.
Não é de bom tom que mensagens de todo e qualquer tipo não sejam imediatamente respondidas, por mais desinteressantes que elas sejam.
A sinceridade da resposta é o que menos conta. Insistimos em nos mostrarmos, ainda que o outro não esteja apto a essa troca.
Ignoramos a privacidade alheia, pois estamos tão umbigados, que o que queremos mesmo é amenizar as nossas carências.
Confundimos tudo isso com atenção e afeto, sentimentos bem distantes do profundo respeito ao próximo que deveria ser o princípio básico a reger nossas vidas.
Tal como náufragos desesperados, buscamos no outro a boia para as nossas frustrações.
Nesses últimos anos, a mídia digital contribuiu, em muito, para o aumento das nossas fragilidades.
Debaixo dessa troca hipócrita de afeto, o que tentamos mesmo é viver a vida do outro quando sentimos que a nossa está totalmente despida de interesse.
Não imagino que Bill Gates ao criar a sua máquina diabólica, pudesse calcular o grau de frustração dos habitantes desse planeta e o resultado que esse tiroteio digital causaria.
Ainda bem que o lado positivo do mundo digital ultrapassa, em muito, essa faceta mesquinha e perversa do seu uso com a qual, infelizmente, temos de conviver.
Como se já não bastasse as nossas inúmeras fragilidades, ainda temos que aturar a de tantos outros através de mensagens compulsivas e ininterruptas - nem sempre em momentos oportunos - quando, o que queremos mesmo, é a entrega ao devaneio e à imaginação.
Gabriel Novis Neves
04-02-2015

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