sexta-feira, 17 de novembro de 2023

CALOR ABRASADOR


Os jornais reeditam algo que se faz habitual. Agora, um tanto agigantado: seremos premiados com uma semana de ‘calor extremo’.


Não sem razão, convidei o técnico do ar-condicionado, que esteve em casa para consertar o aparelho do meu dormitório.


Já velho conhecido meu, perguntei a ele se iria passar as festas natalinas em meio aos seus familiares, na bela São Luís do Maranhão.


Achou estranha a pergunta. Arregalando os olhos sobre mim, arrematou: nunca, como agora, ganhei tanto dinheiro cuidando dos aparelhos de ar condicionado da Grande Cuiabá.


O ano em curso destampou uma estação só. Daí por que os fabricantes de aparelhos de refrigeração e de cervejas quebraram todos os recordes.


Nessa esteira, o competente e esperto brasileiro lá do Nordeste nem pensa em se afastar desta cidade, ‘galinha dos ovos de ouro’.


Aparelho de ar condicionado, sabemos todos, não traduz objeto de luxo em uma das cidades mais quentes do mundo. Aqui é prioridade.


Invadiu o território da farmacologia médica e é receitado para substituir indutores do sono e hipnóticos. Muito recomentado à classe trabalhadora que pega duro no trabalho braçal. Dormir num clima desses, só com o ar-condicionado no quarto!


Não poucos asseguram que não houve aquecimento em Cuiabá. O que dizer, então, das derrubadas das matas? O que pensar das queimadas que assolam o cerrado?


Não nos esqueçamos a transformação que houve em nossa cidade! Antigos casarões e quintais, antes arborizados, viraram espigões de concreto armado. Pergunto: isso não influenciou na elevação da temperatura!


Nossas chácaras de ontem não mais existem, cedendo espaço a inúmeros bairros e condomínios. Nossos córregos, riachos, bicas de água potável foram reduzidos a cartões postais, pálidas lembranças da Cuiabá de nossos avós.


Tudo em nome do ‘progresso’, esquecido o ‘desenvolvimento social’.


Até à época em que meus estudos me expulsaram para estudar fora (1953), morava em casa de adobe, coberta com telhas de cerâmica, feitas às margens do rio Coxipó.


A casa, acredite, não era forrada. Vantagem é que o pé direito era bastante elevado, para dar mais arejamento. O chão, de ladrilhos. Já as portas e janelas, bem amplas. Sempre de madeira.


Noite após noite, eu e meus irmãos dormíamos embalados nos cobertores das ‘Casas Pernambucanas”. Também meus pais.


Nos meses de inverno —havia inverno em Cuiabá! —, as roupas de frio deixavam os armários. Usávamos luvas, gorros, casacos e meias de lã. Inacreditável aos olhos de hoje!


Nossa alimentação era bem variada. O café com leite, antes da aula pela manhã era substituído pelo leite com chocolate quente. Um luxo!


A minha casa não tinha chuveiro elétrico, e o banho na água fria não se fazia obrigatório, nesse período.


Ia me esquecendo: não havia ventiladores para os dias mais calorentos. Curioso: sua falta, ninguém notava.


Há quem, ao ler essa crônica, venha a pensar que estou inclinado à caduquice, dada a minha idade algo avançada. Eu lhes confesso: relato a mais pura realidade!


Diante desse cenário, fico a me perguntar: o que fizeram com a minha aprazível cidadezinha? Por favor: não me julguem melancólico...


Qual o quê! A verdade trazida às claras, é que o progresso chegou.


Sem o trem!


Gabriel Novis Neves

13-11-2023




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