Brasília foi construída em quatro anos por Juscelino Kubitscheck e inaugurada em 21 de abril de 1960.
Nos seus primeiros anos a vida na nova capital era um desafio.
O clima seco e desértico tornava as tempestades de poeira uma cena frequente.
A cidade ainda carecia de infraestrutura: poucos edifícios públicos, escassos hotéis e raros restaurantes.
Projetada por Lúcio Costa em formato de avião, teve Oscar Niemayer como arquiteto de suas curvas ousadas.
O aeroporto, apesar de sua imensa pista de concreto, dispunha apenas de uma rudimentar estação de passageiros — e servia a uma população que mal ultrapassava cem mil habitantes.
Entre os pontos mais movimentados daquele pequeno terminal, destacava-se a banca de engraxates.
Quem aguardava o horário do embarque aproveitava para tirar a poeira dos sapatos.
Foi ali, em 1972, que, enquanto eu engraxava os meus, notei ao lado uma figura familiar. Seus traços me pareciam conhecidos.
Mesmo hesitante, arrisquei:
—O senhor é médico?
Ele sorriu e respondeu afirmativamente — chamando-me pelo nome.
Num ímpeto, abracei-o e perguntei o que fazia em Brasília.
Quase se desculpando, revelou que havia sido eleito deputado federal pelo MDB de Minas Gerais.
Carlos Cotta concluirá o curso de Medicina em 1963 e logo recebera um convite para trabalhar no sindicato dos metalúrgicos na Grande Belo Horizonte.
Com a cassação dos políticos tradicionais, foi escolhido para disputar uma vaga na Assembleia Legislativa e, depois na Câmara dos Deputados.
Chegou sua vez de perguntar:
—E você? O que faz em Brasília?
Contei-lhe que fora eleito pelo Conselho Diretor para implantar a Universidade Federal de Mato Grosso, em Cuiabá.
Carlos era três anos mais velho que eu, mas foi meu calouro no Hospital Municipal e Pronto Socorro Souza Aguiar, no Rio de Janeiro.
Na Faculdade Nacional de Medicina, também estava três anos atrás de mim.
Nossos encontros continuaram acontecendo ali, na banca de engraxates do aeroporto.
Conversávamos sobre tudo e sobre nada.
O convite para um cafezinho na Câmara dos Deputados ficou para outra encarnação.
Carlos partiu para o mundo espiritual há cinco anos.
Gabriel Novis Neves
19-02-2025
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