Uma das histórias mais fascinantes que eu conheço, é sobre a vida da minha mãe.
Nem sei por onde começar este texto comemorativo aos seus 111 anos de idade.
Minha mãe era a sexta filha de um médico com a filha de um usineiro, fazendeiro, dono de fábrica de cerveja e Casa Bancária.
Era considerado o homem mais rico de Cuiabá!
Minha avó materna casou-se muito jovem, e teve um filho por ano, sendo sete mulheres e um homem.
Meu avô ainda jovem ficou surdo, e como sua mulher tinha muito dinheiro e vivia ‘adoentada’, resolveu ir a Alemanha e Paris à procura de tratamento médico em 1913.
Os maiores especialistas disseram que o caso dele era irreversível.
Pediu que estudasse leitura labial para se comunicar.
Em Paris, a minha avó Tutica estava ‘muito mal’, então meu avô médico Alberto Novis, que falava fluentemente o francês, marcou uma consulta com o professor Pinard.
Esse professor obstetra foi o inventor do aparelho para auscultar os batimentos cardíacos dos fetos na cavidade uterina.
O estetoscópio de Pinard foi utilizado em todo o mundo.
Eu estudei medicina bem antes do sonar e utilizei muito o Pinard, que poderia ser de madeira ou metal.
O professor Pinard examinou a minha avó Antonieta (Tutica).
Sabedor que ele estava em trânsito, foi até um mapa do mundo que possuía no consultório e pediu ao meu avô que indicasse o trajeto e número prováveis de dias para chegar em Cuiabá.
A minha avó era multípara, a cabeça da criança estava encaixada e o colo em início de dilatação.
O diagnóstico era gravidez e a recomendação era que pegasse o primeiro vapor com urgência.
Tudo foi feito, com a minha avó em contrações uterinas atravessando o Atlântico até a Bacia do Prata.
Depois fizeram a troca para um navio menor que os conduziu pelo rio Paraguai até à cidade de Corumbá.
Nova mudança de embarcação para uma menor e mais lenta com destino à Cuiabá.
Bem antes da chegada à capital, a minha avó entrou em período expulsivo.
Meu avô médico comunicou ao Comandante da embarcação o fato, dizendo que a criança não deveria nascer na pequena embarcação.
Estavam próximos a Usina do Itaicy!
A embarcação aproximou-se das barrancas da usina.
Minha avó, com a criança nascendo foi transportada em canoa até o outro lado do Rio.
Meu avô, ajudado por peões, correndo com a minha avó deitada na rede, chegaram ao ‘monumental prédio da sede da usina’ e no primeiro quarto a minha mãe nasceu gritando.
Minha mãe nasceu no dia 2 de setembro de 1913, na Usina do Itaicy, município de Santo Antônio de Leverger.
Minha avó Antonieta ainda teve dois filhos e morreu antes de completar 30 anos de idade, deixando oito crianças órfãs.
Minha mãe não se lembra da sua mãe, e foi educada por parentes e pelo pai.
Quase parisiense, não cuiabana de nascimento, casou-se com um cuiabano 19 anos mais velho que ela.
Teve nove filhos dando-lhes todo seu amor e carinho.
Encaminhou-os para a vida pela educação e ensino.
Foi uma heroína, diariamente lembrada pelos seus filhos.
Inteligente, autodidata, poeta, compositora com canção gravada, escrevia e falava corretamente o português e o francês.
Adorada pelos filhos, era uma exímia jogadora de xadrez, e desempenhava todos os encargos de uma dona de casa.
A vida lhe concedeu todos os troféus de ‘honra ao mérito’!
Obrigado minha mãe, e até.
Gabriel Novis Neves
02-09-2024
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