sexta-feira, 31 de dezembro de 2021

SUPERSTIÇÕES E CRENDICES POPULARES


Dizem as superstições  e crendices que na primeira refeição do ano não devemos comer carnes de animais que “ciscam” para trás, pois a ingestão delas "iria impedir nosso progresso ao longo do ano".   


Com isso, muitos frangos, perús e outras aves escaparam da mortandade havida nessa data.  Para os supersticiosos vale apostar na carne de porco, cordeiro ou peixe, garantia de um ano com muito dinheiro.


Quando mais jovem, o dia 31 de dezembro era de uma terrível tortura para mim. Tudo começou quando do meu regresso do Rio de Janeiro.   Morava com mulher e filha de três meses de idade na Rua Floriano Peixoto, ao lado da Escola Técnica.


A minha vizinha, bem mais idosa, com filhos crescidos e netos, morava só com seu marido já aposentado.   Muito acolhedora, logo se tornou nossa amiga e orientadora. Nascida em Santo Antônio do Leverger, era moradora há anos em Cuiabá.


Supersticiosa e apegada às crenças populares, também conhecia os efeitos medicamentosos de folhas e raízes; conhecimentos  que nos ajudaram no início da nossa vida no trato com crianças pequenas para criar.


No dia 31 de dezembro de 1964, lá pelas oito horas da noite, apareceu em minha casa para nos visitar.  Encontrou-me de bermudas, camiseta, com a minha filha no colo, balançando tranquilamente em uma cadeira de balanço, na saleta de entrada da pequenina casa.


Perguntou para mim se não iria passar o réveillon em algum clube da cidade. Respondi que não tinha com quem deixar a minha filhinha.  Foi logo procurar a Regina, que estava nos fundos da casa, preparando a cama da neném. Indagou como iríamos nos vestir para receber o ano novo.


Regina lhe respondeu que estaria dormindo de camisola azul-clarinho e eu de bermuda cáqui e camiseta branca. A neném toda de branco como todas as crianças.


Minha vizinha ficou desesperada. Pediu permissão para abrir o guarda-roupa. Escolheu uma roupa apropriada para Regina e para mim, onde o branco e amarelo não podiam faltar de jeito algum!


Foi à sua casa e nos trouxe romã e ensinou-nos como utilizá-la.  Depois recomendou para ter o cuidado de não comer na nossa primeira refeição de 1965 galinha e peru.


O primeiro presente que ganhamos no ano novo foi a gravidez do nosso segundo filho, que nasceu em setembro!


De lá para cá "levo cola" escrita de tantas superstições para entrar com sorte o ano novo. Tem dado certo para mim e para minha família, desde então, em que tudo de bom acontece, graças a Deus e às crendices daquela vizinha, natural de Santo Antônio do Leverger.


Gabriel Novis Neves

22-12-2021










quinta-feira, 30 de dezembro de 2021

TODO CUIDADO PERMANECE


Meu filho, que é médico e trabalha em um dos grandes hospitais de Cuiabá, me telefonou dizendo que por três horas o hospital foi obrigado a fechar o seu Pronto Atendimento.


O número de pessoas “gripadas”, crianças e adultos foram à causadora dessa medida extremada.


Cuiabá atravessa um surto grave de disseminação desse vírus e as pessoas e autoridades parecem ignorá-lo, permitindo aglomerações nas festanças de final de ano.  Muitos se esqueceram do uso de máscaras protetoras facilitando ainda mais a disseminação do vírus.


Mesmo em casa, vacinado com a 3ª dose contra Covid 19 e sem participar de grandes reuniões, tendo o cuidado de atender as poucas pessoas que me procuram com a máscara protetora, minhas funcionárias sempre usando máscaras, fui atingido pelo vírus de uma gripe.


De um dia para outro apresentei tosse, espirros e dor na garganta sem placas infecciosas ou alteração na temperatura.  Para saber se estava com Covid ou H3N2, fui obrigado a fazer meu mapeamento viral, com coleta de material das narinas e garganta.


Felizmente o exame foi negativo para 24 vírus respiratórios, e Graças a Deus não foi detectado vírus no nariz e garganta. Não tenho também Covid ou H3N2.


Fiquei tranquilo porque a “gripe” é causada pelo vírus influenza, que causa febre alta, dor intensa no corpo, tosse, dor de garganta e cansaço.


A infectologista, acertadamente, pediu que não usasse antibióticos e fizesse gargarejos com água morna, vinagre e sal. Usasse soro fisiológico para limpeza das narinas e em caso de muita dor de garganta gotas de novalgina.  Quarenta e oito horas após esses cuidados estou bem, com um pouquinho de rouquidão.


Meu diagnóstico não foi da “gripe” que está abatendo a cidade, ou Covid, e sim, de um ingênuo “resfriado” assustador, que “melhorou” com os resultados do mapeamento viral que fiz.


Usar máscaras e evitar aglomerações humanas é a minha receita para evitar essa onda viral no Ano Novo.


Gabriel Novis Neves

28-12-2021




quarta-feira, 29 de dezembro de 2021

FRONTEIRAS DO TEMPO


Estamos no mês propício para refletirmos sobre as fronteiras do tempo. Será que elas realmente existem, ou é apenas uma convenção para evitarmos viver em linha reta?


Contar o tempo tem o nome de calendário, e sempre foi uma preocupação do homem.  Em geral, os Calendários se baseiam nos ciclos do Sol e Lua.


O mais antigo calendário é o chinês, e teve o seu início entre 2697 a.C. e 2597 a.C.   Depois, os egípcios estabeleceram um ano civil invariável de 365 dias, após muitas reformas, conservando a tradicional divisão em 12 meses de 30 dias e 5 dias adicionais no fim de cada ano.   No dia 24 de fevereiro de 1582, o papa Gregório XIII criou o Calendário Gregoriano, para ajustar o ano civil ao ano solar, período que a Terra leva para dar uma volta ao redor do Sol.


Na atualidade existem aproximadamente 40 calendários em uso no mundo, que podem ser classificados em três tipos: Solares, Lunares e Lunisolares.


O homem tem uma grande necessidade de marcar o tempo; não apenas por questões práticas, como também psicológicas.


Quando Cabral chegou por aqui encontrou os nossos índios medindo o tempo pelos ciclos lunares.


Ninguém sabe ao certo como se chegou à data para ser o primeiro dia do ano. Eram muito complicados os cálculos que se faziam naquela época para se chegar àquela data.


Realizei toda essa pesquisa para dizer que ganhei de Natal de uma das minhas irmãs o Calendário do Sagrado Coração de Jesus, ano 2022.   


Essa "Folhinha", editada pela “Editora Vozes”, está na 83ª Edição, e a conheci logo que foi lançada, na casa dos meus pais.  Na ocasião, eu fazia o antigo curso ginasial, quando os professores de português escolhiam temas para exercícios de redação a serem feitos como tarefas de casa.


Quando não pedia auxílio ao Rubens de Mendonça meu vizinho de rua, implorava por auxílio à  minha mãe Irene, sempre ocupadíssima com a “criação da filharada”. 


Esta comprava livros de Monteiro Lobato para minha leitura e desenvolvimento da aptidão para a redação.  Também me aconselhava a ler diariamente a Folhinha do Sagrado Coração de Jesus, com suas anotações muito interessantes.


Em breve teria acumulado informações para minhas redações escolares e para a minha vida.


Durante o período que estudava aqui, logo após o café da manhã, arrancava do calendário a folhinha do dia anterior e lia os acontecimentos históricos e mensagens filosóficas sobre o dia que estava começando.


Este ano, a Folhinha de 83 anos brinda o Ano Novo com a letra de uma canção de Jota Quest que exprime o desejo de todos nós:


“Vivemos esperando dias melhores, dias de paz, dias a mais, dias que não deixaremos para trás. Vivemos esperando o dia em que seremos melhores: melhores no amor, melhores na dor, melhores em tudo”.


Gabriel Novis Neves

17-12-2021




terça-feira, 28 de dezembro de 2021

SINAIS DOS TEMPOS


Quando não reconhecemos mais nossos colegas de faculdade, é sinal para ligarmos o alerta do tempo.   Depois de 60 anos de formados, os “sobreviventes” da minha turma de médicos, resolveram suspender os encontros realizados anualmente no Rio de Janeiro.   O baixo comparecimento dos colegas - plenamente compreensível - e a falta de “reconhecimento” de alguns, foram fatores decisivos nessa escolha.


Dia desses, um colega mais jovem da Academia de Medicina, visitando as raízes da sua família na cidade de Corumbá, postou uma foto sua com um querido colega da Praia Vermelha, morador daquela cidade.   


Não o reconheci pelos anos de distanciamento.  Diz ele, no vídeo a mim endereçado, que continua dando plantões na maternidade, atendendo consultório e com tempo de participar de festas.   Conclamou-me a voltar às atividades médicas, que exerci com grande intensidade até os 82 anos de vida plena.


Respondi que atualmente trabalho em tempo integral em outra atividade, diferente daquela da minha formação profissional.   Não me sobra tempo para nada, muito menos para participar de festas.   


Mesmo não sendo escritor escrevo crônicas, que publico diariamente no meu blog, com foco voltado em breve para minhas 3000 crônicas.   Ele poderá facilmente consultar sobre a veracidade das minhas afirmações, consultando meu livro eletrônico.


A necessidade me fez descobrir um timing, para meu envelhecimento com qualidade de vida. Escrever me fez uma pessoa mais compreensiva com a modernidade do mundo atual.   Passeio pelas distâncias do meu passado tão ricos de desafios, maiores que aqueles enfrentados na profissão médica.


Ao meu querido colega de Corumbá, amigo de sempre, inteiraço na nossa idade, convido para uma visita a cidade-mãe para realizarmos um grande encontro, oportunidade em que será proibido conversar sobre doenças e remédios.  


Também não se permitirá destaque para atualizar o obituário dos colegas que partiram para uma vida melhor, com certeza.


Antes de nos reencontrarmos, todos, atualizaremos fotos e vídeos antes da reunião  para evitarmos constrangimentos aos presentes.


Gabriel Novis Neves 

16-12-2021




segunda-feira, 27 de dezembro de 2021

AMIGO OCULTO


Fui convidado por um grupo de amigos a participar da festa do amigo oculto, também chamado de secreto.  Quando mais jovem, no exercício de cargos empresariais e públicos, participei de vários.   Com a idade chegando e com minha reclusão em casa por motivos médicos, há anos não participo dessa confraternização de final do ano.


Acho muito engraçada essa tradição, que teria tido a sua origem na Grécia Antiga.  Naquelas cidades haviam muitas pessoas que ocupavam cargos e funções importantes, tornando-se influentes.  Então, em algumas datas festivas, os gregos começaram a presentear esses indivíduos, seguindo um método aleatório, isto é, presenteavam as pessoas escolhidas por um sorteio.


A segunda versão defende que a origem do amigo secreto ocorreu no século VIII, quando, numa forma de ritual, os povos nórdicos trocavam presentes para celebrar pactos que tinham com os deuses.


Por fim, a terceira versão indica que a origem do amigo secreto foi nos Estados Unidos, no início do século XX.   Os operários queriam dar presentes para os colegas de trabalho nas festas de final de ano, em época de crise financeira.


Para que ninguém ficasse de mãos vazias, a solução encontrada foi um sorteio. Assim, todos teriam que dar e receber algo nas celebrações do amigo oculto. O resultado foi que as pessoas que não se conheciam tão bem acabaram se aproximando.


A brincadeira se popularizou e hoje é praticada em praticamente todo o mundo.  É realizada em empresas, escolas, e até dentro de casa, junto com a família.   Reúne todo tipo de pessoa, como as crianças, os jovens e adultos. Fazer o sorteio desperta uma tensão e suspense, criando ainda mais expectativas para o momento de iniciar este entretenimento.


No fim das contas, todos nós adoramos festejar o Natal com a família e amigos!  A brincadeira popular do amigo oculto não pode ficar de fora. É uma ótima forma para unir e divertir de forma econômica.


Gabriel Novis Neves 

19-12-2021





sábado, 25 de dezembro de 2021

PITORESCOS V


Minha mãe Irene nasceu na Usina do Itaicy, município de Santo Antônio do Leverger. A minha avó Eugenia, mãe do Bugre do Bar, era carioca. Posso me considerar cuiabano de “tchapa e cruz”?


Minha mulher era argentina e descansa na Piedade em Cuiabá. Meu avô cuiabano está no São João Batista no Rio de Janeiro.


Na Cuiabá de antigamente era difícil fazer diagnóstico de gravidez.  Meu avô Alberto Novis (médico), levou minha avó para “tratamento” em Paris.  Feito o diagnóstico, não houve tempo para a criança nascer em Cuiabá. Hoje o teste da gravidez é realizado nas farmácias.


Antigamente as crianças cursavam o ensino ginasial. Hoje cursam o fundamental.


Antigamente, aqueles que estudavam o ensino superior fora de Cuiabá, ao retornarem eram chamados de doutores.  Os alunos de hoje das universidades de Cuiabá chamam seus professores com pós-graduação, por "vocês" ou pelo nome próprio.


Antigamente em Cuiabá o jornal que fazia oposição ao governo foi registrado com o nome de “O Combate”. Os cuiabanos o chamavam de “cão que bate” e era impresso com páginas amarelas.


Antigamente os políticos eram cassados. Hoje afastados do cargo, até seu retorno, quase sempre.


A divisão do Estado de Mato-Grosso não foi ao meio. O norte ficou com a maior parte das terras.


Os cuiabanos de antigamente ficaram tristes com a divisão. Hoje estão contentes até demais.


As cidades de Mato-Grosso antigamente e de modo geral tinham apelidos. Cuiabá de antigamente era a “Cidade Verde”. Hoje o verde só existe em reservas florestais, bem distantes de Cuiabá.


Antigamente,  “Gatinho” era nome reconhecido de um garimpo, de cidade do interior. Hoje é Alto-Paraguai.


Nos bailes de antigamente, moças dançavam ingenuamente com outras moças. Hoje esse tipo de dança é considerada como “sinal dos tempos”.


“Dança dos Mascarados” era uma dança de homem dançando com homem. Era apreciada em danças na Cuiabá de antigamente.


Homem pantaneiro de antigamente elegia até governador do Estado. Hoje quem elege governador são os fazendeiros do nortão.


Antigamente existiam “batedores de carteiras” chamados de pianistas. Hoje pianistas são pessoas que tocam piano, igual minha bisneta.


Muitos ladrões da contemporaneidade são conhecidos por títulos nobres, tais como “comendadores”.


"Rouba, mas, faz" foi um slogan lançado bem antigamente no Brasil. Hoje continua na moda em Cuiabá.


Bem antigamente, pedir pelo telefone era remédio na farmácia. Hoje é mais usado para encomenda de comida.


Bem antigamente, visita curta era visita de médico. Hoje é de garota de programa.


Assistir jogo de futebol, antigamente em Cuiabá, era ir aos domingos no campo de futebol do Colégio Estadual de MT. Hoje, basta ligar a TV por assinatura paga para ver campeonatos nos mais diversos países do mundo.


Nos domingos de antigamente eu me reunia com a família. Hoje, me ocupo de relembrar, pesquisar e escrever sobre o pitoresco para publicar aos domingos.


Gabriel Novis Neves

05-12-2021











sexta-feira, 24 de dezembro de 2021

BONS PRESENTES DE NATAL


Todos os dias, após escrever minhas crônicas, chamo a funcionária que cuida da minha alimentação e a enfermeira para comigo lerem o que escrevi.  Aprendo muito com elas, que participam da estruturação de algumas crônicas.


Há dias escrevi sobre as “coisas chatas” da vida e ficaram impressionadas pela dificuldade que relatava para cortar minhas unhas.   Hoje pela manhã recebi de uma delas um alicate com curvas, apropriado para cortar unhas das mãos e pés, sem o perigo de tirar “bifes”. Também uma lixa amarela para acertar as pontas das unhas.   A minha cozinheira não suportou guardar o segredo e já me adiantou que a enfermeira me trará de tarde uma nova escova para os cabelos.


Presentes só são presentes quando úteis. Aqueles que ganhei de Natal das minhas  funcionárias começarei a usá-los à partir de hoje, para alegria da minha filha que reclamava dos antigos objetos que utilizava com prazo de validade há anos vencidos.


Os presentes  simples dessas pessoas tocam mais fundo o meu coração quando os recebo.  Sei das dificuldades econômicas e o que representa sair do seu apertado orçamento para demonstrarem seu carinho para mim.


Vivemos de emoções e gestos como estes, das minhas funcionárias, que me estimulam a ser mais solidário no ano novo que vem aí.   


Os sábios nos ensinam a viver este momento do ano com muito recolhimento espiritual e paz.   Lembrando sempre das pessoas que sofrem com a ausência das políticas sociais para minorarem seu padecimento.


Os presentes que ganhei de Natal de gente tão querida servem para eu nunca me esquecer delas, além de serem úteis para meu cotidiano.


Gabriel Novis Neves

22-12-2021




CEIA DE NATAL


Do meu escritório sinto o cheiro do leitãozinho, que foi preparado ontem, e agora está no forno assando.   Ganhei da fazenda do meu filho, para fazer para o almoço da família do dia 24, aniversário da minha neta mais velha.   Até uma auxiliar para a minha cozinheira foi providenciada pela minha filha, para que tudo corresse bem.


Minha família cresceu muito e tive que criar, com ajuda de arquiteto, novos espaços na sala para acolher tanta gente no almoço.   Os bisnetos em número de quatro ficarão com as suas babás, na copa que foi refrigerada e equipada para conforto da minha terceira geração.


A salada para o almoço deverá vir da “Salavitte”, empresa recém-criada pela minha neta Fernanda, que tem tudo para dar certo no competitivo mercado da gastronomia.   Como quem administra a minha casa por ocasião desses encontros é a minha filha, pelo número de pacotes de presentes que chegaram, tenho a impressão que iremos comemorar o Natal antecipado.


Daqui a pouco farei a barba para recepciona-los.   O ano que finda teve o seu 1º semestre com alguns “solavancos”, com a minha bisneta, comigo e com o Covid na minha filha, filho, nora e bisnetas. Já o 2º semestre foi pleno de saúde.  Mas temos muito que agradecer a Deus pelas graças alcançadas por dias felizes.


As festas natalinas até podem ser muito bacanas, mas é equivocada aos momentos espirituais do ser humano.   Transforma tudo em agitação, consumismo, comidaria, gritaria, bebidaria, no fundo, uma enorme confusão. Penso que o Natal é para ser vivido em recolhimento, paz e meditação. Estes são os comportamentos sábios.


Gabriel Novis Neves

24-12-2021




quinta-feira, 23 de dezembro de 2021

NATAL CUIABANO


Perguntaram-me certa ocasião como era o Natal cuiabano de antigamente.   Atualmente o nosso Natal é igual ao de toda cidade grande brasileira.


As famílias, com maior poder aquisitivo, contratam um Papai Noel, que trabalha com horário marcado.   Reúnem seu grupo social no apartamento e, na hora combinada, chega o Papai Noel.   


Todo paramentado, com o seu sininho na mão tocando sem cessar, e sua sacola vermelha às costas, comunicando-se com o seu característico riso forçado: - Oh, Oh, Oh!   Posa para fotos com a criançada e adultos. Ajuda entregar os presentes que estão na enorme árvore de natal no centro do salão de visitas.


Muitas vezes o Papai Noel vem acompanhado do seu empresário, que o ajuda a controlar o tempo da sua permanência no local da festa. O pagamento é feito antecipado pelo PIX.   Após a saída do Papai Noel é servido os comes e bebes com auxílio de garçons, e a festa não tem horário para terminar.   Geralmente os adultos vão descansar da festa de Natal, muitas horas após ao nascimento de Cristo.


Nas famílias menos favorecidas pela fortuna material, atualmente os pais levam seus filhos menores aos shoppings, para tirar fotos com o Papai Noel pelo seu celular e guardar como recordação.


Nas vésperas de Natal, as crianças pobres vão para a cama cedo, e seus pais ficam a beber cervejinha e comer churrasquinho de carne com vinagrete, esperando o nascimento de Jesus, nosso Salvador, para dormirem.   As crianças dormem com a esperança que Papai Noel não se esquecerá delas, deixando um presentinho em seus chinelinhos.


Na Cuiabá de antigamente, o Natal significava ter em casa rabanada, colocada em enormes travessas no centro da mesa principal, encobertas por fina toalha de linho branco, protegendo a guloseima das moscas.


A criançada e adultos, à noitinha percorriam as casas cuiabanas onde sabiam encontrar os presépios, maior atração do Natal da minha infância.   No retorno havia oração, pequeno lanche no qual comíamos rabanadas e as crianças iam dormir para acordarem cedo, e procurar debaixo da cama os presentes que por carta tinham pedido ao Papai Noel.


Quando criança, na minha casa nunca houve festa de natal. Meu pai sempre trabalhou nas noites de 24 de dezembro no bar.   A mais remota lembrança que tenho desse tempo, era de encontrar presentes debaixo da cama no dia de Natal, e ouvia comentários da missa do galo, na Catedral Metropolitana.


Também me recordo de conversas que ouvia das funcionárias da minha casa e redondeza, sobre a presença de Dona Zulmira Canavarros na missa do galo.   Ela tocava o órgão da Catedral com sua filha Maria, cantando com voz de soprano e o coral com os alunos do Seminário, dando mais alegria à missa.


Mais crescido e com vários irmãos pequenos, ficávamos brincando no corredor do nosso casarão da Rua do Campo, jogando futebol de botões feitos dos casacos do meu pai.   Minha mãe na cozinha cuidava do almoço do feriado do dia 25 de dezembro, onde não podia faltar o leitãozinho, refrigerante de Cuiabá e muita rabanada de sobremesa.


Fui aos 17 anos estudar fora com essa cultura natalina de nunca ter a família reunida para a ceia de Natal.   Voltei casado aos 29 anos e, no meu primeiro Natal, já tinha uma filha com três meses de idade, impossível de fazer na ocasião a festa de 24 de dezembro.


Como meus dois outros filhos nasceram com diferença de um ano de idade, só muito mais tarde iniciamos a cumprir o ritual cuiabano de antigamente.


Hoje, passo o Natal na casa de filhos, netos e bisnetos, ocasiões em que não se praticam mais aquelas tradições da Cuiabá que vivi nos meus tempos de criança.


Gabriel Novis Neves

21-12-2021













quarta-feira, 22 de dezembro de 2021

ROJÕES


Segundo historiadores, herdamos dos portugueses o hábito de celebrar nossas alegrias “soltando” os rojões de pólvora.   Nas festas religiosas, datas cívicas, no Natal e Ano Novo, aniversários de pessoas queridas, campanhas políticas e até para comemorar um gol do nosso time do coração, “soltamos” foguetes.


Foguetório pode também ser aviso, que a droga chegou ao morro, ou a polícia estar chegando.   Quem ganha um prêmio na loteria, só a casa lotérica que vendeu o bilhete comemora com foguetório. O sortudo desaparece e o valor do prêmio determina a distância da fuga do ganhador.   Até festa de amigo oculto tem fogos!


Ontem, já noitinha, quando ouvi pela janela do meu escritório o barulho de fogos bem distantes, tive a certeza da comemoração de alguém.   Logo me veio à lembrança o barulho dos fogos da minha infância, quando comecei a entender das coisas da vida.


O primeiro filme recordação foi do ruído dos fogos comemorando o Natal e Ano Novo.   Lembrei-me do Papai Noel vestido de vermelho, com botas pretas, cabelos brancos, óculos claros e enorme saco vermelho às costas, cheio de presentes.


Depois, os barulhos típicos das queimas de fogos continuaram durante esses anos todos, ficando cada vez mais sofisticados.   A felicidade passou a ser medida pelos minutos das queimas dos fogos, como na entrada do ano novo, onde há uma verdadeira competição mundial.


Antigamente, rojões com muito barulho eram “soltos” da Igreja de São Benedito, de meia em meia hora, das quatro às cinco da madrugada, para acordar os fiéis para a missa do Santo.   Toda a cidadezinha da minha infância acordava, quando seus pais iam à missa do santo da devoção.


Já na passagem do ano velho para o ano novo as crianças eram acordadas pelo “estrondo” dos foguetes, com a certeza que logo completariam também nova idade, quando receberiam presentes.


Ontem, ao ouvir o barulho dos fogos, fui invadido por uma onda de melancolia. Sabia que os fogos aconteciam em alguma parte não muito distante do local onde moro, da hoje cidade grande.   Desconhecia quem estava comemorando daquele jeito, com quem, por qual motivo, bem diferente dos meus anos da infância quando sabíamos de tudo. Os fogos das madrugadas da igreja não se ouvem mais do lugar onde moro.


Só posso estar velho, ainda "ouvindo" o foguetório que acordou minha cidadezinha na madrugada de 29 de outubro de 1945, quando a ditadura Vargas chegou ao seu final.   Eu menino, corri às janelas da minha casa encontrando lá os meus pais, com a vizinhança nas calçadas da Rua do Campo, próximos a residência dos governadores.


Tudo era foguetório - e continua - graças aos portugueses que nos ensinaram também queimar dinheiro para demonstrar um momento de felicidade.


Gabriel Novis Neves

16-12-2021







terça-feira, 21 de dezembro de 2021

ESTOU CONTENTE


Hoje pela manhã enviei aos meus contatos do celular uma simples mensagem de Natal e Ano Novo.  Deixei para encaminhá-la no início da semana do Natal e bem antes do Ano Novo.


Sei que nessas ocasiões muita gente viaja para descansar com a família e dá um descanso ao celular não o consultando, ficando impossibilitados de receber o nosso abraço eletrônico.  A internet também fica sobrecarregada nesses dias, dificultando ainda mais nossa comunicação.


Confesso que com este simples ato de confraternização cristã, ganhei o melhor presente de Natal, que foram as respostas carinhosas que recebi, quase que instantâneas, dos meus amigos e amigas, cheias de muito calor humano.  Não imaginava ser tão querido e acolhido por vocês, meus amigos!


As mensagens que recebi de retorno foram todas de forte cunho emocional, neste período do ano em que as emoções estão à flor da pele.  É quando fazemos a contabilidade daquilo que foi possível realizar e o planejamento daquilo que ainda pretendemos fazer na nossa vida.


Isso é um exercício também onde verificamos o que deixamos de fazer e a consciência que construímos muitos projetos sociais para a nossa gente, especialmente as mais pobres, porém insuficientes pelas demandas acumuladas.


Na minha idade, experimentei neste Natal e Ano Novo, o consolo da solidariedade e apreço de tanta gente boa, sinal que fui aprovado no difícil vestibular da vida.


Assim mesmo, “dobrando o cabo da boa esperança” como dizia a minha mãe, desejo repetir no próximo ano, esta mensagem de “boas festas” bem no início do mês de dezembro, para logo usufruir das emoções humanas tão necessárias e transmitidas por vocês.  Estou contente pelo simples ato que pratiquei esta manhã, logo ao acordar.


Gabriel Novis Neves

20-12-2021




segunda-feira, 20 de dezembro de 2021

DINHEIRO GUARDADO NAS MEIAS



Era estudante no Rio de Janeiro quando consegui com o brigadeiro Anísio Botelho, filho de Rosário Oeste, uma passagem aérea.  Na ocasião ele comandava o Correio Aéreo Nacional da FAB, que realizava voos de Integração Nacional. Fui até o Galeão onde funcionava esse departamento no qual ele era chefe.


Contei-lhe minha história de estudante pobre, com saudade dos meus pais.  Deixei seu gabinete com a ordem de viagem em minhas mãos. Antes me disse que se houvesse necessidade de embarque de militar à serviço, ficaria em terra, aguardando a próxima oportunidade.


O velho DC3 decolaria às 5:30 da manhã do Galeão, com escalas em São Paulo, Três Lagoas, Campo-Grande e Cuiabá.  Os assentos eram de madeira e ocupavam as laterais do avião. Seus passageiros, quase na sua totalidade, eram de militares de baixa patente, onde os soldados serviam apenas água.


Viajar de costas para a janelinha do avião foi uma sofrida experiência para o menino do interior que cresceu ouvindo dos seus pais relatos das belezas observadas pelas viagens na janela dos aviões.


Eu tinha em meus bolsos alguns biscoitos para distrair a fome até chegar “sem ônus” aos meus pais em Cuiabá.  Tudo ia muito bem até o pouso em Três Lagoas, quando recebemos ordens para descermos da aeronave.


No aeroporto fomos cientificados que o vôo não teria prosseguimento naquele dia. Uma pane no motor do avião exigia a troca da peça que viria de São Paulo.   Com certeza o voo teria continuidade no outro dia pela manhã, e que passageiros civis teriam que se deslocar de taxi até o centro da cidade para se hospedarem em um hotel. Os militares foram para o quartel.


Não tinha na minha carteira dinheiro para pagar o taxi, muito menos a pensão mais barata da cidade, onde não conhecia ninguém.   

Notei que dos poucos passageiros civis, havia um senhor falante de Cuiabá. Aproximei-me dele, contei toda a minha situação. Assumi o compromisso de resgatá-lo do empréstimo ainda no aeroporto de Cuiabá.   Ele me convidou a ir até o banheiro do aeroporto, sentou-se em pequeno banco de cimento, tirou os sapatos e retirou de dentro das meias o dinheiro que precisava para minhas despesas imprevistas.

Chegando à Cuiabá meu pai já estava no aeroporto e, sabedor da minha dívida, pagou e agradeceu ao amigo, que nunca mais vi em minha vida.


Gabriel Novis Neves

23-11-2021