segunda-feira, 31 de janeiro de 2022

VITÓRIA COMERCIAL


Em 1953, antes de viajar e me transferir para estudar no Rio de Janeiro, lembro-me do armazém do Hélio Esteves (*). Ficava no cruzamento da rua do Meio com rua Campo Grande, próximo à rua Voluntários da Pátria.


De vez em quando mamãe pedia que eu fosse a esse armazém para comprar alguma coisa em falta no Dutra.


Guardo uma passagem com “seo” Hélio Esteves que me marcou.


Era início de setembro e os pés das mangueiras do quintal da minha casa na rua do Campo estavam com seus galhos arqueados de tanta manga.  Diariamente íamos ao quintal recolher do chão as mangas que haviam caído a noite.


Na noite anterior ao dia 7 de setembro, houve um temporal com fortes ventos e chuvas. No dia seguinte quase não se podia pisar no quintal tamanho era o número de mangas.  


Enchi uns latões com manga e disse à minha mãe que iria vendê-las.  Tem que ser em um armazém, aconselhou minha mãe, pois na Praça em frente ao bar não encontraria comprador.


Tinha meus 15 anos de idade e levei algumas mangas em cestos de palha, ajudado pelo meu irmão Pedro, ao armazém do Hélio Esteves.


A chuva havia diminuído. Encontrei o dono do negócio na porta do estabelecimento, onde, na calçada encostada à parede do armazém, colocava caixas com produtos hortigranjeiros para vender.


Perguntei se queria comprar as minhas mangas e que em casa tinha ainda latões cheios de mangas.


Fez a inspeção e disse que compraria todas as mangas, inclusive aquelas que estavam em minha casa e o preço que oferecia era de três mangas por dez centavos. O preço era irrisório, mas se não vendesse as perderia - o que não estava nos meus cálculos.


Voltei para casa, cansado e desapontado, após “algumas viagens da minha casa ao armazém” com alguns trocados. Mas aprendi com “seo” Hélio como funciona “à lei da oferta e procura”, o que nunca mais esqueci.


Continuei no período das mangas a fazer negócios e vendas à varejo na porta da minha casa.


Gabriel Novis Neves

07-01-22


(*) N.E. - Bar e Armazém Vitória


FOTOGRAFIAS DO ACERVO DE FRANCISCO CHAGAS ROCHA:








Atual situação do imóvel 

domingo, 30 de janeiro de 2022

O PITORESCO X


Bem antigamente, quando “casais héteros” cometiam “certos atos”, eles se arrependiam. Hoje, existe a “pílula do dia seguinte”, que cura arrependimentos.


Na Cuiabá antiga, aqueles que chegavam de fora, eram sempre “bacanas”, e as moças ficavam agitadas pensando logo em um bom casamento. Seus pais cautelosos só investigavam. Hoje, todo mundo fica com todo mundo.


Bem antigamente, as casas cuiabanas tinham janelas com ripas de madeira colocadas com espaços para que as mães observassem o namoro das suas filhas na porta da casa. Hoje, as mães convidam os namorados das suas filhas a dormirem no quarto com a filha.


Na Cuiabá antiga, o estacionamento dos taxis ficava ao lado do bar do Bugre e tinham donos. Hoje, a maior rede de taxis de Cuiabá não tem estacionamentos e desconhecemos os seus proprietários (Uber).


Bem antigamente, os motoristas de taxi conheciam toda a nossa vida. Hoje, quando pegamos um Uber vamos aos poucos sabendo quem são os motoristas.


Na Cuiabá antiga, só os homens dirigiam os automóveis de aluguel. Hoje, homens e mulheres dirigem os carros de aluguel. A maioria deles é de jovens de ambos os sexos. Muitos são estudantes universitários. Outros já concluíram o seu curso superior e não conseguiram empregos.


Hoje, o preço dos serviços prestados por taxis particulares, é maior que o dos uber. Antes de viajar você paga o uber. O taxi, só após a corrida e o preço é marcado no taxímetro.


Bem antigamente, os músicos só tocavam à noite em clubes, boates e bares. Hoje, no café da manhã de certos bares e na sala de espera do Laboratório de Imagens em Cuiabá ouvimos músicas.


Na Cuiabá antiga, o paciente ia ao consultório médico para se consultar. Após, minucioso exame clínico, poderia ou não deixar o consultório com algum pedido de exame. Hoje, o paciente já vai consultar com um monte de resultados de exames. O médico lê e receita. O paciente entra mudo e sai calado, da consulta.


Bem antigamente, os curandeiros estudavam muito plantas e raízes medicamentosas para curar. Hoje, com um celular na mão, ninguém precisa nem estudar medicina para diagnosticar doenças e trata-las.


Na Cuiabá antiga, conseguir injetar um medicamento na veia de um paciente, era sinal de competência. Hoje, coloca-se cateter em veia profunda, com auxilio do ultrassom e posteriormente fazem-se raios-X do braço, para verificar se o cateter está bem colocado e, quantos centímetros penetraram na veia.


Bem antigamente, “arroz de festa” era aquele convidado ou não, que comparecia a todas as festas. Hoje, “arroz de festa” é aquele cereal que mandamos preparar nos dias de festas da família.


Na Cuiabá antiga, passar zunindo era passar muito rápido por onde você estava. Hoje, “zunindo” é doença para ser tratado por otorrinolaringologista.


Bem antigamente, os homens de Cuiabá usavam chapéus como sinal de elegância. Eram comprados na Europa. Os trabalhadores usavam chapéus de palha para protegê-los do sol cuiabano.


Hoje, políticos e homens do agronegócio usam enormes e caros chapéus, símbolos de poder político e econômico. Chamam também muito a atenção, pois são usados inclusive, em recintos fechados.


Na Cuiabá antiga, sempre os detentos eram muito vigiados para não fugirem das cadeias. Hoje, habitam penitenciárias modernas de segurança máxima. Todos em “ressocialização” possuem dois ou três celulares para comandarem seus negócios aqui fora.


Bem antigamente, nos dias de visita na penitenciara de Cuiabá, parentes levavam comida e roupas. Hoje, não sei como mulheres passam pela “revista” feminina e conseguem levar celulares aos seus parentes e amigos. Como? Não sei!


Na Cuiabá antiga, “Barnabé” era nome próprio de membro da Academia Matogrossente de Letras e Instituto Histórico e Geográfico de MT. Ainda hoje se usa para funcionários públicos que ganham muito bem. Às vezes os “barnabés” do serviço público realizam seu “trabalho” em casa de Cuiabá ou fora daqui.


No carnaval de 1947 Emilinha Borba imortalizou a marchinha do “funcionário barnabé”. Hoje, todo funcionário público sonha em receber o seu precatório. Os “barnabés” conseguem receber com juros e correção monetária.


Bem antigamente o Ano Novo, era recebido como o ano que não tinha “passado”. Hoje, sabemos que o Ano Novo tem muitos séculos.


Na Cuiabá antiga, tínhamos touradas, no Campo do Ourique. Hoje, nesse “lugar funciona a Câmara de Vereadores de Cuiabá”.


Gabriel Novis Neves  

26-12-2021




sábado, 29 de janeiro de 2022

MINHA GRATIDÃO


Nunca tive dúvidas sobre o quanto me sinto querido nesta cidade.  Confirmei concretamente esse sentimento em razão das respostas a um covarde ataque que recebi da variante do Covid.


Tomei as duas doses da vacina Astrazenica e a de reforço da Pfizer.  Vivo em isolamento social, cumprindo com rigor todas as normas da vigilância sanitária.  Assim que meus parentes e amigos ficaram sabendo da minha situação de saúde, recebi um verdadeiro abração de solidariedade.


Este simbólico “abração” foi bem mais intenso que a carga viral do ômicron.  Produziu o mesmo efeito do “anticorpo monoclonal”, que usei para evitar complicações da nova doença, ainda pouco conhecida da ciência médica.


Não gosto de escrever sobre minha sensação subjetiva de alegria, mas neste caso não tenho porque esconder.  Na minha idade é bom escrever como me senti diante de um choque de solidariedade humana, para poder agradecer a todos que se preocuparam com a minha saúde.


Viver com a gratidão recebida e retribuída é uma felicidade.


Foi tanta gente querendo me ajudar!  Médicos, enfermeiras, fisioterapeutas, e patologistas clínicos com seus conhecimentos científicos sobre essa doença, que teeninou por me descobrir bem escondidinho dela.


A minha imensa família que tudo fez para minha cura, inclusive a minha filha correndo o risco de se contaminar.  Aos amigos que acumulei pelo tempo, com as suas orações.  Ao editor do meu blog e colegas jornalistas, minha gratidão pelo desejo externado pela minha recuperação.


Só pelo avanço dos estudos da ciência médica, poderemos sair desta pandemia, cujos recursos terapêuticos existentes hoje, ainda não chegam a beneficiar a base aumentada da pirâmide social.


Não temos equipes de saúde treinadas e preparadas, em números suficientes para atender toda a população, assim como PSFs, UPAs, Hospitais, UTIs e medicações.


Estamos no caminho certo, e em breve teremos a vacinação das crianças, aumentando o número de imunizados.


Minha gratidão.


Gabriel Novis Neves  

22-01-2022




sexta-feira, 28 de janeiro de 2022

AMIZADE NÃO TEM PREÇO


Sempre vivi dentro de um hospital. Sentia paz, tranquilidade e leveza. Às vezes, quando passava visitas nas minhas pacientes, desligava do mundo.


Quando fiquei na exclusiva função de professor no HUJM, após ter sido Reitor da Universidade, lecionando a disciplina ginecologia e obstetrícia, pedi ao chefe do serviço que também me escalasse para orientar os alunos nas visitas às pacientes internadas nas enfermarias, aos sábados pela manhã.


Quem não compreendia essa minha mania de trabalhar aos sábados eram meus filhos menores.  Hoje, entendem perfeitamente essa minha vocação. Nunca os abandonei.


Existiam mais pessoas necessitadas dos meus cuidados profissionais e do ensino humanizado aos futuros médicos.  Após 30 anos, os antigos estudantes sempre se lembram de mim, como o “professor das visitas aos sábados”.


Quando, um tanto desiludido da má prática getal da medicina humanizada - muita falada e pouco utilizada -, tive necessidade de me internar para tratamento.


Encontrei  aquilo que fora motivo de me sentir tão bem quando jovem nos hospitais.  Em plena pandemia do Covid fui atendido, medicado e permanecido internado por 24 horas em um leito do Pronto Atendimento de Doenças Infeciosas Pulmonares.  


Estava no 2º dia de sintomas e testagem positiva do PCR para Covid.  A internação foi preventiva, para evitar complicações em idoso de 87 anos, mesmo tendo tomado as duas doses da vacina  Astrazenica e dose de reforço da Pfizer, contrai a variante do vírus Covid 19.


Fui atendido por um médico e professor universitário de invejável currículo acadêmico, muito competente, humilde e transbordando empatia e humanismo, que não conhecia pessoalmente antes desse episódio.


Após a alta médica e hospitalar, o procurei em seu consultório para perguntar o preço dos seus honorários e efetuar pagamento; ao que me respondeu – “esqueça-se dessa pergunta.  Eu é que lhe devo, pois acabei de adquirir uma amizade e isso não tem preço."


Gabriel Novis Neves

20-01-2022





quarta-feira, 26 de janeiro de 2022

CHEIRO DE LOJA


Em julho de 1952, aproveitando as férias escolares, meu pai me levou ao Rio de Janeiro.  Era seu desejo que eu conhecesse a “cidade grande”, onde concluiria meu 2º grau e faria o vestibular para medicina.


Ficamos hospedados em um modesto hotel na Avenida N. Sa. de Copacabana, próximo à residência dos seus irmãos.


Meu pai tinha alergia até à maresia, e nunca provou frutos do mar, tampouco tomou foi à praia.


Logo que chegamos, no outro dia fomos almoçar com meus tios.  Eram quatro “solteirões”, dos quais três trabalhavam fora e a irmã mais velha cuidava deles.


A conversa longa e descontraída terminou com a necessidade de eu conhecer a loja “Sears”, recém-inaugurada em Botafogo, embora  meu interesse maior fosse conhecer o “Maracanã”, inaugurado dois anos antes e onde o Brasil perdeu para os uruguaios a Copa do Mundo.


Fizemos uma visita demorada à loja da Praia de Botafogo.  Conheci as escadas rolantes, acho que a primeira do Rio, que nos conduziam aos diversos andares da moderna loja, causando-nos admiração.


Todo “mundo” ia passear por lá e aproveitar a sua refrigeração, onde só se encontrava gente bonita.  Fiquei encantado com tudo que via e era novidade para mim.


Após uma semana de passeios, voltei com o meu pai para Cuiabá, já com uma noção da “Cidade Maravilhosa” que iria me acolher para realizar o meu sonho de ser médico!


Retornando ao Rio no ano seguinte para estudar, minha pensão ficava na mesma quadra da loja recém-inaugurada.  Estudava no Colégio Anglo Americano e no término das aulas, ia muito passear por lá.


A maioria das alunas dos famosos colégios da Praia de Botafogo (Anglo Americano, Andrews, Imaculada Conceição, Juruena) era encontrada lá.  Eu comprava pipocas e amendoim salgado, na entrada da loja, passeava e paquerava as lindas meninas.


Tenho até hoje guardado em minha memória o “cheiro” da Sears!


Como tudo no mundo é provisório, essa loja inaugurada em 1949 fechou as suas portas em 1980.


Nunca mais a visitei para não “matar uma fantasia” do início dos anos cinquenta.


Em seu lugar funciona hoje, o “Botafogo Praia Shopping”.


Gabriel Novis Neves

13-01-2022











HISTORIADOR RUBENS DE MENDONÇA


Na minha vida tive inúmeros professores formais (e alguns, não).  Nesse último grupo incluo o historiador Rubens de Mendonça.


Quando me mudei da rua de Baixo para a rua do Campo, aos dez anos de idade, morava muito próximo à casa do historiador e de seu pai, também historiador, Estevão de Mendonça.


Eu era mais jovem que o Rubens, e logo descobri que ele “fazia tarefas” para os estudantes sem cobrar nada.  Atendia com paciência a todos que o procuravam em casa, especialmente quando o assunto era redação.


Tornei-me amigo dele nessa ocasião,  assim permanecendo a vida inteira. Voltei do Rio de Janeiro onde fui estudar e continuamos amigos.


Depois de voltar como médico, professor  e Reitor da UFMT, fui seu colega de universidade, pois o nomeei “professor colaborador” em razão da importância dos seus conhecimentos, embora não possuísse curso superior. Sua vasta obra e o currículo autorizavam.


Hoje, com toda justiça, seria “professor Doutor Honoris Causa” na UFMT ou qualquer outra instituição de ensino superior que preze o conhecimento, o ensino, a pesquisa e a extensão.


Tudo que sei sobre a história de Mato Grosso, aprendi nas conversas com o Rubens.   Nas portas do Bar do Bugre, na sua casa, na janela da sua casa, voltadas para a rua, e quando ia à Academia de Letras e Instituto Histórico e Geográfico de Mato-Grosso.


Rubens era secretário perpétuo da Academia de Letras e possuía chave própria da porta principal.


Era obrigatório, quando ia para a Academia fazer pesquisas, passar pela porta da minha casa.  Nessas ocasiões me convidava para aproveitar as frutas do quintal da Academia, como goiabas vermelhas, atas, jabuticabas e mangas burbons.


O meu 4º consultório, antes de ir definitivamente para o da Clínica Femina, foi ao lado da casa do historiador.  A sala de consultas era separada do escritório do Rubens por grossa parede de adobe.  


Quando desejava me dar uma notícia urgente, não ligava seu telefone de parede ou ia ao meu consultório.  Batia com os punhos das mãos na parede. Eu já sabia que ele desejava falar comigo.


Saía à janela do meu consultório e ele na sua do escritório.  Conversávamos.


Após o término do período de atendimento, eu ia à sua casa. Às vezes era uma consulta. Outras, minha opinião sobre as últimas “quadrinhas” que ele iria distribuir na porta do Bar do Bugre.


O Rubens era muito espirituoso,  fazia poesias, mas era imbatível nas suas famosas quadrinhas.


Em 1969 eu era secretário de Educação e Cultura do Estado de Mato-Grosso, no governo Pedro Pedrossian.  Uma comitiva foi escolhida pelo governador para a compra de tratores na Romênia.


Fazia parte dela o secretário de Planejamento, o engenheiro chefe do Escritório Comercial de Mato Grosso em São Paulo e eu.


O Rubens me chamou, tirou do bolso da sua camisa um pedaço de papel datilografado.  Disse-me “que tinham colocado em seu bolso” e que lesse o que estava escrito.


“Para a compra de tratores

O Pedroca nos ensina

Tem que ser doutor

E formado em medicina”


Essa era uma quadrinha maliciosa, de inúmeras que fez em “minha homenagem”!


Assim era o meu querido professor Rubens de Mendonça!


Gabriel Novis Neves

18-01-2022


N.E.: Fotografias dos acervos pessoais e também públicos, oriundas dos grupos do Facebook "Cuiabá-MT de antigamente" e "Cuiabá e Mato Grosso  de antanho"





HISTORIADOR ESTÊVÃO DE MENDONÇA 

 




HISTORIADOR ESTÊVÃO DE MENDONÇA 











O escritor, em noite de autógrafos 

A vasta obra literária 









Credencial da Imprensa Internacional 











O escritor, em noite de autógrafos 

A vasta obra literária 









Credencial da Imprensa Internacional 


Reconhecimentos para eternizar a obra 

Desde a preparação para o futuro 

Para sempre, no coração de Cuiabá