quinta-feira, 29 de abril de 2021

IMUNIZAÇÃO

Dia quatro de fevereiro uma quinta feira à tarde no Centro de Eventos do Pantanal, tomei a primeira dose da vacina contra o vírus que mata.


Não houve escolha, e naquele dia só estavam vacinando com a AstraZenica de Oxford, de Manguinhos (RJ).


Sai do posto de vacinação já com o dia de aplicação da segunda dose marcada para, vinte e oito de abril de dois mil e vinte e um, uma quarta-feira.


Foram oitenta e três dias de espera e incertezas. As notícias não eram nada agradáveis. Faltava vacina em todo o país, Manguinhos ficou um tempo sem receber insumos, e tivemos que enfrentar o terrorismo do mês de março quando batemos os recordes de infectados e mortos.


O dia da minha segunda dose se aproximava, a ansiedade aumentava, o pensamento era um só: conseguir me vacinar no prazo marcado.


Hoje tudo deu certo, e é muito bom elogiar o que é bem feito. Não enfrentei filas, a enfermeira que me vacinou - a Moema foi aluna do Curso de Enfermagem da UFMT, me tratou com humanidade e técnica.


Aproveito para agradecer a eficiência da Secretaria de Saúde Municipal, e a todos seus funcionários por esse belo trabalho social enfrentando a pandêmica na sua linha de frente.


Sinto-me aliviado, com a sensação do dever cumprido, protegendo ao meu próximo e a mim mesmo.


Vou esperar catorze dias para reunir os filhos, netos e bisnetos, para os tradicionais almoços de domingo!


Mas com os cuidados do uso de máscara, álcool e gel.


Como foi difícil atravessar essa longa fase de isolamento!


Minha neta colou grau em medicina, meu neto foi estudar em São Paulo e, por causa do vírus, está em Cuiabá estudando à distância.


Outra neta casada e morando em Portugal está impedida de vir ao Brasil e meu bisneto português está enorme!


Minhas duas bisnetas – as Marias, estão moças e não pude acompanhar essa maravilhosa fase da vida delas como gostaria.


Usam computador e celular e sabem mais das coisas do que eu, como comer comida japonesa com aqueles dois pauzinhos!


É bom ter ilusões, mesmo ao ocaso da vida. Espero daqui para frente enfrentar os dias com mais leveza, não me esquecendo nunca que a vida é aquela que se vive hoje.


Não digo que estou feliz, nem vou tirar fotos sorrindo, pois a “felicidade é um produto mercadológico”, mas sentindo um alívio social pelo dever cumprido: estou vacinado.


Faço um apelo para que todos se vacinem.


Gabriel Novis Neves

28-04-2021

OITO DE ABRIL

 Antes de viajar para o Rio de Janeiro para estudar medicina, o feriado mais esperado para mim, era o comemorativo da fundação de Cuiabá.


Ainda na Escola Modelo Barão de Melgaço, entre seis e dez anos, marchava de uniforme cáqui com meus colegas de ensino primário, no desfile cívico militar.


Foi em um desfile que descobri o amor que meus pais tinham por mim.


Deixavam seus inúmeros afazeres para assistirem ao desfile do seu primogênito!


Quando voltava para casa, recebia abraços e beijos pelo brilhantismo da minha participação na festa cívica.


Por alguns dias em casa, o assunto era o desfile escolar e a rixa com os outros colégios!


 Por ser alto e magro, era escolhido para ser o homem base do grupo de trinta meninos, responsável pelo deslocamento do grupo.


 Quando fui para o Colégio Salesiano, mais conhecido como Colégio dos Padres, para fazer o antigo ginásio, mudei de categoria.


 Pela altura desfilei carregando a bandeira do Colégio Salesiano, e no último ano participei da fanfarra, glória para todos os alunos da época.


 Eu tocava o surdo, na última fila da banda!


 Oito de Abril era uma festa das famílias de Cuiabá.


No meu retorno a Cuiabá para exercer a profissão de médico, não me neguei a retribuir o que o Estado investiu em mim.


Exerci por longos anos os cargos de secretário Estadual de Educação, Cultura e Lazer, e implantei a UFMT.


Sempre participei dos desfiles agora no palanque, com meus filhos pequenos.


Há quinze anos, tento esquecer o feriado esperado da minha infância.


A minha companheira de quarenta e três anos, nos deixou prematuramente vítima de um câncer do rim! Foi a maestrina da minha vida, e da minha família.


Ela tinha consciência do seu papel social, e todas as condições de tranquilidade me ofereceu para viabilização de projetos essenciais ao desenvolvimento de Mato-Grosso.


Minha mulher era argentina de nascimento, foi criada no Rio de Janeiro, casou com um médico cuiabano, vindo a residir e constituir família aqui.


Seus três filhos são cuiabanos, nascidos no Hospital Geral, hoje Hospital Geral Universitário (HGU).


Seus netos nasceram aqui, como duas bisnetas.


Toda perda significa uma diminuição, mas a morte da Regina produziu um vácuo na nossa família e um trauma nos meus projetos de vida.


Sete de Abril é véspera de Oito de Abril, luto permanente para mim.


 Nada tenho mais a comemorar em Oito de Abril, a não ser a certeza do nosso já próximo encontro, desta vez para sempre.


Gabriel Novis Neves

06-04-2021

terça-feira, 27 de abril de 2021

INQUIETAÇÕES

 Boa parte da população mundial neste momento tem uma única  preocupação - saber se após o isolamento social a que somos obrigados a manter por causa desse terrível vírus que mata, as relações sociais serão as mesmas ou se sofrerão mudanças importantes.

O mundo nunca mais será o mesmo, dizem alguns.

Já passamos por varias pandemias e epidemias no passado e muito pouco mudou em nossos hábitos sociais.

Na verdade estamos trancados em casa, mas os entregadores de mercado, farmácias, alimentos, serviçais, continuam seus trabalhos normalmente.

Utilizam os meios de transportes coletivos sempre superlotados, um colado ao outro, a maioria sem máscara.

Porque privar essa classe trabalhadora que não pode ficar em casa, das suas festas em família e amigos? Os ricos viajam pelo Brasil e para o exterior em seus jatos particulares, ou passeiam em seus enormes iates de luxo.

Todos estamos no mesmo barco com relação à pandemia, e essa discrepância me cheira à hipocrisia e mentira, pois que, entre outras coisas, favorece o acirramento das diferenças sociais.

Basta visitar hospitais e constatar aquilo que falo.

Depois de alguns meses da erradicação dessa maldita doença, os antigos hábitos sociais de convivência voltarão a ser novamente incorporados?

Acredito que ficarão como sequelas da pandemia o hábito de usar máscaras e o trabalho à distância, causando mais desempregos.

O brasileiro tem memória curta, e até a vacinação deverá ficar como herança, pelo menos por algum tempo.

Nunca uma pandemia ocupou espaço tão grande na mídia! O pior que poderia acontecer para apavorar a população e transformar essa doença, que ninguém conhece, em arma política.

Daqui a dois dias vou tomar a segunda dose da vacina AstraZenica de Oxford, aguardar catorze dias e, com a ilusão da imunidade ,chamar o cabelereiro para cortar meus compridos cabelos do isolamento.

E as inquietações e insegurança permanecerão por quanto tempo?

Muita água ainda passará debaixo da ponte até que o mistério deste vírus seja esclarecido, que, segundo alguns, está na sua terceira onda.

Acredito que a ciência médica nos dará, não sei quando, a explicação definitiva para nossas inquietações.


Gabriel Novis Neves

26-04-2021



segunda-feira, 26 de abril de 2021

GENÉTICA

 Se a pandemia do terrível vírus nos fez sofrer com as perdas de milhares de vidas humanas e me obrigou a não sair de casa, muito menos receber visitas dos meus filhos, netos e bisnetos, de outra parte tenho tempo demais para ser preenchido.

Entre ficar o dia todo deitado na cama, mesmo com os sintomas da minha desautonomia, resolvi ler e escrever.

Os primeiros dias foram terríveis. Essa doença neurológica deixa o paciente zoado. Aprendi a sublimar, e mesmo em condições desfavoráveis tento escrever, utilizando o meu dedo do meio da mão direita para teclar.

Cada vez que penso sobre a reprodução humana, mais me emociono com uma célula masculina se unindo a outra do sexo feminino, dando origem à vida.

A ciência está muito evoluída, porém jamais conseguirá criar a máquina mais complexa que existe que é o ser humano!

Só mesmo um ser superior é capaz de trazer para Cuiabá um jovem médico baiano para lutar na expulsão dos paraguaios da cidade de Corumbá.

Lendo “Raízes do Passado” de Pedro Novis Neves, cheguei à conclusão que a família Novis Neves é subproduto da Guerra do Paraguai e da construção da Praça Alencastro.

Explico: o meu bisavô materno, médico Augusto Novis, baiano de Salvador só veio para Cuiabá por causa da Guerra do Paraguai e aqui ficou pelas consequências sanitárias do conflito, que foi a epidemia da varíola que dizimou metade da população cuiabana. Na época ele era o único médico que tratava essa doença, e nos anais médicos há anotações de uma vacina criada por ele, além de muita fé.

Casou-se com uma cuiabana, Maria da Glória Leite Novis (Nharinha) com a qual teve onze filhos.

Do lado paterno minha bisavó era uruguaia – Leonarda de Vasconcelos Herrara e meu bisavô um gaúcho Marechal Américo Rodrigues de Vasconcelos. Tiveram apenas uma filha nascida no Rio de Janeiro, Eugênia de Vasconcelos Neves.

Meu bisavô era militar engenheiro e recebeu do Presidente Floriano Peixoto a missão de construir a Praça Alencastro.

Veio para cá com mulher e filha adolescente, que logo se apaixonou e casou com o comerciante Gabriel de Souza Neves.

Dessa união nasceram catorze filhos, todos conhecidos por apelidos. O meu pai era chamado de Bugre, aos vinte e seis anos quando abriu o Bar Moderno, passou a ser o Bugre do Bar.

Olyntho Neves só existia na sua certidão de nascimento e Junta Comercial.

Bugre casou-se com Irene Novis e deixou nove filhos, constituindo os “Noves Neves”.

A minha indagação é se sou um produto genético da Guerra do Paraguai e Construção da Praça Alencastro?

Parece estranho esse meu interesse pelos meus genes, vindo de lugares tão distantes em situações bastante missionárias.

Vou consultar um geneticista.


Gabriel Novis Neves

23-04-2021

quinta-feira, 22 de abril de 2021

USADO NÃO É VELHO


Estava há mais de cinco anos, sem usar o meu antigo laptop. Muitos chegaram a comentar que o equipamento era um lixo de luxo, que guardava comigo.

Tenho um novo bastante moderno, que uso diariamente.

Não tinha respostas para esse tipo de pergunta, e para me satisfazer inventei que o decano computador é que escrevia as minhas crônicas.

E não foram poucos, os trabalhos que juntos realizamos. Foram mais de duas mil e seiscentas crônicas publicadas no blog bar do bugre, invenção do meu querido amigo João Cunha.

A funcionária responsável pela minha casa, nunca tinha me visto brincando com esta antiga peça.

Fui pego em flagrante quando veio fazer a limpeza no quarto. Ela não se conteve e perguntou o motivo da troca do moderno computador pelo velho.

Fiquei mudo e ela quis me ajudar: O senhor tem amor a esse aparelho!

Respondi-lhe: como vou amar a um objeto!

Amizade também não, pois é impossível pensar nisso.

Daí saiu à resposta para me satisfazer, mas, não sei ao certo desse meu apego.

Quantas vezes em minha vida dei respostas para me aliviar, por exemplo: porque me casei com uma carioca e vim exercer a minha profissão em Cuiabá?

Acho que todos que tiveram o privilégio (!) de uma vida longa, estou com oitenta e seis anos, já passou várias vezes por essa situação de receber uma pergunta sobre decisões tomadas, e inventar uma resposta que mais lhe agrade emocionalmente.

Na verdade não sei responder, e essa dúvida carrego a vida toda.

Tenho tantas perguntas sem respostas, que nem gosto de pensar.

Tento racionalizar aquilo que é emoção para apagar essas dúvidas da minha longa estrada já percorrida.

O meu ciclo biológico está fechando, e só não quero continuar sofrendo com essas lembranças do passado, que fazem parte da minha vida.

Porque voltei afinal, a escrever do meu antigo computador?

Ajudem-me a resolver pelo menos, este pequeninho problema, tão importante para mim.

Depois, prometo colocar antigas decisões que fazem parte da minha biografia, sempre pensando na melhor opção, mas hoje, não convencido do acerto.

Ai vem à desculpa racional: usado não é velho.


Gabriel Novis Neves

21-04-2021

quarta-feira, 14 de abril de 2021

DIAS IGUAIS

Bons tempos aqueles no qual esperávamos com avidez, os dias da semana com as suas peculiaridades.

Quem não se recorda da sexta-feira, dia da esperança de um agradável final de semana.

Sexta sextou, com programas em bares, lanchonetes, restaurantes, boates ou simplesmente reunião com amigos em casa!

Sábado da feijoada e churrasquinho em toda cidade.

Domingo da macarronada em reunião da família.

Na minha casa com o aumento da família, tive que ampliar o salão do almoço, para abrigar filhos, netos, genros e bisnetos no mesmo aconchego.

E o que dizer da segunda da preguiça e terça, quarta e quinta no papel burocrático de completar a semana!

Quase todos os meses tinham os abençoados feriados, civis e religiosos cada qual com a sua caracterização histórica.

A vida era gostosa e esperada onde a aglomeração era o ponto alto.

Tudo evoluiu e o vírus chinês saiu de casa para ganhar o mundo, com o nome de pandemia.

Dizimou em pouco tempo, milhares de vidas em todo o universo, produzindo dores, tristezas, e pobreza.

A ciência médica ficou humilde, pois desconhecia totalmente a nova doença e seu ciclo de evolução e cura.

O mundo mudou para pior, e o abraço que tanto bem faz ao ser humano foi proibido.

Aqueles que podem estão condenados ao isolamento social.

O vazio acentuou a solidão perversa inimiga do homem.

A vida do velho ficou insuportável, com o terrível ninho vazio dando lugar,

a sofridos pesadelos de horror.

E o vírus chinês continua matando!

Quanto mais estudo essa doença, menos sei. A única certeza é que cada dia mais vidas são ceifadas.

Temos que descobrir como encarar a morte, como evento fisiológico.

A esperança de vida simbolizada pela vacina tem que chegar a todos, o mais rápido possível.

Só assim, acredito que os dias serão diferentes, e a felicidade voltará ao nosso convívio com muitos abraços e beijos.

 

Gabriel Novis Neves

04-04-2021