Era estudante no Rio de Janeiro quando consegui com o brigadeiro Anísio Botelho, filho de Rosário Oeste, uma passagem aérea. Na ocasião ele comandava o Correio Aéreo Nacional da FAB, que realizava voos de Integração Nacional. Fui até o Galeão onde funcionava esse departamento no qual ele era chefe.
Contei-lhe minha história de estudante pobre, com saudade dos meus pais. Deixei seu gabinete com a ordem de viagem em minhas mãos. Antes me disse que se houvesse necessidade de embarque de militar à serviço, ficaria em terra, aguardando a próxima oportunidade.
O velho DC3 decolaria às 5:30 da manhã do Galeão, com escalas em São Paulo, Três Lagoas, Campo-Grande e Cuiabá. Os assentos eram de madeira e ocupavam as laterais do avião. Seus passageiros, quase na sua totalidade, eram de militares de baixa patente, onde os soldados serviam apenas água.
Viajar de costas para a janelinha do avião foi uma sofrida experiência para o menino do interior que cresceu ouvindo dos seus pais relatos das belezas observadas pelas viagens na janela dos aviões.
Eu tinha em meus bolsos alguns biscoitos para distrair a fome até chegar “sem ônus” aos meus pais em Cuiabá. Tudo ia muito bem até o pouso em Três Lagoas, quando recebemos ordens para descermos da aeronave.
No aeroporto fomos cientificados que o vôo não teria prosseguimento naquele dia. Uma pane no motor do avião exigia a troca da peça que viria de São Paulo. Com certeza o voo teria continuidade no outro dia pela manhã, e que passageiros civis teriam que se deslocar de taxi até o centro da cidade para se hospedarem em um hotel. Os militares foram para o quartel.
Não tinha na minha carteira dinheiro para pagar o taxi, muito menos a pensão mais barata da cidade, onde não conhecia ninguém.
Notei que dos poucos passageiros civis, havia um senhor falante de Cuiabá. Aproximei-me dele, contei toda a minha situação. Assumi o compromisso de resgatá-lo do empréstimo ainda no aeroporto de Cuiabá. Ele me convidou a ir até o banheiro do aeroporto, sentou-se em pequeno banco de cimento, tirou os sapatos e retirou de dentro das meias o dinheiro que precisava para minhas despesas imprevistas.
Chegando à Cuiabá meu pai já estava no aeroporto e, sabedor da minha dívida, pagou e agradeceu ao amigo, que nunca mais vi em minha vida.
Gabriel Novis Neves
23-11-2021
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